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2 – LEGISLAÇÃO COMPARADA
A análise de um instituto jurídico não pode se limitar às fronteiras de um só país. É absolutamente necessário situá-lo num quadro mais vasto que compreenda ao menos a “família jurídica[1]” que lhe deitou influências. É imperioso o esforço de cada nação em melhorar as condições de suas leis, solvendo em outras o que puder ser útil à civilização, com reverência aos bons princípios e sem nunca romper com as tradições do próprio Direito, cujas raízes se alongam por um passado verdadeiramente remoto (PICANÇO, 1996). A própria existência do Direito assenta-se numa comparação bastante primitiva, é verdade, entre legislações diversas.
Mas não é apenas isso. Com o moderno fenômeno da globalização e seus desdobramentos, em que há intensificação de fluxos, perda de controle do Estado sobre esses fluxos e diminuição da distância espacial e temporal, o jurista contemporâneo pode defrontar-se na prática com institutos de outros Estados e, aí, não há dúvidas de que uma visão bifocal ajudará sobremaneira nas soluções dos litígios.
O direito brasileiro, assim como o da maioria dos Estados latinos, faz parte da família dos direitos ditos romanistas, ou seja, dos sistemas jurídicos influenciados pelo direito romano da antiguidade, razão pela qual a maioria das suas legislações, mais especificamente o seu Código Civil, acolheu uma vasta orientação dos direitos de estirpe romano-germânica, notadamente das idéias francesas (Código de Napoleão), portuguesas (Ordenações do Reino) e, principalmente, alemãs ( BGB)[2]. De tal forma que nada mais apropriado que engendrar, nessa quadra, um exame legislativo-comparativo sobre os limites no exercício das servidões, utilizando-se como parâmetro a legislação civil francesa, o Código Civil Italiano, o Código Civil alemão e o Código Civil português.
2.1 Os limites da servidão no Código Civil francês[3]
Legislação jusracionalista que projetou regras pautadas sobretudo na evidência e na exatidão, o Código Civil francês regulamentou com pouco rigor metodológico, em seu livro segundo, título IV “ Des servitudes ou services fonciers”, os direitos de vizinhança e de servidão, classificando com desnecessária minúcia os seus tipos específicos.[4]
Apesar disso, ao tratar dos limites das servidões, dispôs o Código de Napoleão, em seu artigo 702, sob a seção III “Des droits du propriétaire du fonds auquel la servitude est due”, que :
Art. 702. De son coté, celui qui a um droit de servitude ne peut en user que suivant son titre, sans pouvoir faire ni dans le fonds qui doit la servitude, ni dans le fonds à qui elle est due, de changement qui agrave la condition du premier (FRANÇA, 1984).
Segundo os comentadores mais seguidos desse artigo, o legislador francês procurou, através dele, determinar que as obrigações do fundo dominante cingem-se em usar a servidão até os limites do seu título, sem poder praticar qualquer mudança que constitua um agravamento. Como exemplo, pode-se considerar como uma agravação da servidão o ato de se substituir uma servidão contínua por outra descontínua, sem a autorização do proprietário do fundo serviente .
Vê-se que, diferentemente do que dispõe o Código Civil pátrio, a lei francesa faz expressa menção ao exercício da servidão nos limites do título constitutivo.
No que diz respeito às adminiculas servitudes, o artigo 1.380 do Código Civil brasileiro (2002) é quase que idêntico ao art. 697 do Código de Napoleão que assim dispõe: “Art. 697. Celui auquel est due ube servitude, a droit de faire tous le ouvrages nécessaires pour en user et pour la conserver”(FRANÇA, 1984).
Como se pode ver, o supracitado dispositivo estabeleceu que é direito do proprietário do prédio, ao qual a servidão é devida, praticar todos os atos necessários para o seu uso e conservação.
2.2 Os limites da servidão no Código Civil italiano
Amostra significativa da positivação do instituto da servidão encontra-se no Codice Civile italiano, que sob o título VI “Delle servitù prediali” passa a tratar do assunto de maneira detalhada tal qual sucede no estatuto francês, ou seja, procurando assentar, além de disposições gerais, disposições específicas acerca dos diversos tipos de servidão, o que pode ser perfeitamente explicado pelo fato de ter a Itália absorvido, além da influência particular do seu antigo gênio jurídico, influência direta da codificação napoleônica.[5]
Nada obstante, relativamente aos limites no exercício das servidões, a legislação italiana procurou ressaltar a importância do elemento “utilidade”, encartando nos artigos 1027 e 1028 o seu conceito e abrangência. A saber:
1027. Contenuto del diritto. – La servitù prediale consiste nel peso imposto sopra un fondo per l’utilità [1028] di un altro fondo appartenente a diverso proprietario [1072].
1028. Nozione dell’utilità. – L’utilità può consistere anche nella maggiore comodità o amenità del fondo dominante. Può del pari essere inerente alla destinazione industriale del fondo (ITÁLIA, 1983).
Destarte, com base nos mencionados artigos, a servidão predial é um encargo imposto sobre o prédio serviente para a utilidade do prédio dominante, consistindo essa utilidade numa maior comodidade ou aproveitamento do fundo dominante.
Comparando com a legislação brasileira, trata-se, com a devida alteração de pormenores, do exercício das servidões nos limites da sua “necessidade”.
2.3 Os limites das servidões no Burgiliches Gesetcbuch (BGB)
Máxime arquétipo do Código Civil pátrio, visto que a legislação nacional aproveitou a sua taxinomia, o BGB, situado na esfera rigorosamente conceitual e sistemática da pandectística, prima, através de uma renúncia quase total à casuística, pelas suas famosas clareza e coerência, motivo pelo qual consegue, por meio dos seus arts. 1019 e 1.020, abranger uma enormidade de regras limitantes do exercício das servidões.
Art. 1.019.Una servidumbre predial solo puede consistir en un gravamen que ofrezca ventaja para el aprovechamiento de la finca del titular – de la servidumbre – . El contenido de la servidumbre no puede exceder de la medida derivada de esto.
Art. 1.020. En el ejercicio de una servidumbre predial el titular há de respetar lo más posible interés del propietario de la finca gravada. Si para el ejercicio de la servidumbre tiene una instalación en la finca gravada, ha de conservala en estado reglamentario en la medida que lo exija el interés del propietario (ALEMANHA, 1950).
