Monografias

Atual Migração Africana para o Brasil e Direitos Humanos

FRANCISCO JACY LUZ NETO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Newton Albuquerque.

Ao Mestre Jesus,

Aos Libertários da Terra.

AGRADECIMENTOS

Agradeço principalmente e insuficientemente a irmã Eleia Scariot, missionária do mundo, que me faz entender que a sociedade e o coração devem ser libertados em conjunto.

A toda família muito amada.

Pelo risco mnêmico de elencá-los, aos amigos digo que os amo todos.

Aos imigrantes e irmãos africanos de Fortaleza.

À Pastoral dos Migrantes.

Ao Prof. Dr. Newton Albuquerque, pela atenção e orientação.

Aos professores participantes da banca examinadora, a mestranda Julianne Melo dos Santos e o mestrando Isaac Rodrigues Cunha, por terem aceito o convite.

RESUMO

O escopo deste trabalho é abordar a atual migração africana para o Brasil e relacioná-la com a positivação e efetividade dos direito humanos no âmbito internacional e no corpo jurídico brasileiro, em especial no que concerne à política migratória, bem como apontar as causas diretas da migração africana na atual globalização, quais guerras, perseguições, subdesenvolvimento, necessidades de trabalho e formação acadêmica. É também escopo tratar das consequências do colonialismo e da escravidão dos séculos XV ao XIX para o racismo histórico e para o tratamento dado aos atuais imigrantes africanos em terras brasileiras.  A metodologia usada foi a de pesquisa bibliográfica e documental. O resultado do trabalho ensejou uma visão mais abrangente e realística da migração africana ao Brasil, que cresce, revela violações e, ao mesmo tempo, oportuniza, por meio de militância e esforços, a construção do progresso, pautado nos direitos humanos, das políticas migratórias brasileiras, de modo a servir de exemplo aos demais países do mundo.

Palavras-chave: Direitos humanos. Migração africana. Legislação brasileira.

ABSTRACT

The purpose of this study is to discuss the current African migration to Brazil and relate it to the affirmations and effectiveness of human rights internationally and in the Brazilian legal body, especially with regard to the migration policy, as well as to identify the direct causes of African migration in the current globalization, such as wars, persecutions, underdevelopment, labor needs and academic training. It is also scope to address the consequences of colonialism and slavery, between the XV and XIX centuries, to the historical racism and to the treatment received by African immigrants in the Brazilian territory. The methodology used was bibliographical and documentary research. The result of this paper gave rise to a more comprehensive and realistic view of the African migration to Brazil, which still grows. Also, reveals violations and, at the same time, through social struggles, favors the Brazilian progress, based on human rights, in its immigration policies as an example to be given to the rest of the world.

Keywords: Human rights. African migration . Brazilian law.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.. 1

2 GLOBALIZAÇÃO, ÁFRICA E BRASIL. 4

2.1 Globalização e Migração Africana. 4

2.2 Relação entre os Povos, Racismo e Políticas Públicas. 11

3 DIREITO INTERNACIONAL E CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 18

3.1 Soberania, direitos humanos e migrações internacionais. 18

3.2 Internacionalização dos direitos humanos. 24

4 VIOLAÇÕES NA ATUAL MIGRAÇÃO AFRICANA AO BRASIL. 34

4.1 Migração e trabalho: entrada e exploração de africanos no Brasil atual34

4.2 Violência contra africanos. 38

4.3 A política migratória brasileira – refúgio, anistia e projeto de lei.42

5 CONCLUSÃO.. 49

REFERÊNCIAS.. 51

1 INTRODUÇÃO

As grandes migrações, como a diáspora africana forçada entre os séculos XV e XIX e a migração europeia durante o século XIX e começo do XX, são relevantes para a compreensão da trajetória do capitalismo mundial. Por sua vez, o refúgio e a migração econômica contemporâneos evidenciam deletérias desigualdades e difundidas mazelas no orbe terrestre.

Nesse contexto, na medida em que as regiões de economia Central, em especial a Europa Ocidental, cerram mais intensamente as fronteiras e os problemas socioeconômicos e políticos na África se agravam, crescem as migrações destes povos aos países emergentes.

Dentre estes, destaca-se o Brasil, que nos últimos anos marcou-se por relativa estabilidade política e econômica, com progresso no combate à fome e à miséria e com aumento de acesso e de estrutura quantitativa do ensino, em especial o superior, fatores atrativos da migração.

A par disso, este trabalho se justifica pela demanda cada vez mais premente por proteção dos direitos humanos aos migrantes africanos no Brasil, tendo em vista o aumento no território brasileiro de africanos desempregados, escravizados pelo trabalho, vítimas de racismo e violência física, e de estudantes com dificuldades de apoio.

Em relação aos aspectos metodológicos, as hipóteses serão analisadas através de pesquisa bibliográfica e documental. No que se refere à tipologia da pesquisa será esta pura, segundo a utilização dos resultados, cujo norte é o intuito de aumentar o conhecimento, sem alteração da realidade. Conforme a abordagem, será quantitativa, insculpida na pesquisa de fatos e dados objetivos, assim como qualitativa, com a observação intensiva de determinados fenômenos sociais.

Quantos aos objetivos, a pesquisa será exploratória, definindo objetivos e buscando mais informações sobre o tema em análise, bem como descritiva, descrevendo fatos, natureza, causas, relações e características da atual migração africana para o Brasil e sua relação com os direitos humanos.

No primeiro capítulo, abordar-se-á fatores diretos que impulsionam a emigração na África, em especial a subsaariana, no contexto da atual globalização. Em seguida, tangenciará as relações entres povos europeus e africanos durante o Colonialismo Mercantil, o estabelecimento da respectiva escravidão e sua repercussão para o racismo do Brasil, nas instituições estatais e nos padrões sociais, até os dias hodiernos, em que pese os avanços do combate ao mesmo.

Ademais, serão apontadas políticas brasileiras em relação aos países africanos no decorrer do século XX, citando os acordos de cooperação acadêmica, assim como a extensão dos problemas raciais aos atuais imigrantes africanos no Brasil.

No segundo capítulo, será avaliada a questão da soberania dos Estados frente aos direitos humanos dos imigrantes, com destaque a efetividades dos direitos humanos internacionais no tratamento dos imigrantes, sobretudo irregulares, nos países comprometidos com tratados de amparo à dignidade humana.

Ainda, analisar-se-á os efeitos da internacionalização dos direitos humanos no corpo jurídico brasileiro por meio de sua Carta Magna, bem como suas implicações no amparo aos imigrantes e as necessidades de avanços jurídicos na temática.

No terceiro capítulo, será abordada a entrada de imigrantes africanos no espaço brasileiro através das fronteiras terrestres do norte do país, indicando o distanciamento do estado brasileiro para com este crescente fluxo, e o reflexo disso na vulnerabilidade e no trabalho escravo deste grupo, seja em empregos formais ou não.

Além disso, serão analisadas a política do refúgio, dando destaque aos imigrantes econômicos irregulares que recorrem a tal solicitação; a política eventual de anistia dos imigrantes irregulares, apontando sua importância e suas falhas; e a necessidade de reformulação dessas políticas e da lei pertinente ao imigrante, Estatuto do Estrangeiro, ressaltando os progressos presentes no Anteprojeto da Lei do Migrante.

Cabe dizer que este trabalho terá mais foco nos imigrantes africanos subsaariana, conquanto por vezes, mesmo não especificando, o estudo englobe os do Norte da África. Tal foco se justifica nas fontes de pesquisas disponíveis e no estímulo do contato frequente com subsaarianos na militância da migração, em especial na Pastoral dos Migrantes de Fortaleza.

Dar-se-á mais atenção a migração econômica, deslocamento motivado pelo subdesenvolvimento social, embora se aborde outras conexas, quais a migração estudantil e o refúgio.

Partimos da ideia de que os atuais modos de produção, sistema econômico mundial e liberalismo compõem as causas do deslocamento espacial humano. Contudo, não caberá a este trabalho se aprofundar nas mesmas, ater-se a discussão sobre os graus de liberdade e coerção nos fluxos migratórios nem tratar das correntes de estudo da migração.

Também não caberá aqui o estudo dos direitos humanos no que se refere a sua formação histórica, ou a reflexão sobre sua banalização e instrumentalização de opressão no capitalismo. Abordamos os direitos humanos, assim como o termo dignidade humana, no aspecto de instrumentos práticos para proteção e melhoria da qualidade de vida, no que é possível no sistema econômico vigente, de indivíduos e coletividades, bem como suas positivações internacionais e nacionais.

Em suma, o ponto principal que será abordado no presente trabalho é a investigação sobre motivações diretas, inserções, violações e desdobramentos da atual migração africana para o Brasil, relacionando-a com o desenvolvimento da positivação dos direitos humanos e com a realidade brasileira.

2 GLOBALIZAÇÃO, ÁFRICA E BRASIL

2.1 Globalização e Migração Africana

Os atuais fatores diretos que impulsionam a mobilidade na África Subsaariana são o crescimento demográfico, com alta taxa de natalidade (38 por 1000) e a população mais jovem do planeta, sendo 45% com menos de 15 anos e 3% com mais de 65 anos; a pobreza, 34 dos 49 países menos desenvolvidos são subsaarianos, com proporções de precariedade aumentando; o esgotamento dos recursos naturais, com fortes secas, desertificações, desmatamentos, baixa produção agrícola, escassez de água e crescente urbanização; os conflitos, várias guerras civis nas últimas décadas, como em Ruanda, Burundi, Uganda, Libéria, Serra Leoa, Somália, Guiné-Bissau, Congo-Brazzaville, RD Congo, Sudão, Costa do Marfim, Mali, África Central, entre outros.

Los 400 millones de pobres africanos, o sea la mitad de la población del África Subsahariana, seguirán siendo candidatos potenciales a la emigración hacia Europa, por haber perdido económica y socialmente la década de los 80 y 90, y sin tener claras perspectivas en la de los 2000, por la persistencia e incluso el empeoramiento de los factores arriba diagnosticados. Las responsabilidades de la persistencia de esta situación son internas y externas. (KABUNDA, 2015, p.40).

Há que falar também dos estados despóticos ou profundamente corruptos cujas políticas não estão voltadas para o desenvolvimento social, sendo característicos muitos deles agirem com estímulo ou indiferença ante a migração de suas populações, não esclarecendo a respeito de desilusões e riscos – morte em travessias, prostituição, perseguição policial – na mobilidade às regiões receptoras como a Europa, as vezes incentivando tal deslocamento.

A razão dessa postura está na pressão de envio de capital europeu em tese destinado ao auxílio do desenvolvimento local, dinheiro dos ricos dos países ricos aos ricos dos países pobres, alimentando o clientelismo e a corrupção de elites africanas. Ademais, enseja a saída de segmentos mais críticos aos descasos estatais. O retorno e a situação dos migrantes são tratados com desprezo pelas embaixadas e políticas de certos países africanos.

La estrategia consiste en encubrir las profundas desigualdades sociales nacidas de la monopolización por una minoría de todas las riquezas del país, y su incapacidade para resolver los problemas de sus pueblos y a definir una política de reinserción económica y social o de recuperación de este capital humano que son los inmigrantes. En consecuencia, favorecen la marcha de sus conciudadanos para presionar al Norte, para que aumente su ayuda al desarrollo, como queda subrayado, ayuda que se há convertido en muchos casos en la ayuda de los ricos de los países ricos a los ricos de los países pobres, o como una alternativa barata a la persistente crisis económica interna. Potencian la emigración, que es la principal fuente de divisas de muchos países, o para eliminar sus adversarios políticos o los opositores. Nunca los Estados emisores se preocupan del retorno de los inmigrantes, ni tampoco preparan su reinserción en el caso en el que decidieran regresar. Al contrario, no desean este regreso, por ser este colectivo el más informado sobre sus derechos y que podría perturbar la relativa paz social interna, mantenida mediante la represión y disuasión de las clases obreras. Triste realidad a la que está sometida la juventude africana a la que, según denuncia Boisbourvier (2006: 68), se deja solo uma alternativa: elegir entre el exilio o el kalashnikov. El no respeto de los derechos humanos en los países emisores debilita aún más a los inmigrantes en los países de inmigración. Prueba de ello es que las embajadas y los consulados de estos países no suelen preocuparse de la defensa de los derechos de sus conciudadanos. Es la prolongación en el exterior de la política interna, donde las autoridades suelen someter a los ciudadanos a una serie de trabas administrativas contra cualquier actividad productiva o iniciativa individual. Ello genera una situación de total indefensión y contradicción, y es lo que caracteriza la vida de los inmigrantes, descuartizados entre la hostilidad o el rechazo de los países receptores y la indiferencia o el abandono de los países emisores. (KABUNDA, 2015, p.45).

O neoliberalismo internacional alimenta a disparidade e as mazelas na medida em que as elites econômicas e políticas lançam mão de agendas da concentração de renda em detrimento das massas. Empréstimos de bancos internacionais ditam e amarram a política interna de países africanos, em programas que priorizam o cumprimento de obrigações financeiras a despeito do atendimento básico à população e da implantação de políticas programáticas para o desenvolvimento social. O mercado interno, os povos e a natureza são instrumentos para uso ou desprezo de acordo com as conjunturas das elites locais e dos interesses financeiros de corporações e estados desenvolvidos.

Las estructuras y los mecanismos del sistema internacional tienen una clara responsabilidad en la emigración de los africanos a través de las políticas macroeconómicas (los programas de ajuste estructural) del Banco Mundial y del Fondo Monetario Internacional que, al imponer a los gobiernos los deberes externos em detrimento de los internos (ajustes estructurales, condicionalidades de la ayuda, liberalismo asimétrico con las subvenciones agrícolas que arruinan al campesinado africano), han quitado a los Estados locales todas las funciones económicas y socialespara sólo fortalecer las de gendarme o de represión. Es decir, el debilitamiento del sector público con el principio del adelgazamiento del Estado, cuyo papel se deslegitima como factor de desarrollo en el marco del liberalismo selectivo impuesto por el Norte y aquellas instituciones. Todo lo que sale del suelo y del subsuelo africano está destinado a la exportación, dejando insatisfechas las necesidades locales. Dicho de otra manera, se da prioridad a los mercados externos en detrimento de los mercados internos. El resultado es la pauperización de amplias capas de la población, el descuido de los aspectos de desarrollo humano (educación, sanidad y formación) y la extensión de la pandemia del SIDA, consagrando el derecho a la muerte de los africanos que no pueden tener acceso a los fármacos o a los medicamentos genéricos antisida. Ello equivale a la violación del derecho al desarrollo y a la vida de los africanos. Es decir, la no asistencia a personas en peligro. Las consecuencias económicas y sociales del SIDA, con 25,4 millones de seropositivos (o el 60% de personas infectadas en el mundo), seguirán teniendo graves y nefastas repercusiones en el desarrollo del continente em las décadas venideras. Por lo tanto, el continente se ha convertido en un infierno del que huyen los ciudadanos (“efecto huída”). En uno u otro sentido, se ha equivocado de camino en el trato del fenómeno de la inmigración, al perder de vista que dicho fenómeno viene dictado esencialmente por factores de orden económico, que no han resuelto ni las políticas de desarrollo impuestas a los gobiernos y pueblos africanos, basadas en el modelo de industrialización occidental y la mayor apertura externa, ni la ineficiente cooperación o ayuda al desarrollo, a causa de la adversidad de los mecanismos y estructuras del sistema internacional concebidos por y para los países ricos. En el mismo orden de ideas, Sassen (2002: 11-12) subraya que no se puede atribuir exclusivamente la inmigración a la huída espontánea de las masas de la pobreza hacia la riqueza, sino también y sobre todo a las políticas concebidas y realizadas desde el exterior o de los países desarrollados, en el tiempo y en el espacio, y que convierten la emigración en una de las opciones de supervivencia de las poblaciones, tales como las prácticas de las empresas multinacionales que en su afán de internacionalización de la producción arruinan a los pequeños productores locales además de favorecer la movilidad de mano de obra y la extroversión de las economias locales; las operaciones e intervenciones militares a manos de los gobiernos con su cohorte de desplazados, refugiados, el ajuste privatizador de las instituciones financieras internacionales que obligan a los pobres a utilizar la emigración como estrategia de supervivencia, y el liberalismo comercial y económico que implica la libre circulación o la importación de la mano de obra especializada. (KABUNDA, 2015, p.51).

