EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA …. VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE …. ESTADO DO ….
AUTOS Nº …..
O Estado do …., pessoa jurídica de direito público interno, dando atendimento aos termos do Ofício nº …./…., expedido nos autos de Mandado de Segurança sob nº …./…, impetrado por …., vem à presença de Vossa Excelência, prestar informações e oferecer razões em defesa de seus interesses.
PRELIMINARMENTE
DA AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE AUTORIDADE COATORA – DA ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO …. NO PRESENTE MANDAMUS
A …. (….), insurge-se contra sanção administrativa que lhe foi aplicada em virtude de atraso na entrega de mercadorias, objeto das licitações modalidade Cartas Convites nºs …./…., …./…., …./…. e …./….
Porém, impetrou o presente mandamus contra o Estado do …., pessoa jurídica de direito público interno, e não contra a autoridade que lhe aplicou a sanção administrativa contra a qual se insurge.
Conforme leciona Hely Lopes Meirelles, a parte legítima para figurar no pólo passivo da relação processual, na qualidade de Impetrado, é:
“(…) é a autoridade coatora, e NÃO A PESSOA JURÍDICA OU ÓRGÃO A QUE PERTENCE e ao qual o seu ato é imputado em razão do ofício. Equivocadamente alguns autores e julgados têm considerado a pessoa jurídica, a que pertence o coator, como a impetrada no mandado e parte na ação. A entidade pode ingressar no processo, a seu pedido, ao lado do coator, MAS NÃO O SUBSTITUI NEM O EXCLUI DA LIDE.” (in Mandado de Segurança, Ação Popular e Ação Civil Pública, Malheiros Editores, 20º ed., 1998, pág. 53).(g.n.)
“Autoridade coatora é aquela que, ao executar o ato, materializa-o.” (RTFR 152/271). No mesmo sentido: TFR – Pleno, MS 105.867-DF, Rel. Min. Geraldo Sobral, j. 23.04.91, v.u., DJU 8.04.91, p. 3.869, 2ª col. em.).
Isto porque o mandado de segurança tem por objeto o ataque ao ato da autoridade que eventualmente tenha, por ilegalidade, violado o direito líquido e certo da Impetrante, não podendo ser impetrado contra a entidade de direito público à qual a autoridade pertence.
Assim, a autoridade coatora, no caso em tela, é o Sr. …., Diretor do Departamento …. – …., responsável pelo despacho que manteve a penalidade aplicada (doc. …. – fls. ….), que sequer foi notificado.
Ocorrendo equívoco desta natureza, a jurisprudência pátria é unânime ao prever que deve ocorrer a extinção do mandamus, senão vejamos:
“É caso de extinção do processo se o impetrante, ao invés de indicar a autoridade coatora, move a ação contra a pessoa jurídica de direito público em nome da qual agiu.” (RJTJESP 111/182).
“O impetrante deve eleger corretamente a autoridade dita coatora. No rito sumaríssimo do mandado de segurança, não cabe ao juiz, substituindo-se ao interessado, investigar quem deve ocupar o pólo passivo da relação processual.” (Bol. TFR – 3ª Região 9/67).
“Se a impetração for mal endereçada, vale dizer, se apontar como autoridade coatora quem não tem a responsabilidade funcional de defender o ato impugnado, o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito.” (STJ – 2ª Turma RMS 4.987-6-SP, Rel. Min. Ari Pargendler, j. em 21.08.95, negaram provimento, v.u., DJU 09.10.95, P. 33.536 1ª col., em). No mesmo sentido: RTJ 123/475, 145/186, STF-RT 691/227; RSTJ 4/1.283.
Diante do exposto, o Estado do …. requer a extinção do feito, sem o julgamento do mérito, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil, por não ter sido a impetração dirigida contra a pessoa que praticou o ato ora impugnado.
DO MÉRITO
Afastada a preliminar acima argüida, hipótese que se levanta apenas para argumentar, uma vez que tanto a doutrina como a jurisprudência pátria são unânimes em reconhecer que, nestes casos, a extinção do processo é medida que se impõe, no mérito a pretensão da Impetrante não encontra melhor sorte, conforme se verá abaixo.
A Constituição Federal em vigor, ao alencar os “Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”, no artigo 5º, inciso LXIX, define a hipótese de concessão do mandado de segurança:
“Conceder-se-á mandato de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por ‘habeas corpus’ ou ‘habeas data’, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.”
A letra constitucional estabelece os parâmetros de adequação do mandado de segurança: visa a proteção de direito líquido e certo contra a ilegalidade praticada por autoridade.