Parece que o artigo 1.019 contém regra que estabelece, de modo iniludível, que a servidão deve conter-se nos limites do necessário, pois, segundo dispõe a regra mencionada, uma servidão predial só pode consistir num encargo que ofereça vantagem para o aproveitamento do prédio titular da servidão. O conteúdo da servidão não pode exceder da medida derivada disto.
Já o artigo 1.020, buscou evidenciar, pelo visto, o exercício civiliter modo das servidões ao prescrever que no uso de uma servidão o seu titular deve respeitar, ao máximo, os interesses da propriedade gravada, devendo ser conservados os direitos do senhor do prédio pertinente.
2.4 Os limites das servidões no Código Civil português
Em que pese o atual Código Civil de Portugal não ter deitado influências no seu similar brasileiro, posto que à época da elaboração do Código Civil de 1916 o Brasil já era um Estado independente, é oportuna uma rápida análise na legislação civil lusitana, uma vez que o seu Código vigente, datado de 1963, é marcado, como sucede com o Código Civil pátrio, pela influência Alemã.
Desse modo, o Código lusitano estabelece no seu livro III, sob a epígrafe “Direito das Coisas”, o título VI “ Das servidões prediais”, que, por sua vez, assenta no capítulo IV “exercício das servidões”, os limites ao seu exercício.
Nesse sentido, os artigos 1564° e 1565° tratam de regular o exercício das servidões através do seu título constitutivo, da sua necessidade e por meio do exercício civiliter modo. Senão, vejam-se:
Artigo 1564.º Modo de exercício.
As servidões são reguladas, no que respeita à sua extensão e exercício, pelo respectivo título; na insuficiência do título, obter-se-á o disposto nos artigos seguintes.
Artigo 1565.º Extensão da servidão.
1. O direito de servidão compreende tudo que é necessário para o seu uso e conservação.
2. Em caso de dúvida quanto à extensão ou modo de exercício, entender-se-á constituída a servidão por forma a satisfazer as necessidades normais e previsíveis do prédio dominante com o menor prejuízo para o prédio serviente (PORTUGAL, 1983).
Tal qual resulta dos termos dos mencionados artigos, o exercício das servidões no Direito lusitano encontra-se positivado nos mesmos termos do Direito brasileiro, ou seja, fixando regras no sentido de enfatizar objeto instituído no momento da constituição do seu título, a finalidade estabelecida, o exercício de acordo com o menor transtorno, ou seja, civiliter uti e compreendendo todos os atos necessários para o seu uso e conservação (adminicula servitudes).
Portanto, das observações que encerram os parágrafos anteriores decorre a constatação de que é vitoriosa, em todo o sistema romano-germânico, a doutrina dos limites ao exercício das servidões nos contornos em que ficou revelado no capítulo antecedente, sendo consagrado no próprio direito legislado de vários países todos os elementos mencionados, quais sejam, o objeto, a necessidade, a finalidade e o exercício civiliter.
3 – JULGADOS
Como visto, a doutrina majoritária e a lei, caminhando no mesmo sentido, vislumbram como limites ao exercício das servidões a raia espectral constituída pelo objeto, necessidade, finalidade e exercício civiliter, elementos que traduzem a busca por uma utilização igualitária da propriedade e que nada mais são que um reflexo do almejado ideal de justiça.
Apesar de tudo, para se tornar completa a tríade que dá contornos finais ao assunto, é necessária, ainda, a análise da jurisprudência, inegável fonte de Direito que orienta os tribunais na decisão dos casos idênticos.
Em sendo assim, apesar da notória falta de julgados a respeito dos limites ao exercício das servidões, procurar-se-á colacionar, junto ao judiciário nacional, sínteses de acórdãos que lhes sejam pertinentes, no intento de propiciar o conhecimento exato de como os magistrados brasileiros têm aplicado a matéria na prática forense. Veja-se, então:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDÃO. CONSTRUÇÃO.
Ao direito de uso e gozo da servidão, corre paralelo o dever de nada fazer que o embarace ( artigo 702 do C. Civil). Mesmo possa o dono do prédio serviente removê-la de um lugar para o outro, não lhe é licito diminuir as vantagens do dominante (artigo 703 Código Civil). a construção da nova ponte, por isso, se contém nos estritos limites do que dispõe o título constitutivo da servidão, sem lhe atribuir maior largueza ou resultar modificação. Apelo não provido (Grifado). (TJRS. AC nº 598598548. Primeira câmara de férias cível. Relator: Juiz Genaro José Baroni Borges. Julgado em 20/04/1999).
Analisando-se ligeiramente o supracitado julgado, não se pode chegar a outra ilação que não seja a que vislumbra no “objeto” instituído por meio do título constitutivo uma forma limitadora do exercício da servidão.
Isso porque, como bem se verifica na hipótese em análise, a construção de uma ponte no prédio serviente deve ser feita em consonância com o disposto no título, que nada mais é que o objeto da servidão.
No mesmo sentido:
SERVIDÃO DE PASSAGEM – LIMITE – ABUSO DE DIREITO – A servidão é uma restrição que se impõe ao pleno exercício da propriedade, devendo ser utilizada nos estritos limites para os quais foi constituída. Se, na servidão de trânsito, se permitiu a passagem de pedestres, não pode ser utilizada para automóveis e muito menos pode o beneficiário arrancar cercas ou deixar abertas partes móveis destas, sob pena de configurar abuso de direito, que deve ser coibido pela ordem jurídica(Grifado). (TAMG. AC. nº 0218275-6. 2ª C.Cív. Relator: Juiz Caetano Levi Lopes. Julgado em 25/06/1996).
No que tange ao exercício civiliter modo, não há a menor sombra de dúvida acerca da sua utilização para limitar o uso das servidões, e a jurisprudência dos pretórios pátrios vem assim utilizado-o para decidir os litígios:
REINTEGRAÇÃO DE POSSE – REQUISITOS – PROVA TESTEMUNHAL – SERVIDÃO DE PASSAGEM – PROVA No exercício do interdictum recuperandae possessionis, cumpre ao autor demonstrar os requisitos essenciais a tutela possessória, como a posse anteriormente exercida e sua perda pela pratica do esbulho. O depoimento testemunhal é a prova por excelência, nas questões possessórias, para se comprovar a posse do autor, a pratica da turbação ou do esbulho, como para a identificação do agente e da data em que se praticou o ato que a molesta ou a perde, requisitos da custódia possessória. A servidão deve ser exercida civiliter, dentro dos limites das necessidades que se proponha a satisfazer, devendo persistir se não há prova que dela se utiliza por comodidade o proprietário do prédio dominante (grifado) (TAMG. A C. nº 0245612-6. 3ª C.Cív. Relator: Juiz Duarte de Paula. Julgado em: 03/12/1997).
