Sociedade

Não há direito adquirido contra a sociedade

Não há direito adquirido contra a sociedade

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

Duas questões têm sido levadas às manchetes de jornais no concernente aos vencimentos de magistrados e procuradores do Ministério Público. A primeira diz respeito à possibilidade do pagamento de jetons aos membros dos Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público pelo trabalho adicional que sua função de controle externo exige.

 

A segunda é sobre a deliberação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de que os magistrados que recebem mais do que o teto constitucional deveriam passar a ter redução de seus vencimentos para adaptar-se ao limite da lei suprema.

 

Teses consistentes são apresentadas de ambos os lados. Aqueles que defendem jetons, alegam trabalhar mais e, por isto, poderiam receber além das fronteiras da Carta Magna. Os que advogam o direito adquirido à remuneração superior entendem que tal direito é cláusula imodificável da ‘lex maxima’.

 

Embora reconheça consistência nas diversas teses (teto constitucional, direito adquirido, trabalho adicional), tenho posição pessoal a respeito dos dois temas.

 

Considero que há três instituições fundamentais à administração da Justiça – advocacia, Ministério Público e Poder Judiciário, controladas, respectivamente, pela Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e CNJ. Aqueles que se candidatam para conselheiros da OAB, do CNMP ou do CNJsabem que servirão à classe. Ninguém é obrigado a participar dos órgãos. Ora, se os conselheiros da OAB não são remunerados – fui conselheiro por 8 anos da seccional de São Paulo e nunca nada recebi – não vejo porque, neste ‘munus’ público, os conselheiros dos dois outros organismos devam receber adicionais por um serviço às suas respectivas classes e à comunidade em geral.

 

Quanto ao direito adquirido, há anos defendo a tese de que a autoridade não tem direito adquirido contra a sociedade, pois está para servi-la e não para ser por ela servida. Nesta linha, se, como defesa da sociedade, os constituintes impuseram limites remuneratórios em benefício do povo para evitar pressão fiscal maior decorrente de autoconcessões de vencimentos, a tese do direito adquirido não poderia ser levantada, por atingir os verdadeiros destinatários do serviço público, que são os cidadãos. Neste caso, entendo que o CNJ tem razão de impor o limite constitucional.

 

Nada obstante minha convicção pessoal, que me causa enorme desconforto, por ser contrária à de eminentes amigos na magistratura e no Ministério Público, reconheço que as teses contrárias são também consistentes e caberá ao próprio Poder Judiciário optar por umas ou outras.

 

 

* Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: www.gandramartins.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Não há direito adquirido contra a sociedade. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/nao-ha-direito-adquirido-contra-a-sociedade/ Acesso em: 01 jul. 2025
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