Direito Civil

A culpa é de Napoleão

Resumo: O texto aponta o Código Napoleão de 1804 como um grande vetor influenciador do direito brasileiro, notadamente do direito civil brasileiro.

Palavras-Chave: Direito Civil. Constituição Federal de 1988, Código Civil. Código Napoleão. Direito Processual Civil. História do Direito.

Não sei se você parou para analisar, mas o Brasil existe, por culpa de Napoleão Bonaparte, e seu bloqueio continental[1]. O que conduziu a Coroa Portuguesa para a Colônia.

Napoleão Bonaparte nasceu em 15 de agosto de 1769 e virou tenente já aos 16 anos de idade e, tal precocidade se deve a sua exímia dedicação aos estudos militares.

Aos quinze anos quando fora admitido como cadete na Escola Militar de Paris, onde se formaria como artilheiro em tempo recorde, dez meses, quando o normal seria em três anos.

Foi dedicado e mergulhou com afinco aos estudos no Tratado de Matemática, do professor Bezout, um grande livro de quatro volumes, cujo conteúdo era a base principal para o exame final para os aspirantes ao cargo de oficial de artilharia.

Resultado: em apenas um ano Napoleão já envergava um belo uniforme de tenente do exército francês. Aos dezessete anos, Napoleão era um magricelo com cabelos engordurados e portava um uniforme sempre amassado de sorte que não atraia muitos olhares das mulheres.

As moças de Paris o consideravam definitivamente desengonçado, ganhando até o apelido de “gato de botas”[2] por uma jovem amiga, pois suas botas negras e sujas e que pareciam grandes em demasiado para aquele par de pernas finas e curtas e exibia[3].

Sua vida amorosa, só deslanchou mesmo aos dezoito anos, precisamente em 1787, quando abordou uma prostituta nas ruas de Paris. E, antes de chegarem ao ato sexual, ele fez um autêntico interrogatório à prostituta, chegou, na época, aborrecer a profissional do sexo[4].

Só se casou aos vinte e seis anos com Josefina de Beauharnais, uma nobre viúva de um visconde que adorava ser perdulária, e trair o marido. O imperador então, deu-lhe o troco, e virou um galanteador, faturando muitas conquistas sexuais ao longo da vida.

Napoleão Bonaparte cercou-se de uma corte suntuosa, os generais e os altos funcionários recebem títulos de nobreza. Seus irmãos se transformam em monarcas: Joseph torna-se rei de Nápoles, Louis rei da Holanda, Jerôme, rei da Westfália. Elisa, sua irmã torna-se grã-duquesa de Toscana. Sem filhos para sucedê-lo, separa-se de Josefina, e em 1810 casa-se com Maria Luísa da Áustria, filha de Francisco II e irmã de D. Leopoldina, esposa de D. Pedro I. Enfim teve um filho[5], mas que teve uma vida breve.

Uma das grandes obras[6] do antigo Egito, a esfinge de Gizé teria perdido o nariz por obra de… Napoleão, é claro. Isso é o que diz a lenda. Mas nesse caso o imperador é inocente, já que desenhos de 1755 – quatro décadas antes da chegada das tropas francesas ao Egito – já retratavam a dita-cuja desfigurada. O mais provável é que, entre os séculos XVI e XVII cristãos coptas ou otomanos tenham feito o estrago.[7]

Napoleão Bonaparte morreu na ilha de Santa Helena[8], no dia 5 de maio de 1821, depois de seis anos de exilo. Seus restos mortais encontram-se no Panteão dos Inválidos, em Paris.

Bem, nós brasileiros, devemos muito à Bonaparte, pois sem o embargo continental nossos colonizadores jamais teriam vindo até aqui, e lembrado de nossa parca existência. Isso, sem cogitar, da influência no Código Civil de Beviláqua e quase todo Direito Privado…

Napoleão fora endeusado por muitos, como pelo historiador Alberto Sorel[9], e execrado por outros, como Guillemin[10], que o incluiu no rol dos grandes canalhas. De toda sorte, cumpriu uma estoica e orgulhosa sina, sendo uma personalidade carismática capaz de gerar paixões e acirrar a ira de seus detratores.

Há os que o apresente como filho dileto da Revolução Francesa, cujos ideais, também lhe acusam de tê-la traído. Porém, há um ponto de consenso, pois até mesmo os filósofos da história lhe reconhecem a prevalência de forças coletivas e reduzem o valor do indivíduo, pois ficam perplexos diante de Napoleão, reconhecendo mesmo sua massiva influência pessoal na história europeia e do mundo.

O Código de 1804 foi o primeiro monumento jurídico da era moderna e sua inspiração permanente se deve a ele, tanto que era denominado também como Código Napoleônico.

Quando isolado em solidão, em seu exílio na ilha de Santa Helena, teve uma premonição, ao falar in litteris: “Minha verdadeira glória não foi ganhar quarenta batalhas. Waterloo apagará a lembrança de tantas vitórias. Mas o que nada apagará, o que viverá eternamente, é meu Código Civil.”.

Tal código nascido com nome, mais democrático, de Código Civil dos franceses, então, passou a se denominar, a partir de 1807 de Código de Napoleão, voltando, após, o Congresso de Viena, em 1815, mais simplificadamente, a ser chamado simplesmente como Código Civil.