Quanto ao exercício de acordo com o seu fim, os Tribunais têm sistematicamente delimitado o conteúdo das servidões, merecendo colação, nesse sentido, pronunciamento do Tribunal de Alçada Civil de São Paulo:
POSSESSÓRIA – MANUTENÇÃO DE POSSE – SERVIDÃO DE PASSAGEM.
Caminho vicinal utilizado para passagem de pedestres e cavaleiros, transformado em estrada para veículos – inadmissibilidade – desconformidade com a finalidade aceita – impossibilidade do prédio dominante ampliar os ônus decorrentes da servidão – obras ditas de conservação que traduzem atos de verdadeira turbação da posse – legítima interdição do caminho não traduzindo esbulho à posse dos autores – improcedência mantida (TacivSP, [s.d]).
Decidindo sobre o mesmo assunto, o eminente Desembargador Artur Mafra prolatou decisão nos seguintes termos:
SERVIDÃO DE PASSAGEM – UTILIDADE E PROVEITO DO PRÉDIO DOMINANTE – ABERTURA DE ESTRADA PÚBLICA – EXTINÇÃO DA SERVIDÃO
A finalidade da servidão é proporcionar utilidade ou proveito ao prédio dominante. Se se abre estrada pública acessível ao prédio dominante, já não será necessária a servidão, cujo pressuposto é a falta de estrada pública, salvo se esta não suprir a função da estrada aberta através do prédio serviente (Grifado) (TJMG. AC. n° 76.328. 5ª C. Relator: Desembargador Artur Mafra . Julgado em 23/12/1988).
Como se vê, a jurisprudência acerca da finalidade é conclusiva e não deixa margem a maiores discussões.
Em sentença que representa verdadeira lição sobre a “necessidade” no exercício das servidões, o Desembargador Hélio Mosimann proferiu decisão ímpar, ressaltando a importância desse elemento. Observe-se parte da aula magistral:
EMENTA. PASSAGEM POR SIMPLES COMODIDADE. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. SERVIDÃO. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO REINTEGRATÓRIO.
Constituindo a servidão uma restrição imposta a um prédio para o uso e utilização de outra propriedade, pertencente a proprietário diverso, limita-se às necessidades do prédio dominante, evitando-se, quando possível, agravar o encargo do prédio serviente. Assim sendo, não se justifica a reclamação de passagem por simples comodidade ou capricho (Grifado). (TJSC. AC nº20. 905. Relator: Desembargador Hélio Mosimann).
A propósito, em hipótese semelhante à anteriormente mencionada, veja-se como decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
EMENTA: SERVIDÃO DE PASSAGEM
Colocação de cercas e porteiras nas sua extremidades constitui direito do dono do prédio serviente, quando o imóvel pretende dar destinação econômica, especialmente quando nele irá explorar pecuária, consoante a regra do CC-588. O uso da passagem deve-se circunscrever aos limites da necessidade comprovada dos donos do prédio dominante (CC-704). Natureza dúplice dos interditos possessórios que permite outorgar proteção a apelante (CPC-922). Apelação provida (Grifado). (TJRS. AC nº 197066582. sexta câmara cível. Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco. julgado em 18/09/1997)[6].
Questão relacionada ao elemento “necessidade” que tem suscitado vivíssimas controvérsias nos tribunais pátrios, dando azo a opiniões diametralmente opostas, é a que diz respeito à necessidade ou não do encravamento do prédio dominante para instituição de uma servidão.
Sustentam alguns que o prédio serviente só pode ter o seu direito de propriedade mitigado por necessidade extrema (encravamento absoluto do prédio dominante), em razão de ser a servidão um elemento limitador do direito de propriedade. Por outro lado, luzes mais brilhantes insurgem-se contra esse entendimento ao argumento de duas ordens: primeiro, que encravado não é só o prédio sem saída, mas, também, aquele cuja única via de acesso é excessivamente onerosa, impraticável ou perigosa. Segundo, o direito real de servidão, ao contrário do direito de vizinhança à passagem forçada, dispensa o encravamento do imóvel dominante, sendo necessário para o direito de servidão, apenas, a dificuldade no exercício do direito de propriedade.
Afirmando que quando ausente o encravamento da propriedade não há que se falar em servidão, o ilustre magistrado Rômulo Taddei sentenciou nos autos do AI, nº 35019002274, da seguinte forma:
AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO NEGATÓRIA DE SERVIDÃO – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE DE PARTE – REJEITADA – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA – REJEITADA – MÉRITO – EXISTÊNCIA DE OUTROS MEIOS PARA OS AGRAVANTES ALCANÇAREM A SAÍDA DE SUA PROPRIEDADE – AUSÊNCIA DE ENCRAVAMENTO – RECURSO IMPROVIDO – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE DE PARTE – DIRECIONANDO-SE O OBJETO DE AÇÃO NEGATÓRIA DE SERVIDÃO AO EXERCÍCIO INDEVIDO DE SERVIDÃO DE PASSAGEM PELOS AGRAVANTES, TOLHIDO INJUSTAMENTE O PLENO EXERCÍCIO DA PROPRIEDADE PELOS AGRAVADOS, EXSURGE A PERTINÊNCIA SUBJETIVA PASSIVA DOS PRIMEIROS – MESMO PORQUE, AS INDAGAÇÕES REFERENTES À NECESSIDADE E LEGITIMIDADE DA ABERTURA DA ESTRADA, A QUEM APROVEITA OU A QUEM MOSTRA-SE POSSÍVEL IMPUTAR A RESPONSABILIDADE PELAS EVENTUAIS RESTRIÇÕES EM PROPRIEDADE ALHEIA SÃO QUESTÕES MERITÓRIAS E NO MOMENTO OPORTUNO SERÃO ENFRENTADAS PELO JUÍZO MONOCRÁTICO APÓS CABAL INSTRUÇÃO – PRELIMINAR REJEITADA – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA
Para a antecipação de tutela não se impõe sempre o efetivo e prévio contraditório, o qual pode restar postergado para o momento oportuno, desde que presentes os requisitos que autorizam o expediente, elencados no artigo 273, caput, incisos I ou II, e parágrafos 2º e 3º, todos do Código de Processo Civil, sem que de tanto se possa argüir cerceamento de defesa. A isso deve-se agregar que, a mera ausência de intimação de uma parte para que pudesse se manifestar sobre petição protocolada pela parte adversa não constitui cerceamento quando não demonstrado qualquer efetivo prejuízo para a defesa. Preliminar rejeitada. Mérito. Restando inatacado a motivação do decisum consistente na existência de outros meios para os agravantes alcançarem a saída de sua propriedade, assim não se prestando para infirmá-la a desjudicializada declaração ineficaz à comprovação da identidade do trecho ali referido com a via retratada pelas fotografias e considerada pelo Juízo monocrático, apresenta-se como injustificada a servidão de passagem, porquanto não lhe enseja a mera aspiração de encurtamento do caminho, a título de comodidade, quando ausente o encravamento da propriedade, o que restará definitivamente acertado quando da realização de prova pericial já deferida e com realização iminente. Recurso improvido (Grifado). (TJES. AI 35019002274. 3ª C.Cív. Relator: Desembargador Rômulo Taddei. Julgado em 25/02/2002)
No mesmo sentido:
EMENTA: SERVIDÃO DE PASSAGEM. IMÓVEL ENCRAVADO. ESTRADA ENTRE DUAS GLEBAS. INEXISTÊNCIA DE SERVIDÃO.