O envio de dinheiro dos imigrantes africanos a seus países representa parcela significativa no fluxo de capital na áfrica. Com diferentes perfis de destinação, tais remessas movimentam a economia local às vezes com tal dependência que o corte abrupto deste fluxo causaria graves impactos econômicos a muitas comunidades.

São constituídas associações de migrantes no exterior para destinar remessas a uma gama de serviços, incluindo serviços públicos, quais transporte, moradia, ensino, poços de água, mesquitas. Algumas associações configuram-se como verdadeiras sócias financeiro-econômicas do Estado de origem, ou mantenedoras de seguridade social como compensação a precariedade ou distanciamento social do Estado.

Outras remessas têm destinação individual-familiar, para sustento, matrícula em colégios, consumo em geral, como também para o estabelecimento de status e diferenciação de famílias e grupos.

Cabe registrar que autores africanos apontam efeitos negativos nesse quadro, como a dependência das remessas que implicaria em estímulo a permanência do ciclo geracional migratório, e portanto de suas problemáticas, e em desestímulo ao desenvolvimento do trabalho no âmbito interno.

Los inmigrantes africanos, en su mayoría sin papeles o indocumentados, trabajan esencialmente en la construcción, los servicios y la hostelería en los países europeos de acogida. A pesar de sus modestos sueldos, envían entre 2,5 y 3 millones de euros cada año en sus regiones de origen, este monto se refiere a la zona de Kayes (región occidental de Malí), financiando la construcción de pozos de agua, de carreteras, escuelas, mezquitas, dispensarios (cf. Pourtier, 2001: 238 & Brunel, 2004: 205). Estas actividades tienen importantes resultados en los aspectos de desarrollo humano. Además, las remesas de la diáspora sustentan la vida en algunas regiones como en la mencionada zona de Kayes o en el valle del río Senegal. Además, el lado negativo estriba en el fomento en la zona de una certa “mentalidad de asistidos” y en favorecer la cultura de migraciones en la población, pues se sigue equiparando la migración con las riquezas y el prestigio, con el subsiguiente fortalecimiento de la dependencia y el espíritu rentista que, en la opinión de Bernard (2002: 43), pueden asfixiar al propio desarrollo. En el caso de la RDC, un país devastado por varias décadas de mala gestión, de dictaduras y de guerras que han consagrado la desaparición de hecho del Estado, muchos congoleños huyen de la tremenda crisis económica y del paro generalizado (el 96% de la población activa no dispone de empleo), para emigrar tanto hacia los países del Norte (Bélgica, Francia y Estados Unidos, Canadá, Alemania, Luxemburgo, Suiza, Reino Unido) como del Sur (países del Golfo, Asia, Sudáfrica, Senegal, Nigeria, Camerún, Costa de Marfil, Togo), motivados por tanto por razones políticas y económicas. Integrados por estudiantes, universitarios, profesionales altamente cualificados, hombres de negocio, exiliados, pero contando también con delincuentes e indocumentados y otros “sapeurs” (de SAPE ?Société des ambianceurs et des personnes elegantes? o asociación de jóvenes elegantes y a la moda), los inmigrantes congoleños, estimados entre 3 y 4 millones de personas, destacan, en el marco de la tradición de solidaridad y de asistencia mutua por el envío al país de grandes cantidades de dinero (4.800 millones de dólares en 2003 excluyendo los montos enviados por las vías informales) y otros bienes, y que permiten a sus familiares o a los más desfavorecidos sobrevivir, asumiendo de este modo la función de seguridad social ausente. Con estas inyecciones de divisas en el circuito económico congoleño, los inmigrantes financian en más del 50% los transportes públicos urbanos, el pago de la matrícula de los niños y de los estudiantes, la satisfacción de las necesidades básicas de los familiares, convirtiéndose de este modo, en verdaderos socios financieros y económicos de la RDC (Panu-Mbendele, 2005: 20). Desgraciadamente, las trabas administrativas por parte de los poderes públicos y el desorden organizado les impiden invertir en los proyectos de desarrollo…los jóvenes inmigrantes congoleños o los “sapeurs”, al contrario de sus equivalentes malienses y senegaleses socializados y organizados en torno a las cofradías (caso de los Mourides sénégalais) y asociaciones de canteranos o aldeanos, suelen adoptar comportamientos individualistas y utilizan a menudo la inmigración como un instrumento de acceso al status de adulto (valentía y éxito personales), em sustitución de la iniciación tradicional. (KABUNDA, 2015, p.67).

            O Subdesenvolvimento impulsiona intensa fuga de cérebro, mobilização dos que tem formação acadêmica ou dos que estão em vias ter, nos países africanos. Novamente aponta-se o desvio das finalidades assumidas pelos Estados, tendo em conta importantes agentes das elites internas e internacionais num contexto de capitalismo descontrolado regido em geral pelo lucro ad infinitum, que repercute inclusive em produção, perfil e deslocamento da mão de obra qualificada ou em vias de qualificação.

Escassa política de geração de emprego e renda, economia sem aportes e sem direcionamento para a produção diversificada, parco incentivo ao desenvolvimento do ensino e da ciência, bem como pouca valorização a cientistas e estudiosos, do ramo tecnológico ao universitário, além da burocracia e da censura a determinados estudos, compõem as causas diretas da emigração de mão de obra qualificada e dos que anelam formação acadêmica nos países economicamente centrais.

Ademais, o avanço da padronização do conhecimento, das metodologias, da cultura e da visão de mundo dos países de economia central, destacam-se o eurocentrismo e o modelo americano, são contributos para a exportação de cérebros bem como, diga-se de passagem, para a presença dos anseios por importações de modo de vida e de organização social estrangeiros.

En definitiva, son las propias condiciones del subdesarrollo, de orden económico, político y social, o la acumulación de factores de expulsión, las que explican la fuga de cerebros, en particular las ineficientes estrategias de desarrollo, el desempleo endémico por la falta de coordinación entre la política educativa, la política del empleo y la política científica y tecnológica; los pocos fondos dedicados a la investigación (la ausencia de una comunidad científica activa); la persistencia de una burocracia pesada que impone la censura y la autocensura a los investigadores; así como la incapacidade de la economía nacional de satisfacer las demandas y aspiraciones de los cuadros altamente cualificados o la ausencia de incentivos, junto a la inseguridad professional en la carrera científica (Zekri, 2002: 38-39; Naji: 142-143). Es decir, la falta de perspectivas y de proyectos claros y viables en los países de origen y el sueño de um futuro mejor en los países de acogida, son los factores poderosos que explican la fuga de cerebros y de la juventud. Según Hountondji existe en el Sur em general y en África en particular una fuerte dependencia de los equipos de laboratorio, la documentación y los paradigmas científicos del centro del sistema, dependencia que crea en el investigador o el científico la obsesión de dirigirse hacia el público o lectorado occidental, y que termina llevándole a la decisión de marcharse a Europa o Norteamérica al depender su contribución científica extrovertida de modelos teóricos y metodológicos, libros y artículos elaborados en estos centros. (KABUNDA, 2015, p.75).

           

            Imposições de ordem diplomática – financeira – empresariais em conluio, ou em estímulo, com ditaduras ou gestões governamentais marcadamente corruptas, estabelecendo a abertura descontrolada ao capital estrangeiro, a exploração da mão de obra barata da pobreza, a extração desmedida das matérias primas, o impedimento para estruturação do mercado interno, a manutenção da economia nacional baseada na monocultura ou a na monoprodução industrial, suscetibilizando todo o país a flutuações do mercado internacional, a imposição de importações, o gasto exorbitante com pagamento de dívidas, entre outras circunstancias e arranjos, devem ser vistos como fatores que impelem o fluxo migratório.

            Quando se discute a contribuição para o desenvolvimento social da África, deve-se ficar atento a propostas de assistência clássica, que frequentemente compuseram estratégias econômicas que privilegiaram determinados grupos nacionais e estrangeiros. Mesmo o assistencialismo bem implantado, não obstante a relevância da ajuda emergencial, deve ser considerado paliativo e temporário, não uma “cooperação para o desenvolvimento socioeconômico” que maquie a distancia e a indiferença dos países desenvolvidos aos povos africanos.

            A boa fé dos países ditos desenvolvidos estaria em ações que visassem cooperar na superação da estrutura colonial, ou das consequências dela, nas regiões africanas. Diversificar a economia, investir no povo e na preservação ambiental seriam algumas políticas implantadas ou defendidas, com mais ou com menos consistência, nos países desenvolvidos, mas não apoiadas e até desarticuladas para os países subdesenvolvidos. Lembrando que as crises neoliberais do mundo atingem a população dos países centrais, contudo é inconteste que o peso inclina-se para o dorso do mais frágil, em especial a África.

            A migração de trabalhadores africanos alivia tensões e pobrezas nas regiões de onde saíram, diminuindo portanto as pressões para mais migrações. Há que dizer, numa perspectiva positiva das migrações, que além das remessas de dinheiro elas ensejam novas formas de os migrantes refletirem a realidade e problematizarem as condutas políticas de seus países. Ademais, possibilitam o enriquecimento cultural, artístico, estético e genético às regiões receptoras, oportunizando o enriquecimento das relações humanas e o acréscimo ao modo de pensar, interagir e ser.

A raíz de lo anteriormente expuesto, se debe considerar el fenómeno migratório como un derecho nacido de las propias leyes de la naturaleza o de la condición de persona del inmigrante, en particular la necesidad de supervivencia y la búsqueda de un mejor porvenir de los seres humanos. Está alimentado por las perversas prácticas oficiales y las injusticias institucionalizadas, nacionales e internacionales, responsables de la pobreza, subdesarrollo, hambrunas y persecución e los que huyen las víctimas. Es decir, está dictado por la supervivencia de los sujetos individuales o colectivos. Ir a contracorriente de este objetivo, por acción u omisión, equivale a vulnerar los derechos humanos fundamentales y naturales o los derechos de los inmigrantes como seres humanos: el derecho a la satisfacción de las necesidades básicas o a la supervivencia; el derecho a buscar las mejores condiciones de vida; el derecho a la libre circulación y a conocer mundo, y por lo tanto, a descubrir los fallos personales y de los sistemas políticos de sus países de origen, etc… En pocas palabras, la violación de los derechos de la persona basados en la dignidad humana. Puesto que los inmigrantes africanos huyen de la pobreza, el hambre y la persecución, como queda subrayado, la solución a la inmigración africana pasa por la ayuda a las economías africanas para superar sus estructuras coloniales y la monoproducción, es decir, conseguir su diversificación e ir en contra de la dependência con respecto a las materias primas, cuyas constantes fluctuaciones en el mercado internacional bloquean cualquier posibilidad de acumulación interna, la legalización de los inmigrantes africanos arraigados en los países de la Unión Europea, la comprensión y el trato más humano de la inmigración africana, que alivia en el Continente la miséria de millones de seres humanos que, de lo contrario, serían candidatos a la inmigración. Además de concebir una nueva forma de cooperación desinteresada, desde la sociedad civil y orientada hacia la justicia social, al margen de la asistencia clássica pasiva con efectos nocivos (efecto que ha arruinado a África), al igual que ocurre em los demás países del Sur, que han pagado muy caro los proyectos de cooperación, ayudando de una manera involuntaria y gratis a Europa con la exportación de sus cerebros o cuadros, cuya formación costó mucho tiempo y dinero a los Tesoros Públicos locales, y la importación impuesta de cooperantes o “desarrolladores”europeos con altos sueldos. Por otra parte, se ha de considerar la clandestinidad de los/as inmigrantes irregulares como una verdadera pérdida de talentos, por ser integrado este colectivo por hombres válidos, jóvenes y solteros en edad de producción y procreación. Se debe presentar a la opinión pública europea la inmigración no como un problema o “um riesgo para las identidades colectivas”, sino como una “contribución al enriquecimento de la cultura receptora” (Altamirano Rua, 2006: 204) o de las culturas locales en um contexto de interculturalismo, y a favor de las relaciones humanas y comerciales, máxime cuando millones de personas que viven hoy en Europa son de descendência africana. En definitiva, la única manera de impedir la emigración de los africanos pasa por la mejora de las condiciones de vida y la promoción de los derechos humanos en el continente, para erradicar las raíces de la violencia estructural y física y de la miseria, que constituyen el caldo de cultivo de la emigración. En este continente se imponen cambios radicales por evolución y por revolución, empezando por la creación de condiciones para que la globalización, que ha generado una situación en la que hay muchos perdedores y muy pocos ganadores, esté al servicio de los intereses de los países africanos. (KABUNDA, 2015, p.82).

2.2 Relação entre os Povos, Racismo e Políticas Públicas

            Para entender a atual migração africana ao Brasil e o racismo que jaz premente, faz-se mister abordar as relações históricas dos povos, especialmente a partir do século XV entre os da Europa e os da África, até os fatos internos e internacionais do Brasil relacionados aos países africanos nos séculos XX e XXI.

O Império Colonial europeu, Portugal, Espanha, Inglaterra, Holanda e França, junto com a Igreja Católica sustentaram, material e ideologicamente, a instrumentalização de milhões de africanos como mercadoria de trabalho. Escravidão, racismo e tráfico negreiros foram mantidos e apoiados por essas instituições. No século XV os europeus que aportavam na costa africana firmaram relações de modo geral assimétricas, conquanto se considere vários agentes africanos, (reis, traficantes, entre outros), na prática da escravidão.

A preponderância dos interesses europeus nos séculos do configurado comércio triangular, África, Europa e América, foi estabelecida de modo geral à força e assim se desdobrou até a presente globalização. As marcas probatórias dessas seculares opressões estão hoje no racismo “mundializado” contra os negros, na conjuntura político-econômica da África e também da América Latina, e a imposição cultural eurocêntrica que reveste o consumo, o modo de viver e de pensar em vários quadrantes da Terra, a benefício ainda hoje do enriquecimento das elites mundiais, em boa parte brancas.

A instituição de escravidão e do tráfico negreiro geraram lucros para uns e ônus para outros. Para os europeus e seus descendentes, geraram lucros econômicos e prestígios. Para os africanos traficantes e colaboradores ativos ou passivos, se durante a existência dessas atividades tiveram lucros econômicos, nem todos conseguiram conservá-los depois. O ponto comum, hoje, entre aqueles africanos e as vítimas de escravidão que ficaram no continente africano e os que foram embarcados para as Américas, é que todos são hoje portadores de danos econômicos e psicológicos. Sofrem o preconceito e o racismo pelo fato de ser negros, vistos pelos brancos como povos diferentes por conta de sua cor e cultura. A branquitude racista, nesse quadro, continua reproduzindo as desigualdades raciais, torturando e mutilando os corpos dos negros descendentes e negros africanos (BENTO, 2002). (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 7).

A fundamentação ideológica da escravidão mudou de roupagem do século XV para o XIX, passando da teologia racista para o darwinismo social, ambos servindo de argumento para a manutenção dos impérios e dos privilégios sobre povos e grupos humanos e usados pelas elites das metrópoles e das colônias. Nesse quadro ressalta-se a Conferência de Berlim de 1885, proposta por Portugal, da qual as potências europeias acordaram quais territórios africanos cada uma iria explorar.

