Economia Política

A Arte de Enriquecer

Hernane Elesbão Wiese e Marcel Belli*

 

 

 1 BIOGRAFIA

 

Considerado um dos maiores influentes do pensamento ocidental, Aristóteles nasceu em 384 a.C. na cidade macedônica de Calcídica.

 

Com cerca de dezessete anos, o filósofo seguiu para Atenas, intencionando dar prosseguimento aos estudos, optando por entrar na Academia Platônica – a qual, diz-se, que possuía uma placa na entrada, dizendo “quem não dominar a geometria, que não adentre este lugar” -, onde estudou por vinte anos.

 

Após a morte de Platão, grande mestre de Aristóteles, este deixa a academia, juntamente com alguns alunos, por talvez discordar do caminho que o novo diretor da academia estava dando-a – matematicalização da filosofia – ou por achar-se mais indicado ao cargo do que Espeusimo, sobrinho do fundador original.

 

Vagando por várias cidades – exemplificando Assos, onde se casou, e Mitilene, na ilha de Lesbos – ele acaba regressando a Atenas, onde se torna preceptor de Alexandre da Macedônia.

 

Após a posse deste, Aristóteles funda a Academia Aristotélica, em Atenas, com extrema ênfase no cientificismo.

 

Após treze anos dirigindo a academia, teve de deixar Atenas, pois a morte de Alexandre criou a insurreição de pensamentos antimacedônicos.

 

Em Cálcis, Eubéia, ele morre, um ano após sua partida de Atenas.

 

Um dos destaques do pensamento Aristotélico fica na lógica, que se utiliza do método Silogista, mais tarde aperfeiçoado por Ponens e Tollens.

 

 

2 A ARTE DE ENRIQUECER

 

Pode-se indagar se a arte de enriquecer é a mesma que a economia doméstica, uma parte ou subordinada a ela.

 

A arte de enriquecer não é igual a administrar a casa, a primeira tem a função de prover e a última de utilizar, portanto torna-se contraditório dizer que a arte de enriquecer é parte da economia doméstica. Quem deseja ficar rico precisar saber onde obter bens e dinheiro, sabendo diferenciar os dois. A agricultura, conservação e captura de alimentos faz parte da economia doméstica ou é algo diferente?

 

Há muitas espécies de alimentos, e estes definem as particularidades de cada ser vivo, tanto dos animais como do ser humano.

 

Os homens podem ser nômades e viverem às custas de um rebanho móvel ou viver da caça, porém a maioria vive da agricultura. Alguns podem combinar diferentes atividades a fim de obterem a auto-suficiência. A natureza provê a todos os seres, meios de conseguirem seus alimentos, e estes seres vivem em favor dos homens. A arte da guerra é de certo modo uma arte da aquisição quando usada de maneira correta contra animais selvagens e homens que se recusem a consenti-la. Portanto, existe um tipo de arte da aquisição que faz parte da economia doméstica, uma vez que deve proporcionar bens acumuláveis, para a vida da comunidade ou da família. Estes bens parecem constituir a verdadeira riqueza e apesar de Sólon ter dito que não foi fixado um limite de riquezas para o homem, na verdade foi.

 

Há outro tipo de arte da aquisição, chamado de arte de enriquecer, que originou a visão de que não há limites para as riquezas. Iniciemos o seu estudo com o seguinte apontamento: existem dois jeitos de se usar cada bem. Exemplo: um sapato pode ser calçado ou pode ser permutado. Isto prova que a arte da aquisição não é por natureza uma parte da arte de enriquecer, pois era necessária para satisfazer as necessidades do homem.

 

Na família não havia lugar para o comércio, os membros desta partilhavam o que possuíam. Já um agrupamento de famílias tinha acesso a produtos de seus vizinhos através das permutas e delas surgiu o comércio. Com isso apareceu a necessidade de se instituir o uso do dinheiro. Os homens pactuaram dar e receber produtos úteis e fáceis de se conduzir (como ferro, prata, etc.) definidos de início apenas pelo seu tamanho e peso, e posteriormente marcados com símbolos que representavam o seu valor e sua autenticidade. Desse modo com a invenção da moeda, passou a existir outra forma de ficar rico: comercializando, que proporcionava métodos de permuta capazes de aumentar os lucros (emergindo a idéia de que enriquecer está vinculado ao dinheiro).

 

Pois sendo com o dinheiro que se faz negócios, presume-se que a riqueza consiste em grande quantidade daquele; que é necessário para se adquirir bens indispensáveis à vida, mas que também pode levar à ganância – citando a fábula do Rei Midas, abençoado com o toque de ouro, mas que morreu de fome. Sendo o dinheiro o primeiro elemento e o limite do comércio, a riqueza derivada daquele é ilimitada e o seu fim é a aquisição de produtos. Mas a arte de enriquecer ligado à economia doméstica tem um limite, pois não é função desta ganhar dinheiro.

 

Já pessoas cujo objetivo é uma vida agradável, perseguem-no pelos prazeres do corpo. Como o corpo parece depender de bens, toda a energia concentra-se em ficar rico, e, por conseguinte nasceu o segundo tipo de arte de enriquecer. Sendo os desejos excessivos e não conseguindo satisfazê-los com a arte de enriquecer, tenta-se chegar a eles de qualquer outra maneira, sem medir escrúpulos.

 

A arte de enriquecer é função do chefe de família ou do estadista ou os suprimentos devem estar disponíveis naturalmente? Melhor seria se os meios de sobrevivência fossem antecipadamente proporcionados pela natureza, o que faria com que a arte de obter riquezas através da terra poderia ser praticada por todos.

