OAB/ES

OAB-ES e Fórum Direito à Verdade e à Memória vão apoiar a investigação da Comissão da Verdade

17 | 05 | 2012

OAB-ES e Fórum Direito à Verdade e à Memória vão apoiar a investigação da Comissão da Verdade

“Ao instalar a Comissão da Verdade não nos move o revanchismo, o ódio ou o desejo de reescrever a história de uma forma diferente do que aconteceu, mas nos move a necessidade imperiosa de conhecê-la em sua plenitude, sem ocultamentos, sem camuflagens, sem vetos e sem proibições”. Este é apenas um trecho do discurso emocionado da presidente Dilma Rousseff, durante a instalação da Comissão da Verdade, solenidade realizada nesta quarta-feira (16).

Abaixo você confere a íntegra do discurso da presidente Dilma Rousseff.

Formada por sete integrantes, a Comissão da Verdade terá a missão de investigar violações aos direitos humanos ocorridos entre os anos de 1946 e 1988, período popularmente conhecido como “Anos de Chumbo”.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Espírito Santo (OAB-ES), Homero Junger Mafra, sempre defendeu a abertura dos arquivos da ditadura militar. “É preciso que a busca pelos desaparecidos políticos seja contínua, permanente, incessante e não mero ato retórico de governantes que eleitos no tempo da liberdade têm um medo fóbico de enfrentar aqueles que destruíram a democracia em nosso país. Sem esse reencontro necessário com a história, nossa democracia nunca será plena”, afirmou Homero Mafra já em seu discurso de posse.

O subsecretário da Secretaria Estadual de Direitos Humanos, Perly Cipriano, esteve na cerimônia de instalação da Comissão da Verdade, em Brasília. Para o subsecretário o momento é histórico. “O Brasil dá um forte passo para encontrar consigo mesmo. Esta é a consolidação da democracia do Brasil, o país precisa conhecer os horrores desse passado recente, das prisões arbitrárias, das torturas, dos esquartejamentos, dos desaparecimentos, das ocultações de cadáveres, mas mais que isso, é preciso conhecer como todas as instituições do país foram infectadas pela ditadura” Perl Cipriano continuou, “esse é um momento que será lembrado por todas as gerações e o Espírito Santo fará com certeza a sua parte. Nós precisamos andar no mundo de cabeça erguida, não temos um passado oculto, não vamos mudar o passado, mas é preciso conhecê-lo para caminhar e evitar que tudo isso volte a acontecer”.

O membro do Fórum Direito à Verdade e à Memória, Francisco Celso Calmon, também esteve em Brasília. Mais de quarenta anos depois de ter sido preso e torturado pelos militares, Francisco Calmon afirma que se emocionou durante a solenidade. “Foi uma emoção muito grande estar lá na cerimônia, um filme passou pela cabeça… quando a Dilma me cumprimentou de longe, naquele momento me veio o pai da filha dela que foi um companheiro, minha primeira esposa que foi uma companheira, tanto que eu só sorri, eu nem consegui retribuir e os meus olhos ficaram umedecidos”, conta o advogado, que participou do mesmo grupo de resistência política da presidente Dilma Roussef.

Francisco Calmon acredita que os membros da Comissão da Verdade terão muito trabalho nesses dois anos de atuação. “Para alcançar seus objetivos em dois anos a Comissão vai ter que contar com a colaboração de todos e nesse sentido o Fórum pela Memória e pela Verdade aqui do Estado, que tem a atuação da OAB-ES, vai aumentar a pressão junto ao Governo do Estado para que seja criada a Comissão Estadual da Verdade, no sentido de colaborar com a Comissão Nacional. Vamos continuar pressionando também para que o Estado peça desculpas e indenize aqueles que em seu território foram perseguidos e mortos pela ditadura militar. Já inclusive encaminhamos ao governo uma minuta de Projeto de Lei que trata dessas questões”.

Ele ainda acrescenta: “São Paulo já tem comissão estadual criada pela iniciativa do legislativo, Pernambuco também com iniciativa do executivo. O nosso estado não pode ficar para trás. O importante é termos respostas para mortos não sepultados, desaparecidos sem nomes… temos que acabar com tudo isso e ver a história reescrita de forma correta”.

“A Comissão da Verdade vem junto com a Lei de Acesso à Informação, que será um grande impulso da visão republicana que temos que ter”, lembra Perly Cipriano.