Especialmente no Novo Mundo, os juristas foram fiéis ao título personalista, até que, por um Decreto de 1852[11] se restabeleceu, por questão de justiça, o nome oficial de Código Napoleão, em unânime homenagem ao seu idealizador e artífice.

Registre-se que sendo vinculado à Declaração dos Direitos do Homem, todo o Código repousa numa concepção puramente individualista, o que muito influenciou todo o direito do século XIX, inclusive o brasileiro. É possível perceber que o referido Código refletiu honestamente o pensamento liberal consagrado na Revolução Francesa.

Há uma obsessiva busca de proteção da liberdade e da propriedade individual, que iria colocá-la fora do poder absoluto de governantes, o que redundou na exaltação da lei como o único instrumento capaz de legitimamente limitar a liberdade humana.

Não poderia, é fato, o referido Código adotar as ideias sociais que só mais tarde vieram a influenciar o Direito, notadamente o Direito Privado, posto que adotasse a visão individualista e liberal que fora emergente da Revolução Francesa. Mas, com Napoleão efetivamente surgiu o pensamento codicista que tanto supervalorizou o direito positivo, superando-se o Direito Natural, que deixou de ser fonte direta de consulta.

Com a febre de codificação que varreu toda a Europa no século XIX, espalhando-se inclusive para as colônias, nas Américas, onde, aliás, o Código de Napoleão servira como espécie de código-modelo, mas muito mais que isso, servira de permanente inspiração.

Em torno do Código Napoleão floresceu a Escola Exegética com juristas como Duverger, Tropolong, Laurent, Huc, Baudry Lacantenerie e, que se cristalizou finalmente com a obra prima que é o Cours de Droit Civil Français de Aubry et Rau[12], construído sobre o plano geral da obra de Zachariae.

O Código tomou tamanho vulto que seus princípios estenderão e passou a influenciar todo o direito europeu chegando até a América, sendo adotado em Quebec, no Canadá, e, em Louisiana, nos Estados Unidos[13].

Quase todos países latino-americanos tomaram-no como modelo, até mesmo no Chile, adentrou, através da obra de Andres Bello, o autor do Código Civil do Chile, em 1854, que fora o primeiro a consagrar o princípio da igualdade entre nacionais e estrangeiros, quando ao gozo de direitos civis, o que lhe atribuiu o honroso título de “O Codificador dos Andes”.

Apesar de magistral o Esboço de Teixeira de Freitas[14], não se pode mesmo afirmar, que o direito pátrio gravitava, como tantos outros, em torno do Código Napoleão. Pois Freitas era feroz crítico e se afastava da doutrina francesas, insurgindo-se contra o divórcio do Direito Comercial e o Direito Civil.

Aliás, se afinava propriamente com Savigny que fora seu grande inspirador, propugnando pela união do Direito Privado, no que se antecipou a Cesare Vivante, que só veio a defendê-la em 1892.

Confirma-se também que tanto para Freitas como para memorável Caio Mário, a base de todo Direito Civil é a distinção existente entre os Direitos Reais e os Direitos Pessoais.

Por isso, o Esboço de Freitas foi na contramão dos demais países sul-americanos. E, com a codificação civil de 1916, com Clóvis Beviláqua, os rumos do direito pátrio mudaram definitivamente.

A primeira influência que se nota é a dicotomia coma separação do Direito Civil e o Direito Comercial, e preservou-se o vetusto Código Comercial de 1850, divorciando-se do sonho unificador de Teixeira de Freitas.

Igualmente é sabido que, em certos aspectos, o Código de Bevilácqua divergiu, frontalmente, da doutrina francesa, aproximando-se, mais propriamente, do Código Civil Alemão[15].

Basta verificar o caso da aquisição da propriedade por ato intervivos. Pois enquanto que na concepção francesa o contrato de compra e venda tinha o condão de transferir o domínio, o que se deve à especial influência do direito e pessoal de Napoleão, o que se insurgiu contra a opinião da Comissão, que se mantinha mais fiel à tradição romana, no direito brasileiro.

E, mesmo, atualmente, a propriedade não se transmite somente pelo consenso, exigindo um ato posterior, formal e material e concreto, que é a tradição, sendo móveis as coisas, ou então, o registro do título aquisitivos quando se tratar de bens imóveis.

Ressalte-se que não possui o negócio jurídico translativo de propriedade a natureza real, a que lhe confere o Código Napoleão[16], incluindo-se no rol dos consensuais. Já quanto à doação, o Código Napoleão não lhe atribuiu a natureza contratual, e, ao que se cogita também, por inspiração de seu criador, que era contra os ensinamentos de Pothier.

Registre-se, ainda, que no direito francês se considera a doação um ato unilateral, que independe da vontade do donatário, equiparando-se ao testamento. Mas, a única diferença é quantos os efeitos da doação que se produzem ainda em vida do doador, enquanto que as disposições testamentárias, só se tornam eficaz após a sua morte.

Outra nítida diferença, se refere aos tratamento jurídico dado aos estrangeiros, é o que se justifica, pois enquanto Napoleão expandia fartamente os seus domínios, alargando as fronteiras do Império Francês, vislumbrando nos estrangeiros a figura do inimigo, se já não atual, diferentemente, nós precisávamos deles, principalmente para povoar e modernizar o país.