Embora as teorias racistas sejam construídas historicamente no século XIX, quando os impérios europeus conquistaram as terras africanas, o racismo como prática e ideologia de superioridade racial encontra a sua explicação numa arqueologia histórica de longo alcance. A emergência do racismo do século XIX pode ser delineada no século XV, com a aparição da teologia da escravidão, que pregava a escravização dos africanos pelos europeus pelo fato de serem filhos do Cam. Carlos Moore (2007) chamou esse tipo de escravidão de “escravidão racial de plantação”, para diferenciá-la dos outros tipos, quais sejam: escravidão econômica e escravidão doméstica. Ao serem capturados, vendidos, transportados e usados como mão de obra barata tanto na África como nas Américas, os corpos dos africanos livres e seus descendentes escravizados foram transformados em “peças”, coisas, mercadorias, isto é, os não humanos, semoventes (MOURA, 1994). A teologia da escravidão e a filosofia escolástica funcionaram como aparelhos ideológicos, nos séculos XVI, XVII, como forma de manutenção da dominação e das violências físicas e simbólicas (BOURDIEU, 2002) contra os corpos dos africanos e seus descendentes. Assim, de mulheres e homens livres em seus territórios, os africanos foram transformados em escravos e selvagens pelas instituições estatais e eclesiásticas da época. No século XIX, a colonização europeia sobre a África, para se manter, recorreu ao darwinismo social e às teorias racistas vigentes. Para essas teorias era preciso colonizar os africanos, pois eram “povos primitivos”, isto é, pertenciam a raças inferiores. A lei do mais forte foi usada para justificar essa colonização. Os impérios europeus nesse período recorreram à violência física (guerras) e simbólica presentes no seu racismo tanto intelectual quanto religioso para dominar os corpos africanos (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015).

Após a pressão inglesa, de interesses econômicos, que resultou na proibição do tráfico de escravos em 1850, continuou-se praticando aqui comércio de seres humanos por quase quatro décadas, até 1888, sendo o Brasil o último país a positivar a proibição da escravidão no mundo.

Prosseguem os ditames estatais ratificando a ideia de inferioridade do negro, como a busca do branqueamento da população no fim do século XIX e começo do XX, causa da imigração europeia desse período que provavelmente se sobressai as demais consideradas, quais as de mão de obra assalariada para cafeicultura e de mão de obra já afeiçoada à indústria para os projetos de industrialização brasileira. 

No desfraldar da chamada República, Deodoro da Fonseca, em 1890, assina decreto dificultando a entrada de imigrantes asiáticos e africanos, além de vários discursos de parlamentares e intelectuais expressamente eugênicos a respeito de quais povos se deveria estimular e permitir a vinda ao Brasil a fim de povoá-lo e desenvolvê-lo, em claras importações do pensamento europeu que muitas vezes forjou o conhecimento em função do poder.

Ainda nessa esteira de ideias, em 1943 um decreto de Getúlio Vargas coloca explicitamente a necessidade de a migração ser europeia.

A elite, que era contra a abolição, era a mesma que propagava a política de branqueamento e da imigração seletiva branca europeia (MALOMALO, 2010). Foi ela que, embutida de medo contra as possibilidades de reformas da parte dos abolicionistas e monarquistas – e contra uma possível revolta da população negra que compunha a maioria da população – daria o golpe do Estado de 15 de novembro de 1889, fundando, com esse ato, a República Brasileira (SKIDMORE, 1976). Cabe dizer ainda que é a mesma elite brasileira, em permanente contato com as teorias racistas europeias, que inventou o negro brasileiro como o ser inferior (SANTOS, 2005)… o presidente Deodoro da Fonseca assinou o decreto n. 528 (em 28 de junho de 1890), que dificultava a imigração asiática e africana no Brasil. Somente em 1892 foi aprovada a lei n. 97, que viria a permitir a entrada de imigrantes chineses e japoneses no Brasil e, dessa forma, o decreto n. 528, de 1890, perderia o seu efeito. Um decreto do presidente Getúlio Vargas de 18 de setembro de 1943, afirmava visar atender “na admissão dos imigrantes a necessidade de preservar e desenvolver, na composição étnica da população, as características mais convenientes de sua ascendência europeia”. O darwinismo social, com certeza, atuava na ideologia social e migratória da elite branca brasileira dos séculos XIX e XX. Foi a defensora da ideologia do branqueamento da população brasileira, fazendo da imigração europeia a sua estratégia política; uma parcela da elite foi adepta da eugenia no país. Seria inútil dizer que o racismo era um dos seus fundamentos. Levando-se em conta seu descrédito nos anos do pós-guerra pela comunidade internacional, a parcela dominante da elite brasileira pautou suas práticas discriminatórias nas teorias da democracia racial de Gilberto Freyre. O discurso dessa teoria, de que o Brasil é um paraíso das relações raciais, está presente também no discurso da sua política imigratória. Para nós, seguindo a crítica de Florestan Fernandes (IANNI, 2004), a democracia racial continua sendo um mito para os não brancos, mais especificamente para os negros brasileiros e os negros africanos imigrantes. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 8;9).

Com respeito ao vulto intelectual, Gilberto Freyre é hoje tido por importantes estudiosos como um dos formuladores de uma distorção da realidade brasileira chamada Democracia Racial. Criticado por partir de uma óptica elitista, seu pensamento serviu para políticas internas e externas do racismo e do velamento do mesmo.

Resposta a Tratados de Direitos Humanos e à imagem que deveria expor ao mundo, bem como contrapartida às pressões internas da sociedade civil, a Democracia Racial tornara-se, desde a primeira metade do século XX até hoje, passando pela utilização do tropicalismo como culturalismo (data vênia aos seus grandes artistas), uma ideologia de maquiagem para a manutenção imperturbável do status de uma privilegiada camada branca, ou mestiça considerada branca, e do racismo na política e na sociedade.

Com efeito, entende-se atualmente que a mestiçagem brasileira nos séculos de escravidão se deu em grande medida pela exploração sexual e social das mulheres negras e indígenas. Percebe-se de outra forma a causa e o processo de surgimento de uma sociedade etnicamente misturada, bem como a formação das divisões sociais com uma pobreza preponderantemente negra e parda e a permanência resistente do preconceito de cor.

O tropicalismo e a teoria da democracia de Gilberto Freyre impediram a realização de uma política cidadã tanto para os negros brasileiros como para com os negros africanos durante os governos de Getúlio Vargas e de Juscelino Kubitschek. Nos dois governos, o Brasil não teve coragem de assumir a questão das desigualdades raciais entre negros e brancos. A política de Vargas foi de cunho culturalista: reconhecimento do samba como patrimônio o nacional (PAIXÃO, 2006), enquanto as casas de candomblé continuaram a ser perseguidas até 1976. O governo Kubitschek, pelo seu apoio ao governo português, não pôde ter uma posição firme de condenação ao colonialismo português na África (RAMPINELLI, 2008). A “cultura mestiça”, como expressão do tropicalismo, foi usada por estes governos como arma política de manutenção da ordem sociorracial estabelecida do que para buscar soluções efetivas. Em ações concretas, o culturalismo serviu mais para a retórica do que para uma política das relações raciais e imigratórias em relação à África. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 9).

Na década de 60, começa a se desenhar uma abertura oficial brasileira às migrações africanas. O Presidente Jânio Quadros, com lampejos de autonomia à cartilha política norte americana, intenta uma independência maior no plano diplomático ao lançar mão de ações como convênios de cooperação de cultura e tecnologia com países africanos independentes. A partir daí inicia a vinda de estudantes africanos conveniados para diversas faculdades brasileiras.

Nessa década, vieram migrantes principalmente do PALOP (Países Africanos de Língua Portuguesa), sendo que na década de 70, em decorrência das guerras civis pós-independência em Angola e Moçambique, acentuou-se a vinda de refugiados desses países, como também por motivo de guerra os de fora do PALOP, quais os da Costa do Marfim e da República Democrática do Congo.

A partir dos anos 90 cresceu a imigração de africanos oriundos de países não pertencentes ao PALOP, como os congoleses, senegaleses, marfinenses, liberianos, etíopes e tanzanianos, motivados pela instabilidade política e econômica, pela pobreza e descaso dos estados marcados pelo neoliberalismo e pela intensificação dos controles migratórios das ex-metrópoles.

Dados da Organização Internacional da Migração (OIM) do ano de 2012, revelam que em todo o mundo estima-se cerca de 19 milhões de imigrantes africanos (OIM, 2012). Em relação à situação da imigração africana atual para o Brasil, há uma dificuldade na obtenção de dados recentes, precisamente por ser uma temática pouco estudada e não ter a devida atenção nas políticas públicas.

Em dados estatísticos divulgados por Desidério apud Langa (2006) referentes ao Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2000) nos anos de entrada – entre 1996 e 2000 -, havia no Brasil 15.568 africanos, certamente um número muito menor do que o da realidade atual, pois só no Ceará apenas o número de estudantes é apontado em mais de 3 mil, havendo em vários estados brasileiros a presença de migrantes africanos, especialmente migrantes econômicos. No entanto, em tal estatística, já bem desatualizada, não se explicita em quais categorias eles se encontram, se são imigrantes econômicos, refugiados ou estudantes.

Muitos destes africanos são migrantes econômicos, refugiados (que trataremos adiante), ou estudantes que fazem parte do Programa de Estudante-Convênio de Graduação (PEC-G) e Pós-Graduação (PEC-PG), programas que têm o objetivo de formar recursos humanos em ciência e tecnologia e que possibilitam que estrangeiros oriundos de países em desenvolvimento ingressarem nos programas de pós-graduação nas instituições do ensino superior no Brasil. De acordo com Desidério (2006), segundo o censo demográfico do ano de 2000, havia 1.630 estudantes africanos no Brasil, seja nos programas de graduação ou de pós-graduação. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 2;3).

            A inclusão e a dignidade dos descendentes de escravos negros não seriam apenas uma justiça socioeconômica do século XIX, mas uma necessidade de efetivação contemporânea. Tal postergação de quase 130 anos é responsável por mazelas imensuráveis e fornece um dos principais esclarecimentos sobre a nossa pobreza social que distancia mais de uma centena de milhões de seres humanos da parcela mais incluída da economia nacional.

            O racismo cognitivo, difundido pelo modo de pensar e aprender que desconsidera os elementos da cultura intelecto material africana e afro-brasileira, que rechaça os fenótipos dos povos negros e que põe como modelo corporal o da minoria branca, contribui para diversos mal estares no povo marcadamente negro. Tais como a baixa autoestima, a fuga contraditória e inútil do reconhecimento identitário negro, já que a sociedade permanece discriminando, o racismo de negro a negro e o desperdício de uma múltipla e rica cultura nos aspectos estéticos, artísticos, políticos, técnicos, sociais, ambientais e religiosos, acrescentadores do desenvolvimento social e quiçá fontes de soluções para as relações humano-afetivo-ambientais no destrutivo capitalismo global.

            Inconteste, há no Brasil a transferência, do afrobrasileiro ao migrante subsaariano, do desrespeito ao corpo negro.

Embora alguns venham com o status de estudantes, o que se percebe na atualidade brasileira é que a imigração africana continua sendo tratada ainda numa perspectiva de “política colonialista” racista. Se a política migratória brasileira, em geral, é tratada ainda como “caso da polícia”, ela atua ainda sobre os corpos dos imigrantes africanos de forma desumana. Os agentes do Estado da imigração brasileira, sobretudo a polícia, continuam lidando com os imigrantes africanos com base na violência simbólica e física. Como os casos relatados resultantes da batida da Polícia Federal ocorrida no centro de São Paulo em março de 2012, que prendeu dezenas de pessoas de forma arbitrária, bastava ser negro e estrangeiro, inclusive haitianos com o visto “humanitário”. A maioria estava em situação regular e foram soltos no dia seguinte. Essa violência tem o cunho racista do passado colonial e que se configura no presente republicano. A violência cometida pela política contra cidadãos negros brasileiros nos séculos XX e XXI, muitas vezes, é transferida para os corpos dos “cidadãos do mundo africanos”. Uma parcela dos cidadãos comuns brasileiros e estrangeiros, os estudantes, os tripulantes dos navios estrangeiros que trafegam entre África e Brasil, marcados pelo mesmo racismo, tendem a violentar os corpos dos africanos. Tudo isso é por causa da cor da sua pele, que os diferenciam. Além disso, o despreparo dos policiais, dos estudantes brasileiros e tripulantes dos navios em lidar com a interculturalidade agrava negativamente o seu relacionamento com os imigrantes africanos. Suas atitudes, que causam a violências sobre estes e violam os direitos humanos, manifestam- se através de seus discursos e suas ações em relação aos imigrantes africanos que têm vindo de forma legal ou clandestina para o Brasil nos séculos XX e XXI. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 13).

Numa operação da Polícia Federal (PF), no centro de São Paulo, no ano de 2012, rodeada de espetáculos e flashes da imprensa burguesa, foram presos cerca de 600 africanos. Contudo, uma sul-africana branca foi abordada pela polícia, mas não foi levada para as instalações da PF[1].

Nessa problemática, reconhece-se o avanço da implementação da história africana no ensino brasileiro, luta antiga dos movimentos sociais. Com efeito, gestões governamentais dos últimos anos ou das últimas décadas possibilitaram algumas concretizações de demandas de movimentos da causa negra. As ações afirmativas no ensino superior público para afro-brasileiros, tema polêmico e controverso, é uma delas junto com o reconhecimento e proteção de quilombos, não obstante entraves e morosidades.

Cabe lembrar a existência de lutas libertárias desde os primeiros traslados atlânticos de escravos e as suas diversas formas, quais bélicas, psicológicas, políticas, religiosas, artísticas, desportivas, científicas e literárias, até os dias hodiernos.

O desafio ainda se mostra extenso, servindo de estímulos os frutos das lutas brotados especialmente de poucos anos para hoje, como as positivações constitucionais do artigo 4ª inciso VII, o qual prevê como princípio das relações internacionais o repúdio ao racismo, do artigo 5º inciso XLII no qual “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”, a lei 7.716/89 que define os crimes resultantes do preconceito de raça e de cor, a existência de julgados mais frequentes de condenação por tal crime e algumas políticas estaduais e municipais voltados aos brasileiros negros.

Contudo, mesmo considerando certo tempo geracional para o esgotamento do racismo, tais avanços são insuficientes, como evidenciam a realidade lentamente alterada e a necessidade de mudanças a curto e médio prazo. Ademais, e de certa forma por extensão, quando se refere às políticas públicas voltadas a proteção e inclusão dos imigrantes africanos constata-se o distanciamento estatal.

Desde a abolição dos escravos a maior parte de nossos governos tentou cobrir o problema do racismo como “peneira sob o sol”, aplicando adrede a exclusão, distorcendo e escamoteando esse opróbrio espinho que ainda fere a maioria dos brasileiros.

3 DIREITO INTERNACIONAL E CONSTITUIÇÃO FEDERAL

3.1 Soberania, direitos humanos e migrações internacionais

Um fato, abordado com profícua metáfora por Reis (2004), sobre o aspecto da soberania estatal num contexto mundial de conflitos e exclusões de grupos humanos, põe à tona a contradição dos Estados contemporâneos que são considerados democráticos e firmados em direitos humanos.

No dia 28 de agosto de 2001, um navio cargueiro, denominado Tampa, de bandeira norueguesa resgatou 438 pessoas que estavam num barco indonésio à deriva em alto-mar. A maioria dessas pessoas vinha do Afeganistão, mas também havia passageiros do Sri Lanka e do Paquistão, todos tentando chegar à Austrália. A imprensa dividiu-se entre falar de um navio “cheio de refugiados” ou de um navio “cheio de imigrantes ilegais”. A Austrália recusou-se a recebê-lo, e afirmou que “a carga” do Tampa era responsabilidade da Indonésia ou da Noruega. A Indonésia ameaçou mandar o exército ao porto para impedir os refugiados de desembarcarem, mas depois voltou atrás, aceitando recebê-los. Os passageiros, por sua vez, recusaram-se a voltar e resolveram fazer greve de fome. Durante uma semana, o navio Tampa permaneceu no mar, vigiado pela marinha australiana e impedido de atracar em qualquer lugar do mundo. A situação desse navio serve como uma metáfora da questão da imigração atualmente, refletindo, na figura de um navio impedido de atracar, a situação de milhões de pessoas ao redor do mundo. Os dilemas e os questionamentos que vieram à tona durante as negociações sobre o destino dos passageiros do Tampa sintetizam, de certa forma, uma série de problemas gerais relacionados aos aspectos políticos das migrações internacionais hoje. Em uma só questão: Afinal, o que impede um indivíduo de viajar para o exterior ou viver em um determinado país? Levando em consideração de que é cada vez mais fácil, tanto em termos de custo como de tecnologia de transporte, se deslocar de um ponto ao outro do planeta, e tendo em mente que as oportunidades econômicas são tão desigualmente distribuídas em termos geográficos, por que, então, as pessoas não podem simplesmente sair de um lugar e ir para outro em busca de uma vida melhor?  (REIS, 2004, p. 149).