Imprescindível à configuração da servidão de passagem seja o imóvel encravado, de modo a impossibilitar o acesso a lugares públicos (Grifado). (TJDF. AP Cível nº 3263494. 3º Turma. Relator Juiz Nívio Gonçalves. Julgado em 17/08/94).
Para conhecimento de servidão de trânsito é condição essencialíssima o encravamento do prédio e só se justifica frente a indeclinável necessidade, necessidade absoluta (Grifado). (Revista de Jurisprudência Mineira, Vol. VII, pág. 127, citado por TJRN. AC nº 02.003417-2 . Relator: Desembargador Armando da Costa Ferreira).
Decidindo sobre o tema, a Ministra Nancy Andrighi prolatou decisão acolhendo a tese da desnecessidade do encravamento do prédio em decisão que representa verdadeira lição acerca do assunto. A saber:
RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – PREQUESTIONAMENTO – AUSÊNCIA – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL – COMPROVAÇÃO – REEXAME DE PROVA – SERVIDÃO DE TRÂNSITO – OBRAS – CONTÍNUA E APARENTE – PROTEÇÃO POSSESSÓRIA – POSSIBILIDADE – ENCRAVAMENTO DO IMÓVEL DOMINANTE – DESNECESSIDADE
Não se conhece o recurso especial quanto a questões carentes de prequestionamento. A ausência da confrontação analítica dos julgados, assim como dessemelhança dos casos confrontados, enseja o não-conhecimento do recurso especial pela letra “c” do permissivo constitucional. Na via especial, é inadmissível a alteração das premissas fático-probatórias estabelecidas pelo tribunal a quo. É passível de proteção possessória a servidão de trânsito tornada contínua e aparente por meio de obras visíveis e permanentes realizadas no prédio serviente para o exercício do direito de passagem. O direito real de servidão de trânsito, ao contrário do direito de vizinhança à passagem forçada, prescinde do encravamento do imóvel dominante, consistente na ausência de saída pela via pública, fonte ou porto (Grifado). (STJ. Resp. nº 223590. 3ª T. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Julgado em 17/09/2001)
Em igual sentido :
POSSESSÓRIA
Reintegração de posse. Servidão instituída em contrato, com registro. Inocorrência de renúncia tácita a sua utilização, haja vista não ter se completado o prazo previsto na Lei. Artigo 710, III, do Código Civil. Irrelevância ademais, do encravamento, que não é o substrato único da instituição da servidão. Ausência dos pressupostos da extinção da servidão, merecendo os autores serem reintegrados na posse. Impossibilidade, ainda, do impedimento da passagem dos proprietários do prédio dominante, erguendo cerca. Infringência ao artigo 702 do Código Civil. Recurso improvido (Grifado). (1º TACSP. AP nº 0810531-9. 5ª C. Relator: Juiz Manoel Mattos. Julgado em 27.09.2000).
Pelo que parece, os seguidores da corrente que impõe a necessidade do absoluto encravamento do prédio emprestaram demasiada importância ao direito pleno de propriedade, esquecendo de analisar a questão à luz da Constituição Federal e do próprio Código Civil, que são bastante claros no trato do assunto.
O caput do artigo 1.228 do Novo Código Civil (BRASIL, 2002) assegura que o proprietário pode usar, gozar e dispor dos seus bens, mas deve fazê-lo de modo a não colocar em risco a promoção do bem comum. Mesma preocupação teve o legislador constitucional, ao destacar no art. 5º, XXIII da Magna Carta pátria (BRASIL, 2002) a moderna concepção da função social da propriedade, pois ao mesmo tempo em que consagrou o direito de propriedade como fundamental (art. 5º, XXII), deixou de caracterizá-lo como incondicional e absoluto (MORAIS, 2002).
Ademais, não é dispendioso notar que através de uma interpretação bastante lógica do art 1.384 do Código Civil atual (BRASIL, 2002), pode-se inferir muito bem que não é necessário o encravamento do prédio para constituição de servidão. Isso porque se a servidão pode ser removida de um local para outro pelo dono do prédio serviente se em nada diminuir as vantagens do prédio dominante e houver considerável incremento da utilidade, pode-se dizer que para o seu exercício pode haver mais de uma forma, bastando que uma delas seja necessária ou útil.
Assim, os adeptos da corrente que reza pelo necessário encravamento absoluto do prédio para instituição da servidão vêem pouco e de perto.
Por derradeiro, sobre as adminiculas servitudes observe-se caso em que o Juiz Palma Bisson, do Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, entendendo improcedente a alegação da parte apelante, sentenciou no sentido de ser necessária para o uso da servidão a pratica de atos acessórios. Veja-se:
DIREITO DE VIZINHANÇA – DEMOLITÓRIA – SERVIDÃO DE PASSAGEM – PORTÃO ELETRÔNICO QUE IMPEDE O EXERCÍCIO DO DIREITO DE IR E VIR – OBRA NECESSÁRIA À CONSERVAÇÃO, SEGURANÇA E USO DA SERVIDÃO – DESCABIMENTO – APLICAÇÃO DO ART. 699 DO CÓDIGO CIVIL.
