Direito Penal

A Lei n° 12.403/2011 e os seus reflexos na prisão preventiva

Conforme leciona o ilustre professor Luiz Flávio Gomes, a prisão preventiva não é apenas a ultima ratio, na verdade, trata-se da extrema ratio da ultima ratio. Portanto, a regra em nosso sistema jurídico é a liberdade; a exceção são as cautelares restritivas da
liberdade. Assim, com a nova redação dada pelo art. 319 do  Código de Processo Penal, remodelado pela Lei n.° 12.403/2011, verifica se que a
prisão, por expressa previsão legal, restará com último recurso do qual devem se servir os aplicadores da Lei.

Na verdade, houve uma compatibilização constitucional das hipóteses de prisão, já que, nos termos do art. 5º, inciso LVII, da Magna Carta, “ninguém
será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” e ainda, nos termos do inciso LXI do mesmo diploma “ninguém será
preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita”.

De tal sorte, o art. 283 da lei processual penal, acompanhando a mens constitutionis, ao estabelecer que “ninguém poderá ser preso
senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória
transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Conforme ministra o iminente Dr. Eugênio Pacelli “a Constituição da República, portanto, promoveu: a) a instituição de um princípio afirmativo da
situação de inocência de todo aquele que estiver submetido à persecução penal e b) a garantia de que toda prisão anterior à condenação definitiva
seja efetivamente fundamentada e por ordem escrita de autoridade judiciária competente.  Em consequência, toda e qualquer prisão deverá se pautar
na necessidade ou na indispensabilidade da providência, a ser aferida em decisão fundamentada do juiz ou do tribunal, segundo determinada e
relevante finalidade”.

O ilustre Desembargador Fausto De Sanctis ao comentar o Projeto de Lei n.° 111/2008 o qual foi convertido na mencionada alteração legislativa
afirmou que “em outras palavras, a prisão estará praticamente inviabilizada no país, já que se exige a aplicação, pelo juiz, de um total de nove
alternativas antes dela, restringindo-a sensivelmente”.

Nos termos do art. 282 extraiem se as nove medidas cautelares que surgem no sistema processual penal brasileiro, senão vejamos:

“I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado
permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela
permanecer distante;

IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para
a prática de infrações penais;

VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser
inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de
resistência injustificada à ordem judicial;

IX – monitoração eletrônica”.

O novel Procurador da República Dr. Eugênio Pacelli resumiu as alterações trazidas à baila pelo dispositivo em apreço em dez itens que devem ser de
imediato analisados pelo intérprete da Lei Processual Penal e os quais cita-se in integrum pela magnitude dos estudos empreendidos pelo
nobre membro do Parquet federal. Senão vejamos:

“1) Embora a Lei 12.403/11 mantenha a distinção conceitual entre prisões, medidas cautelares e liberdade provisória, é bem de ver que todas elas
exercem o mesmo papel e a mesma função processual de acautelamento dos interesses da jurisdição criminal;

2) As medidas cautelares, quando diversas da prisão, podem ser impostas independentemente de prévia prisão em flagrante (art. 282, § 2º, CPP), ao
contrário da legislação anterior, que somente previa a concessão de liberdade provisória para aquele que fosse aprisionado em flagrante delito. Por
isso, podem ser impostas tanto na fase de investigação quanto na do processo;

3) As referidas medidas cautelares, diversas da prisão, poderão também substituir a prisão em flagrante (art. 310, II, e art. 321, CPP), quando não
for cabível e adequada a prisão preventiva (art. 310, II, CPP);

4) A liberdade provisória, agora, passa a significar apenas a diversidade de modalidades de restituição da liberdade, após a prisão em flagrante. O
art. 321, CPP (ausentes os requisitos que autorizam a prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as
medidas cautelares previstas no art. 319…) deve ser entendido nesse sentido (de restituição da liberdade do aprisionado) e não como fundamento
para a decretação de medidas cautelares sem anterior prisão em flagrante. A base legal para estas últimas providências reside no art. 282, § 2º,
CPP;

5) A prisão preventiva tanto poderá ser decretada independentemente da anterior imposição de alguma medida cautelar (art. 282, § 6º, art. 311, art.
312 e art. 313, CPP), quanto em substituição àquelas (cautelares) previamente impostas e eventualmente descumpridas (art. 282, § 4º, art. 312,
parágrafo único, CPP);

6) Poderá, do mesmo modo, ser decretada como conversão da prisão em flagrante, quando presentes os seus requisitos (art. 310, II, CPP), e forem
insuficientes as demais cautelares;

