Presidentes Despreparados
Ives Gandra da Silva Martins*
Em 1977 publiquei livro intitulado O Direito do Estado e o Estado de Direito, em que, após uma análise perfunctória da evolução do poder, na história humana, propunha a criação de escolas políticas patrocinadas pelo poder público, em nível de 1º e 2º graus, assim como universitário, para preparar candidatos aos Legislativos e Executivos municipais, estaduais e federais, respectivamente. Denominei tal tipo de regime de ”democracia de acesso”.
Aprenderiam, os estudantes com vocação política, história, economia, direito, sociologia, filosofia, política e outras ciências sociais, para que estivessem preparados para se apresentar, perante a sociedade, como candidatos a sua representação, nos Legislativos e Executivos. À evidência, componentes do Poder Judiciário ficariam fora de tais exigências, porque já prestam dificílimo concurso para ingresso na carreira.
O certo, infelizmente, é que o preparo para o exercício de funções públicas políticas é elemento, na realidade brasileira, absolutamente despiciendo. Os resultados do despreparo, no país e no mundo, estão a demonstrar que, além da vocação política, há necessidade de um mínimo de conhecimento geral sobre ciências sociais, para que se possa bem governar uma nação.
Na Polônia, Walessa, fantástico líder operário, foi um desastre na presidência. Nos Estados Unidos, um despreparadíssimo presidente – embora tenha cursado cursos superiores, na verdade com aproveitamento medíocre – abalou os Estados Unidos, numa guerra insana, sem horizontes, desestabilizando o Iraque, que embora governado por um ditador, vivia organizadamente. Conseguiu não reduzir o terrorismo, mas aumentá-lo de forma considerável.
Na Venezuela, nada obstante qualquer cidadão poder ser bom presidente, pois, estando o petróleo nos níveis de preço em que está, há dinheiro de sobra, o ”risco país” é superior ao do Brasil e apenas inferior ao da Argentina. Não sei como será a presidência de Morales na Bolívia, mas por suas primeiras polêmicas declarações não deverá ser boa.
De rigor, ninguém confia em investir num país que não dá qualquer segurança jurídica ao investimento.
Ronald Coase, prêmio Nobel de Economia, foi assim agraciado porque defendeu a tese de que a economia de mercado e o desenvolvimento econômico só existem se as instituições forem estáveis e a segurança jurídica ofertar certeza de que os investimentos serão respeitados. Perde, com Chávez, a Venezuela a grande chance de se transformar, com os preços atuais do petróleo, na grande estrela econômica da América Latina.
No Brasil, o presidente Lula, tão despreparado quanto Chávez, apesar de ter sido um estupendo líder sindical, em seus três primeiros anos de governo, fracassou. O Brasil, em 2005, só cresceu mais do que o Haiti, ficando atrás de todos os países emergentes da América Latina. E a única parte de seu governo que teve reconhecimento foi aquela em que seguiu a política do governo anterior, embora com excessiva calibragem de juros e tributos.
No que concerne, todavia, a investimentos, ação social, eficiência da máquina administrativa, moralidade pública, seu governo foi um desastre. Por mais que negue não haver provas, espoucam, de todos os lados, todos os dias, novos inequívocos indícios de que o dinheiro público foi malbaratado, aquinhoando pessoas do segmento privado com benesses oficiais para que fornecessem recursos ao partido do Presidente e aos parlamentares e seus aliados, através de instituições financeiras e outras, beneficiárias de contratos também governamentais. Como disse o ministro Marco Aurélio de Mello, em recente entrevista, nunca houve algo semelhante, em nível de esfrangalhamento de costumes políticos, como no governo Lula, na sua opinião, muito superior ao do governo Collor.
E a inação perante o inchaço da máquina estatal com o ingresso de correligionários e amigos – segundo os jornais, mais de 40 mil servidores contratados sem concurso – fez com que o projeto Fome Zero fosse um fracasso, a Bolsa Família um projeto que dá o peixe, mas não ensina a pescar, e as demais ações governamentais na economia e na ação social, precárias. Assim, num momento em que todos os países do mundo aproveitaram a espetacular evolução da economia global, o Brasil patinou com crescimento, no ano de 2005, de apenas 2,5% do PIB!
Estou convencido de que o povo deve, cada vez mais, se quiser exercer corretamente sua cidadania, começar a escolher seus candidatos em função do preparo para governar, e não apenas pelo fato de serem líderes -alguns admiráveis demagogos-, de segmentos sociais, mas sem visão abrangente do que é o terrível encargo de governar uma nação.
* Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: www.gandramartins.adv.br
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