Os donos da servidão que estalam portão para evitar que a presença de vadios terceiros, na rua particular destinada à passagem, a dificulte, agem de conformidade com o disposto no artigo 699 do CC, isto é, empreendem obra necessária à conservação e o uso da servidão em seu favor instituída. Ademais, se, o proprietário do prédio gravado com servidão de passagem conservar a faculdade de fechá-la, de maneira que não prejudique o exercício da servidão, bastando, para tanto, que ofereça uma chave ao seu titular, não podendo este ser impedido por aquele de proceder do mesmo modo, destinando-se o fechamento à maior segurança de ambos. (TacivSP. AP nº 619.749-003. 12ª Câm – Relator: Juiz Palma Bisson. Julgado em: 13.12.2001).
De maneira idêntica:
POSSESSÓRIA – INTERDITO PROIBITÓRIO – FUNDADO RECEIO DE TURBAÇÃO OU ESBULHO – AUSÊNCIA DE PROVA – SERVIDÃO – REALIZAÇÃO DE OBRAS DE MANUTENÇÃO E USO – IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA
Na ação de interdito proibitório, cabe ao autor da demanda demonstrar, de forma satisfatória, um fundado receio contra atos de turbação ou esbulho por parte de terceiros, sob pena de improcedência da demanda. Constituída servidão, tem direito o possuidor de realizar obras necessárias à sua conservação e uso, sem que tal ato se constitua em turbação ou esbulho da posse do proprietário do prédio serviente. (TAMG. AP nº 0345687-5. 4ª C.Cív. Relatora: Juíza Maria Elza. Julgado em 17.10.2001).
Diante de tudo quanto exposto, vê-se que a matéria em apreço já foi discutida e sua plausibilidade editada nos Tribunais, o que permite, remansosamente, para arremate do assunto, concluir que a jurisprudência sanciona a doutrina majoritária e a legislação unânime, comprovando que os limites no exercício das servidões constituem-se nos seguintes: objeto (conteúdo) da servidão; uso civiliter modo; finalidade e necessidade (utilidade).
CAPÍTULO IV
1 – ABUSOS NO EXERCICIO DAS SERVIDÕES
Superado qualquer percalço quanto aos limites no uso das servidões, é de bom talante observar, em vista dos litígios que envolvem o seu exercício, quais as hipóteses em que estes se verificam abusivos e contrários aos seus fins.
Não vem ao caso aqui embrenhar-se em movediças considerações acerca das correntes diametralmente opostas que se digladiam em torno da teoria do abuso de direito[7], sendo necessária, apenas, para os fins pretendidos, uma rápida conceituação do instituto em sintonia com o positivado pelo Código Civil de 2002.
Pois bem, é princípio assente em toda sociedade moderna o de não prejudicar outrem, devendo as pessoas agirem no estreito caminho da boa-fé e em compasso com os ditames da ética. Essa rudimentar forma moral é marco limitador das faculdades que o exercício da liberdade individual comporta (DIAS, 1983), impondo uma verdadeira conciliação entre a utilização do direito próprio e o respeito à esfera jurídica alheia.
Procurando um equilíbrio entre esses direitos, a ordem jurídica passou a considerar os atos com desvios de conduta, egoísticos e tendentes a prejudicar, abusivos, mesmo quando exercidos nos contornos de direito legítimo. De tal modo que entendeu-se por abuso no exercício de direito quando apesar de lícito o objeto, ultrapassa a pessoa, os limites impostos pela regularidade, provocando resultado que o direito arrepia, ou seja, a pessoa tem o direito, mas, pelo excesso na utilização, arca com as conseqüências correspondentes (BITTAR, 1994)
Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2003), o abuso de direito acontece a partir do instante em que o agente, operando dentro dos contornos da lei, deixa de considerar a finalidade social de seu direito subjetivo e o exorbita ao exercê-lo, causando prejuízo a outrem. Embora não haja, em geral, violação ao limites objetivos da lei, o agente desvia-se da finalidade social a que esta se destina.
No mesmo diapasão, preceitua Paulo Nader (2004) que o abuso de direito é espécie de ato ilícito, que tem como pressuposto a violação de direito alheio mediante conduta intencional que exacerba o regular exercício de direito subjetivo.
Com isso, parece razoável entender-se que o sujeito que pratica ato abusivo é titular de um direito irregularmente exercido, o que difere do ato considerado ilícito (em sentido estrito), já que neste o sujeito não pode alegar em seu favor nenhum direito, posto que transgride o direito de outrem sem qualquer razão juridicamente apreciável.
São, pois, o ato abusivo e o ilícito em sentido estrito ejusdem generis, ou seja, pertencentes ao gênero dos atos ilícitos em sentido amplo.
Válido nesse sentido, face à inequívoca relevância, trazer a lume as palavras do eminente Carlos Barbosa Moreira (2003) que, discorrendo sobre o tema, vislumbra ser possível, do ponto de vista teórico, distinguir o ato ilícito do abuso de direito. De acordo com o autor, uma é a situação de quem sem poder evocar a titularidade de direito algum simplesmente viola direto alheio. Seria esse o autêntico perfil do ato ilícito strictu sensu. Outra situação é a daquele que sendo titular de um direito irregularmente o exerce. Assim, ao contrário do que se dá no ato ilícito, no ato abusivo não há a violação de um direito de outrem, mas o exercício anormal de um direito próprio.
O estatuto civil pátrio, ao tratar desse assunto, o fez incorrendo nessa mesma doutrina, pois dispõe, em seu artigo 186, que quem por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. E em seguida reza o seu art. 187 que também comete ato ilícito o titular de um direito que ao exercê-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (BRASIL, 2002).
Dessa forma, o elemento fundamental para que se caracterize o abuso do direito, como se depreende do mencionado dispositivo, é a ultrapassagem de determinados limites no respectivo exercício, sendo tais limites impostos em razão do fim social, da boa-fé ou através dos bons costumes.
A propósito do exercício abusivo do direito de servidão, é componente capital para a sua caracterização que sejam suplantados os limites preestabelecidos pela lei, doutrina e jurisprudência, ou seja, os limites do uso civiliter, da necessidade e da finalidade, que encontram-se postos, justamente, no escopo de proteger o fim econômico ou social, a boa fé e os costumes no exercício do direito de propriedade.
Note-se que o componente “objeto” (conteúdo) alhures indicado como limitador ao exercício da servidão não serve para estabelecer, como num primeiro momento poderia parecer, o exercício abusivo do direito. Isso porque sendo ultrapassado esse elemento no uso da servidão, estar-se-á violando direito alheio (ato ilícito), e não sendo exercido de modo anormal direito próprio (abuso de direito).