Nesse acontecimento, a Austrália estaria violando o Protocolo de Nova York e o artigo 33 da Convenção de Genebra, que estabelecem a norma de non-refoulement, (não devolução), ou seja, nos pedidos de refúgio o Estado não deve tomar atitudes de devolução ou extradição dos peticionários antes de avaliar a situação dos mesmos, como comprimento das regras internacionais que amparam aqueles que saem de seus territórios por ameaça à vida e à liberdade. E nesse sentido

a Convenção de Genebra e o protocolo de Nova York representam um constrangimento para a autonomia decisória do Estado no que diz respeito ao controle de suas fronteiras, e por isso não se inserem na lógica do direito internacional tradicional, que garante a soberania nacional no controle dos movimentos migratórios. (REIS, 2004, p. 150).

Os institutos do direito internacional para proteção dos direitos humanos, e em especial dos trabalhadores migrantes, ampliam-se e aperfeiçoam-se, conquanto muitos Estados em contrapartida recrudesçam políticas conservadoras de restrição ao ser humano.

Pode-se elencar no rol do avanço da positivação internacional, as Convenções da OIT, destacando-se a Convenção de Imigração para o Trabalho (n. 97), de 1949, e a Convenção dos Trabalhadores Imigrantes (n.143), 1975, bem como, as Convenções da ONU, em particular, a Convenção sobre Direitos dos Imigrantes, de 1990, aprovada em Assembleia Geral. Quando a organizações, deve-se apontar a IOM, Organização Internacional para Migração, criada em 1951.

A estas, acrescentam-se estudos e encontros que viabilizam diálogos para questionamentos e possibilidades de avanços, revelando a tendência de se intensificar a pauta da questão migratória.

A importância cada vez maior das migrações internacionais no cenário internacional também pode ser medida tanto pela proliferação de reuniões onde esse assunto se tornou tema principal (Seminário Internacional sobre o Diálogo Cultural entre Países de Origem e Destino de Trabalhadores Imigrantes, 1989), como pelo papel de destaque que o tema adquiriu em conferências mais amplas, como as relacionadas à população, ao trabalho e ao combate ao racismo (Conferência Mundial de Direitos Humanos, parte 2, parágrafos 33-35; Conferência Internacional em População e Desenvolvimento, capítulo 10; Cúpula Mundial de Desenvolvimento Social, cap. 3 e 4; e IV Conferência Internacional da Mulher, cap. IV. D). (REIS, 2004, p. 153).

As Convenções e Conferências abordam sobre os combate ao tráfico de pessoas e à vulnerabilidade dos migrantes irregulares. Sendo que o combate direto a irregularidade do migrante deve ser no sentido de atender-lhe as necessidades com políticas de inclusão e alternativas humanitárias, e não na direção de injustificáveis expulsões, extradições e barreiras grotescas, como as muralhas, cada vez mais erguidas nos países ditos desenvolvidos, denotando frieza, desumanidade política e ilusão de existir uma guerra com lados opostos.

O combate, portanto, não é ao imigrante em situação irregular em si. Tal política, inócua e alienante, de criminalização e por vezes perseguição ao migrante, vem sendo implantada em vários países receptores.

Existe uma tendência atual de disseminação da prática da construção de muros de contenção nas fronteiras dos países mais ricos. Já existem trinta barreiras dessa espécie construídas no mundo, com destaque para as seguintes: a China construiu uma cerca de concreto e arame farpado, de 4,5 metros de altura, em sua fronteira com a Coreia do Norte, a fim de inibir a entrada de coreanos; os Estados Unidos edificaram um muro de metal de 5 metros de altura em um terço de sua fronteira com o México, também para evitar a imigração ilegal; para evitar a entrada de africanos na Europa, foi erguido um muro de 6 metros de altura e 8,2 quilômetros de extensão para isolar a cidade espanhola de Ceuta, que fica incrustada no Marrocos; Israel já levantou 434 quilômetros de um muro que tem previsão de contar com 707 quilômetros de extensão, para se isolar da Cisjordânia. Não bastasse, a Grécia pretende construir um muro em sua fronteira continental com a Turquia, com 3 metros de altura e 12,5 quilômetros de extensão[2].

Não obstante avanços internacionais na defesa de que os direitos que dignificam a pessoa humana independem da nacionalidade, são ainda os Estados que controlam e têm, normalmente, a última palavra de como vão lidar com as pessoas oriundas de fora de suas fronteiras ou com as gerações descendentes de migrantes não inseridas socialmente no interior de um país. Na prática, na maior parte das vezes cabe à decisão estatal a garantia dos direitos básicos dos migrantes no mundo

Um fato a ser citado para a reflexão da problemática da migração no contemporâneo duelo entre direitos humanos, consagrados externa e internamente pelos países, e conjunturas políticas e sociais de efeitos xenófobos e excludentes, foi o ocorrido nos Estados Unidos no início dos anos 1980.

Na Califórnia, por meio de plebiscito, a maioria da população aprovou medida que excluía do ensino público os filhos de imigrantes irregulares. A medida, conhecida como proposição 187, foi revogada pela Suprema Corte, que fundamentou-se no direito inalienável do ser humano e na ideia de que as crianças não deveriam ser punidas pela situação de irregularidade de seus ascendentes. (REIS, 2004)

Hodiernamente, o argumento da segurança nacional tem alimentado as políticas de restrição migratória em vários países, presentes discursos simplistas e maniqueístas que colocam nos migrantes oriundos de países periféricos e nas culturas e religiões diferentes as causas da existência do terrorismo, do narcotráfico e da violência urbana.

Assim, distanciam a reflexão sobre as raízes e os agentes responsáveis por essas problemáticas, ensejando o uso da violência contra grupos discriminados como fator agregador de nacionais para apoio às elites ultraconservadoras anelantes do monopólio do poder e do aumento da riqueza.

A questão da imigração continua a ser regulamentada basicamente pelo Estado, além de ser tratada, na maioria das vezes, como um problema de segurança pública e uma questão de polícia. Como vimos, a Austrália tratou o problema do navio Tampa como uma questão de segurança nacional desde o começo, convocando a Força Aérea para interceptar o navio e obrigá-lo a voltar para águas internacionais. A União Européia, por sua vez, discute uma política de imigração comum no mesmo grupo de trabalho que discute terrorismo, narcotráfico e questões relacionadas à segurança interna. Nos Estados Unidos, sobretudo após os atentados de 11 de setembro de 2001, a questão da imigração também é considerada sobretudo um problema de segurança nacional. (REIS, 2004, p. 161)

A tendência em associar migração com delinquência é muito preocupante. A perspectiva sensacionalista adotada nos meios de comunicação não colabora com uma correta interpretação do fenômeno. Muitas vezes informam-se dados distorcidos sobre o número de migrantes detidos, omitindo o fato de que a maioria dessas detenções deve-se à situação administrativa irregular do migrante e não por crimes.

O Relator da Conferência Internacional sobre Migração e Crime, levada a cabo em Itália, em 1996, observou com razão, que “o termo migrante “ilegal” (que devemos evitar) “implica uma condição de criminalidade ipso facto antes de qualquer determinação judicial do status.  Mais ainda, implica que um migrante ‘ilegal’ é um criminoso”. No Brasil, de forma insistente, inconsequente e estigmatizante, usa-se o termo “ilegal”, sem medir as desastrosas consequências de tal discriminação.

As prisões (ou centros de detenção) para imigrantes ilegais proliferam ao redor do mundo. Existem vários centros instalados na Europa, sendo que a Diretiva de Retorno, já mencionada, prevê a possibilidade de detenção de famílias, inclusive com crianças, até a efetivação da deportação. Ressalta Schwarz (2010, p. 182) que existem 224 centros de detenção de imigrantes na União Europeia, com capacidade para trinta mil detentos188. Israel já possui uma prisão para dois mil detentos, onde os imigrantes ficam de 2 meses a um ano presos, conforme o grau de lotação, mas está construindo um centro de detenção com capacidade para até dez mil pessoas, visando manter imigrantes ilegais africanos que entram no país pela fronteira sul do Egito, até que possa repatriá-los[3].

No Japão, por exemplo, existem centros de detenção nas cidades de Osaka e Ibaraki, onde inclusive são mantidos imigrantes menores; as detenções são por tempo indeterminado, e há registro de suicídios nessas prisões, inclusive de um imigrante brasileiro (INTERNATIONAL PRESS, 17-5-10). Na Austrália as condições dos centros de detenção são tão precárias que no dia 20 de abril de 2011 alguns detentos iniciaram uma rebelião e colocaram fogo no local. As denúncias são de superlotação e demora no processamento dos pedidos de asilo; as incertezas e inseguranças acarretam a deterioração do estado mental dos presos, com registro de episódios de suicídio e autoflagelação.

A Anistia Internacional acusou a Grécia de tratar imigrantes ilegais como criminosos, ao puni-los com prisão. Segundo a entidade, os imigrantes, que vêm de locais como Afeganistão, Somália, Palestina, Iraque e Eritreia, depois de uma jornada perigosa, são lançados em centros de detenção sem acesso a advogados, intérpretes ou assistentes sociais, mantidos por longos períodos de tempo em cadeias superlotadas, com menores desacompanhados detidos juntamente com adultos. Conforme a entidade, “a detenção não pode ser usada como uma ferramenta para controlar a imigração”.

Em dezembro de 2009 a deputada do Parlamento Europeu, Ana Gomes, encaminhou ao Conselho do Parlamento pergunta escrita a respeito desses dados, e a resposta foi que o Conselho “não dispunha desses dados”. A mesma notícia informa que entre 2006 e 2009 já haviam ingressado 20 mil africanos ilegais no território de Israel, e as estimativas eram de mais 13 mil ao longo de 2010; além dos africanos, estimavam que existiam outros 120 mil imigrantes com vistos vencidos no território do Estado[4].

Importante perceber, contudo, que as opções do Estado nas políticas de migração não ocorrem unissonamente ou como as decisões de um ente homogeneamente direcionado. Com efeito, o entrechoque de interesses pinta o quadro da atuação estatal. Essa realidade política e social, composta de diferentes forças acionadas por distintos interesses, torna em alguma medida imprevisíveis as ações governamentais que sentem pressões de agentes internos e externos.

O que a literatura estudada considera uma limitação do papel do Estado seria, na verdade, apenas um reflexo do fato de que não existe um ator único – o Estado –, cuja vontade seja clara e indivisível. As políticas de migração refletem o dissenso dos diferentes atores políticos, dentro e fora do Estado, sobre a construção de suas fronteiras. A suposta ineficácia das políticas de imigração e nacionalidade não é resultado da perda de soberania do Estado em função do desenvolvimento da economia ou da evolução dos direitos humanos, mas, sim, um espelho das dificuldades de se chegar a um consenso quando se trata de delimitar as fronteiras do Estado. Quando se alinha a opinião pública ao lado dos restricionistas e alega-se que a defesa dos direitos humanos dos imigrantes não possui bases sociais, não se leva em conta que existem também defensores dos direitos dos imigrantes e que, mesmo entre os que preferem reduzir o nível da imigração, é muito difícil para as pesquisas de opinião captarem quais seriam as prioridades dessas pessoas, isto é, se elas aceitariam uma restrição de direitos em nome de uma restrição no número de imigrantes. (REIS, 2004, p. 160)

Dessa complexidade define-se a força de segmentos que se evidenciam em grupos na grande massa, como fascistas e boa parte da direita que buscam apoio de camadas nacionais pela abordagem (sutil ou explícita) xenófoba e racista da migração, ou como movimentos normalmente de esquerda que defendem maior humanização das políticas migratórias. Daí o significado para os imigrantes da possibilidade de exercer os direitos políticos, como o de votar e ser votado.

Se os imigrantes compõem a manutenção da economia pela força do trabalho, por vezes em labores mais intensos do que os nacionais, se acrescentam valores, cultura, arte e genética ao países receptores, e se estão em minorias marginalizadas demandantes do cumprimento de garantias estatais aos seres humanos, são, portanto, credores de participação democrática nos rumos e ações governamentais.

Tão importante quanto a ausência do direito de residir é o fato de os estrangeiros não participarem nas decisões a respeito de sua própria situação, não terem direitos políticos. De um modo geral, independentemente de quais sejam os direitos acordados aos cidadãos, todas as democracias modernas definem a exclusão sobretudo em relação aos direitos políticos… A participação política é fundamental na definição da nacionalidade/cidadania e vice-versa, e é por isso que, ao longo da história, sempre houve tanta disputa para decidir quem fazia parte da pólis. Definir quem pode ser um cidadão é uma das questões mais importantes para a vida política de um país. Em se tratando de países que se pretendem democráticos, a decisão é ainda mais importante, porque define quem vai participar do processo político. Sendo também uma questão de distribuição de direitos, a definição de cidadania envolve uma luta política em torno de objetivos bastante concretos. (REIS, 2004, p. 159)

Cabe ressaltar que o direito de ir e vir, posto no escol da proteção humana pelas revoluções burguesas, ainda não existe no plano internacional. Migrar em si não é internacionalmente reconhecido como um direito humano. Na temática da migração, a legislação internacional em peso se refere às situações práticas em que o imigrante já existe, como as convenções que tratam dos direitos dos trabalhadores migrantes, e não ao direito de migrar. Exceção são os casos tidos como ocasionados por “temor justificável”, quais sejam os de refúgio e asilo, e mesmo neles quem têm definido a situação são os Estados, valendo constar a ausência de organismo coercivo internacional no monitoramento da aplicação dos respectivos tratados e leis.  (REIS, 2004)

3.2 Internacionalização dos direitos humanos

A internacionalização dos direitos humanos iniciou-se com o Direito Humanitário, a Liga das Nações Unidas e a Organização Internacional do Trabalho. Partindo de propostas que objetivavam o estabelecimento de respeito mínimo às pessoas nas condições de guerra, a busca da manutenção da paz, a fixação de padrões mínimos de proteção ao trabalhador, entre outros, tais entidades marcaram o início da proteção sistemática dos direitos humanos em esfera internacional, bem como o começo da ruptura da exclusividade dos Estados governamentais como sujeitos de direitos.

Por sua vez, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, concebida como interpretação autorizada dos art. 1º e 55 da Carta da ONU, traz à tona direitos civis e políticos e direitos econômicos e sociais, colocando-os como indissociáveis e inerentes a condição de ser humano. Toda via, por ser uma declaração, não um tratado, não tem força de aplicação, o que ensejou a “judicialização” da Declaração, com a elaboração de dois pactos em 1966, quais sejam o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que somados a Declaração de 1948 constituíram a Carta Internacional dos Direitos Humanos.

Ratificada pela Declaração de Viena de 1993, a ideia de universalização dos direitos humanos cria consistência no direito internacional, como também resistência dos que defendem o relativismo dos direitos fundamentais, que estariam em função da cultura e das características econômicas e sócio políticas em determinada sociedade, contestando o “mínimo ético irredutível” e os padrões mínimos de segurança da dignidade humana.

Aos que defendem a universalização dos direitos básicos dos seres humanos, o citado contraponto político pode servir de argumento para a manutenção das violações e a conservação irredutível da soberania face a proteção da vida humana.