Eis o porquê o artigo 11 do Código Napoleão adotou o princípio da reciprocidade diplomática, ao estabelecer, de modo restritivo, que os estrangeiros gozarão, em França, dos mesmos direitos civis que, fossem concedidos aos franceses. em seus países de origem. Eram, afinal, muitos dispositivos restritivos, e muitos, os direitos dos estrangeiros, o que confere ao Código Napoleão exacerbada conotação xenófoba, ultranacionalista, o que é perfeitamente compreensível, conforme aludiu o Desembargador Sylvio Capanema.

Diferentemente, o Código Beviláqua consagrou o princípio da igualdade, entre nacionais e estrangeiros, o que se refere ao gozo de direitos civis, incentivando a imigração, que nos era indispensável. No que se refere ao termo inicial da personalidade também a fixamos a partir do nascimento com vida, sendo suficiente, a primeira troca oxi-carbônica, enquanto que o Código Napoleão exigia ainda a prova de viabilidade do nascituro.

Já quanto à aplicação temporal da norma jurídica, o direito brasileiro preserva a regra consagrada no Código Napoleão, segundo a qual a lei dispõe para o futuro, não podendo ter efeitos retroativos. Inserimos também a regra irretroatividade não apenas na Introdução ao Código Civil, em seu artigo 6º, como ainda a convertendo em ditame constitucional, consagrando-a no rol de garantias individuais, reconhecendo com cláusula pétrea[17].

Assinale-se que em todas as nossas Constituições federais, desde da imperial de 1924 até a de 1988, a atual, com exceção da Carta de 1937, consagraram, o princípio da irretroatividade da lei, tida como garantia individual, protegida como cláusula pétrea, em que pese, como se sabe, não se tratar de regra absoluta, admitindo mitigações, tal como nos exemplos da lei penal mais benéfica, e das normas de natureza puramente interpretativas.

A estrutura dos atos jurídicos do Código Civil de 1916 adotou a mesma perspectiva contida no artigo 1.108 do Código Napoleão, o que persiste na descrição dos vícios de consentimento. Vide aliás, que quanto ao erro, a coação e ao dolo, foram atribuídas as mesmas consequências do Código francês.

Digno de nota foi a corajosa opção feita pelo Código Napoleão pelo casamento civil, atribuindo-lhe natureza contratual, enfraquecendo a influência da Igreja. E, assim, diante da existência de um contrato, era imperiosa também a adoção de divórcio[18], conforme de extingui-lo, pelo distrato, rompendo-se, assim, a forte tradição canônica da indissolubilidade do vínculo matrimonial, o que trouxe a possível abertura para uma visão mais liberal do Direito de Família.

Já quanto ao regime matrimonial de bens, o Código Napoleão teve que optar entre o regime de comunhão que era prevalente ao Norte, na região do direito costumeiro e, ainda o regime dotal, que imperava no Sul, da França.

E, Napoleão sendo fiel à sua vocação popular, mantendo a reação contra a nobreza, adotou o regime de comunhão, que era o preferido pelo povo francês, afastando-se do regime dotal, de nítida índole aristocrática, mais frequente aos nobres.

E, mais uma vez, o Código Napoleão o seu papel de apressar a decomposição da nobreza, introduzindo-se institutos mais democráticos e igualitários. Assim, a comunhão de bens passou a ser o regime legal, em que pese a sua origem germânica[19], unificando todo o patrimônio familiar.

E, Beviláqua igualmente concordava, a não ser quanto ao divórcio, pois tinha férrea influência da moral tradicional cristão, mantendo-se a indissolubilidade do vínculo matrimonial, o que só veio ao direito pátrio em 1977.

É verdade que pelo Código Civil de 1916, a mulher casada[20] se incluía no rol dos relativamente incapazes, uma situação constrangedora e equivalente aos silvícolas e dos pródigos. A ´preocupação era submeter a mulher ao exercício de direitos civis e à assistência do marido. No fundo, era um caso de ilegitimidade e, não propriamente de incapacidade relativa.

Já o Código Napoleão, trouxe um razoável equilíbrio, no que se refere à estrutura da família, libertando-a do modelo feudal, e do poder absoluto do marido, embora não lograsse êxito em alcançar o grande ideal revolucionário da igualdade.

E, nisso, é elogiável do Código Civil brasileiro de 2002 que se afastou desse entendimento, ao consolidar o princípio da absoluta igualdade de direitos entre os cônjuges, ao estabelecer que o poder familiar (e não mais, o pátrio poder) será por estes exercido em conjunto.

A importante regra moral elementar traduzida pelo brocardo neminem laedere fora textualmente consagrada em 1.382 do Código Napoleão, bem como a sanção, diante da violação, funcionando como regra geral, já consagrada desde os canonistas.

Desta forma, percebe-se que o Código francês se preocupou com a organização técnica da responsabilidade civil, para sancionar o dever moral, de ainda determinar a regra de conduta. Porém, não logrou o legislador êxito em atingir resultados positivos, deixando ao julgador, a árdua e delicada tarefa de calcular o valor da indenização e adotando, a culpa, como a palavra-chave da responsabilidade civil, não conferindo, infelizmente, maior precisão técnica e semântica dos termos jurídicos.

Tal fato teve massiva influência sobre todo direito do século XIX, durante o qual os juristas não duvidaram de que a responsabilidade civil repousava sobre a ideia de culpa, aliás, sendo explicada com nitidez por Georges Ripert[21], em sua obra ” A regra moral nas obrigações civis”.

É certo que vige até os dias presentes, expressiva dificuldade em provar a culpa, quase sempre uma prova diabólica, provocando não apenas a tardança no julgamento das ações indenizatórias e, quase a transformando em impunidade do autor do dano, como regra geral.

