Sociedade

Um tigre inocente e a criança carente

A preocupação ecológica tem sido uma tônica para o mundo contemporâneo. Muito se cogita a respeito de preservação de recursos naturais e também da vida selvagem. Mas também os recursos faunísticos são dignos de proteção.

Por suas peculiares características sem a preservação do meio ambiente, não podemos entender a importância da sobrevivência dos animais selvagens, seja compondo a fauna local, seja quando integrado ao conjunto de animais que vivem em determinada área.

A importância da vida selvagem está relacionada com o equilíbrio ambiental, com a harmonia dos ecossistemas em geral, pois muitos animais são cruciais para a existência de flora e tantos atuam como elo de procriação, sendo agentes polinizadores e controladores de espécies das mais variadas.·.

Não podemos olvidar que os reinos animal e o vegetal estão integrados nessa fina camada do planeta terra, a conhecida biosfera e, é regida por rigorosas leis fisiológicas que permitem a sobrevivência das espécies.

E ao romper tal harmonia abruptamente seja pela interferência humana ou por motivos civilizatórios acarretamos não apenas a extinção de milhões de espécies mas culmina a médio e longo prazo a própria extinção da espécie humana.

Diante disso, é crucial afirmar que a paternidade responsável está em perigosa extinção na sociedade humana. E, pior, isso já traz sérios reflexos diretos em nosso ecossistema.

A biodiversidade das espécies vive constantemente ameaçada até mesmo pela cultura do desafeto que se instaurou na família contemporânea.

Nosso texto fundamental vigente aponta que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal a competência de legislar concorrentemente sobre a fauna, em seu art. 24, inciso VI. E, determina igualmente que o Poder Público proteja tanto a fauna como a flora, ficando proibidas as práticas que importem em risco a sua função ecológica, ou que provoquem a extinção de espécies ou submetam animais à crueldade ( art. 225).

A visitação e o comportamento dos visitantes, notadamente de crianças, em Zoológico acarreta stress e sim, poderá efetivamente suscitar crueldade no trato com esse animal selvagem que já está submetido às circunstâncias tormentosas de cativeiro e exposição.

Os zoológicos são em verdade uma invenção de invasores, especialmente de europeus, que sequestravam tais animais das regiões mais remotas e impunham sua tirania para expô-los aos olhares curiosos nos grandes centros urbanos europeus.

Atualmente tal costume resta superado mas tanto do ponto de vista científico como o ético é fácil concluir que pouco aprendemos sobre a natureza de um animal quando vemos por detrás de grades de ferro, solitário e infeliz e muito distante de seu habitat original.

O zoo só faz sentido se forem transformados em hospitais de custódia e tratamento para animais feridos ou ameaçados que poderiam ser protegidos por um tempo determinado, até que fossem devolvidos ao seu ambiente originário natural.

Em verdade nenhum zoo deveria ser aberto à visitação pública, da mesma forma que nenhum hospital ou clínica expõe seus pacientes em tratamento.

De pouco adianta a lei prever crimes ambientais e severas sanções através da Lei 9.605/98, bem como regular também os crimes contra a fauna e flora, pois a legislação seja insuficiente para protegê-los e consequentemente preservar a vida selvagem.

Nenhum batalhão de guardas e vigilantes poderia deter a deseducação, a negligência e, ouso dizer a indiferença de um pai, que assiste filmagens e comportamentos impróprios sem ser capaz de intervir e impedir um mal maior.

Ademais temos a Lei 7.173, de 14 de dezembro de 1983 que dispõe sobre o estabelecimento e funcionamento de jardins zoológicos. E que expressamente prevê que cada alojamento está condicionado ao respectivo certificado de habite-se que será fornecido após inspeção pelo IBDF – Instituto brasileiro de Desenvolvimento florestal.

Consta ainda como permitida em seu art. 17 do referido diploma legal a cobrança de multas administrativas de até um salário mínimo mensal local, por danos causados pelo visitante aos animais.