A concepção universal dos direitos humanos demarcada pela Declaração sofreu e sofre, entretanto, fortes resistências dos adeptos do movimento do relativismo cultural. Para os relativistas, a noção de direitos está estritamente relacionada aos sistemas político, econômico, cultural, social e moral vigentes em determinada sociedade. Por esse prisma, cada cultura possui seu próprio discurso acerca dos direitos fundamentais, relacionado às específicas circunstâncias culturais e históricas de cada sociedade. Em face dessa polêmica, compartilha-se da corrente universalista, acolhida pela Declaração de Viena de 1993, quando consagra que todos os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. Compartilha-se, todavia, da defesa de um “universalismo de confluência”, ou seja, um universalismo de ponto de chegada e não de ponto de partida. Acredita-se que a abertura do diálogo entre as culturas, com respeito à diversidade e com base no reconhecimento do outro, como ser pleno de dignidade e direitos, é condição para a celebração de uma cultura dos direitos humanos, inspirada pela observância do “mínimo ético irredutível”, alcançado por um universalismo de confluência. Este universalismo de confluência, fomentado pelo ativo protagonismo da sociedade civil internacional, a partir de suas demandas e reivindicações morais, é que assegurará a legitimidade do processo de construção de parâmetros internacionais mínimos voltados à proteção dos direitos humanos. (PIOVESAN, 2013, p. 481).

Há que ressaltar a permanente resistência de assumir com igualdade e indissociabilidade as proteções consagradas no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, direitos de 1ª geração, e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, direitos de 2ª geração.

Ao primeiro Pacto prevê-se a aplicabilidade imediata, e com o respectivo Protocolo Facultativo é possível a petição individual a ser examinada pelo Comitê de Direitos Humanos. Quanto ao segundo Pacto, a previsão de que sua aplicação é “progressiva” e a demora para a adoção respectivo Protocolo Facultativo demonstram a diferença de patamares em que os dois pactos ainda estão.

Ao se abordar os direitos dos migrantes, percebe-se mais ainda a importância de se equiparar os dois perfis de direitos, haja vista os direitos sociais, uma vez que devem alcançar a todos indistintamente, como do trabalho, da moradia, da saúde e da educação, repercutirem em significativa proteção normativa internacional aos indivíduos e grupos migrantes.

É injustificável a distinção, na prática e nos recursos jurídicos internacionais, dos dois grupos, um resguardando direitos do discurso liberal e outro tutelando direitos do discurso social, como se as demandas por liberdade e por igualdade fossem independentes, quando se sabe serem indivisíveis e interdependentes.

Os direitos enunciados no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos apresentam aplicabilidade imediata, devendo ser assegurados de plano pelo Estado-parte. Já os direitos enunciados no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, na linguagem do Pacto, têm aplicação “progressiva”, tendo em vista que estão condicionados à atuação do Estado, que deve adotar medidas, até o máximo de seus recursos disponíveis, com vistas a alcançar progressivamente a completa realização desses direitos. No entanto, esforços têm sido empenhados no sentido de fortalecer a aplicabilidade dos direitos sociais, econômicos e culturais, realçando seu caráter jurídico e acionabilidade. Para este estudo, tais direitos são direitos legais e acionáveis, já que a ideia da não acionabilidade dos direitos sociais é meramente ideológica e não científica. É uma preconcepção que reflete a equivocada noção de que uma classe de direitos (os direitos civis e políticos) merece inteiro reconhecimento e respeito, enquanto outra classe de direitos (os sociais, econômicos e culturais), ao contrário, não merece reconhecimento. Sustenta-se que os direitos fundamentais — sejam civis e políticos, sejam sociais, econômicos e culturais — são acionáveis e demandam séria e responsável observância. O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos apresenta um peculiar mecanismo de implementação e monitoramento, que envolve a sistemática dos relatórios encaminhados pelos Estados-partes e a sistemática, opcional, das comunicações interestatais. O Protocolo Facultativo relativo a esse Pacto vem adicionar a essas sistemáticas um importante mecanismo, que traz significativos avanços no plano internacional, especialmente quanto à international accountability — o mecanismo das petições individuais a serem examinadas pelo Comitê de Direitos Humanos. Essas petições são encaminhadas por indivíduos que denunciam serem vítimas de violação de direitos enunciados pelo Pacto dos Direitos Civis e Políticos. A petição deve respeitar determinados requisitos de admissibilidade, como o esgotamento prévio dos recursos internos e a comprovação de que a mesma questão não está sendo examinada por outra instância internacional. Já o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais apresenta tão somente a sistemática de relatórios a serem encaminhados pelos Estados-partes, evidenciando as medidas adotadas em cumprimento ao Pacto. Em dezembro de 2008, finalmente, foi adotado o Protocolo Facultativo a esse Pacto, estabelecendo o mecanismo da petição individual, das comunicações interestatais e da investigação in loco, na hipótese de grave ou sistemática violação por um Estado-parte de direito econômico, social e cultural enunciado no Pacto. (PIOVESAN, 2013, p. 482).

Outro aperfeiçoamento reivindicado por pensadores do Direito Internacional, de acordo com Piovesan (2013), é o monitoramento da aplicação dos tratados de Direitos Humanos. O Tribunal Penal Internacional, estatuído em 1998 pelo Estatuto de Roma e estabelecido em 2002 em Haia, tem cunho exclusivamente penal e é o único Tribunal permanente de nível global com natureza jurisdicional sobre as violações contra os direitos humanos. Ou seja, não há, em escala mundial, jurisdição para julgar e conter coercitivamente a maior parte dos crimes perpetrados que desrespeitam a dignidade humana.

Destarte, com exceção do Tribunal Penal Internacional, adstrito a previsões penais como genocídio e crimes de guerra, o mecanismo de monitoramento internacional de direitos humanos restringe-se à recomendações e à sanções políticas, daí a proposta de instituir um Tribunal Internacional dos Direitos Humanos.

Ressalta-se, contudo, que enquanto não se configuram órgãos e sistemas mais eficientes no controle do desrespeito às normas internacionais de proteção do ser humano, reconhece-se a importância da possibilidade de pressão política e moral no monitoramento internacional, por vezes último recurso e esperança de comunidades e grupos que demandam proteção de direitos em vários pontos do orbe terrestre, podendo ser útil para coibir as violações contra migrantes e ser encarada como pródromo de um controle verdadeiramente efetivo da dignidade humana no mundo.

Constata-se que, no sistema normativo global de proteção, seja de alcance geral, seja de alcance específico, até o advento do Estatuto do Tribunal Penal Internacional, em 1998, não era previsto um órgão jurisdicional com competência para julgar casos de violação de direitos internacionalmente assegurados. Com exceção dessa jurisdição de natureza estritamente penal, no âmbito global a sistemática de monitoramento internacional continua a se restringir ao mecanismo de relatórios, a serem elaborados pelos Estados-partes, e, por vezes, ao mecanismo das comunicações interestatais e petições individuais, a serem consideradas pelos Comitês internacionais, que, todavia, não apresentam caráter jurisdicional. Isto é, as decisões desses Comitês são de cunho recomendatório e não têm natureza jurídica sancionatória, de modo que se aplicam ao Estado violador sanções de caráter moral e político, mas não jurídico, no enfoque estrito. Impõe-se, assim, no âmbito global, a instituição de um Tribunal Internacional de Direitos Humanos, como órgão jurisdicional competente para tutelar os direitos humanos no sistema global, tendo o poder de proferir decisões com força jurídica vinculante e obrigatória aos Estados perpetradores de violações. Faz-se também necessária a adoção do mecanismo de petição individual por todos os tratados internacionais de proteção de direitos humanos, já que esse mecanismo permite o acesso direto de indivíduos aos órgãos internacionais de monitoramento. (PIOVESAN, 2013, p. 484).

Vale lembrar o monitoramento regional da Convenção Americana de Direitos Humanos, que se vale da Comissão Americana de Direitos Humanos e da Corte Interamericana, os quais vêm desempenhando importantes conquistas em precedentes de afirmação dos direitos humanos, como leciona Piovesan.

Quanto à Corte Interamericana, é o órgão jurisdicional do sistema regional interamericano, que apresenta competência consultiva e contenciosa. No plano contencioso, a competência da Corte para o julgamento de casos é, por sua vez, limitada aos Estados-partes da Convenção que reconheçam expressamente tal jurisdição. Atente-se que apenas a Comissão Interamericana e os Estados-partes podem submeter um caso à Corte Interamericana, não estando prevista a legitimação do indivíduo — nesse sentido, mais uma vez se enfatiza a necessidade premente de democratização dos procedimentos internacionais, com a garantia de acesso direto de indivíduos e entidades não governamentais à Corte. A Corte Interamericana possui jurisdição para examinar casos que envolvam a denúncia de que um Estado-parte violou direito protegido pela convenção. Se reconhecer que efetivamente ocorreu a violação, a Corte determinará a adoção de medidas que se façam necessárias à restauração do direito. A Corte poderá ainda condenar o Estado a pagar uma justa compensação à vítima, tendo sua decisão força jurídica vinculante e obrigatória. Se a Corte fixar uma compensação à vítima, a decisão valerá como título executivo, em conformidade com os procedimentos internos relativos à execução de sentença desfavorável ao Estado. Ainda que recente seja a jurisprudência da Corte, o sistema interamericano se consolida como relevante e eficaz estratégia de proteção dos direitos humanos quando as instituições nacionais se mostram omissas ou falhas. (PIOVESAN, 2013, p. 486).

O acionamento direto pelos indivíduos dos órgãos de proteção internacional dos direitos humanos significa um relevante mecanismo para o amparo da dignidade humana, na medida em que isso se efetive com qualidade e como resposta às violações perpetradas sem fronteiras na humanidade.

Os Estados seguem sobremaneira os interesses da elite que os governa, e o quadro de ineficientes democracias nos Estados de Direito demonstra a preponderância dos interesses econômicos e políticos não afinados com gestões que priorizem a dignidade humana.

Tal realidade, o pouco controle frente aos que buscam concretizar incessantemente interesses econômicos em detrimento do respeito ao ser humano, está no âmbito das relações internacionais e no âmbito interno dos países, contudo o passo a frente de permitir, com mínima eficiência, aos indivíduos e grupos de indivíduos demandarem diretamente a proteção dos direitos humanos demonstra progresso no caminho para uma efetiva proteção global dos seres humanos, ponto ainda distante na contemporaneidade.

Efetivando-se tal progresso, imigrantes do mundo passam a ter melhores recursos e possibilidades perante os órgãos internacionais de Direitos Humanos.

Os indivíduos convertem-se em sujeitos de Direito Internacional — tradicionalmente, uma arena em que só os Estados podiam participar. Com efeito, na medida em que guardam relação direta com os instrumentos internacionais de direitos humanos — que lhes atribuem direitos fundamentais imediatamente aplicáveis —, os indivíduos passam a ser concebidos como sujeitos de Direito Internacional. Nessa condição, cabe aos indivíduos o acionamento direto de mecanismos internacionais. É o caso das petições ou comunicações, mediante as quais um indivíduo, grupos de indivíduos ou, por vezes, entidades não governamentais podem submeter aos órgãos internacionais competentes denúncias de violação de direito enunciado em tratados internacionais. É correto afirmar, no entanto, que ainda se faz necessário democratizar determinados instrumentos e instituições internacionais, de modo que possam prover um espaço participativo mais eficaz, que permita maior atuação de indivíduos e de entidades não governamentais, mediante legitimação ampliada nos procedimentos e instâncias internacionais. (PIOVESAN, 2013, p. 462).

A dignidade é demandada pelos violentados e excluídos do mundo, ensejando lutas por novas positivações a respeito da definição de cidadania. Tal aperfeiçoamento compõe o fomento do progresso social dos países juridicamente alicerçados sobre direitos humanos, como ordena o fulcro da Carta Magna do Brasil, tendo em vista que a Democracia da Dignidade Humana deve ter como princípio a proteção sem carimbos de fronteiras, e como prática a coerência de ações entre políticas internas e externas.

Seja em face da sistemática de monitoramento internacional que proporciona, seja em face do extenso universo de direitos que assegura, o Direito Internacional dos Direitos Humanos vem a instaurar o processo de redefinição do próprio conceito de cidadania no âmbito brasileiro. O conceito de cidadania se vê, assim, alargado e ampliado, na medida em que passa a incluir não apenas direitos previstos no plano nacional, mas também direitos internacionalmente enunciados. A sistemática internacional de accountability vem ainda a integrar esse conceito renovado de cidadania tendo em vista que às garantias nacionais são adicionadas garantias de natureza internacional. Consequentemente, o desconhecimento dos direitos e garantias internacionais importa no desconhecimento de parte substancial dos direitos da cidadania, por significar a privação do exercício de direitos acionáveis e defensáveis na arena internacional. Hoje se pode afirmar que a realização plena e não apenas parcial dos direitos da cidadania envolve o exercício efetivo e amplo dos direitos humanos, nacional e internacionalmente assegurados. (PIOVESAN, 2013, p. 467).

A prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais do Brasil está prevista na Constituição Federal, nos seguintes termos:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

II – prevalência dos direitos humanos; (Grifo nosso)

III – autodeterminação dos povos;

VII – solução pacífica dos conflitos;

VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo;

IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;

X – concessão de asilo político.

A Constituição de 1988 inovou o regimento jurídico brasileiro positivando direitos fundamentais de modo nunca antes feito na história de nossas constituições, estabelecendo tutelas almejadas por séculos de lutas e prevendo um sistema aberto ao progresso, nunca ao regresso, de futuras proteções dos direitos humanos consolidadas pelo direito internacional. Fruto dessa inovação é a consideração de limites da soberania Estatal ante a proteção jurídica dos direitos fundamentais estabelecida internacionalmente.

A partir do momento em que o Brasil se propõe a fundamentar suas relações internacionais com base na prevalência dos direitos humanos, está ao mesmo tempo reconhecendo a existência de limites e condicionamentos à noção de soberania estatal, do modo pelo qual tem sido tradicionalmente concebida. Isto é, a soberania do Estado brasileiro fica submetida a regras jurídicas, tendo como parâmetro obrigatório a prevalência dos direitos humanos. Surge, pois, a necessidade de interpretar os antigos conceitos de soberania nacional e não intervenção à luz de princípios inovadores da ordem constitucional; dentre eles, destaque-se o princípio da prevalência dos direitos humanos. Esses são os novos valores incorporados pelo Texto de 1988 e que compõem a tônica do constitucionalismo contemporâneo. (PIOVESAN, 2013, p. 474).

A Constitucionalização dos Tratados Internacionais que versam sobre direitos humanos está expressa na Carta Magna e repercute em todo o corpo jurídico que deve se harmonizar com o teor e o direcionamento constitucional vigente.

CF ART 5º § 2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)   (Atos aprovados na forma deste parágrafo)

Passa-se, assim, a concatenar normas internacionais e nacionais no fortalecimento dos direitos humanos. Segundo a interpretação de notórios juristas, como Flávia Piovesan, os parágrafos 2º e 3º são interpretados como a configuração de materialidade constitucional de todos os tratados de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, e de formalidade constitucional dos tratados equiparados a Emendas Constitucionais depois de aprovados por três quintos dos votos, em dois turnos, em cada casa do Congresso Nacional.

Por força do art. 5º, § 2º, da Constituição Federal de 1988, todos os tratados de direitos humanos, independentemente do quorum de aprovação, são materialmente constitucionais, compondo o bloco de constitucionalidade. O quorum qualificado introduzido pelo § 3º do mesmo artigo (fruto da Emenda Constitucional n. 45/2004), ao reforçar a natureza constitucional dos tratados de direitos humanos, vem a adicionar um lastro formalmente constitucional aos tratados ratificados, propiciando a “constitucionalização formal” dos tratados de direitos humanos no âmbito jurídico interno. Nessa hipótese, os tratados de direitos humanos formalmente constitucionais são equiparados às emendas à Constituição, isto é, passam a integrar formalmente o Texto. Com o advento do § 3º do art. 5º surgem, assim, duas categorias de tratados internacionais de proteção de direitos humanos: a) os materialmente constitucionais; e b) os material e formalmente constitucionais. Frise-se: todos os tratados internacionais de direitos humanos são materialmente constitucionais, por força do § 2º do art. 5º. Para além de serem materialmente constitucionais, poderão, a partir do § 3º do mesmo dispositivo, acrescer a qualidade de formalmente constitucionais, equiparando-se às emendas à Constituição, no âmbito formal. (PIOVESAN, 2013, p. 475).