 

Um dos ramos da arte de enriquecer é de natureza comercial e justamente censurado, por lançar mão da usura. A usura deturpa o sentido original do dinheiro (que é de facilitar a permuta), mas os juros desta aumentam a quantidade do próprio dinheiro em detrimento de outro. Esta forma de ganhar dinheiro é a mais avessa à natureza.

 

 

3 ANÁLISE CRÍTICA

 

O texto apresentado deve ser levado em conta, claro, por ter sido produzido por um pensador nascido antes mesmo de Cristo, mas não podemos deixar de apontar a quantidade de observações ou até mesmo de pensamentos naturalmente dispensáveis.

 

É interessante observarmos o pensamento extremamente futurista de Aristóteles.

 

Há elementos de Antropocentrismo – encontrado novamente na história apenas no movimento conhecido como Renascimento (Europa, séc. XIV, XV e XVI) -, de predestinação – retomado por Calvino durante a Reforma (Europa, séc. XVI) -, e de Socialismo – manifestado novamente, após o Neolítico, durante o Século XX, em partes da Europa, da Ásia e na ilha de Cuba.

 

Estes elementos denotam um pensamento extremamente lógico ou conhecedor do comportamento histórico humano.

 

Destaca-se o pensamento antropocentrista, que chega ao teor do egocentrismo. Frisa-se que todos os demais seres do mundo existem e coexistem para servir o homem e suas necessidades.

 

É interessante também ressaltar como Aristóteles explicou – frisando: ANTES DE CRISTO – todo o fenômeno do ressurgimento do capitalismo no período da Baixa Idade Média, cerca de mil e quinhentos anos à frente do seu tempo.

 

As observações sobre excedentes, cunhagem de minérios preciosos e reinício do comércio são impressionantes de serem achados em um texto tão antigo.

 

Analisando as formas de enriquecimento discursadas pelo autor, é possível chegar à conclusão de que a Arte de Enriquecer serve para o angariamento e a acumulação de bens supérfluos, enquanto os processos da Economia Doméstica englobam a angariação de materiais indispensáveis à sobrevivência – e talvez até ao bem-estar e à qualidade de vida.

 

É frisado pelo autor: as pessoas que visam o enriquecimento como meta de vida não medem esforços. Ponto de vista corretíssimo e confirmado mesmo na sociedade moderna, onde o individualismo social cria abismos de capital.

 

Como o próprio autor comenta, a riqueza monetária está longe de suprir as necessidades de uma pessoa. A própria fábula de Midas, citada no texto. De que adiantaria o dinheiro, a moeda, o ouro, se não houvesse um valor “teórico” em cima dele.

 

No final das contas, dinheiro é apenas papel – a cédula moderna – e o ouro é apenas mais um metal, cuja raridade o confere um valor maior, mas é apenas mais um metal com propriedades físicas peculiares. A chegada dos portugueses no litoral brasileiro mostrou muito bem como o dinheiro e o metal precioso têm seu valor apenas na teoria, pois, no final das contas, os nativos preferiram receber espelhos – os quais lhes eram úteis – a pepitas de ouro.

 

Estaria condenado o homem que, mesmo dispondo de todo o dinheiro do mundo, se encontrasse em um local onde o dinheiro não tivesse valor. Antes de formados os “bancos de troca” – criados no final da Baixa Idade Média – esse fato era extremamente comum, de alguém ter o dinheiro de um feudo e encontrar-se de mãos atadas em outro por esta moeda não ter valor no designado lugar.

 

Ratifico a lucidez do autor de praticamente “prever” os acontecimentos com um milênio e meio de antecipação.

 

As teorias econômicas de angariamento de material de valor foram diversamente comprovadas em tempos futuros ao do filósofo.

 

A Justificativa Marcial que ele dá à guerra por esta permitir novamente a angariação de valor. Seja pelas pilhagens materiais – citam-se as Cruzadas, movimento liderado pela Igreja Católica Apostólica Romana para a invasão dos reinos persas, tendo como um dos propósitos a pilhagem dos conhecidíssimos tesouros do reinado Médico – pela conquista de território – bem de extremo valor, pois permite a produção agrícola – e de pessoas, ou seja: escravidão.

 

“Não foi fixado para o homem um limite de riquezas”. Devemos contradizer Aristóteles por ele ter contradito a citação acima. Na sociedade moderna não há limites para a riqueza. Empresas multinacionais lideradas por meia dúzia de pessoas bem-instruídas cruzam fronteiras, compram países, exploram territórios, levam morte a tribos, depredam riquezas naturais, poluem o meio, tudo com o único propósito: DINHEIRO.

 

Nota-se a extrema capacidade do autor de entender o funcionamento fundamental do capitalismo humano seja no tempo que for. O problema é a falta de perspectiva dele – a qual não podemos condenar, pois quem pensaria em computadores, globalização, era da informação e espacial há dois mil e trezentos anos?

 

REFERÊNCIAS:

 

Política. ARISTÓTELES.

 

Nova Enciclopédia Barsa. ARISTÓTELES. São Paulo: Encyclopaedia Britannica dos Brasil Publicações, 1998, v. 2, p. 28-30

 

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Como citar e referenciar este artigo:
WIESE, Hernane; BELLI, Marcel. A Arte de Enriquecer. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/resumos/economia-politica/aartedeenriquecer/ Acesso em: 22 nov. 2024
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