Há ruidosas críticas também ao IBAMA que insiste em não dialogar com os zoológicos brasileiros. A Instrução Normativa 169 de 2008 não agradou em nada os setores envolvidos, a saber: os zoológicos, criadouros, mantenedouros e centros de reabilitação, e no entender da Sociedade dos Zoológicos Brasileiros (SZB) fere diversas questões jurídicas referentes a esse tipo de estabelecimento, o único criado por lei ordinária federal.

A Instrução Normativa 169 de 2008 não agradou em nada os setores envolvidos, a saber: os zoológicos, criadouros, mantenedouros e centros de reabilitação, e no entender da Sociedade dos Zoológicos Brasileiros (SZB) fere diversas questões jurídicas referentes a esse tipo de estabelecimento, o único criado por lei ordinária federal.

A SZB afirma que o IBAMA não dialoga com as partes envolvidas e prefere tomar atitudes coercitivas, em puro tom autoritário.

Observa-se que mais de cinquenta dos cento e vinte e sete zoológicos brasileiros se encontram devidamente registrados no IBAMA, desde que a primeira portaria em 1989 regulamento a lei federal de 1983 entrou em vigor, na referida IN exige-se que todos os zoológicos já registrados possuem um ano para se adaptar. O que se revela
ser ilegal, pois nenhuma alteração na lei fora proferida.

Outra dificuldade grande é 65% dos zoológicos brasileiros pertencem aos municípios que trabalham com dotação orçamentária prevista no mínimo seis meses antes do ano fiscal vigente. Além disso, os projetos de obras devem ser previstos no plano plurianual, feito a cada quatro anos, tudo com estreito cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Ao que se sabe o humilde zoológico da cidade de Cascavel cumpriu
todas as recomendações técnicas, porém não tinha imunidade contra a negligência e o abandono material e moral sofrido pela criança que resultou atacada pelo tigre e, perdeu um braço..

Proteger a vida selvagem em sua solidão do cativeiro também depende de hábitos culturais dos visitantes. E essa vacina infelizmente parece que ainda não fora desenvolvida…

De sorte que se aumentar a cerca e a precaução, sem contudo, enfatizar que a necessidade de se ter a paternidade responsável vai além do pagamento de pensão alimentícia, e da pseudotolerância as visitações recorrentes.

O tigre Hu é que fora em verdade a vítima do menino de onze anos que tragicamente sofreu com desfecho quase fatal… se bem que a rigor, tão carente de afeto e de atenção o menino colocava a sua vida em risco, na busca provável de maior manifestação
de amor e atenção de pai distante e possivelmente ausente.

Ademais é discutível a manutenção de animais selvagens em cativeiro para servir de entretenimento de humanos.

As inúmeras provas materiais comprovam que o garoto (Vrajmany Fernandes Rocha) invadiu inadvertidamente a área de segurança na presença paterna, e este pai ficou distante, inerte e ocupado com outro filho menor.

O pai depois da tragédia concedeu uma entrevista onde restou patente o quão despreparado é, admitindo até que o filho guardava e oferecia ossos colhidos durante o almoço aos animais.

O que por si só, constrói dantesco perigo, pois a ingestão indevida poderia até levar um desses animais à óbito.

O dilaceramento do braço do menino foi horrível, e mesmo assim a visitação no zoológico dobrou após a dita tragédia, o que requereu da instituição conforme noticiou a CBN notícias.

O resumo do discurso patético do pai se traduziu em afirmar que tentou fazer o que pode pelo filho… e ainda, enaltecer que o menino se preocupava com o animal.

Evidentemente o menino correndo e se expondo efetivamente, colocando as mãos e braços dentro da jaula do animal não foi alvo de preocupação do pai.

É bom relatar, no entanto que o menino tem onze anos, e os pais biológicos se encontram separados há dez anos… portanto é parca a convivência familiar da criança com seu pai. Até pela distância física existente entre a cidade onde mora o pai e a cidade onde mora a mãe.

