Política

Medida Provisória do Bem

Medida Provisória do Bem

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

O anúncio de uma Medida Provisória “do Bem”, por parte do Governo, merece algum elogio, suscita certas dúvidas, não equaciona o problema fundamental da tributação no Brasil e é criticável, pelo menos, em nível de comunicação, o título que se deu ao ato.

 

Se a M.P. é do “Bem”, significa que toda as demais M.Ps. tributárias do governo federal foram do “Mal” e só agora o Governo se consciencializa de que agiu mal, nesta matéria, e, ao menos uma vez, resolveu agir bem. O título não poderia, pois, ser pior.

 

Os elogios à M.P. referem-se a algumas desonerações, principalmente no setor de exportação e de agrobussiness, estimulando o investimento mediante a contrapartida da isenção ou da redução de tributos incidentes sobre a circulação ou renda, como COFINS, PIS, I.R. e Contribuição Social sobre o lucro. Pesquisa e desenvolvimento, investimento e exportação, construção civil e tributação, microempresas e desenvolvimento regional, financiamento e mercado de capitais, previdência complementar e estímulos, custos e alargamento de prazos de recolhimento de IOF, CPMF e I.R. foram alguns dos binômios estimuladores da M.P.

 

Em relação à construção civil, remanescem algumas dúvidas, principalmente, no impacto da inclusão das receitas financeiras para cálculo da CSLL, conforme o regime jurídico seguido pelos construtores, no que diz respeito ao imposto de renda. É de se conferir, ainda, se, para alguns empreendimentos, não haverá aumento de carga tributária.

 

O certo é, todavia, que o governo aliviou, com injustificável timidez, a carga tributária para setores da economia, em face de seu brutal aumento ao longo do governo Lula, que lhe permitiu inclusive – apesar da sensível elevação dos custos da máquina estatal, com multiplicação de ministérios, cargos e contratações de concursados ou não- gerar superávits primários superiores aos exigidos pelos acordos com o FMI.

 

E tal carga tributária tem derivado do aumento de quase todos os tributos: os tributos circulatórios (IPI, ICMS, ISS, COFINS, PIS, CPMF, IOF, CIDEs), os tributos sobre a renda e patrimônio (I.R., CSL, IPTU, ITR), os incidentes sobre transferências patrimoniais (I. Transmissão onerosa e não onerosa) e sobre as empresas e os cidadãos.

 

O que é, todavia, curioso assinalar, é a incidência –não aliviada suficientemente- da pessoa física, em nível de imposto de renda.

 

Apresento ao leitor da Gazeta Mercantil quadro significativo para uma renda LIQUIDA de 20.000 euros anuais, nos países da União Européia, ou seja, em torno de 72.000 reais, ou, 6.000 reais por mês.

 

Na União Européia, as deduções são muito maiores, em cada país, do que no Brasil, razão pela qual a renda líquida é realmente renda líquida.

 

O quadro é o seguinte:

 

“País                                      Tributo sobre o salário líquido do indivíduo

                                                Salário de 20.000 Euros

Chipre                                          600

França                                       1.433

Alemanha                                    2.206

Irlanda                                        1.440

Italia                                          3.769

Luxemburgo                                 1.008

Holanda                                            0

Polônia                                        3.800

Espanha                                      3.512

Suiça                                          2.353

Reino Unido                                  2.489”

 

(Taxes in Europe 2004, 12th edition, Editor Yves Blaise, Delmas, Paris, 2004)

 

Em todos estes países, quem tem renda líquida de 72.000 reais-ano paga menos de 20% de imposto sobre a renda. O brasileiro paga em torno de 20%, sem quase nenhuma dedução, sendo, pois, sua “renda líquida” uma “renda quase bruta”!!!

 

Parece-me, pois, que a essência de uma verdadeira M.P. do bem, afim de contrabalançar todas as MPs. do mal anteriores e complementar a primeira MP do governo Lula digna desse conceito, em matéria tributária, teria que passar por uma desoneração da renda líquida do trabalhador ou do autônomo, risco de continuarmos a praticar injustiça tributária com quem mais necessita e de não gerarmos receita para o consumo, que tais cidadãos poderiam disponibilizar, numa perspectiva de criação de mercado próprio.

 

Todos esperam que, cortando gastos – tal corte hoje se faz necessário- e reduzindo juros a patamares civilizados, poderá o governo praticar  justiça tributária e gerar desenvolvimento, que é aquilo que todos desejam.

 

 

* Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: www.gandramartins.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Medida Provisória do Bem. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/medida-provisoria-do-bem/ Acesso em: 29 jul. 2025
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