Política

Financiamento público de campanha: um Robin Hood às avessas

Bruno de Oliveira Carreirão[1]

Em época eleitoral, sempre volta à tona o debate a respeito da fonte de financiamento das campanhas. De um lado, os críticos do financiamento privado, que dizem que privilegia os candidatos já com mais recursos e propicia a oportunidade de doações como “investimento”, visando uma futura troca de favores com um eventual governo eleito. Do outro lado, a crítica ao financiamento público, principalmente ao bilionário “fundão” eleitoral, que reserva dos já combalidos cofres públicos uma alta quantia de recursos que poderiam ter destinação muito mais nobre: saúde, educação, segurança pública, etc.

Há nessas discussões uma premissa bastante equivocada: a de que o financiamento privado privilegia os candidatos ricos e o financiamento público beneficia os candidatos pobres, em uma versão eleitoral da velha teoria da luta de classes. A realidade, no entanto, teima em desmentir a retórica fácil e vazia.

Mesmo entre os candidatos de partidos e coligações consideradas “populares”, que têm entre suas diretrizes a alegada defesa da população mais carente, é possível notar que os candidatos costumam ter patrimônio confortável e boa capacidade de captação de recursos privados, fazendo campanhas milionárias que são muitas vezes até mais caras do que as dos partidos que geralmente são estigmatizados como “elitistas”. Basta lembrar dos valores das campanhas presidenciais de 2018.

A verdade é que, independentemente da fonte de financiamento de campanha, a candidatura é um privilégio para poucos. Enquanto servidores públicos gozam de licença remunerada para serem candidatos e empresários conseguem deixar subordinados para que suas empresas não percam o faturamento, a grande maioria da população trabalhadora não tem tempo para uma campanha eleitoral, pois estão ocupados buscando o seu sustento. É aí que mora a grande perversidade do financiamento público: uma grande massa trabalha e recolhe impostos para que uma casta privilegiada possa ter suas campanhas financiadas com dinheiro público, a pretexto de estarem supostamente representando os interesses da população.

O financiamento privado não está imune de defeitos, principalmente considerando as tentações da corrupção; a solução, porém, não pode ser a sua condenação, mas sim a governança e controle rígido dos atos da administração pública, bem como a redução de espaço para uma relação promíscua entre governo e oportunistas.

Ainda que o financiamento privado esteja sujeito a falhas, ao menos permite que o eleitor possa escolher a candidatura que quer apoiar. Com o financiamento público, no entanto, a lógica é inversa: é o candidato que escolhe quais pautas o pobre trabalhador será obrigado a financiar com os seus impostos. Por isso, o financiamento público de campanha é uma procuração em branco, que permite que candidatos privilegiados possam fazer campanha defendendo seus próprios interesses como se fossem interesses da população.



[1] Advogado, Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e membro da Associação Brasileira de Direito e Economia – ABDE.

Como citar e referenciar este artigo:
CARREIRÃO, Bruno de Oliveira. Financiamento público de campanha: um Robin Hood às avessas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2020. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/financiamento-publico-de-campanha-um-robin-hood-as-avessas/ Acesso em: 13 mai. 2024
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