Ademais, os direitos humanos nascidos nos tratados internacionais de que o Brasil seja parte têm aplicação imediata, conforme o § 1° do art.5 da CF “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”, possibilitando juridicamente maior proteção de direitos e legitimidade de cobrança nas situações cujo tempo de resposta é imprescindível para combate da violação ou ameaça de violação de direito fundamental, e afastando o entendimento de que os direitos internacionais são imprecisos, indefinidos ou tão somente fontes de interpretação da norma.

Há que ser também afastada a frágil argumentação de que os direitos internacionais integrariam o universo impreciso e indefinido dos direitos implícitos, decorrentes do regime ou dos princípios adotados pela Constituição. Ainda que não explícitos no Texto Constitucional, os direitos internacionais são expressos, bastando para tanto a menção aos dispositivos dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos, que demarcam um catálogo claro, preciso e definido de direitos. (PIOVESAN, 2013, p. 466).

A redemocratização brasileira, com o progresso jurídico da carta Magna de 1988, alimentou as esperanças de avanço na efetivação dos direitos humanos. Porém, a “constituição cidadã” não penetrou no âmago das estruturas estatais, tampouco transformou substancialmente dilemas dolorosos arrastados por séculos por sobre o dorso da camada mais frágil da estratificação social, em contraste com a exacerbada riqueza sempre evidenciada nas classes dominantes.

Atualmente, migrantes mal inseridos na sociedade brasileira engrossam o grupo de trabalhadores escravos e de marginalizados, alertando para um preparo, pautado nos direitos humanos consolidados universalmente, para lidar com uma problemática que provavelmente se agravará no contexto do aprofundamento das desigualdades do globo, da divisão internacional do trabalho e da expansão pareada da globalização consumista com a carência de recursos básicos de vida.

As opções políticas que repercutem na positivação e na aplicação de leis melhores dependem da mobilização social consciente, baseada no direito dos seres humanos e não no privilégio de grupos. Daí a importância de se abordar e esclarecer coletivamente à sociedade brasileira sobre as demandas de direitos no nível internacional, como fortalecimento de construção jurídica e cultural para uma estrutura de organização estatal que atenda às necessidades dos seres humanos, sejam eles nacionais ou migrantes.

É sensatez dignificante, basilar de paz social, e obrigação estatal atender as demandas de todos os seres humanos presentes no território nacional. Assoma-se a essa necessidade a importância da sensibilização dos agentes operadores do direito, a fim de advogarem mais na concretização dos tratados internacionais.

Aguardam essas mobilizações o progresso brasileiro na esfera dos direitos internacionais, como a aceitação de mecanismos de petição individual de Tratados, a ratificação do Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais e da Convenção da ONU sobre a Proteção dos Direitos dos Trabalhadores Migrantes e Membros de Sua Família.

Contudo, para que o Brasil se alinhe efetivamente à sistemática internacional de proteção dos direitos humanos, em relação aos tratados ratificados, é emergencial uma mudança de atitude política, de modo que o Estado brasileiro não mais se recuse a aceitar procedimentos que permitam acionar de forma direta e eficaz a international accountability. Superar a postura de recuo e retrocesso — que remonta ao período de autoritarismo — é fundamental à plena e integral proteção dos direitos humanos no âmbito nacional. Nesse sentido, é prioritária no Estado brasileiro a revisão de declarações restritivas elaboradas, por exemplo, quando da ratificação da Convenção Americana. É também prioritária a reavaliação da posição do Estado brasileiro quanto a cláusulas e procedimentos facultativos — destacando-se a urgência de o Brasil aceitar os mecanismos de petição individual e comunicação interestatal previstos nos tratados já ratificados. Deve ainda o Estado brasileiro adotar medidas que assegurem eficácia aos direitos constantes dos instrumentos internacionais de proteção. A essas providências adicione-se a urgência de incorporar relevantes tratados internacionais ainda pendentes de ratificação, como o Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Todas essas ações são essenciais para a efetiva reinserção do Brasil, na condição de Estado Democrático de Direito, no cenário internacional de proteção dos direitos humanos. Embora avanços extremamente significativos tenham ocorrido ao longo do processo de democratização brasileira, no que tange à incorporação de mecanismos internacionais de proteção de direitos humanos, ainda resta o importante desafio — decisivo ao futuro democrático — do pleno e total comprometimento do Estado brasileiro à causa dos direitos humanos.” (PIOVESAN, 2013, p. 489).

4 VIOLAÇÕES NA ATUAL MIGRAÇÃO AFRICANA AO BRASIL

4.1 Migração e trabalho: entrada e exploração de africanos no Brasil atual

            Muito atestam os problemas sociais brasileiros, como os abismos da desigualdade social, que fechar-lhes os olhos é engendrar agravamentos. Um deles, de conexão direta com o malogro das disparidades globais, é a entrada irregular de imigrantes econômicos que não recebem a devida atuação dos poderes públicos. Em maioria são os chamados migrantes laborais, que anelam empregos formais no Brasil na construção civil, em frigoríficos e em outros setores da indústria e do comércio.

Além de frigoríficos e carvoarias, eles começaram a ser empregados em massa na construção civil. A situação chamou a atenção do Ministério Público do Trabalho do Paraná, que investiga denúncias dos sindicatos locais de que empreiteiras têm sido constituídas apenas para contratar esses imigrantes. Elas preenchem as folhas da carteira de trabalho, mas jamais registram o trabalhador efetivamente. Haitianos e africanos descobrem a fraude meses depois, quando o contrato termina, e eles não têm direito à rescisão e ao seguro-desemprego, ou quando sofrem acidentes e não contam com cobertura do INSS. Eles também receberiam menos do que o piso da categoria e cumpririam jornadas de trabalho superiores ao limite estabelecido pela legislação. Foi o que aconteceu em Conceição do Mato Dentro (MG), onde cem haitianos trabalhavam na construção de um mineroduto da empresa Anglo American. O fiscal do trabalho que atuou no caso relatou que o alojamento deles lembrava uma senzala. A comida fornecida era de baixa qualidade, o que teria provocado hemorragias estomacais[5].

Chegam através de fronteiras, como as da região Norte do Brasil, depois de imensas e adversas trajetórias, qual a rota Dacar-Madrid-Equador-Peru-Bolívia. Vale registrar que muitos imigrantes africanos que chegam pelo Acre são oriundos de vários países de vitimados nas tragédias ocorridas no início de 2015 no mediterrâneo.

Tais naufrágios e o endurecimento da “política-polícia” migratória europeia podem estabelecer relações diretas com o aumento da entrada de imigrantes no Brasil.

Entre os 27 sobreviventes da recente tragédia no mar Mediterrâneo, há migrantes de Mali, Gâmbia, Senegal, Somália, Eritreia e Bangladesh. Aqui, em nossa fronteira seca, dados oficiais registram o uso da rota por nacionais da Gâmbia, de Bangladesh, Senegal, Nigéria, Mauritânia, Camarões, Serra Leoa e Somália. As tragédias no mar Mediterrâneo podem sim ter impacto direto no uso cada vez mais frequente da rota Dacar-Madri-Equador-Peru-Bolívia por africanos e asiáticos, para ingresso em território brasileiro pelo Acre. Isso porque na União Europeia existem leis rígidas que criminalizam a imigração ilegal. E as políticas migratórias da União Europeia são bem mais restritas para cidadãos não europeus que as atualmente adotadas pelo Brasil. Há um fator comum entre a rota terrestre de acesso ao Brasil pelo Acre e a do mar Mediterrâneo para ingresso na zona do euro: ambas são vias ilegais. Portanto, Europa e Brasil sofrem do mesmo dilema: implantar vias legais de migração, sob controle governamental, permitindo o acesso dos migrantes a políticas públicas adequadas. À medida que a União Européia endurecer as regras migratórias, os estrangeiros buscarão destinos onde o acesso ao território esteja oficialmente mais facilitado, como é o do Brasil, pois não somos um povo xenófobo, mas existem pessoas no país que pretendem escravizar esse trabalhadores imigrantes[6].

De início, por acharem serem provisórios tais fluxos nas fronteiras do norte brasileiro, as entidades estatais eram ainda mais distantes. Contudo, tem se evidenciado com mais impacto à sociedade civil e ao Estado o aumento da imigração irregular e os efeitos da relegação.

A falta de políticas apropriadas para atendimento básico, registro, avaliação dos casos e inserção dos imigrantes colocam-nos à margem ou na invisibilidade de serviços e registros estatais, aprofundando a suscetibilidade às garras do trabalho escravo no Brasil, e intensificando as redes de traficantes de seres humanos.

Operações de combate ao trabalho escravo se deparam com a figura crescente do imigrante irregular africano, demonstrando a pressão da realidade para se pautar mais frequentemente a migração nas instancias políticas brasileiras.

A par disso, faz-se premente a reconstrução da normativa específica da migração no Brasil, porquanto o inadequado Estatuto do Estrangeiro, lei da última ditadura brasileira feita sob uma política de perseguição, destoa-se do compromisso com os direitos fundamentais positivados na Carta Magna.

Essa contradição, Estatudo do Estrangeiro e direitos humanos do migrante, aumenta o engessamento do progresso das políticas migratórias brasileiras, especialmente para o migrante econômico que, por não conseguir outros meios de regularização, normalmente recorre à solicitação de refúgio em cujo período de processo pode ter carteira de trabalho assinada, submetendo-se a uma situação provisória, burocrática e quase sempre de indeferimento.

Sua condição precarizada de um provisório-permanente – o solicitante de refúgio – que cumpre os rituais burocráticos do Conselho Nacional de Refugiados a cada três meses, na esperança de um dia se mobilizar de igual para igual no mercado das humilhações primárias, se desfaz a cada vez que deixam as cidades sedes das fábricas espalhadas pelo Brasil para visitarem, em um final de semana, o escritório da ACNUR na Praça da Sé, em São Paulo. Alguns ainda aproveitam para um passeio na Praça da Luz ou uma visita ao SESC do Carmo, onde possivelmente encontram novos imigrantes africanos, desesperados com a falta de trabalho em São Paulo – ou ainda aqueles que recusam o trabalho da construção civil, em Alphaville ou Mauá, que pagam 12 reais por dia. De volta para a fábrica, encontramos serra-leonenses, guineenses, nigerianos, iraquianos, até nepalenses, cumprindo jornadas de trabalho de três turnos (24 horas), com salários por volta de 800 reais que, diga-se de passagem, dá para o aluguel, a comida e, quando muito, para financiar as viagens de volta para São Paulo, a cada três meses, para cumprir os rituais burocráticos e receber um novo selo de indeferimento[7].        

Segundo o Procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho do Acre, este estado de fato proporcionou serviços de urgência, porém não suficientes para políticas adequadas. Mais grave seria o distanciamento das instituições federal, haja vista a Constituição lhes direcionar as competências sobre migração.

Todos acreditavam que era um fenômeno passageiro que exigia políticas públicas temporárias. Com o passar do tempo, a rota Haiti-Panamá-Equador-Peru-Bolívia consolidou-se como porta de entrada para o território brasileiro, para o ingresso de caribenhos. Para a entrada de africanos, surgiu a rota Dacar-Madrid-Equador-Peru-Bolívia. O maior erro foi tratar a migração como um problema transitório. E por trás de tudo isso existe uma legislação obsoleta -o Estatuto do Estrangeiro, Lei Federal 6.815/1980- outorgada durante a ditadura miliar, marcada por uma ideologia nacionalista de combate ao comunismo, ou seja, leis antigas que não disciplinam a imigração sob o ponto de vista do imigrante, como ser humano sujeito de direitos. A falta de políticas adequadas, o grau de vulnerabilidade humana apresentada por esses migrantes, a ausência de controle governamental interno do processo migratório têm ampliado a precarização desses trabalhadores e a submissão deles ao trabalho escravo, como se pode constatar em pelo menos 5 grandes operações realizadas pelo Grupo Móvel Interinstitucional de Combate ao Trabalho Escravo (MPT, MTE, PF e PRF), entre os anos 2013 e 2015. Cada vez mais os trabalhadores migrantes serão sujeitos presentes em todas as políticas e em todas as instâncias da vida pública. Ao mesmo tempo em que é preciso garantir tais políticas públicas de acolhimento, é inadiável a apresentação de uma solução definitiva para acabar com a rota ilegal pela fronteira seca, o que desestimulará as redes de coiotes e traficantes de pessoas que atuam no aliciamento desses trabalhadores estrangeiros desde o Haiti até o território brasileiro. Sem sombra de dúvida, a omissão e a negligência do Governo Federal, em todos os aspectos que envolvem a migração, é o maior dos erros. Para nós, do MPT, o Estado do Acre tentou fazer sua parte desde o início da crise migratória em nossa fronteira. Desde a 2ª Guerra Mundial, a migração haitiana e senegalesa, principalmente, foi uma das maiores já vista em nosso território. Segundo dados oficiais, quase 37 mil estrangeiros ingressaram em território brasileiro pela fronteira seca (terrestre) do Brasil com Peru e Bolívia, ao longo do território acreano. Apenas neste ano, nos três primeiros meses, dados do Governo do Estado do Acre apontam que 3000 estrangeiros ingressaram no Brasil pelo Acre. Na última sexta (17), no abrigo em Rio Branco, havia mais de 800 estrangeiros, haitianos, senegaleses, homens, mulheres e crianças[8].

Na reflexão sobre trabalho escravo de imigrantes, deve-se lembrar que uma real política de inserção não se limita a regularização dos imigrantes para lhes possibilitar a formalização de emprego. O trabalho escravo também está presente nos empregos formais que se evidenciam violadores e degradantes, para os quais boa parte dos africanos regularizados são vulneráveis, como nas prestações de serviços terceirizados.

Ao contrário do que as campanhas contra o trabalho escravo permitem pensar, tais relações de trabalho super precarizadas estão presentes no chão das fábricas mais modernas e com gigantescas balanças de exportações do Brasil, os conglomerados puramente fictícios, reproduzidos pelo Estado à custa de subsídios e de bancos públicos para manter o país na rota do crescimento econômico prometido[9].

Diga-se de passagem que a atual pressão pela permissão e propagação da terceirização nos trabalhos-fins das empresas resultará, se atingir o desiderato, em mais escravização e precarização da mão de obra migrante, em especial dos africanos, haja vista muitos já se encontrarem em tais situações reveladoras das deficiências de monitoramento e aplicação das normas protetoras. Como no caso de imigrantes africanos islâmicos na produção de frango halal no Paraná. Trabalham por meio de terceirização em condições aviltantes, sob baixa temperatura em cargas horárias extenuantes, e recebendo parcos salários, o que ensejou o ingresso na justiça pelo Ministério Público.

Somente uma pequena parte dos funcionários da unidade da Sadia de Francisco Beltrão são islâmicos: cerca de 100 de um quadro de 2.500 pessoas. Entretanto mais de 90% da produção realizada ali é halal. Os abatedores trabalham em uma seção chamada sangria. O galpão da sangria é estreito e barulhento, confinado como uma penitenciária, mas branco como um hospital. É inacreditável o ritmo e a velocidade do abate, sempre atrasado em relação a esteira de aspecto fordista. Cada uma das três linhas de sangria conta com três funcionários cortando pescoços a todo vapor: por hora cada uma dessas linhas de sangria abate de 8.400 aves. Além desses nove funcionários, um supervisor anda pra lá e pra cá entre as linhas… Os abatedores são contratados oficialmente pela empresa Grupo de Abate Halal, com e de em São Bernardo do Campo, caracterizando uma terceirização dentro do próprio chão da fábrica. O Sindicato de Trabalhadores da Indústria de Alimentos de (SINTRIAL) Dois Vizinhos (PR) informa que a legislação trabalhista brasileira não permite a terceirização da ”atividades fins”. No começo de 2011 o Ministério Público abriu um processo contra a Sadia de Dois Vizinhos, mas sequer a linha parou de funcionar e já estava pronto um documento que permitia que as cabeças continuassem rolando. E parece que vai seguir assim por um bom tempo. A Sadia de Francisco Beltrão foi processada pelo mesmo problema e o processo arquivado. É possível que todas as linhas de produção de frango halal no Brasil encontrem-se submetidas a esse problema porque o Grupo de Abate Halal monopoliza o fornecimento de força-de-trabalho especializada para o sangria[10].

