Direito de Família

É possível cobrar alimentos durante a gestação?

Laísa Santos[1]

Thais Pinheiro Fim[2]

O ordenamento jurídico brasileiro reconhece como dever da família, do Estado e da sociedade assegurar à criança, ao jovem e ao adolescente, o direito e a proteção à vida, à saúde, à alimentação, à dignidade e à convivência familiar. Resguarda, ainda, desde a concepção, os direitos do nascituro, estendendo a estes o direito à prestação de alimentos.

Diante deste cenário, foi promulgada a Lei 11.804/2008, cujo objetivo principal foi regulamentar o direito de alimentos da mulher gestante, popularmente conhecido como “alimentos gravídicos”, garantindo a proteção do estado gestacional e possibilitando o desenvolvimento com dignidade e segurança do nascituro.

O que são alimentos gravídicos?

A Lei 11.804/2008 dispõe, em seu art. 2º, caput, que os alimentos gravídicos são entendidos como os valores suficientes para cobrir as despesas do período de gravidez e da concepção ao parto. 

Portanto, os alimentos gravídicos são valores pagos à mulher gestante, com o objetivo de garantir o amparo financeiro ao nascituro, auxiliando nas despesas comuns durante o período gestacional

Qual o valor dos alimentos gravídicos e o que eles cobrem?

Os alimentos gravídicos atuam como “subsídios gestacionais”, não cobrindo apenas os alimentos, isto é, os recursos necessários à subsistência e à preservação da vida, como também os gastos com assistência médica e psicológica, exames complementares, enxoval, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas que o médico ou o juízo entendam como pertinentes. 

O valor é fixado com base nas necessidades do nascituro e nas possibilidades financeiras do genitor (ou possível genitor). Assim, não há um valor fixo ou predeterminado, variando de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto. 

Quem tem direito ao recebimento dos alimentos gravídicos?

Entende-se que toda mulher grávida é legitimada a propor ação de alimentos gravídicos, pleiteando a necessidade de auxílio financeiro do (possível) genitor da criança, uma vez que ambos são responsáveis pelos custos da gestação do bebê.

Quem é o responsável pelo pagamento dos alimentos gravídicos?

Os alimentos gravídicos devem ser custeados pelo provável genitor. Nas uniões homoafetivas, em que o nascituro é concebido por técnicas de reprodução assistida, entende-se que também é cabível a prestação de alimentos gravídicos, sendo assim, custeados pelo futuro pai ou mãe. 

Em regra, a obrigação alimentar é de responsabilidade dos genitores. No entanto, caso seja comprovada a total incapacidade financeira do genitor ou genitora para custear as despesas durante a gestação, a obrigação poderá ser transmitida aos avós paternos e maternos, de maneira subsidiária. Isso ocorre porque a obrigação de pagar alimentos se estende a todos os ascendentes, conforme determina a legislação civil. [3]

Como conseguir tal direito? 

Na hipótese das partes envolvidas não estarem de acordo com a fixação dos alimentos gravídicos ou com o quantum a ser fixado, é necessário que a gestante ingresse com uma ação judicial solicitando a fixação pelo juízo. 

Caso as partes estejam de acordo com o valor e a forma a ser fixada, é bastante importante que se realize a minuta deste acordo e, posteriormente, busque a homologação pelo juízo. Isso garante que, em caso de inadimplemento dos valores por parte do genitor/genitora, a gestante possa cobrar os valores em atraso judicialmente.

Quais são os documentos necessários para propor a ação?

Para propor a ação não é preciso haver comprovação de casamento ou união estável, basta que a gestante reúna provas do relacionamento ou envolvimento amoroso, da gravidez decorrente e das despesas geradas em razão do período gestacional. 

Além disso, é necessária a apresentação de indícios que apontem e comprovem a paternidade, tais como fotos, testemunhas e mensagens no celular, sendo cada vez mais frequente a aceitação de mensagens trocadas entre as partes via aplicativo de mensagens.

Após o nascimento da criança, o que muda?

Os alimentos gravídicos devem ser pagos até o nascimento da criança e, após o nascimento, devem ser automaticamente convertidos em pensão alimentícia em favor do recém-nascido, estabelecida de acordo com o binômio possibilidade-necessidade.

O que ocorre caso o pagante dos alimentos gravídicos não seja o verdadeiro pai? 

O Código Civil entende que os alimentos pagos são insuscetíveis de cessão, compensação ou penhora[4]. Isso significa que, em regra, os valores pagos à título de alimentos, não podem ser devolvidos. Assim, não há o que se falar de reembolso dos valores depositados à título de alimentos.

Na hipótese de se conseguir comprovar, de maneira inequívoca, que a gestante agiu dolosamente, isto é, que tinha conhecimento de que o pagante não era o genitor e, mesmo assim, ingressou com a ação requerendo a fixação dos alimentos em desfavor deste, o pagante poderá ingressar com uma ação requerendo a devolução dos valores indevidamente pagos e, a depender do caso, até a compensação pelos danos morais sofridos.

Este artigo foi originalmente publicado em: https://schiefler.adv.br/e-possivel-cobrar-alimentos-durante-a-gestacao/



[1] Advogada no escritório Schiefler Advocacia

[2] Estagiária no escritório Schiefler Advocacia

[3] Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

[4] Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.

 
Como citar e referenciar este artigo:
SANTOS, Laísa; FIM, Thais Pinheiro. É possível cobrar alimentos durante a gestação?. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2023. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-de-familia/e-possivel-cobrar-alimentos-durante-a-gestacao/ Acesso em: 21 mai. 2024
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