A presidente Dilma enfatizou a importância da Lei de Acesso à Informação em seu discurso. “A nova lei representa um grande aprimoramento institucional para o Brasil, expressão da transparência do Estado, garantia básica de segurança e proteção para o cidadão. Por essa lei, nunca mais os dados relativos à violações de direitos humanos poderão ser reservados, secretos ou ultrassecretos”.

Para o presidente da OAB-ES, Homero Mafra, o momento é importantíssimo para a história do Brasil, mas principalmente para as famílias dos brasileiros que sofreram com a ditadura militar. “As feridas jamais serão fechadas enquanto houver pessoas desaparecidas, sem que as famílias saibam onde estão os corpos. É preciso que a sociedade brasileira saiba quando, onde, como e porque. É preciso que essas respostas sejam dadas e acredito que agora serão.”

LEIA O DISCURSO DE DILMA

Senhor Michel Temer, vice-presidente da República, senhores ex-presidentes da República: senador José Sarney, ex-presidente da República e presidente do Senado Federal; senhor Fernando Collor de Mello, ex-presidente da República; senhor Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República; senhor Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República; deputado Marco Maia, presidente da Câmara dos Deputados, ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal, senhor Dipp Lângaro, aliás, desculpa, Gilson Lângaro Dipp, representante membro do Supremo [Superior] Tribunal de Justiça, e representante aqui da Comissão da Verdade, senhoras e senhores ministros de Estado aqui presentes.

Eu cumprimento todos ao cumprimentar a Gleisi Hoffmann, da Casa Civil; o José Eduardo Cardozo, da Justiça; o Luís Inácio Adams, da Advocacia-Geral da União; e a Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos; e o embaixador Celso Amorim, da Defesa. Senhores ex-ministros da Justiça: Fernando Lyra, senador Aloysio Nunes Ferreira, senador Renan Calheiros e o integrante da Comissão da Verdade, que foi responsável pela fala que dá início a esta cerimônia, que é José Carlos Dias. Queria cumprimentar também os senhores e senhoras senadores aqui presentes, ao saudar o senador Eduardo Braga, líder do governo no Senado Federal. Cumprimentar as senhoras e senhores deputados federais, cumprimentando o deputado Arlindo Chinaglia. Cumprimentar também o senhor Roberto Gurgel, procurador-geral da República, o ministro João Oreste Dalazen, presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

Cumprimentar aqui também o senhores comandantes das Forças: almirante Júlio Soares de Moura Neto, da Marinha; general Enzo Martins Peri, do Exército; brigadeiro Juniti Saito, da Aeronáutica; general José Carlos De Nardi, do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas. Senhoras e senhores membros da Comissão da Verdade Cláudio Fontelles, Gilson Lângaro Dipp, José Carlos Dias, José Paulo Cavalcanti Filho, Maria Rita Kehl, Paulo Sérgio Pinheiro, Rosa Maria Cardoso da Cunha. Queria cumprimentar todos os prefeitos aqui presentes saudando o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati. Cumprimentar o coordenador residente das Nações Unidas no Brasil, Jorge Chediek. Cumprimentar o senhor Amerigo Incalcaterra, representante regional do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos, por intermédio de que cumprimento todos os demais representantes de Organismos Internacionais. Cumprimentar todas as senhoras e senhores representantes de entidades de defesa dos direitos humanos, senhoras e senhores familiares, senhoras e senhores jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas.

Senhoras e senhores.

Eu queria iniciar citando o deputado Ulysses Guimarães que, se vivesse ainda, certamente, ocuparia um lugar de honra nessa solenidade.

O senhor diretas, como aprendemos a reverenciá-lo, disse uma vez: “a verdade não desaparece quando é eliminada a opinião dos que divergem. A verdade não mereceria este nome se morresse quando censurada.” A verdade, de fato, não morre por ter sido escondida. Nas sombras somos todos privados da verdade, mas não é justo que continuemos apartados dela à luz do dia.

Embora saibamos que regimes de exceção sobrevivem pela interdição da verdade, temos o direito de esperar que, sob a democracia, a verdade, a memória e a história venha à superfície e se torne conhecidas, sobretudo, para as novas e as futuras gerações.

A palavra verdade, na tradição grega ocidental, é exatamente o contrário da palavra esquecimento. É algo tão surpreendentemente forte que não abriga nem o ressentimento, nem o ódio, nem tampouco o perdão. Ela é só e, sobretudo, o contrário do esquecimento. É memória e é história. É a capacidade humana de contar o que aconteceu.