Essa questão é muito bem abordada por Clóvis Beviláqua (2003) quando doutrina que a servidão deve ser exercida civiliter e limitando-se às necessidades do prédio dominante, pois qualquer excesso praticado pelo dono deste constitui ou ato contra o direito, se exceder os limites do título constitutivo da servidão, ou ato abusivo de direito, se embora não excedendo aqueles limites, contrariar os fins para que a servidão foi constituída.
Assim, ainda na esteira dos ensinamentos do autor, se o proprietário do prédio dominante retira do prédio serviente 15.000 litros d’água quando seu direito de acordo com o título constitutivo da servidão era o de retirar 5.000 litros, seu ato é contra o direito por se chocar com os termos do contrato. Mas, se embora sem dela necessitar retira os 5.000 litros d’água que o contrato lhe conferia para desperdiçá-la, seu ato é abusivo de direito. O que, sem qualquer embargo, não deixa de ser ilícito, pois, segundo o já mencionado artigo 187 do Código Civil de 2002, também comete ato ilícito o titular de um direito que ao exercê-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Ao revés, não vendo qualquer diferença nas conseqüências dos atos praticados além dos limites, seja do “objeto constituído” seja do “necessário”, o brilhante comentador Carvalho Santos (1991) entende ocorrer o abuso no exercício da servidão sempre que o dono do prédio dominante extrapole as necessidades de seu prédio ou os limites da sua constituição, com prejuízo do prédio serviente.
Já Pontes de Miranda (1957), em harmonia com a doutrina de Clóvis, afirma que se a servidão vem a ser exercida além das necessidades do prédio, embora se trate de utilitas fundi, isto é, de utilização que poderia ser conteúdo de servidão, é irregular o exercício da servidão. Ressaltando, logo em seguida, que o agravamento da servidão por lhe exceder o conteúdo é ilícito e ofende o prédio serviente, podendo mudar, todavia, respeitados os princípios da servidão e as circunstâncias, a extensão e o seu modo de exercício.
Apesar disso, vê-se que as conseqüências dos atos ilícitos em sentido estrito ou abusivo são as mesmas, tendo em vista serem todos os dois espécies do gênero ilícito. De tal modo que, como bem pontua Silvio Venosa (2002), verificado e declarado um ato como havendo sido cometido com abuso de direito, esse fato provoca os efeitos de todos os atos ilícitos, quais sejam a obrigação de reparar os danos por ele causado e a nulidade do ato.
Sendo importante saber, exclusivamente, que qualquer excesso é incursão ilícita na esfera jurídica do dono do prédio serviente, não tolerando a lei que a agravação exceda, sem necessidade, os limites da restrição resultante da imposição da servidão, acarretando prejuízo ao dono do prédio serviente.[8]
Portanto, o abuso de direito no exercício das servidões encontra os seus termos e latitude nos limites do uso civiliter modo, da finalidade e da necessidade, sendo o seu objeto constituído limitador dos atos ilícitos em sentido estrito.
Dito isso, mister se faz analisar uma pequena massa de acórdãos, que, à sombra do assunto ora em análise, elucida quais os contornos que vêm sendo dados pelos Tribunais brasileiros a esse respeito.
Manifestando-se sobre o abuso de direito no exercício das servidões, o Tribunal de Alçada Cível de Minas Gerais, representado pelo Juiz Caetano Levi Lopes, em acórdão já mencionado, mas que se aplica de igual modo ao assunto vertente, concluiu por ato abusivo de direto a não observância do objeto para o qual foi a servidão constituída, determinando a sua utilização nos estritos limites do seu conteúdo. A propósito:
SERVIDÃO DE PASSAGEM – LIMITE – ABUSO DE DIREITO – A servidão e uma restrição que se impõe ao pleno exercício da propriedade, devendo ser utilizada nos estritos limites para os quais foi constituída. Se, na servidão de trânsito, se permitiu a passagem de pedestres, não pode ser utilizada para automóveis e muito menos pode o beneficiário arrancar cercas ou deixar abertas partes móveis destas, sob pena de configurar abuso de direito, que deve ser coibido pela ordem jurídica (Grifado). (TAMG. Ap nº 0218275-6. 2ª C.Cív. Relator: Juiz Caetano Levi Lopes. Julgado em 25.06.1996).
No que respeita aos atos praticados no intuito de conservar a servidão (adminicula servitudes ), as cortes nacionais têm entendido que, se exercidos dentro do seu objeto, não há que de se cogitar em abuso de direito. A esse respeito, observe-se o seguinte decisum:
APELAÇÃO CÍVEL-AÇÃO CAUTELAR INOMINADA – ABUSO DE DIREITO DE POSSE EM SERVIDÃO- PLANTIO DE ÁRVORES E FOLHAGENS- EMBELEZAMENTO E CONTENÇÃO DE CHUVAS E EROSÃO-OBRAS REALIZADAS DENTRO DO LIMITE TERRITORIAL DA SERVIDÃO – PERMISSIVO DO ART. 1380, CC-ABUSO NÃO CONFIGURADO-DECISÃO-REFORMADA-RECURSO-PROVIDO
Não comete abuso de direito de posse sobre servidão aquele que, detentor da mesma, realiza obras dentro de seu limite territorial com a finalidade de embelezar, restaurar a natureza e o meio ambiente e conter erosão e chuvas, eis que sua conduta está protegida pelo artigo 1380 do CC. (omissis).
Dando relevância ao fato de ser a necessidade elemento limitador do exercício da servidão, o Tribunal de Alçada Civil de Minas Gerais qualificou aos atos que ultrapassam o limite do necessário de abusivos ao direito. Observe-se como se pronunciou a sua Primeira Câmara:
AÇÃO DE SERVIDÃO NATURAL DE ÁGUAS – ÔNUS DA PROVA
Os atos que ultrapassam os limites do uso normal às necessidades de consumo das águas pelo prédio superior devem ser repelidos, sob pena de prejuízo ao proprietário do prédio inferior, que tem o direito ao uso das sobras. ‘Como disse acima, o proprietário do prédio inferior, ao mesmo tempo que tem a obrigação de receber as águas que fluem naturalmente do prédio superior, tem o direito aos sobejos. Pois, o dono da fonte não captada, satisfeitas as necessidades de seu consumo, não pode impedir o curso natural das águas pelos prédios inferiores (Cód. Civ., art. 565). Trata-se da antiga servidão legal de águas supérfluas, segundo a qual o prédio inferior tem direito às mesmas’. A regra que impera mesmo em processo é a de que ‘quem alega o fato deve prová-lo’. O fato será constitutivo, impeditivo, modificativo ou extintivo do direito, não importando a posição das partes no processo. Desde que haja a afirmação da existência ou inexistência de fato, de onde se extrai situação, circunstância ou direito a favorecer a quem alega, dele é o ônus da prova. (TAMG. AP nº 0357226-3. 1ª C.Cív. Relator: Juiz Gouvêa Rios. Julgado em 30.04.2002).