Mas, o artigo 159 ao esquadrinhar o ato ilícito, se abeberou novamente no modelo napoleônico, prevalecendo a teoria subjetiva da culpa provada, para aferir a responsabilidade civil extracontratual, o que até hoje se mantém, basta uma leitura do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil de 2002.

Quanto ao tema do abuso de direito, a tipificar ato ilícito com o consequente dever de indenizar, o Código Napoleão, bem como o nosso código civil de 1916, não contem uma regra geral que o reprima, cabendo, à doutrina e à jurisprudência enfrentar mais amiúde o tema.

O nosso Código Civil de 1916 fora fortemente influenciado pela doutrina Demolombe[22] e Planiol[23] e, a corrente doutrinária dominante identificava com a tese do abuso de direito como ato ilícito tinha que se socorrer de uma interpretação a contrario sensu do inciso I do artigo 160, do Código de Beviláqua, segundo o qual não constituiria ato ilício, o exercício regular de um direito legítimo, o que não se aplicaria ao que fosse irregular ou abusivo.

Destacou Capanema que houve progresso pelo paradigma de eticidade, o Código Civil de 2002, que expôs em seu artigo 197, equipando o abuso de direito ao ato ilícito, definindo-o como sendo aquele que ultrapassasse a razão econômica e social do direito e as regras de boa-fé. Adiante, ao tratar das consequências jurídicas do ato ilícito previsto no artigo 927, reiterou o Código Civil de 2002 que o dever de indenizar recai sobre quem o comete, fazendo expressa referência aos artigos 186 e 187.

No dinâmico mundo dos contratos, trouxe o Código Napoleão o apogeu dos princípios da vontade e da sua força obrigatória, refletindo os ideais da Revolução Francesa. Aliás, era célebre a máxima que afirmava; “tudo o que é contratual é justo, desde que as partes sejam livres para contratar”, cabendo-lhe, somente, zelar para assegurar a liberdade dos contratantes, no momento do nascimento da avença.

Foi silente o Código Beviláqua quanto à lesão, não a incluindo no elenco dos vícios de consentimento, a ensejar a anulação do negócio jurídico. Mas, com o Código Civil de 2002, chegou finalmente a lesão ao direito positivo brasileiro, conforme se vê do artigo 157.

A lesão se revela como defeito de vontade, que se caracteriza quando alguém se aproveita da premente necessidade de outrem, ou de sua inexperiência e, lhe impõe uma prestação manifestamente desproporcional à contraprestação.

Antecede, portanto, a lesão, ao próprio nascimento do contrato, que já nasce por esta maculado, o que se reflete pelo desequilíbrio das prestações recíprocas. Idêntica influência se traduz na evolução, quando da adoção da teoria da onerosidade excessiva ou da imprevisão, que não fora consagrada no Código Napoleão.

Aliás, o dito Código francês consagrou, sem exceções, o princípio da força obrigatória dos contratos, em seu artigo 1.134, que tanto inspirou o sistema jurídico brasileiro. E, uma doutrina que mitiga tal regra não encontraria guarida no Código Napoleão e, mesmo nos que o seguiram.

Registre-se, ainda, que a cláusula rebus sic stantibus[24] quase desapareceu, com o advento do Código francês, para que não se enfraquecesse a regra elementar do pact sunt servanda. Foram as comoções econômicas posteriores, produzidas pelas guerras, trouxe a doutrina revisionista dos contratos, e, voltou a comparecer, na conhecida Lei Faillot[25], de 1918, que permitiu aos juízes resolver ou modificar os contratos que tivessem sido celebrados antes da guerra, especialmente os de natureza agrária. E também, assim se orientou o nosso Código Civil de 1916, sendo silente bem como o foi, o Código Frances.

Apesar de duzentos e dezesseis anos passados, o Código Napoleão resistiu, em sua essência, às brutais transformações econômicas, culturais e sociais que tanto marcaram o século XIX e XX. E, só foi possível os aperfeiçoamentos modificativos posteriores, mas resistiu tendo sido preservado como valoroso símbolo da cultura da civilização francesa.

Enquanto o ideal de liberdade for precioso à humanidade, Napoleão e seu código serão reverenciados como eternos e importantes para todo direito civil ocidental.

Referências:

ALTMAN, Max. Hoje na História: Entra em vigor o Código Civil Napoleônico. Disponível em:

http://operamundi.uol.com.br/conteudo/notcias/3317/conteudo_opera. shtmil Acesso em 09.2.2020.

BRUCE, Evangeline. Napoleão e Josefina. São Paulo: Record, 1997.

ENGLUND, Steven. Napoleão – Uma Biografia Política. São Paulo: Jorge Zahar, 2005.

GALLO, Max. Napoleon. Coleção Bouquins. Paris: Robert Laffont, 2012.

AS 1001 Noites de Napoleão Bonaparte: A vida amorosa do líder francês. Disponível em:  https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/as-investidas-de-napoleao-bonaparte.phtml Acesso em 9.2.2020.

DE SOUZA, Sylvio Capanema. O Código Napoleão e sua influência no Direito Brasileiro. Disponível em:  https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista26/revista26_36.pdf Acesso em 09.02.2020. In: Revista EMERJ v.7. n.26, 2004.