Cabe, aqui, a lição de Hely Lopes Meirelles, para quem:
“Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercido no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por Mandado de Segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante.” (in Mandado de Segurança e Ação Popular, 20ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 1998, p. 34).
No caso em análise, se revela a absoluta inexistência de direito líquido e certo da Impetrante, senão vejamos.
A Impetrante foi vencedora das licitações modalidade Cartas Convite nºs …./…., …./…., …./…. e …./…., todas realizadas pelo Departamento …. – ….
Os respectivos editais (juntados aos autos pela Impetrada) previam expressamente no item …., o prazo de fornecimento dos materiais objeto da licitação, que seria de “até …. (….) dias após a emissão da ordem de compra”. Previram, ainda, no item 11, as penalidades que seriam aplicadas ao licitante adjudicado, nos seguintes termos:
“11. Penalidades:
11.1. Se o licitante adjudicado, recusar a cumprir os termos definidos nesta licitação da qual foi vencedor atrasar a encomenda dentro dos prazos da Ordem de Compra ou ainda deixar de entregar os materiais cotados por qualquer motivo ou o fizer fora das especificações e condições pré-determinadas, ser-lhe-ão aplicadas as penalidades seguintes, facultada defesa prévia do interessado, independente de outras previstas em lei;
11.1.1. Advertência;
11.1.2. No caso de inadimplemento total ou parcial do contrato em qualquer de suas cláusulas por ação ou omissão da Contratada, Multa de Mora de ….% (….) ao dia sobre o valor do contrato;
11.1.3. Multa Compensatória de ….% (….) sobre o valor do contrato, de acordo com o artigo 87, inciso II da Lei nº 8.666/93, com as alterações posteriores;
11.1.4. Após o …. dia do inadimplemento total ou parcial do contrato, independente da aplicação das multas previstas nos itens acima, 11.1.2 e 11.1.3 será rescindido o contrato com o fornecedor adjudicado, independentemente de notificação;
11.1.5. Os valores respectivos correspondentes a aplicação dos itens 11.1.2 e 11.1.3, que serão cumulativos, serão retidos do crédito decorrente do contrato objeto desta licitação, garantindo-se o direito a recurso na forma do artigo 109 da Lei Federal nº 8.666/93, com as alterações posteriores;
11.1.6. Suspensão do direito de licitar, junto ao …., pelo prazo que o Diretor do órgão determinar, segundo a natureza da falta e o prejuízo causado à Administração Pública, de acordo com o inciso III do art. 87 da Lei nº 8.666/93, com as alterações posteriores;
11.1.7. Declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública de acordo com o inciso IV e Parágrafo 3º do art. 87 da Lei nº 8.666/93, com as alterações posteriores;
11.1.8. As sanções previstas nos dois últimos itens acima mencionados, admitem a defesa prévia do interessado no respectivo Processo, no prazo de …. (….) dias úteis, com exceção da pena de declaração de inidoneidade, hipótese em que é facultada a defesa no prazo de …. (….) dias da abertura de vista.”
Por sua vez, a Lei nº 8.666/93, (Licitações e Contratos Administrativos), alterada pela Lei nº 8.883/94, prevê que:
“Art. 87 – Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
I – Advertência;
II – Multa na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III – Suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos.”
Assim, mesmo ciente das penalidades que poderiam lhe ser aplicadas, a empresa deixou de entregar as mercadorias objeto das Cartas Convite nºs …./…., …./…., …./…. e …./…., no prazo devido, atrasando em mais de …. (….) dias, como ela própria confessa na exordial, ao afirmar que “pelas Cartas Convite” nºs …./…., …./…., …./…. e …./…., houve um atraso na entrega, nunca superior a …. (….) dias, empenhos estes não superiores a R$ …. (….). (fls. ….).
Tal fato motivou o encaminhamento de notificações a empresa, emitidas pelas Divisões do …. (para que entregasse a mercadoria em …. (….) horas ou apresentasse suas razões) e …. (para o recolhimento de multa de mora ou apresentasse razões), comunicados estes que não obtiveram êxito.
Em razão disso, a empresa foi notificada do cancelamento de …. (….) ordens de compra, bem como lhe foi aplicada a sanção de Suspensão por …. Anos, na forma da Lei nº 8.883/94 e do instrumento editalício. Na mesma ocasião, foi-lhe dado a oportunidade de apresentar defesa prévia, no prazo de …. (….) dias (doc. …. – fls. ….).
No prazo estipulado, a Impetrante apresentou defesa prévia, onde requereu a reconsideração da decisão, quanto à suspensão de futuras concorrências (doc. …. – fls. ….).