Sustentando a necessidade de se levar em conta os parâmetros do abuso de direito quando do exercício das servidões, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em julgado com voto da lavra do Des. Armando da Costa Ferreira, prolatou decisão com o seguinte teor:
EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA. SERVIDÃO DE PASSAGEM. NÃO CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL DESENCRAVADO. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO.
1. É a servidão de passagem uma exceção à regra geral do domínio que deve ser interpretada restritivamente levando-se em conta os princípios gerais de direito de vizinhança e os parâmetros do abuso de direito.
2. Não se caracteriza a servidão de passagem em imóvel que possui outro acesso à via pública, ou seja, em imóvel desencravado (TJRN. AC nº 02.003417-2 . Relator: Armando da Costa Ferreira).
Na mesma linha, em caso análogo, traz-se à baila pronunciamento proferido pelo Desembargador Anselmo Cerello do Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos termos seguintes:
POSSESSÓRIA – SERVIDÃO PREDIAL DE PASSAGEM – ESCADA DE ACESSO AO ANDAR SUPERIOR – ÔNUS DECLARADO EM AVERBAÇÕES IMOILIÁRIAS – DESTRIÇÃO DO IMÓVEL – REFALIMENTO COM A PERSISTÊNCIA DESTE ÚNICO MEIO DE ACESSO – ALEGAÇÃO DE ESBULHO DO PROPRETÁRIO DO IMÓVEL SERVIENTE. IMPROCEDÊNCIA.
Sendo destruído o imóvel serviente, nem por isso resta extinta a servidão de passagem titulada no Registro Imobiliário, por inocorrência de qualquer causa extintiva prevista no art. 769 e 710 do CCB. Reconstituído o prédio serviente deve ser restabelecida servidão de trânsito, ainda que com maior largura, a teor do art. 706 do CCB, salvaguardo ao proprietário do prédio serviente a devida separação nos termos do parágrafo único deste dispositivo, sendo inadmissível a alegativa de esbulho possessório, por força do restabelecimento da servidão, exceto duvidosa prova em contrário que ateste o abuso no aludido restabelecimento(Grifado). (TJSC. AP. nº 88.088388-8; Relator: Desembargador Anselmo Cerello. Julgado em 30/06/1999).
Finalmente, cumpre ressaltar que o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal na AP 2001 031000265-8 retira qualquer margem de dúvida capaz de ensejar interpretação equivocada a respeito da aplicação do instituto do abuso do direito nos estritos contornos dos elementos limitadores do exercício da servidão. É o que se extrai da sinopse abaixo do acórdão aqui referido.
O dono do prédio “A” ajuizou ação ordinária com pedido de antecipação de tutela em desfavor do dono do prédio “B”, narrando que desde 1994 é proprietário de uma gleba de terras próxima a Ceilândia e que no ano de 1997 o réu adquiriu uma área contígua onde já existia uma servidão de acesso à chácara do autor, ocasião em que foi instalada uma porteira com cadeado e cada um dos litigantes ficou com uma cópia da chave. Aduz que o réu, alegando que a porteira não vinha sendo fechada pelo autor, trocou por conta própria o cadeado desta, impedindo o acesso à propriedade.
O M.M Juiz de Primeira Instância achou por bem determinar a autorização do autor para utilizar a propriedade, deferindo o pleito e disciplinando a servidão.
Interposto recurso de apelação contra o julgado, foi- lhe dado provimento pela Segunda Turma do E. Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a qual sob o argumento de que se o pedido formulado na peça de ingresso é no sentido de que o réu se abstenha de impedir o acesso do autor à sua propriedade, correta é a sentença que ao deferir o pleito autoral disciplina essa servidão, fazendo-a da forma menos onerosa.
Analisando o supramencionado caso, evidencia-se que a sentença, confirmada em grau de recurso, invoca, com razão para decidir a favor do demandante, que o réu no momento em que impedia o autor de ir e vir exercia o seu direito de propriedade de maneira excessivamente onerosa, ou seja, além dos limites do uso civiliter modo, o que caracteriza, sem sombra de dúvida, o abuso de direito no exercício da servidão.
Por fim, não dispendiosa a transcrição de alguns casos citados por C. Aubry e C. Rau (1935) e Arnoldo Wald (1995) que não constituem ilícito e de outros que a doutrina tem entendido que caracterizam o abuso. Veja-se:
Não constituem ilícito: A construção de um parapeito em terraço; abrir janelas em outro local para benefício do fundo dominante e desde que não prejudique o serviente; a mudança da forma do telhado, na servidão de escoar chuva, se tornar menos gravosa a situação do prédio serviente; colocar o titular de uma servidão de aqueduto sobre prédio de outrem, água de qualidade diversa daquela que introduzida a princípio, desde que não grave a condição do prédio serviente; na servidão de prospecto exercida por meio de uma janela, a transformação desta em uma sacada, substituindo-se o parapeito de tijolos por uma grade de ferro; estender o cano que conduz a água a outros cômodos da casa, a não ser que prejudique o prédio serviente; quando originalmente o prédio, a cujo proveito foi instituída a servidão, pertencia a um só proprietário e passou depois a pertencer a muitos, todos poderão usar da passagem de tirar água conforme a servidão, sem que nesta última sejam obrigados a gastar apenas a quantidade que gastava o primeiro proprietário.
Constituem abuso no exercício do direito de servidão: a extensão indevida da área da servidão; a prática dos atos nas servidões em horas impróprias; as desnecessárias intensificações do seu exercício; e a alteração do modo de exercê-la.
Portanto, acerca do assunto, a jurisprudência não tem sido diferente da orientação doutrinária, assentando em termos de quase unanimidade que o abuso de direito no exercício das servidões possui lastro nos elementos limitadores que lhe dá os parâmetros exatos para a sua aplicação nos casos concretos.