Enquanto isso o tigre enjaulado chamado de Hu ocupava seu espaço melancólico, foi submetido ao isolamento sendo encerrado num cubículo ainda menor do que o anterior.

Analisando o comportamento do menino que agia como caça, escorado pela omissão paterna e pela omissão da plateia que filmava e fotografava sem, contudo aludir ao perigo. A indiferença da sociedade contemporânea nos faz conhecer contornos sombrios.

Se faltaram vigias do zoológico, faltaram ainda mais afeto e atenção do pai que nada fez até que se configurasse o trágico ataque do animal selvagem.. Quem podia e deveria intervir que era o pai, não o fez, configurando claramente o abandono material e moral da criança.

Fato que é previsto no art. 13, inciso X do Código Penal Brasileiro que expõe que o resultado quando depende a existência do crime, somente é imputável, a quem lhe deu causa. Considerando-se causa também a omissão sem a qual o resultado jamais teria ocorrido.

Ademais, o ECA em seu art. 5º expõe que a criança e adolescente não deve ser objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade, opressão e deverá ser punido na forma da lei qualquer atentado, seja por ação ou por omissão aos seus direitos fundamentais.

Até mesmo a mãe, apesar de ausente, se sabedora da dificuldade ou inaptidão do pai, por existir um irmão menor poderá ser considerada coautora. E, nesse caso sendo ou não dolo direto ou eventual, o MP deverá denunciar o pai que fora efetivamente
omisso por lesão corporal grave e qualificada posto que resultou na perda do membro.

Ao menino faltou educação e afeto. Ao pai faltou o simples bom senso e a atenção que são requisitos mínimos para o salutar exercício do poder familiar e principalmente da paternidade responsável.

Esse é o caso em que o inocente (a criança) é duplamente vítima, do pai omisso e da ausência de condução e educação dos pais. Afinal Hu não era uma figura inerte e inofensiva, e sim um animal selvagem que em sua racionalidade apenas reagiu aos estímulos oferecidos.

Acho importante, recentemente quando se comemora o dia dos pais, ressaltar a importância da figura paterna. Presente e comprometido com o bem- estar e com a educação de seus filhos, e que nem sempre adota uma atitude simpática ou agradável. Mas, quando necessário, aponta firmes limites, e faz respeitar tais limites como regras de sobrevivência e de civilidade. Nunca é de mais afirmar que quem ama, efetivamente educa…

O pai é um herói casuístico, sem medalhas, a enfrentar as batalhas do dia-a-dia. Por vezes a ser o provedor não só no aspecto material, mas principalmente do emocional e capaz de propiciar o efetivo e saudável desenvolvimento psicossocial da criança e do adolescente.

O pai é uma representação de força, de afeto e proteção e jamais deveria faltar ao desenvolvimento humano. Mas, ainda que ausente, resta a sociedade a exaltar a inocência e cultuar a preservação da dignidade da pessoa humana que está na criança e adolescente e que merece toda nossa atenção e reverência.

A placa deveria informar: Perigo. Amor e atenção ausentes!!!

Oportuno lembrar que no dia 30 de agosto temos como principal objetivo aderir a campanha prevenir acidentes com crianças, o tema pode ser por um ato público congregar comunidades, escola e principalmente de pais e responsáveis aludindo aos principais perigos tanto no trânsito, como em afogamentos, intoxicações

e sufocações. É principalmente a falta de afeto que arremessa o inocente a saciar sua carência com atitudes descabidas.

A prevenção de acidentes ainda é o principal desafio e a reflexão sobre nossas responsabilidades é um necessário cuidado para proteger o futuro.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele; HEUSELER, Denise. Um tigre inocente e a criança carente. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2014. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/um-tigre-inocente-e-a-crianca-carente/ Acesso em: 22 nov. 2024
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