[1] O bloqueio continental foi a proibição imposta pelo Imperador Napoleão Bonaparte, com a emanação em 21 de novembro de 1806, do Decreto de Berlim, que consistia em impedir o acesso aos portos dos países então submetidos ao domínio do Primeiro Império Francês (1804-1814) aos navios do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda.

[2] Ou Mestre Gato é um conto de fadas de autoria do escritor francês Charles Perrault, incluído na obra Les contes de ma mère l’Oye publicado em 1697. O conto narra a história de um caçula de três irmãos que recebe como herança de seu pai um gato de estimação. Depois de ganhar um par de botas, o gato consegue convencer um rei muito poderoso de que pertence a um fidalgo chamado Marquês de Carabás, e consegue ao seu dono a mão da princesa em casamento. O Gato de Botas é considerado um dos contos mais antigos, e pode variar muito em cada lugar que é contado. Em outras versões, o Gato de Botas era um cavaleiro enfeitiçado que precisaria trazer fortuna a um humano e assim tornar-se homem novamente. Folcloristas indicam que em versões ainda mais remotas, o gato de Botas era retratado como um escravo que deveria conceder a mão da princesa para seu amo, e assim poder se libertar das correntes (aqui representadas pelas botas). Há ainda uma outra versão antiga contada pelos negros em que o protagonista não é um gato de botas, mas um macaco flautista que fazia feitos heroicos como retribuição ao Doutor Botelho (equivalente ao aqui chamado Marquês de Carabás), que o teria libertado da vida na selva.

[3] Um tenente de maus modos, sempre com a gravata amarfanhada e cabelos gordurosos, notariam as moças casadoiras de Paris. Além disso, as botas negras e sujas pareciam grandes demais para aquele par de pernas finas e curtas, o que lhe valeria o apelido de Gato de Botas, dado por uma jovem amiga, a futura escritora Laure Permon.

[4] A primeira jovem que manifestou o desejo de subir ao altar com o promissor general de brigada foi Bernardine Eugénie Desirée, de apenas dezesseis anos. Contudo, seu pai não permitira o casório, pois não tinha muito gosto pela família Bonaparte. Anos antes, ele já havia permitido José Bonaparte, irmão mais velho de Napoleão, a casar-se com outra de suas filhas. De fato, a condição de homem casado só veio a ser galgada por Napoleão em 1796, quando a viúva Josefina de Beauharnais aceitou o seu pedido.

Perdidamente apaixonado pela esposa, Napoleão escrevia tórridas cartas de amor que confessavam a sua completa devoção à Josefina. Em contrapartida, a mulher traía-o com outros homens e não se importava em responder as cartas de amor do marido. Ao tomar consciência do amor não correspondido, Napoleão decidiu responder à altura mantendo um caso com a bela Pauline Fourès, que havia se disfarçado de homem para acompanhar o marido nas batalhas do Egito.

[5] Napoleão II, (nascido Napoleão Francisco Carlos José Bonaparte; Paris, 20 de março de 1811 – Viena, 22 de julho de 1832), foi um príncipe imperial, da Casa de Bonaparte, intitulado Rei de Roma e único herdeiro direto de Napoleão I, imperador dos franceses, nascido de sua segunda esposa, a arquiduquesa Maria Luísa. Recebeu do pai, ao nascer, em 1811, o título de rei de Roma. Em 1815, foi apontado por Napoleão como seu sucessor no trono imperial francês, na ocasião de sua abdicação, mas não teve seu título reconhecido nem pelos franceses ou pelas potências europeias. Foi levado, ainda em 1815, aos quatro anos de idade, para a Áustria para morar no Palácio de Schönbrunn com a mãe e seus outros parentes da Casa de Habsburgo. Na corte austríaca, ficou conhecido apenas como Franz e pouca menção era feita ao rapaz a respeito das suas reivindicações imperiais na França. Foi educado em línguas (alemão e italiano), matemática e artes militares, mostrando boa proeminência nesses assuntos.

[6] “Minha única paixão, minha única amante, é a França. É com ela que me deito”, proclamava Napoleão. Em breve, isso seria mais do que uma frase de efeito. Com o apoio do povo que o saudava como herói nas ruas, planejou e executou um golpe de estado que o levou ao poder, em 1799. Instituiu o Consulado, triunvirato exercido por ele e mais dois outros aliados de ocasião.

[7] Um dos maiores e mais antigos mistérios é saber como a Esfinge de Gizé perdera seu nariz. Fora construída entre os anos 2558 e 2532 a.C., é considerada um dos maiores monumentos do mundo dotada de 73,5 metros de comprimento, 19,3 metros de largura de 20,22 m de altura. Representa uma mística criatura composta de corpo de leão e cabeça humana, e fora erguida em homenagem ao faraó Quéfren. A primeira versão da perda fora creditada à Napoleão, pois em 1798 suas tropas invadiram o Egito e, ocasionaram o dito estrago. Porém, há um desenho do arquiteto naval Frederick Lewis Norden datado de 1755 onde já mostra a mesma Esfinge sem o nariz. Outra versão, conta que antes da chegada dos franceses, a milícia turco-egípcia que comandava o país, na época, conhecida como mamelucos, teria usado o monumento como alvo enquanto calibravam os canhões de guerra. Tal hipótese igualmente fora descartada pelos estudiosos do Egito Antigo. Outra versão comenta que entre os séculos XVI e XVII os cristãos coptas ou otomanos, arrancaram o nariz da Esfinge, utilizando barras de metal e cinzéis. E, nessa época, era comum ver pessoas sem o nariz, sendo essa a punição aplicada aos ladrões. Anos depois, os egípcios começaram a mutilar as estátuas, para simbolicamente, retirar a honra de pessoas.