Ao instalar a Comissão da Verdade não nos move o revanchismo, o ódio ou o desejo de reescrever a história de uma forma diferente do que aconteceu, mas nos move a necessidade imperiosa de conhecê-la em sua plenitude, sem ocultamentos, sem camuflagens, sem vetos e sem proibições.

O que fazemos aqui, neste momento, é a celebração da transparência da verdade de uma nação que vem trilhando seu caminho na democracia, mas que ainda tem encontro marcado consigo mesma. Nesse sentido… E nesse sentido fundamental, essa é uma iniciativa do Estado brasileiro e não apenas uma ação de governo.

Reitero hoje, celebramos aqui um ato de Estado. Por isso, muito me alegra estar acompanhada por todos os presidentes que me antecederam nestes 28 benditos anos. Por isso, muito me alegra estar acompanhada por todos os presidentes que me antecederam nestes 28 benditos anos de regime democrático.

Infelizmente, não nos acompanha o presidente Itamar Franco, a quem rendo as devidas homenagens, por sua digna trajetória. Por sua digna trajetória de luta pelas liberdades democráticas, assim como pelo zelo com que governou o Brasil, sem qualquer concessão ao autoritarismo.

Cada um de nós aqui presentes –ex-presidentes, ex-ministros, ministros, acadêmicos, juristas, militantes da causa democrática, parentes de mortos desaparecidos e mesmo eu, uma presidenta– cada um de nós, repito, é igualmente responsável por esse momento histórico de celebração.

Cada um de nós deu a sua contribuição para esse marco civilizatório, a Comissão da Verdade. Esse é o ponto culminante de um processo iniciado nas lutas do povo brasileiro, pelas liberdades democráticas, pela anistia, pelas eleições diretas, pela Constituinte, pela estabilidade econômica, pelo crescimento com inclusão social. Um processo construído passo a passo, durante cada um dos governos eleitos, depois da ditadura.

A Comissão da Verdade foi idealizada e encaminhada ao Congresso no governo do meu companheiro de jornada, presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem tive a honra de servir como ministra e a quem tenho o orgulho de suceder. Mas ela tem sua origem, também, na Lei da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos, aprovada em 1995, na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Naquela oportunidade, o Estado brasileiro reconheceu, pela primeira vez, a sua responsabilidade pelos mortos de desaparecidos sob sua custódia. Pelos mortos de desaparecidos sob sua custódia durante o regime autoritário.

No entanto, é justo que se diga que o processo que resultou na Comissão da Verdade teve início ainda antes disso, durante o mandato do presidente Fernando Collor, quando foram abertos os arquivos do DOPS de São Paulo e do Rio de Janeiro, trazendo a público toneladas de documentos secretos que, enfim, revelados representaram um novo alento aos que buscaram informações sobre as vítimas da ditadura.

O Brasil deve render homenagens às mulheres e aos homens que lutaram pela revelação da verdade histórica. Aos que entenderam e souberam convencer a nação de que o direito à verdade é tão sagrado quanto o direito que muitas famílias têm de prantear e sepultar seus entes queridos, vitimados pela violência praticada pela ação do Estado ou por sua omissão.

É por isso, é certamente por isso que estamos todos juntos aqui. O nosso encontro, hoje, em momento tão importante para o país, é um privilégio propiciado pela democracia e pela convivência civilizada. É uma demonstração de maturidade política que tem origem nos costumes do nosso povo e nas características do nosso país.

Tanto quanto abomina a violência e preza soluções negociadas para as suas crises, o Brasil certamente espera que seus representantes sejam capazes de se unir em torno de objetivos comuns, ainda que não abram mão, mesmo que mantenham opiniões divergentes sobre outros temas, o que é normal na vida democrática.

Ao convidar os sete brasileiros que aqui estão e que integrarão a Comissão da Verdade, não fui movida por critérios pessoais nem por avaliações subjetivas. Escolhi um grupo plural de cidadãos, de cidadãs, de reconhecida sabedoria e competência. Sensatos, ponderados, preocupados com a justiça e o equilíbrio e, acima de tudo, capazes de entender a dimensão do trabalho que vão executar. Trabalho que vão executar – faço questão de dizer –com toda a liberdade, sem qualquer interferência do governo, mas com todo apoio que de necessitarem.

Quando cumpri minha atribuição de nomear a Comissão da Verdade, convidei mulheres e homens com uma biografia de identificação com a democracia e aversão aos abusos do Estado. Convidei, sobretudo, mulheres e homens inteligentes, maduros e com capacidade de liderar o esforço da sociedade brasileira em busca da verdade histórica, da pacificação e da conciliação nacionais.

