AP 470 ? Voto do presidente do STF conclui julgamento do item III da denúncia
Último a votar acerca do desvio de dinheiro nos contratos firmados pelas agências de publicidade de Marcos Valério e seus sócios (SMP&B e DNA) com a Câmara dos Deputados e com o Banco do Brasil, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ayres Britto, acompanhou integralmente o voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa, e votou pela condenação dos réus João Paulo Cunha e Henrique Pizzolato (por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro) e Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach (por corrupção ativa e peculato).
Quanto a esse item, o ministro ressaltou que “a leitura atenta dos mais de 200 volumes e apensos permite ao magistrado concluir pela comprovação dos delitos contra a Administração Pública cometidos pelos denunciados Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach. Henrique Pizzolato e João Paulo Cunha. Mais que isso: ficam comprovadas a materialidade e a autoria do delito de lavagem de dinheiro por parte dos réus Henrique Pizzolato e João Paulo Cunha. Em síntese que procuro apertar, anoto que a ambiência factual retratada pelas provas periciais, testemunhais e de uma maneira geral, documentais, permite ainda a individualização das condutas protagonizadas pelos denunciados ou réus que, comprovadamente, materializaram os delitos listados neste capítulo da inicial acusatória”, afirmou.
O presidente rejeitou o argumento das defesas dos sócios de Marcos Valério de que teriam sido denunciados apenas por conta do vínculo societário. O ministro Ayres Britto lembrou que o fato de as pessoas se reunirem numa sociedade comercial, com o objetivo de praticar atos empresariais lícitos, não configura formação de quadrilha ou bando em caso de prática de crimes contra a Administração Pública e o Sistema Financeiro Nacional. Mas salientou que também há aqueles que se associam com fins empresariais lícitos e, paralelamente, cometem crimes, como no caso em questão. “De tudo que neste processo se contém, não tenho margem para dúvida quanto às ações de Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach para consumação dos desvios de recursos públicos da Câmara dos Deputados e do Banco do Brasil”, asseverou.
Para o presidente do STF, as provas constantes nos autos não deixam dúvida quanto aos papéis desempenhados pelo então presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, e pelo então diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato. “As posições funcionais ocupadas por João Paulo Cunha e Henrique Pizzolato na Câmara dos Deputados e no Banco do Brasil, respectivamente, foram decisivamente utilizadas para beneficiar ilicitamente as empresas do grupo de Marcos Valério”, afirmou. “Penso que se deu, no caso, mercancia de função pública”, disse o ministro, acrescentando que Cunha e Pizzolato detinham “a disponibilidade jurídica dos valores ilicitamente desviados da Câmara dos Deputados e do Banco do Brasil”.
O ministro Ayres Britto fez considerações sobre as divergências entre o laudo do Instituto Nacional de Criminalística e acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) a respeito da imputação de peculato decorrente do desvio dos chamados “bônus de volume” no contrato da DNA Propaganda e o Banco do Brasil. Para ele, o laudo prevalece sobre o acórdão do TCU. “No caso, o que me parece, é que a instância penal, validamente conduzida, concluiu por modo diverso daquele veiculado por decisão do Tribunal de Contas da União. A minha conclusão é a de que, no caso, diante dessa divergência, desse confronto de apreciação sobre os mesmos fatos, o que deve ser levado em consideração pelo magistrado é o quadro factual devidamente provado pela instância penal”, observou.
Quanto ao mesmo tema, o ministro fez ainda considerações sobre a Lei 12.232/2010, que dispõe sobre as normas gerais para licitação e contratação pela Administração Pública de serviços de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda. A norma foi invocada em defesa dos réus Marcos Valério e seus sócios, que afirmam que os chamados “bônus de volume” pertencem às agências, e não ao contratante. O presidente do STF observou que o anteprojeto de lei, de autoria do então deputado José Eduardo Cardozo (atual ministro da Justiça), não previa qualquer efeito retroativo à norma.
Uma emenda inseriu no anteprojeto o artigo que estendeu os efeitos da lei “às empresas que possuem regulamento próprio de contratação, às licitações já abertas, aos contratos em fase de execução e aos efeitos pendentes dos contratos já encerrados na data de sua publicação”. O presidente do STF qualificou o dispositivo como “um atentado veemente, desabrido e escancarado” ao artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, segundo o qual “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
VP/AD
Fonte: STF