[8] Napoleão, que nascera em uma ilha, morreria naquela outra, em 5 de maio de 1821. Verdadeiramente um homem insular. Aos 52 anos, o velho general estava doente, obeso e deprimido. Como um de seus últimos pedidos, solicitou que, antes de lhe descerem à sepultura, durante a autópsia, arrancassem-lhe o coração e o enviassem a Maria Luísa.

[9] Alberto Sorel (1842-1906) foi historiador francês e fora indicado ao Prêmio Nobel de Literatura nove vezes. Em 1875, Sorel deixou o Ministério das Relações Exteriores e tornou-se secretário geral do recém-criado escritório da Présidence du sénat . Aqui, novamente, em uma posição em que ele podia observar e rever assuntos, ele prestou um serviço valioso, especialmente sob a presidência de Audiffret-Pasquier, que ficou feliz por ter o conselho de Sorel nas mais sérias crises da política interna. Seus deveres deixaram-no, no entanto, lazer suficiente para lhe permitir realizar a grande obra de sua vida, L’Europe et la révolution française. Seu objetivo era repetir o trabalho já realizado por Heinrich von Sybel, mas de um ponto de vista menos restrito e com uma compreensão mais clara e mais calma do tabuleiro de xadrez da Europa. Ele passou quase trinta anos na preparação e composição dos oito volumes dessa história diplomática; o volume 1 apareceu em 1885; volume 8 em 1904. Francis Herrick diz: “ainda é a melhor análise do sistema estatal europeu no século XVIII e a introdução clássica ao estudo da diplomacia revolucionária e napoleônica.

[10] Henri Philippe Joseph Guillemin (1903-1992) foi crítico literário, conferencista, polêmico historiador e prolífero escritor francês, morto em Mâcon, Saône-et-Loire. É reconhecido por sua expressiva obra histórica e biografias de grandes pessoas francesas. Foi criticado ou admirado, por revelações sobre a vida de pessoas e casos da história francesa, tal como Napoleão Bonaparte, Philippe Pétain, Jeanne d’Arc, Rousseau e Dreyfus, entre outros.

[11] Pouco mais de um mês e meio depois da promulgação do Código, exatamente em 18 de maio de 1804, Napoleão Bonaparte foi proclamado imperador dos franceses, com o nome de Napoleão O. Mediante o decreto imperial de 3 de setembro de 1807 foi determinada uma segunda edição do Code, introduzindo algumas mudanças devidas ao fato da transformação da França, de República a Império. Nessa segunda edição, o nome do Código fora alterado para Code Napoléon. Com a derrota e queda de Napoleão e a restauração da monarquia, uma nova edição do Código fora determinada em 1816, retornando-se seu nome originário. Todavia, por Decreto Imperial de 17 de março de 1852, Napoleão III, em homenagem ao seu tio, novamente restaurou o nome de Code Napoléon. Apesar de que esse último decreto nunca tenha sido formalmente revogado, desde 1870, com o desaparecimento do Segundo Império e a proclamação da Terceira República, é certo que o uso frequente consagrou a denominação de Code Civil, como até hoje é conhecido.

[12] Charles Aubry (1803-1883) foi jurisconsulto francês, professor da Faculdade de Direito +de Estrasburgo. Seu nome está ligado ao de outro acadêmico, Charles Frédéric Rau (1803-1877), com quem publicou uma obra de referência jurídica conhecida como Aubry et Rau. Aubry e Rau, admirados por sua linguagem e suas habilidades legais, são muito menos lidos há vinte anos por causa de seu excesso de concisão, técnica e abstração. Sua autoridade diminui gradualmente, depois de ter sido a maior glória da literatura jurídica francesa.

[13] No sistema constitucional dos EUA, as cláusulas pétreas encontram equivalente parcial na doutrina das entrenchment clauses, que abrangem, entretanto, não apenas matérias de alteração completamente vedada por emenda, mas também matérias cuja alteração é especialmente difícil mas não impossível. Como exemplo de entrenchment clause, pode-se mencionar a Supremacy Clause constante do artigo 6º da Constituição dos EUA, que ao estabelecer que esta Constituição é a Supreme Law of the Land, dispõe que nenhuma parte da Constituição pode ser interpretada ou emendada seguindo entendimento diverso.

[14] Assevera-se que o notável baiano contribuiu para cinco vertentes essenciais, quais sejam: a) a unificação do Direito Privado Brasileiro; b) a análise crítica do direito português, francês e alemão para a elaboração do Esboço do Código Civil; c) a apresentação de posicionamentos originais e vanguardistas nesta seara; d) a influência nos sistemas jurídicos de demais países; e e) a contribuição para o Direito Internacional Privado e outros ramos jurídicos. Entretanto, o “Esbôço” do eminente doutrinador foi, lamentavelmente, rejeitado pelo Governo e, em 1872, rescindiu-se o contrato firmado com o jurista. Mesmo diante deste episódio, em 1876, ele publicou o “Prontuário das Leis Civis”; em 1877, editou um “Aditamento à Consolidação das Leis Civis”; em 1882, o “Formulário dos Contratos e Testamentos” e as “Regras de Direito Civil”. Em 1883, o Brasil termina sendo agraciado com a obra “Vocabulário Jurídico. As obras elaboradas por Teixeira de Freitas exerceram inquestionável influência nos sistemas jurídicos da América Latina. Na Argentina, o jurista Dalmacio Vélez Sarsfield estruturou o Código Civil com base nas suas ideias, vislumbrando-se também influência no Uruguai, Paraguai e Venezuela. Como acentuou Pontes de Miranda, o jurisconsulto muito concorreu para “as leis de outras repúblicas hispano-americanas”, espraiando-se para o Chile e a Nicarágua. Na Europa e na Ásia, traços das ideias originais de Teixeira de Freitas são também notados, conforme exposto nas linhas precedentes.