O país reconhecerá nesse grupo, não tenho dúvidas, brasileiros que se notabilizaram pelo espírito democrático e pela rejeição à confrontos inúteis ou gestos de revanchismo.

Nós reconquistamos a democracia a nossa maneira, por meio de lutas e de sacrifícios humanos irreparáveis, mas também por meio de pactos e acordos nacionais, muitos deles traduzidos na Constituição de 1988.

Assim como respeito e reverencio os que lutaram pela democracia enfrentando bravamente a truculência ilegal do Estado, e nunca deixarei de enaltecer esses lutadores e lutadoras, também reconheço e valorizo pactos políticos que nos levaram à redemocratização.

Senhoras e senhores,

Hoje também passa a vigorar a Lei de Acesso à Informação. Junto com a Comissão da Verdade, a nova lei representa um grande aprimoramento institucional para o Brasil, expressão da transparência do Estado, garantia básica de segurança e proteção para o cidadão.

Por essa lei, nunca mais os dados relativos à violações de direitos humanos poderão ser reservados, secretos ou ultrassecretos. As duas –a Comissão da Verdade e a Lei de Acesso à Informação– são frutos de um longo processo de construção da democracia, de quase três décadas, do qual participaram sete presidentes da República. Quando falo sete presidentes é porque estou incluindo por justiça, e porque o motivo do nosso encontro é a celebração da verdade, o papel fundamental desempenhado por Tancredo Neves, que soube costurar, com paciência competência e obstinação, a transição do autoritarismo para a democracia que hoje usufruímos.

Transição é imperativo que se lembre aqui conduzida com competência, habilidade e zelo pelo presidente José Sarney, que o destino e a história puseram no lugar de Tancredo, e que nos conduziu à democracia.

Mas, mesmo reconhecendo o papel que todos desempenharam, não posso deixar de declarar o meu orgulho, por coincidir com meu governo o amadurecimento de nossa trajetória democrática. Por meio dela, o Estado brasileiro se abre, mais amplamente, ao exame, à fiscalização e ao escrutínio da sociedade.

A Lei de Acesso à Informação garante o direito da população a conhecer os atos de governo e de estado por meio das melhores tecnologias de informação.

A transparência a partir de agora obrigatória, também por lei, funciona como o inibidor eficiente de todos os maus usos do dinheiro público, e também, de todas as violações dos direitos humanos. Fiscalização, controle e avaliação são a base de uma ação pública ética e honesta.

Esta é a razão pela qual temos o dever de construir instituições eficientes e providas de instrumentos que as tornem protegidas das imperfeições humanas.

Senhoras e senhores,

Encerro com um convite a todos os brasileiros, independentemente do papel que tiveram e das opiniões que defenderam durante o regime autoritário. Acreditemos que o Brasil não pode se furtar a conhecer a totalidade de sua história. Trabalhemos juntos para que o Brasil conheça e se aproprie dessa totalidade, da totalidade da sua história.

A ignorância sobre a história não pacifica, pelo contrário, mantêm latentes mágoas e rancores. A desinformação não ajuda apaziguar, apenas facilita o trânsito da intolerância. A sombra e a mentira não são capazes de promover a concórdia. O Brasil merece a verdade. As novas gerações merecem a verdade, e, sobretudo, merecem a verdade factual aqueles que perderam amigos e parentes e que continuam sofrendo como se eles morressem de novo e sempre a cada dia.

É como se disséssemos que, se existem filhos sem pais, se existem pais sem túmulo, se existem túmulos sem corpos, nunca, nunca mesmo, pode existir uma história sem voz. E quem dá voz à história são os homens e as mulheres livres que não têm medo de escrevê-la. Atribui-se a Galileu Galilei uma frase que diz respeito a este momento que vivemos: “a verdade é filha do tempo, não dá autoridade.”

Eu acrescentaria que a força pode esconder a verdade, a tirania pode impedi-la de circular livremente, o medo pode adiá-la, mas o tempo acaba por trazer a luz. Hoje, esse tempo chegou.

 

 

Fonte: OAB/ES

Como citar e referenciar este artigo:
NOTÍCIAS,. OAB-ES e Fórum Direito à Verdade e à Memória vão apoiar a investigação da Comissão da Verdade. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2012. Disponível em: https://investidura.com.br/noticias/oabes/oab-es-e-forum-direito-a-verdade-e-a-memoria-vao-apoiar-a-investigacao-da-comissao-da-verdade/ Acesso em: 15 out. 2025
Sair da versão mobile