7) A prisão preventiva poderá também ser substituída por medida cautelar menos gravosa, quando esta se revelar mais adequada e suficiente para a
efetividade do processo (art. 282, § 5º, CPP);

8) Quando decretada autonomamente, ou seja, como medida independente do flagrante, ou, ainda, como conversão deste, a prisão preventiva submete-se
às exigências do art. 312 e do art. 313, ambos do CPP; quando, porém, for decretada subsidiariamente, isto é, como substitutiva de outra cautelar
descumprida, não se exigirá a presença das situações do art. 313, CPP;

9) Nenhuma medida cautelar (prisão ou outra qualquer) poderá ser imposta quando não for cominada à infração, objeto de investigação ou de processo,
pena privativa da liberdade, cumulativa ou isoladamente (art. 283, § 3º, CPP); do mesmo modo, não se admitirá a imposição de cautelares e, menos
ainda, da prisão preventiva, aos crimes para os quais seja cabível a transação penal, bem como nos casos em que seja proposta e aceita a suspensão
condicional do processo, conforme previsto na Lei 9.099/95, que cuida dos Juizados Especiais Criminais e das infrações de menor potencial ofensivo;

10) Em se tratando de crimes culposos, a imposição de medida cautelar, em princípio, não será admitida, em face do postulado da proporcionalidade;
contudo, quando – e somente quando – se puder antever a possibilidade concreta de imposição de pena privativa da liberdade ao final do processo,
diante das condições pessoais do agente, serão cabíveis, excepcionalmente para os crimes culposos, as cautelares do art. 319 e art. 320, segundo a
respectiva necessidade e fundamentação.”

Dessa feita, deve se concluir, portanto, que não existem mais outras modalidades de prisão cautelar diversas da prisão preventiva (arts. 312 e 313
do CPP) e prisão temporária (Lei 7.960/89). Não se elenca, com a referida mudança a prisão em flagrante como medida cautelar, devendo ser tratando
como medida pré cautelar, como já se adiantam vozes na doutrina.

O espírito da nova lei, conforme dito, estabelece que a prisão em flagrante, medida pré cautelar, irá durar exclusivamente o tempo necessário à
análise judicial, quando então o juiz irá relaxar a prisão, acaso verifique qualquer ilegalidade, convertê-la-á em prisão preventiva preventiva,
presentes os requisitos legais ou concederá a liberdade provisória ao autuado, com ou sem fiança e ainda com ou
sem a decretação de alguma das medidas cautelares previstas pela nova Lei.

O Juiz de Direito ao apreciar a prisão em flagrante ratificada pela Autoridade Policial não mais poderá manter o cidadão em conflito com a Lei
acautelado em razão do estado flagrancial mas deverá ou decretar a prisão preventiva, fundamentadamente, ou aplicar as medidas cautelares diversas
da
prisão prevista nos moldes do já mencionado e redimensionado art. 319 do Código de Processo Penal.

Eugênio Pacelli, afirma que, “a prisão preventiva será utilizada em três circunstâncias específicas: a) de modo autônomo, em qualquer fase da
investigação ou do processo (art. 311, art. 312, art. 313, CPP), independentemente de anterior imposição de medida cautelar ou de prisão em
flagrante; b) como conversão da prisão em flagrante (art. 310, II, CPP); e, por fim, c) de modo subsidiário, pelo descumprimento de cautelar
anteriormente imposta”.

Por fim, deve se mencionar que em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de
ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade
policial, nos termos do art. 311, do Código de Processo Penal.

Dessa sorte, parte da doutrina, entende que na fase investigatória não poderá o Juiz de Direito ex officio decretar a prisão preventiva
posto que, apesar da possibilidade dada pela Lei, tal fere o Princípio Constitucional da Imparcialidade do Juiz. Todavia, tal não é pacífico, já
que, em razão da modernidade dos dispositivos aqui apresentados somente com o decurso do tempo se pacificarão a Doutrina e a Jurisprudência no
ponto.

* Ravênia Márcia de Oliveira Leite, Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais. Bacharel em Direito e Administração – Universidade Federal de
Uberlândia. Pós graduada em Direito Público – Universidade Potiguar e em Direito Penal e Processo Penal – Universidade Gama Filho.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. A Lei n° 12.403/2011 e os seus reflexos na prisão preventiva. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2011. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/a-lei-nd-124032011-e-os-seus-reflexos-na-prisao-preventiva/ Acesso em: 22 nov. 2024
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