[15] Código Civil alemão (Bürgerliches Gesetzbuch – BGB) é o símbolo mais reluzente desse processo de recepção e de influência da cultura jurídica germânica no Brasil, embora não seja o único, evidentemente. É (quase) impossível encontrar um manual, um tratado ou um curso de Direito Civil brasileiro, de algum nível, que desconheça o BGB ou que não cite seus dispositivos. Alguns exemplos assim o comprovam. No primeiro volume de sua coleção de Direito Civil, dedicado à Parte Geral do Código Civil, Sílvio de Salvo Venosa cita o Código Civil alemão em 21 passagens. Caio Mário da Silva Pereira, em seu livro de Teoria Geral do Direito Civil, faz um total de 16 remissões a artigos do Código Civil alemão.8 Orlando Gomes, outro doutrinador muito lido nos cursos de graduação, cita o BGB em 10 seções de seu livro introdutório ao Direito Civil brasileiro.

[16] A criação deste código tinha por objetivo reformar o sistema legal francês, seguindo os princípios da Revolução de 1789. Antes do Código outorgado por Napoleão, a França não tinha um único conjunto de leis, estas eram baseadas em costumes locais, havendo frequentes isenções e privilégios dados por reis ou senhores feudais. O novo código eliminou os privilégios dos nobres, garantiu a todos os cidadãos masculinos a igualdade perante a lei, separou Igreja e Estado, legalizou o divórcio, além de dividir o direito civil em duas categorias: o da propriedade e o da família, e de codificar diversos ramos do direito ainda organizados em documentos esparsos. Título Preliminar: Da publicação, dos efeitos e da aplicação das leis em geral (artigos 1 a 6); Livro Primeiro: Das pessoas (artigos 7 a 515); Livro Segundo: Dos bens e das diferentes modificações da propriedade (artigos 516 a 710); Livro Terceiro: Dos diferentes modos de adquirir a propriedade (artigo 711 a 2302). Até o século XVIII, outras compilações de códigos legais já haviam surgido tanto no ocidente quanto no oriente. Cabe ao Código Napoleônico, porém, a primazia de organizar as leis e distribuí-las em um sistema metódico e de apresentação bastante prática. Sua composição é inspirada nas leis romanas e francesas, além do Corpus Juris Civilis (Corpo de Leis Civis), criado em 534 pelo imperador bizantino Justiniano I. Ele é ainda considerado a concretização de dois ideais do pensamento Iluminista: fazer com que as leis fossem submetidas a uma ordenação determinada pela razão (desejo de Montesquieu) e obra de um déspota ilustrado (como esperava Voltaire).

[17] As cláusulas pétreas são materiais limitações ao Poder de reforma da Constituição de um Estado. Desse modo, são dispositivos que não podem ser alterados, nem por meio de Emenda Constitucional. Existem nas Constituições da República Checa, da Alemanha, da Turquia, da Itália, do Brasil, da Noruega, do Marrocos e do Irã. É motivo de forte controvérsia na literatura jurídica. E, sempre demandam interpretação estrita, pois constituem ressalvas ao instrumento normativo de atualização da Constituição (Emendas Constitucionais). Não são admitidas cláusulas pétreas fora do texto constitucional. As cláusulas pétreas inseridas na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 são áreas temáticas do texto constitucional que não podem ser emendadas e se encontram dispostas em seu artigo 60, § 4º. São elas:

A forma federativa de Estado;

O voto direto, secreto, universal e periódico;

A separação dos Poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário;

Os direitos e garantias individuais.

[18] Desde de 1.1.2017 os casais franceses que desejarem se separar de forma amigável não mais precisaram do aval do juiz. O processo que demoraria mais três meses, doravante fora simplificado e se tornou puramente administrativo e, seu prazo estimado é de cerca de trinta dias.

[19] A influência germânica na formação do direito civil pátrio é insofismável e tem sua origem em diferentes momentos. Os costumes, os institutos e as normas vigentes da Alemanha adentraram o direito português, ainda sob o domínio do bárbaro visigótico, foi um momento violento e trágico do Império Romano do Ocidente. Mais tarde, deu-se nova recepção em era medieval do ius commune. No Brasil Colônia muitos de tais elementos foram introduzidos pela aplicação de leis portuguesas. Assim, houve um entrelaçar da influência direta de fontes portuguesas e a indireta das fontes alemãs. Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, em expressiva metáfora, anotou que o Direito Brasileiro não se pode estudar desde suas sementes, na medida em que “nasceu do galho de planta que o colonizador português, gente de rija têmpera, no ativo século XVI e naquele cansado século XVII em que se completa o descobrimento da América, trouxe e enxertou no novo continente.