CONCLUSÃO
Os limites ao exercício das servidões são, como ficou demonstrado, o objeto constituído, o uso civiliter modo, a necessidade e a finalidade que servem não apenas como linde ao uso desse direito real sobre coisa alheia mas, também, como forma de caracterizar o exercício abusivo de direito.
Isso pode ser observado com base no antigo direito romano, onde foram identificados os primeiros elementos de limitação ao uso das servidões, quais sejam o uso civiliter modo e o objeto (conteúdo). Donde deduz-se, logicamente, que já nesse período havia uma preocupação em estabelecer balizas ao seu exercício no intuito de não onerar em demasia o direito de propriedade alheio.
Apesar disso, foi natural que no correr dos tempos esse iura in re aliena necessitasse de aperfeiçoamento, recebendo conceito próprio, elementos de formação, natureza jurídica, princípios, finalidade, classificação e formas de constituição, passando, a partir daí, a ganhar status de instituto jurídico.
Com efeito, é através desses elementos formadores das servidões que se pode entender por que elas possuem limites no seu exercício e por que sendo esses exorbitados caracteriza-se o ato abusivo e contrário ao direito.
Nesse sentido, a doutrina moderna alcançou o entendimento de que consistindo a servidão num ônus real ao direito de propriedade, seu uso há de conter-se nas cercanias da estrita necessidade do prédio dominante, do objeto constituído, da finalidade e do exercício civiliter, sendo, pois, esses quatro sinais suficientes para restringir a sua utilização.
Essa maneira de compreender os limites ao exercício das servitudes foi de abrangência palmar, tanto que os sistemas legislativos de origem romano-germânica são praticamente unânimes na positivação dos mencionados componentes, contribuindo para que a jurisprudência firmasse entendimento nessa direção e passasse a utilizá-los na solução dos litígios que evolvem o assunto.
Certamente, não se pode negar que a inobservância dos mencionados elementos na prática das servidões desemboca na esfera dos atos ilícitos ou do abuso de direito, visto que sendo eles suplantados estar-se-á exercendo direito de modo exorbitante, malicioso ou egoístico, e sobre isso a doutrina e jurisprudência não vacilaram em momento algum.
Portanto, pode-se afirmar, sem receio de erro, que a servidão deve ser exercida civiliter modo, limitando-se às necessidades do prédio dominante, em consonância com o objeto, e no compasso com a finalidade para a qual foi instituída. Pois, qualquer descomedimento praticado pelo dono do prédio dominante constitui ou ato ilícito stricto sensu ou ato abusivo de direito.
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Daniel F. O. Costa. Advogado. Assessor jurídico do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em direito processual civil. E-mail: danf1110@hotmail.com.
[1] Termo utilizado por René David para conceituar “sistema jurídico”, que tornou-se bastante usual.
[2] “Burgiliches Gesetcbuch”, famoso Código Civil da Alemanha.
[3] Apesar da idéia geral de que o Código Civil francês influenciou marcadamente o Código Civil brasileiro, Franz Wieacker desmistifica esse pensamento quando adverte que a atual zona de influência da família românica francesa, engloba quase todos os paises românicos da Europa e da América latina, com certas reservas, sobretudo, no Brasil (WIEACKER, 1967).
[4] Isso ocorreu, provavelmente, em razão da marcante influência romana.
[5] Apesar de não parecer ter havido qualquer mudança de influência quanto ao assunto em análise, é válido notar que, com o novo ascenso da ciência jurídica na Itália, a teoria do direito aplicou-se cada vez mais ao mundo conceitual da pandectística alemã. Na época moderna, a política do direito desenvolveu também as modernas questões sócias para as quais o grande conservadorismo da legislação francesa não fornecia qualquer modelo, em razão do qual, o direito italiano é visto, na sistemática jurídica atual, numa posição intermediária muito própria. (WIEACKER, 1967).
[6] Nesse sentido, a jurisprudência tem-se manifestado reiteradamente: AC 35. 691-0/188 de Turvânia, DJE 12.066, pág. 12; TAMG – AC 314. 272-1 2° C. Civ. – Rel. Juiz Edivaldo George – DJMG 17.11.2000; TAMG – Ap 0242334-5 – 6ª C.Cív. – Rel. Juiz Belizário de Lacerda – J. 30.10.1997; TAMG – Ap 0255190-8 – 1ª C.Cív. – Rel. Juiz Nepomuceno Silva – J. 05.05.1998; TAMG – Ap 0248518-5 – 3ª C.Cív. – Rel. Juiz Duarte de Paula – J. 11.02.1998; TJMT – AC 23.643 – Classe II – 25 – Cáceres – 1ª C.Cív. – Rel. Des. Orlando de Almeida Perri – J. 08.05.2000; 1º TACivSP – RT 802/253; TACRJ – AC 3077/93 – (Reg. 4425-3) – Cód. 93.001.03077 – 6ª C. – Rel. Juiz Nilson de Castro Dião – J. 27.04.1993; AgIn 1.043. 793-6º Câm-j. 13.11.2001. rel. Juiz Windor Santos.
[7] Várias correntes surgiram ao final do século IXI e início do XX na tentativa de justificar o fenômeno. A negativista, capitaneada por Planiol, entendia ser o abuso de direito uma logomaquia, já que, segundo esse autor, não seria possível um titular de um direito exercer e abusar dele ao mesmo tempo. “On parle volontiers de l’usage abusif d’un droit, comme si ces deux mots avaient un sens clair et certain. Mas il ne faut pas en être duple: le droit cesse où l’abus commence, et il ne peut pas y avoir l’usage abusif d’un droit quelconque, parce qu’un meme acte ne peut pas être tout à la fois conforme et contraire au droit” (PLANIOL, 1952, p. 870). Já a subjetivista, vislumbrava o abuso de direito quando havia intenção de provocar o dano. E por fim, a doutrina objetiva, seguida pelo atual Código Civil pátrio, procurava não se preocupar com a intenção, mais sim, com a finalidade econômica, social e moral. Para maiores informações ver: Fábio Ulhoa Coelho e Carlos Barbosa Moreira .
[8] Carvalho Santos, com acuidade peculiar, observa que o socorro ao prédio serviente só é possível quando a lesão produzida consista em um prejuízo apreciável. Desde que este não se verifique, a agravação da servidão permanece dentro dos limites da legalidade (SANTOS, 1991).