Através do Parecer nº …. a Assessoria Jurídica do …. opinou pelo conhecimento do recurso e seu indeferimento, mantendo-se a penalidade aplicada, fundamentação esta que foi acatada pelo Sr. …., Diretor do Departamento …. – …., através do seguinte despacho:
“1. Acato o parecer retro:
2. Dê-se prosseguimento ao procedimento da punição, conforme notificação.”
Resulta claro, Excelência, que o ato impugnado, ao manter a sanção administrativa, observou estritamente os termos dos respectivos Editais e da Lei nº 8.666/93, alterada pela Lei nº 8.883/94.
É importante frisar, também, que a Administração, ao facultar à empresa o direito de apresentar defesa prévia (o que, aliás, foi feito – doc. …. – fls. ….), além de agir em consonância com os preceitos legais, observou o princípio do contraditório e da ampla defesa.
Não há, portanto, no caso em tela, ato ilegal de autoridade, mas sim, submissão a diplomas legais, o que leva, via de conseqüência, à conclusão de que não há direito líquido e certo a ser amparado pela via mandamental.
Com efeito, o Tribunal de Justiça do Paraná já decidiu que:
“PROCESSO LICITATÓRIO – INEXECUÇÃO PARCIAL DO CONTRATO – SANÇÃO ADMINISTRATIVA – APLICAÇÃO DE SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DE PARTICIPAÇÃO EM LICITAÇÃO – DIREITO A PRÉVIA DEFESA ASSEGURADO – LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO – APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
Se a sanção administrativa foi aplicada com observância da norma legal pertinente, respeitando-se o direito a prévia defesa, lícito e válido o ato administrativo.” (Apelação Cível nº 40.643-7 – Ac. 360 de 03/10/95 – 5º C.C. – TJPR – Relator Des. Carlos Hoffmann).
Da mesma forma, não assiste razão a Impetrante quando pretende a exclusão da sanção administrativa de suspensão temporária de licitação junto ao …. a impedimento de contratar com a Administração, sob a alegação de que:
a) Houve abuso de direito por ser a sanção aplicada rígida demais, tendo em vista que a Impetrante vem fornecendo materiais ao Estado do …. há muitos anos;
b) Ofensa ao princípio da isonomia, uma vez que o Estado do …. também atrasou no pagamento dos empenhos e nenhum dos contraentes pode exigir o implemento da obrigação do outro antes de cumprir a sua (art. 476/CC).
Isto porque, é princípio basilar de que a Administração Pública está adstrita ao Princípio da Legalidade. Assim, constatada a irregularidade, ela tem o poder-dever de agir de acordo com os ditames legais que regulamentam o caso concreto. Portanto, ainda que pareça rígida demais, a sanção aplicada a Impetrante está em consonância com a legislação aplicável à espécie.
Não se aplica ao contrato administrativo a execução de contrato não cumprido, segundo a opinião de HELY LOPES MEIRELLES na obra “Direito Administrativo Brasileiro”, 21ª Ed., Malheiros Editores,1996:
“Execução de contratos não cumprido:
A execução de contrato não cumprido – exceptio non adimplenti contractus -, usualmente invocada nos ajustes de Direito Privado, não se aplica, em princípio, aos contratos administrativos quando a falta é da Administração. Esta, todavia, pode sempre argüir a exceção em seu favor, diante da inadimplência do particular contratado.
Com efeito, enquanto nos contratos entre particulares é lícito a qualquer das partes cessar a execução do avençado quando a outra não cumpre a sua obrigação, nos ajustes de Direito Público o particular não pode usar dessa faculdade contra a Administração. Impede-o o princípio maior da continuidade do serviço público, que veda a paralisação da execução do contrato mesmo diante da omissão ou atraso da Administração. Nos contratos administrativos a execução é substituída pela subseqüente indenização dos prejuízos suportados pelo particular ou, ainda, pela rescisão por culpa da Administração. O que não se admite á a paralisação sumária da execução, pena de inadimplência do particular contratado, ensejadora da rescisão unilateral.” (obra citada, pág. 200).
Portanto, mesmo que tenha ocorrido inadimplência da Administração, este fato não autoriza a execução do contrato por parte da empresa contratada, face ao princípio maior da continuidade do serviço público que deve ser observado.
Conclui-se, desta forma, que também sob estes aspectos não há direito líquido e certo da Impetrante a ser amparado pela via mandamental nem tampouco ato ilegal de autoridade a macular o ato administrativo.
DOS PEDIDOS
Pelo exposto, o Estado do …. requer:
a) O acolhimento da preliminar apontada, com a extinção do processo, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil;
b) No mérito, a denegação da segurança pela absoluta falta dos pressupostos necessários para a sua concessão.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]