4.2 Violência contra africanos

           

A violência nos ambientes de secular e profunda divisão social, como o brasileiro, em que o preconceito de classe e de cor são hodiernos e estruturais em todas as regiões do país, não deixa de cair assaz sobre imigrantes africanos.

O racismo “cortês”, abrangente na contemporaneidade, manifestado por gestos, frases indiretas, atitudes injustificáveis, espaços culturalmente delimitados, são “sutilezas” violentas que o negro brasileiro muito bem conhece. Os subsaarianos com frequência chegam ao Brasil desconhecendo-as.

            Vale considerar os universitários africanos no Brasil, por exemplo, que são em significativa parcela pertencentes à classe média de onde vieram, e que consomem em seus países produtos e espaços padronizados pelo capitalismo global, como shoppings, bares-restaurantes, casas de show, certas marcas de roupa, consumos que no Brasil por vezes são símbolos econômicos de fronteira entre os fenótipos humanos, além do fato de os estudantes africanos estarem cursando em instituições de ensino superior, espaço predominantemente não negro e até hoje mais um demonstrativo brasileiro da divisão de classe e de cor, especialmente nas Universidades Públicas, conquanto certa mudança nos últimos anos.

            Tais estudantes, ou outros grupos de migrantes africanos, que chegam ao Brasil, às vezes com a expectativa de uma nação democrática e harmoniosamente racial, não raro estão despreparados e incautos ante as barreiras raciais.

Os estudantes africanos, ao chegarem no Ceará, não estão inteirados dos limites sociais tradicionalmente construídos pelos brancos para segregar os negros. Não estão informados desses espaços de exclusão, eles rompem as fronteiras estabelecidas e transitam em espaços brancos. (MENDES apud LANGA, 2010, p. :77).

Ao furá-las, conscientemente ou não, ou pelo simples trânsito e presença, podem desencadear em alguns racistas e conservadores recalcitrantes outro tipo de violência, ainda existente no país, que é a da direta brutalidade verbal ou física, culminando em casos de morte.

O Incêndio no dormitório de universitários africanos em Brasília, num atentado cruel contra a vida, como aponta a investigação da Polícia Federal; o espancamento que levou à morte um guineense estudante da Universidade Federal de Mato Grosso; a rajada de tiros contra estudantes angolanos num bar em São Paulo, matando uma jovem e ferindo os demais, entre os sobreviventes uma grávida de oito meses que levara um tiro na barriga, somam-se a outros casos truculentos de desrespeito às minorias, como o inesquecível crime contra o índio pataxó Galdino Jesus dos Santos, morto incendiado por jovens de classe média em Brasília, e os espancamentos e assassinatos de homossexuais, crianças, idosos, moradores de rua, doentes mentais, entre outros.

Em março de 2007 houve um incêndio criminoso em 3 apartamentos que alojavam 10 estudantes africanos oriundos da Nigéria, Guiné-Bissau, Camarões e Senegal na Universidade de Brasília (UNB). O fato ocorreu de madrugada, quando os estudantes dormiam. Mesmo com toda a dificuldade de sair do quarto, conseguiram escapar e ninguém ficou ferido. De acordo com o relato dos estudantes africanos, há alguns anos eles eram alvos de ameaça por parte de outros estudantes; no caso, os brancos brasileiros; inclusive exibiram fotos e pichações na parede com manifestações racistas. Os estudantes brasileiros alegaram que os africanos faziam muitas festas e deixavam o som muito alto, e negaram qualquer envolvimento com o fato supracitado. Na época, a Polícia Federal apurou os fatos e classificou o incêndio como “criminoso” (GAZETA DO POVO, 2007). O Itamaraty, por meio do Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim (Ministro em exercício no ano de 2007), repudiou o episódio e disse ser “um atentado muito grave”. Parlamentares também repudiaram o caso, e propuseram levá-lo ao poder judiciário. Já os casos a seguir resultaram em duas grandes tragédias. No mês de setembro de 2011, o estudante da Guiné Bissau, Toni Bernardo da Silva, de 27 anos, que fazia intercâmbio no Brasil na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), foi morto numa noite em frente a uma pizzaria de Cuiabá. Na versão oficial relatada pelos policiais que estavam no local, o estudante pedia dinheiro aos frequentadores. O estudante esbarrou em uma mulher que estava em uma das mesas e foi então que o namorado dela (um empresário) e, na sequência, dois policiais militares que estavam no local e que utilizavam trajes civis, intervieram com as agressões. Testemunhas disseram que o rapaz foi imobilizado e espancado pelos três por mais de 15 minutos, numa grande sequência de socos e pontapés. O laudo do Instituto Médico Legal (IML) apontou a morte por asfixia, provavelmente causado por um chute ou soco. Segundo relato dos estudantes africanos da UFMT, amigos de Toni, o que o levou a pedir dinheiro era o fato do descaso e do abandono da universidade com os estudantes que fazem intercâmbio. Queixaram-se do auxílio aos estudantes que participam do Programa de Estudantes- Convênio de Graduação (PEC-G). Segundo eles, faltam apoio e acompanhamento da UFMT em relação aos estrangeiros dentro do campus. No dia seguinte ao crime, o Ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, pediu desculpas publicamente ao governo de Guiné-Bissau, durante reunião na sede das Organizações das Nações Unidas (ONU) (G1, 2011). Em março de 2012, a juíza da 8ª Vara Criminal de Cuiabá aceitou a denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), que apontou que a morte do estudante africano foi ocasionada por lesão corporal seguida de morte. Os três acusados respondem o processo em liberdade. Da mesma forma, fruto de uma ação intolerante, como relatado no caso anterior, uma discussão num bar no Brás, região central de São Paulo, deixou uma africana morta e três feridos na noite do dia 22 de maio de 2012. Quatro estudantes angolanos estavam num bar enquanto outros dois clientes brasileiros teriam xingado o grupo com termos como “macacos”. Houve uma discussão e os brasileiros foram embora. Após 20 minutos, um dos brasileiros retornou ao bar em um carro prata, desceu do veículo e atirou contra o grupo de angolanos. Zulmira de Souza Borges Cardoso, 26 anos e estudante de engenharia, foi atingida e morreu no local. Celina Bento Mendonça, 34, grávida de cerca de oito meses, acabou ferida por pelo menos dois tiros, um deles na barriga. Gaspar Armando Mateus, 27, foi baleado na perna. Renovaldo Manoel Capenda, 32, também foi atingido (UOL, 2012). (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 2;3).

Outros fatos ignóbeis ocorrem com africanos que chegam escondidos em navios à costa brasileira. São casos de violações de direitos fundamentais, como a prisão em contêineres, a tortura, a negação aos direitos internacional e nacionalmente firmados sobre refugiados como o princípio do non-refoulement que proíbe o reenvio dos que buscam refúgio, o não acesso aos pedidos formais do mesmo, o impedimento de sair das embarcações e se comunicar com agentes de proteção, como advogados, ONGs, e de demandar a Justiça, além do excruciante lançamento ao mar dos descobertos durante o trajeto, forma perversa de homicídio e descarte da vida humana.

Brasil, nos ajude!”. Este foi um dos dizeres de um dos nove refugiados nigerianos que estavam presos em um navio de bandeira turca no porto de Paranaguá, em setembro de 2011. Os nove rapazes saíram da Nigéria – por conta da situação política e econômica do país – apenas com a roupa do corpo. Estavam escondidos há mais de 10 dias no convés do navio e no meio do percurso, com fome e sede, soltaram uma corda ao mar de forma que fossem localizados pela tripulação. Ao “resgatá-los”, a tripulação os encarcerou em uma sala minúscula sem as mínimas condições de higiene. Quando o navio atracou no porto, a tripulação comunicou aos agentes de fronteira a presença dos clandestinos. Já o delegado da Polícia Federal não permitiu a entrada e a permanência legal em território brasileiro. Em suas palavras, declaradas em horário nobre em plena rede nacional televisiva, os nigerianos poderiam ser “terroristas” e possíveis “ameaças à segurança nacional”, além do que também poderiam ser “ameaças à saúde pública e sanitária” (G1, 2011). Foram impedidos de pisar em solo nacional e continuaram encarcerados no navio. O caso só gerou muita repercussão e se tornou midiático por conta de denúncias das pessoas que trabalham no porto. Os nigerianos conseguiram pisar em solo nacional e pedir refúgio por causa de uma liminar da justiça, obtida por meio da atuação de instituições de direitos humanos, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Diversos direitos dos nigerianos foram violados segundo as normas internacionais do qual o Brasil é signatário, principalmente o direito de solicitar o refúgio. Em maio de 2012, três deles obtiveram o refúgio no Brasil. No mês de fevereiro de 2012, dois africanos – um de Gana e o outro da Costa do Marfim estavam escondidos de forma clandestina no convés de um navio de carga e foram descobertos pela tripulação. O navio já estava atracado no Porto Internacional do Malhado, em Ilhéus, quando alguns membros da tripulação algemaram um deles. Um dos funcionários do Porto filmou as atrocidades as quais estavam expostos, fato que repercutiu na mídia. O africano estava algemado e os tripulantes, de forma sádica, apertavam as correntes. Ecoavam sons de gritos e choros. Em suma, sofreram torturas e maus tratos com o navio atracado em solo nacional. A Polícia Federal foi comunicada posteriormente do ocorrido, abriu uma investigação do caso, mas, por enquanto, não há nada resolvido, e não sabemos realmente o que aconteceu com estes africanos: se solicitaram refúgio ou foram deportados (UOL, 2012). É importante ressaltar que ambos os casos não são fatos isolados. Ao longo dos anos há denúncias de casos de africanos que chegam ao Brasil escondidos em navios e relatos de alguns sobreviventes que foram espancados e jogados ao mar quando descobertos pela tripulação.  (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 3;4).

Registra-se casos de lançamentos coletivos de pessoas ao malogro do mar, como o realizado por tripulantes do navio chinês que se aproximava da costa brasileira, as vítimas foram salvas por uma embarcação de pesca, entre outros tantos episódios, vindos à tona ou não, vitimando fatalmente pessoas escondidas em embarcações que anelavam oportunidades de vida digna noutras terras, comumente tendo o Brasil como passagem ao destino almejado.

Sobre o caso demonstrado dos nigerianos no porto de Paranaguá, o delegado da Polícia Federal violou o artigo 7° do Estatuto dos Refugiados, que diz: Art. 7º O estrangeiro que chegar ao território nacional poderá expressar sua vontade de solicitar reconhecimento como refugiado a qualquer autoridade migratória que se encontre na fronteira, a qual lhe proporcionará as informações necessárias quanto ao procedimento cabível (ESTATUTO DOS REFUGIADOS, Lei 9474 de 1997). Ou seja, o delegado não informou os direitos dos nigerianos de que podiam solicitar refúgio e entrar legalmente em solo nacional. Se refletirmos que o delegado impediu a entrada e a permanência legal no território brasileiro, para onde os africanos seriam submetidos? Seriam deportados para o país de origem? Ficariam sob a “tutela” da tripulação do navio? A mesma que os maltratou? É importante frisar que no ano de 2005 a tripulação do navio chinês Tu-King encontrou africanos clandestinos no navio e os jogaram no mar da costa brasileira. Só se salvaram porque foram localizados por uma embarcação de pescadores (O ESTADO DE SÃO PAULO, 2003). No caso de Paranaguá, a Polícia Federal violou também o artigo 33 da Convenção da ONU de 1951, transgredindo o Princípio do Non-Refoulement (que diz que uma pessoa não pode ser enviada ao seu país de origem, pois pode sofrer alguma tortura ou outro tipo de abuso), e reproduziu a mesma ação adotada nos demais países. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 6)

Ressalta-se que não se deve esquecer, conforme demonstram as pesquisas, os desrespeitos ocasionados pelo Estado, nas políticas de imigração e inserção, no preparo de profissionais que lidam com o atendimento ao público e nos serviços de assistência, incluindo a área da saúde.

4.3 A política migratória brasileira – refúgio, anistia e projeto de lei.

O Brasil possui um arcabouço jurídico, elaborado interna e externamente, que deve proteger o migrante africano, tanto no aspecto migratório quanto no de combate ao racismo.  No plano internacional temos a Convenção da ONU de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados, o Protocolo de 1967 e a Declaração de Cartagena de 1984, instrumentos contendo procedimentos de como os Estados signatários devem atuar ante os refugiados e os solicitantes de refúgios.

Acrescente-se a Declaração de Durban de 2001 para a Eliminação do Racismo, Xenofobia e Intolerância Correlata e as leis internas brasileiras quais a lei 9.474 de 1997 que define mecanismo para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, e a lei 12.288 de 2010 que institui o Estatuto da Igualdade Racial.

Contudo, não se deve esquecer o Estatuto do Estrangeiro, lei 6.815/80 alterada pela lei 6964/81 e regulamentada pelo Decreto 86715/81. Este estatuto é apontado por muitos autores e atuantes na área da migração como impregnado da nódoa ditatorial, elaborado no fim de um regime que, como os demais da América Latina, da Ibéria e doutras partes do mundo, internamente perseguiam e externamente se fechavam aos supostos subversivos. Como soe à arbitrariedade estatal, amplos públicos incluindo as gerações futuras pagam seus desmandos.

O descontentamento da sociedade civil para com o Estatuto do Estrangeiro fomentou um projeto de lei de 2014 que tramita no Congresso Nacional com o fim de alterar a legislação sobre o migrante. Vale lembrar nesse contexto a ponta de lança que lida diretamente com os imigrantes internacionais, a Polícia Federal. Subordinada ao Ministério da Justiça, ela é responsável pela execução e controle da política migratória.

O Anteprojeto de Lei de Migrações e Promoção dos Direitos dos Migrantes no Brasil, elaborado por uma comissão solicitada pelo Ministério da Justiça e concluído em 31 de julho de 2014, com efeito contém progressos para a política migratória brasileira, como visto temporário de um ano dado ao migrante que venha procurar trabalho legal; a substituição  do termo Estrangeiro, que vem tendo acepção pejorativa, para Migrante; o acesso a redes de serviços estatais básicos, como educação, sem a necessidade de regularidade; a isenção de taxas para a regularização aos que estiverem em dificuldades financeiras; entre outros.

Um dos efeitos de tais mudanças seria o de evitar que os imigrantes econômicos entrassem com pedidos de refúgio, em que precisam cumprir burocracias frequentes e inadequadas, dispendiosas ao trabalhador pelo deslocamento periódico das regiões de trabalho aos locais públicos responsáveis pelo processo de refúgio.

Em suma, algumas inovações do Anteprojeto: Visto temporário de um ano para procurar emprego legalmente no Brasil; Criação de um órgão civil para o processo de regularização migratória; Concessão de residência não como discricionariedade do Estado mas como um direito do migrante; Acesso à serviços,  como educação, desvinculado da regularização migratória; Criação de um mecanismo de acolhida humanitária para atender fluxos pontuais de migração internacional; Direito aos Migrantes com dificuldades financeiras de serem isentos do pagamento de taxas de regularização[11].

