Neste comentário abordaremos os artigos 80 e 81 do NCPC, a partir do exame comparativo com a redação atual do CPC.
CPC ATUAL |
NCPC
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Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:
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Art. 80. São deveres das partes, de seus procuradores, e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:
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I – expor os fatos em juízo conforme a verdade;
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I – expor os fatos em juízo conforme a verdade;
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II – proceder com lealdade e boa-fé;
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II – proceder com lealdade e boa-fé;
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III – não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento;
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III – não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento;
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IV – não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa do direito.
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IV – não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito;
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V – cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final,
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V – cumprir com exatidão as decisões de caráter executivo ou mandamental e não criar embaraços à efetivação de pronunciamentos judiciais, de natureza antecipatória ou final;
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VI – declinar o endereço, residencial ou profissional, em que receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva.
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Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado.
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§ 1º A violação ao disposto no inciso V do caput deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, devendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa.
§ 2º O valor da multa prevista no § 1º deverá ser depositado em juízo no prazo a ser fixado pelo juiz. Não sendo paga no prazo estabelecido, a multa será inscrita como dívida ativa da União ou do Estado.
§ 3º A multa prevista no § 1º poderá ser fixada independentemente da incidência daquela prevista no art. 509, § 1º e da periódica prevista no art. 522.
§ 4º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa referida no § 1º poderá ser fixada em até o décuplo do valor das custas processuais.
§ 5º Aos advogados públicos ou privados, aos membros da Defensoria Pública e do Ministério Público não se aplica o disposto nos §§ 1º a 4º, devendo sua responsabilização ser apurada pelos órgãos de classe respectivos, aos quais o juiz oficiará.
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Art. 15. É defeso às partes e seus advogados empregar expressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendo ao juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las.
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Art. 81. É vedado às partes, aos advogados públicos e privados, aos juízes, aos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública e a qualquer pessoa que participe do processo empregar expressões injuriosas nos escritos apresentados, cabendo ao juiz ou ao tribunal, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las.
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parágrafo único. Quando as expressões injuriosas forem proferidas em defesa oral, o juiz advertirá o advogado que não as use, sob pena de lhe ser cassada a palavra.
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Parágrafo único. Quando expressões injuriosas forem manifestadas oralmente, o juiz advertirá o ofensor de que não as deve usar, sob pena de lhe ser cassada a palavra.
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Os artigos 80 e 81 representam a concretização do Princípio da Cooperação, assegurada no início do texto do NCPC, especificamente nos artigos 5 e 8º.
Na verdade, temos sustentado que a cooperação é algo mais do que a simples boa fé.
Embora não haja consenso terminológico e mesmo no alcance da expressão, gosto de pensar que boa fé significa não praticar conduta que possa causar algum dano, ao passo que cooperação é um passo além, ou seja, praticar algo que traga um resultado construtivo ao processo.
Não é apenas se abster de causar um dano; é agir de forma positiva.
O que se denomina, modernamente, de princípio da cooperação intersubjetiva tem dupla compreensão, como destaca GOUVEIA (Lucio Grassi de GOUVEIA. A função legitimadora do principio da cooperação intersubjetiva no processo civil brasileiro. Revista de Processo nº 172. Ano 34, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. Dessa forma, temos: 1) dever das partes de cooperar com o juízo; e 2) dever do juízo de cooperar com as partes.
Podemos dizer que há, ainda, uma terceira dimensão que determina a cooperação das partes entre si.
A parte que não coopera, age em desacordo com o princípio da boa-fé, enveredando pela litigância de má-fé e abuso do direito. O princípio da cooperação é expressamente previsto no artigo 266º do Código de Processo Civil de Portugal ( “Artigo 266º (princípio da cooperação) 1. Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.”) .
Para Miguel Teixeira de Sousa (SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2. Ed. Lisboa : Lex, 1997, p. 65) são deveres essenciais de cooperação:
a) o dever de esclarecimento,
b) o dever de prevenção,
c) o dever de consulta, e
d) o dever de auxilio.
As partes e o juiz devem se esclarecer reciprocamente e ao juiz seus pontos de vista; o juiz deve prevenir as partes quanto às possíveis consequências jurídicas de suas condutas e indagá-las (consultá-las) sobre pontos da disputa relevantes para o julgamento da causa, antes de utilizá-los como fundamento de suas decisões, bem como cumpre ao magistrado auxiliar as partes, removendo obstáculos ao pleno exercício de seu direito de ação ou defesa.
Como bem salientou o Juiz Gustavo Quintanilha Telles de Menezes, em sua dissertação de mestrado intitulada “A fase pré-processual: o ônus de preparação da demanda e os filtros legítimos à propositura de ações judiciais”, realizada na UERJ e sob a orientação do Prof. Dr. Leonardo Greco:
“O processo deverá orientar-se pelo diálogo e comunicação entre os sujeitos processuais, privilegiando tais aspectos em detrimento de um enfoque estratégico ou duelístico. O juiz deixa de ser um mero expectador de uma disputa das partes, passando a agir ativamente para a justa composição do litígio. A prevalência do conteúdo sobre a forma demonstra completa alteração nos paradigmas processuais, que afasta uma concepção do processo civil no liberalismo clássico, criando uma legislação sintonizada com a ideia de um Estado Social de Direito”.
Ainda sobre o tema, recomendamos vivamente a leitura dos textos dos Mestres José Carlos Barbosa Moreira (O processo, as partes e a sociedade in Temas de Direito Processual. Oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004; e Duelo e processo In Temas de Direito Processual. Oitava Série. São Paulo: Saraiva, 2004) e Leonardo Greco (Atos disposição processual : primeiras reflexões in Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais. Estudos em homenagem à Professora Teresa Arruda Alvim Wambier. Medina, José Miguel Garcia et alli [Coords.]. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008; e Publicismo e privatismo no processo civil. Revista de Processo nº 164. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008).
Voltando ao texto do NCPC, pela análise comparativa é fácil perceber que vários dispositivos tem redação bem semelhante a do texto atual. Destacamos, abaixo, os pontos inovadores.
O inciso VI determina que as partes devem “declinar o endereço, residencial ou profissional, em que receberão intimações”, e ainda manter atualizada essa informação.
Não chega a ser uma novidade, eis que já tínhamos norma parecida na Lei nº 9099/95 e a Lei nº 11382/06 inseriu tal dever no CPC ao alterar o art. 238, parágrafo único.
Acrescento, apenas, que em se utilizando o processo eletrônico, deve haver campo próprio para tal finalidade no sistema a ser gerido pelo Tribunal.
Os parágrafos 2º a 5º do art. 80 especificam situações concretas na imposição da multa, prevista no parágrafo 1º, com o objetivo de positivar soluções que antes vinham atormentando os Tribunais.
Por fim, o parágrafo 5 exclui MP e Advocacia Pública e Privada da incidência de tal multa, mas estabelece a possibilidade de punição administrativa, por meio dos respectivos órgãos fiscalizadores. Esta solução parece ser bem interessante, pois permite que cada esfera de responsabilidade seja apurada pela via adequada.
* Humberto Dalla Bernardina de Pinho, Promotor de Justiça no RJ. Professor Adjunto de Direito Processual Civil na UERJ e na UNESA. Acesse: http://humbertodalla.blogspot.com