[20] A promoção dos direitos da mulher começou com uma lei de 9 de abril de 1881, sobre a poupança e, sobretudo, a de 13 de julho de 1907 sobre o salário livre da mulher casada, permitindo assim, àquelas que trabalhavam, a manutenção da família, a realização de economias e também a autonomia do marido. A Lei de 13 de julho de 1965 consagrou a liberdade profissional da mulher casada da mesma forma que sua autonomia bancária. Todavia, a Lei de 22 de dezembro de 1985 aboliu todas as desigualdades das gerências dos bens familiares, ainda existentes. E, finalmente, a Lei de 4 de junho de 1970 eliminou no direito francês a noção de Chefe de família e de potência paterna do Código Civil pela autoridade parental.

[21] Georges Ripert (1880-1858) foi jurista francês, notabilizado como civilista e comercialista. publicou Traité pratique du droit civil, fruto do trabalho de civilistas da Faculdade Paris, em que Ripert foi o coordenador. Esta obra contribuiu, de maneira determinante, pela renovação da doutrina jurídica francesa, na área do Direito Civil. Apesar de sua forte influência no Direito francês, bem como de sua posição de Reitor da Faculdade, era considerado por muitos como o mais antidemocrático de todo o estabelecimento, apesar de militar a favor da Aliança Republicana Democrática. Em verdade, era um conservador moderado.

[22] Jean-Charles Florent Demolombe (2804-1887) jurista e intérprete do Código Civil francês, foi considerado do Príncipe da Exegese. A principal publicação de Demolombe é seu curso intitulado Cours de Code Napoléon, uma obra de maior alcance do que os tratados comparáveis ??de Maleville e Pigeau. Demolombe trabalhou lá a vida toda (desde 1845) e publicou, até sua morte, os primeiros 31 volumes.

Seu aluno, Louis Guillouard, continuará o trabalho até o volume 49. É então outro Jean-Charles, Jean-Charles-Edouard Bucher, que continuou atualizando o Curso para uma edição única e única que marcou grande declínio da influência do “príncipe da exegese”. O tratado segue o plano do Código Civil. O Código ainda é recente e os comentaristas são extremamente respeitosos com o texto. Demolombe desejou limitar-se a traçar os princípios e as consequências lógicas. Ele será o último exegeta depois de quem esta escola será criticada. Sua abordagem evoca o positivismo por vir. Demolombe fala da “ciência do direito” e se refere cada vez mais à jurisprudência, expandindo assim   campo do direito. Ele desenvolve certa desconfiança em relação ao direito natural e oferece uma síntese metodológica que deriva da abordagem analítica e sintética de Aubry e Rau. No entanto, ele condenou a influência alemã defendida por esses autores alsacianos e assumiu posições marcadas em uma controvérsia que permaneceu famosa contra ele contra o autor alsaciano Ernst Haftung.

[23] Marcel Ferdinand Planiol (1853-1931) foi jurista francês, juntamente Saleilles, Geny, foi um dos três renovadores do Direito Civil francês durante a Belle Époque. Empenhado na atividade de trazer ao Direito hodierno a jurisprudência e o Direito comparado, consagra-se, desbancado, de logo, Baudry-Lacantinerie. Apesar de atualmente bastante haver sido modificado no mundo jurídico, seus ensinamentos permanecem, em muito, em conformidade com o mundo dos fatos. Poucos doutos o criticaram, com a adequada consciência, assim o fez nosso Mestre baiano Orlando Gomes, embora em pouquíssimas oportunidades. O Professor Georges Ripert, no fim da carreira universitária de Planiol, tornou-se seu colaborador, participando de numerosas reedições de Traité Élémentaire de Droit Civil. Seu legado jurídico foi reeditado até 1982.

[24] No direito romano, a cláusula rebus sic stantibus somente firmou seu prestígio a partir da época de Constantino, primeiro imperador cristão (288-337 d.C). Ainda no primitivo direito romano, denominado Ius Quiritium, a relação obrigacional (obligatio) era um vínculo eminentemente pessoal a ligar o devedor ao credor numa relação de absoluta sujeição, destituída de qualquer caráter patrimonialista, como ocorre no direito moderno. Contudo, foram os pós-glosadores (séculos XIV a XVI) que enunciaram definitivamente a cláusula rebus sic stantibus, cuja expressão foi cunhada por Baldo de Ubaldis, discípulo de Bartolo (1314-1357), ao estudar a glosa civil em combinação com a canônica, ficando, por fim, assim enunciada: contractus qui habent tractum successivum et dependentiam de futura rebus sic stantibus intelliguntur.

[25] Com isso, nasceu a Lei Faillot de 21 de janeiro de 1918, onde a rigidez contratual foi modificada, pois tal Lei permitia a alteração ou renovação de contratos atingidos por situações imprevistas da guerra, consagrando o princípio da revisão. A Lei Faillot em 1918 (na França) é marco histórico da cláusula rebus sic stantibus posto que modificou normas contratuais onde uma prestação se tornou excessiva penosa a um dos contratantes em virtude da guerra. In LEITE. Gisele. A evolução do contrato. Disponível em:  https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/a-evolucao-doutrinaria-do-contrato/ Acesso em 09.2.2020.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele; HEUSELER, Denise; CRUZ, Ramiro Luiz Pereira da. A culpa é de Napoleão. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2020. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-civil/a-culpa-e-de-napoleao/ Acesso em: 22 nov. 2024
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