Merece destaque igualmente, a Declaração de Cartagena, com a qual o Brasil se comprometeu, que elenca entre as possibilidades de concessão de refúgio as “graves e generalizadas violações de direitos humanos”. Poder-se-ia dizer que essa abertura consolida um avanço na aceitação de refugiados, contudo o teor discricionário e de livre interpretação da sua aplicação não efetivou avanços na política migratória brasileira, que deixa nas mãos de agentes nem sempre preparados as decisões de aceitação de refúgio.

O Ministério da Justiça preside o COMITÊ NACIONAL PARA REFUGIADOS (CONARE), que direciona a política para refugiados e decide colegiadamente sobre a aceitação ou não das solicitações de refúgio. Além do citado ministério que o preside, é composto pelo Ministério das Relações Exteriores, que ocupa a vice-presidência, Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério da Saúde, Ministério da Educação, Polícia Federal e a sociedade civil, com direito a voz mas não a voto, representada pela Cáritas e pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR).

O comitê tem suas decisões realizadas por maioria simples de votantes exclusivamente estatais, das quais se aceita ou rejeita petições de refúgio e se outorga aos declarados refugiados a documentação que chancela residência legal no país, trabalho registrado e acesso a determinados serviços públicos como os de ensino superior e os de maior complexidade de saúde.

Atualmente, existem mais de quatro mil refugiados de 70 nacionalidades reconhecidos pelo governo brasileiro. Em sua maioria, são oriundos do continente africano (78%). No período de 1998 à fevereiro de 2005, como demonstrado pelos dados contidos no artigo de Milesi (2005), o CONARE apresentou os seguintes números de solicitações indeferidas de refugiados africanos: 834, 49% em comparação às deferidas (863), que equivalem a 51%, além do que, 74 refugiados estatutários perderam a sua condição, pois, segundo membros da instituição, isto acontece quando refugiados se envolvem com atividades ilícitas. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 16).

            Em muitos casos, indefere-se a condição de refugiado pelo entendimento de que os solicitantes são migrantes econômicos, e não comprovam os critérios de fundado temor de perseguição, previsto na Convenção da ONU de 1951, nem de grave violação de direitos humanos, da Declaração de Cartagena.

Muito se contesta, porém, a compreensão desses critérios frente à realidade de cada peticionário. As contingências por quais passam e o momento sociopolítico de seus países exigem avaliações capacitadas, sensíveis e afinadas com a proteção da dignidade humana. Ademais, às vezes não é bem clara a distinção entre migração econômica e migração oriunda de perseguição quando ambas estão amalgamadas.

No contato que tivemos com alguns dos africanos que tiveram sua solicitação de refúgio rejeitada, muitos afirmam que não tinham o conhecimento da legislação brasileira sobre a concessão do refúgio; não foram comunicados pelas autoridades sobre os critérios da concessão; desconheciam que o fato do “fundado temor de perseguição” era uma variável central no processo de concessão do refúgio; em contrapartida, afirmavam sofrer algum tipo de perseguição em seus países de origem. De acordo com Derderian e Schockaert (2010), a terminologia e distinção entre refugiados políticos e migrantes econômicos permanece, em grande medida, em construções artificiais, se considerarmos que ambos pegam a mesma rota de fuga; se considerarmos que uma pessoa que também é perseguida politicamente também pode sofrer formas de sanção ou exclusão econômica antes de passar por outros registros de violência simbólica, material ou psíquica. A relação entre as duas categorias é intrínseca. Não dá para reduzir toda esta complexidade de vida a “mentirosos” ou “falsos refugiados”, caracterizando-os por migrantes “econômicos”. Para a análise do processo de concessão do refúgio é necessário compreendermos alguns aspectos (por mais que se tenha o Grupo de Estudos Prévios (GEP) e outras instituições que forneçam subsídios acerca da situação política dos países para os membros do CONARE): como foi conduzida a entrevista? Qual a percepção e conhecimento que os entrevistadores dos solicitantes de refúgio, assim como os membros do CONARE possuem sobre migrações internacionais? O que conhecem sobre a complexidade do continente africano? Qual o conhecimento que eles possuem sobre o país e a região de origem do solicitante? (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 16).

O termo refugiado poderia ser estendido a esses “migrantes (forçados) socioeconômicos”, que também fogem da violação de seus direitos humanos. Mas, mesmo com a definição ampliada de “Refugiado” da Declaração de Cartagena (1984) – segundo a qual o termo se aplica também a “todas as pessoas que fogem dos seus países porque sua vida, segurança ou liberdade encontra-se ameaçada pela violência generalizada, agressão estrangeira, conflitos internos, violação massiva dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham afetado gravemente a ordem pública”, os migrantes que fogem à violação de seus direitos econômicos e sociais não são considerados refugiados e não há no momento perspectiva de mudança nessa situação.

Na verdade, esse não reconhecimento do migrante “socioeconômico” é consequência da tendência ao não reconhecimento dos direitos econômicos e sociais como verdadeiros direitos humanos. Donde conclui-se, embora pareça estranho, que para efeitos de refúgio, a violação massiva dos direitos humanos não inclui direitos econômicos e sociais, somente direitos civis e os políticos. Três por cento da população mundial reside fora de seu país de origem ou de nacionalidade. Sessenta por cento dos migrantes do mundo vivem em países mais desenvolvidos (aproximadamente 1,4 milhão de pessoas por ano dirigem-se para os países desenvolvidos, segundo relatório da OIT) (4). Desses, 56 milhões estão na Europa. Em alguns países europeus, como Luxemburgo e Suíça, eles chegam a representar 25% da força de trabalho[12]. Isso, no entanto, não se reflete na garantia de direitos, concedidos normalmente apenas aos nacionais dos países receptores.

Para evitar inadequação na concessão do status de refugiado, as reuniões necessitariam ser monitoradas pela sociedade civil e com grande transparência em todo o processo. Entidades do movimento negro solicitaram, Em 2005, numa reunião com a Secretaria de Promoção e Igualdade Racial (SEPPIR), que tivessem um assento no CONARE, para que os solicitantes africanos de refúgio pudessem ter suas especificidades representadas no Comitê. Além disso, reivindicaram também a participação como observadores, mas isso não foi concretizado ainda.

            O alto índice de indeferimento de refúgio repercute gravemente na sociedade devido ao aumento do contingente de migrantes considerados ilegais pelo Estatuto do Estrangeiro. Por consequência não têm identificações nem podem assinar carteira de trabalho. Por serem sobremaneira excluídos são vulneráveis ao tráfico humano, conforme alerta o Protocolo de Palermo, e ao trabalho escravo. O Estado lhes é distante, não possuindo políticas específicas nem dados numéricos desse grupo, enquanto as entidades não governamentais, algumas atuando nobremente no limite da capacidade, não abarcam a dimensão do problema.

O acúmulo de exclusão agrava os problemas de um país, com distúrbios vindos à tona cedo ou tarde. Outras experiências violadoras de migração no decorrer de poucas gerações, como as da Europa, guardadas as devidas circunstâncias históricas e sociais, devem alertar o Brasil para uma postura condizente com o respeito aos seres humanos, o cumprimento das normas internacionais pertinentes à questão, e a atuação de políticas humanitariamente previdentes das mazelas sociais, incluindo políticas internacionais.

            Periodicamente o Brasil possibilita a regularização de migrantes por meio de Anistia. No Brasil, a política imigrantista[13] é tradicionalmente voltada à obtenção de trabalhador qualificado, o que não privilegia a realidade encontrada no Brasil, em especial quanto aos não documentados.

A última Anistia, lei 11.961 sancionada em 2009, direcionava-se aos imigrantes que aqui tinham chegado até 1º de fevereiro de 2009, podendo dar entrada na primeira fase do processo de solicitação até 31 de dezembro do mesmo ano.  Tratando-se dessa Anistia exemplifica-se a dificuldade dos grupos que encontram barreiras quase intransponíveis para a regularização, haja vista ela ter beneficiado apenas pequena parcela de imigrantes, especialmente no que se refere a africanos, conquanto se afirme que uma anistia eficiente é uma forma importante de inserção dos migrantes.

Os dados citados no artigo do IBGE acerca da imigração africana são de africanos com algum tipo de documentação, os legalizados; no entanto, estimar o fenômeno de africanos clandestinos é um grande desafio, pois não há estes dados. O que existe são os dados de fontes secundárias, como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a qual aponta que o Brasil possuía aproximadamente 600 mil imigrantes em situação ilegal, dos quais 40 mil foram anistiados em 2009 -segundo dados do Governo Federal, cerca de 7%. Entre a população africana, de acordo com dados da Polícia Federal, 2.972 obtiveram a Anistia na 1° fase (LEITE, 2009). (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 17).

            As exigências, à guisa de barreiras, e as dificuldades burocráticas presentes em tal processo de Anistia são extensões da burocracia travadora e da baixa qualidade de muitos serviços brasileiros direcionados às classes baixas. Ressalta-se nessa Anistia a imposição de taxas, em contradição com a realidade da maioria dos irregulares que por assim estarem compõem a fileira dos desempregados ou dos trabalhadores mal remunerados.

A mal elaborada Anistia, por desaviso ou adrede, revela a indiferença às dificuldades de vida de milhares de seres humanos.

O processo da Anistia no ano de 2009 foi marcado por muitas dificuldades (VARGEM, 2010). Entre as principais queixas dos imigrantes africanos estavam: Documentos que comprovassem a estada no Brasil antes de 1° de fevereiro de 2009; Provar que eram de um determinado país de origem, sendo que muitos consulados cobravam altas taxas para emitir um documento confirmando sua nacionalidade; Falta de representação diplomática. Algumas nacionalidades não tinham representação no Brasil, ou seja, para emitir um comprovante que dizia que era de um determinado país, o valor era altíssimo; Nos órgãos brasileiros era necessário o pagamento da taxa para expedição da Carteira de Identidade de Estrangeiro (CEI), que era de R$31,05 e a taxa de registro no valor de R$64,68. No entanto, muitos não tinham este dinheiro para pagar, pois na condição de imigrantes ilegais estavam desempregados ou trabalhavam clandestinamente por valores muito baixos. Num núcleo familiar com pai, mãe e filho, o valor per capita para o pagamento da taxa era exorbitante; A Defensoria Pública da União tentou anular o pagamento das taxas e obteve êxito em alguns casos; Por estarem ilegais, tinham medo de se expor na Polícia Federal e resultar na deportação; Falta de intérpretes nos órgãos responsáveis. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 18).

Contudo, além do fato de pelo menos uma parcela de africanos e outros terem conseguido a regularização, o processo ensejou organizações e encontros em que se problematizaram e mais se evidenciaram às várias questões dos imigrantes, o que serve como subsídio e estímulo para a cobrança de anistias mais profícuas e abrangentes.

A campanha da Anistia de 2009 foi importante, pois pudemos notar, ainda que de forma tímida, a presença de dezenas de africanos problematizando a situação as quais estavam inseridos, e reclamaram da falta de interlocução com o poder público. Os imigrantes e refugiados africanos não possuem um espaço institucional para falar o que pensam e se tornam objetos de algumas políticas públicas estabelecidas. O extinto Comitê Paulista para Imigrantes e Refugiados, surgido no início de 2009 e alocado até então na Comissão Municipal de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo era inovador, pois qualquer estrangeiro podia dar a sua opinião e participar do fomento de políticas públicas; tinha direito a voz, fato que não acontece com os outros Comitês que tratam desta temática. Na época da campanha da Anistia acompanhamos alguns africanos que abdicaram do direito de solicitar o refúgio e optaram pela anistia, pois era uma via mais fácil e a probabilidade era maior de se obter a tão almejada cidadania no Brasil. (MALOMALO, FONSECA, BADI, 2015, p. 18).

O corpo jurídico, incluindo os Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário, insere o país entre os juridicamente protetores da dignidade dos migrantes, colocando-os como credores do amparo estatal.

5 CONCLUSÃO

Ao tratarmos de migração econômica e refúgio, pode-se dizer que as adversidades da vida sempre foram forças motrizes ao deslocamento humano. Na paisagem antropológica do globo, constatamos pluralidades e miscelâneas de culturas, etnias, fenótipos e modos de vida relativamente distintos. Em contrapartida, socioeconomicamente prepondera-se uma homogeneização mundial da força do capital, que divide papéis e aprofunda desigualdades, percebidas entre favelas de Fortaleza, Luanda, Madri e redutos milionárias dos mesmos países, bem como na Divisão Internacional do Trabalho e nos abismos econômicos entre continentes.

Segundo a Agência da ONU para os Refugiados morreram, em 2014, 3.419 migrantes que tentaram chegar à Europa. O último naufrágio se deu com um barco nas águas territoriais da Itália com 700 pessoas a bordo[14].

Tais circunstâncias, locais e internacionais, somadas a guerras e perseguições, enquanto permanecerem ensejarão a migração como projeto de sobrevivência ou melhoria de vida. Os africanos nesse contexto estão especialmente vulneráveis, pois sentem a “mundialização” do racismo, sedimentado por séculos de colonialismo realizado por nações que até hoje se articulam para a permanência das desigualdades internacionais.

Hoje as relações de domínio entre povos têm outra indumentária e complexidade, desfazê-las passa pela mudança do sistema econômico mundial, não excluindo lutas em todos os âmbitos pela dignidade individual e coletiva.

A destituição de regimes despóticos, o investimento em educação e cultura libertárias, a saúde coletiva, a dignidade humana e a valorização identitária em trocas proveitosas com culturas externas aguardam as mobilizações, reformas ou revoluções progressistas dos povos da África bem como o auxílio internacional de caráter autonomista e edificante.

Quanto ao aspecto jurídico brasileiro frente a questão da migração internacional, há que dizer que a distância entre a lei e a sua aplicação no âmbito dos direitos humanos expõe o grau de organização social e respeito à vida. A par disso, o Brasil se mostra um celeiro demandas sociais, espelhando aos países em desenvolvimento suas lutas e esperanças.

As conquistas progressistas da dignidade humana aqui realizadas refletem positivamente aos povos irmãos, bem como o regresso e a concessão aos movimentos opressores dão ensejos a desesperanças no quadro mundial de concentração de renda, miséria, guerras locais e ações políticas que instrumentalizam o homem à economia, em vez do contrário. A responsabilidade brasileira é global.

Nossa política migratória deve ter papel de ponte ao mundo por onde possam passar os refugiados de guerra, os fustigados por governos autoritários, os excluídos dos recursos de sobrevivência, assim como os desejosos de formação acadêmica, de trabalho e de renda, retornando ou não a seus países.

Não se propõe o Brasil como sanador da problemática migratória mundial, mas um país exemplo, ante o qual podem seguir outros, que atuem, dentro dos limites socioeconômicos realmente possíveis, como acolhedor responsável dos que necessitam migrar. Tendo sempre em vista que o que se deve sanar prioritariamente são as causas das migrações necessárias, a ser feito pelos respectivos povos com contribuições técnicas, econômicas e humanitárias suficientes de organizações internacionais e de países bem intencionados.

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Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direitos Humanos.

Orientação: Prof. Dr. Newton de Menezes Albuquerque.

                      

1. Migração – África. 2. Direitos humanos. 3. Imigrantes. I. Albuquerque, Newton de Menezes (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

                                                                                                           CDD 341.48



[14] Essa tragédia ocorreu em 19/04/2015, poucos dias depois doutra que matou cerca 400 pessoas próximo à costa da Líbia. Em vez de se oportunizar ações oficiais direcionadas às causas das migrações e às políticas internas de inserção humana, recrudesceram respostas bélicas, restricionistas e eleitoreiras dos governos europeus, que não cessarão o hercúleo fluxo dos desesperados e aumentarão os conflitos e o desrespeito aos direitos humanos.  http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/Migracao-ajuda-humanitaria-e-capital/7/33331

Como citar e referenciar este artigo:
NETO, Francisco Jacy Luz. Atual Migração Africana para o Brasil e Direitos Humanos. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2015. Disponível em: https://investidura.com.br/obras/monografias/atual-migracao-africana-para-o-brasil-e-direitos-humanos/ Acesso em: 26 jul. 2024
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