Teses Jurídicas

Modelo de tese jurídica – O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero, razão pela qual a pessoa transgênero tem direito à alteração do prenome e do sexo no registro civil

Tema: Direito Constitucional

Subtema: Igualdade

Tese: O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero, razão pela qual a pessoa transgênero tem direito à alteração do prenome e do sexo no registro civil. 

Aplicação: Petição inicial em processos judiciais de jurisdição voluntária que objetivem autorização judicial para alteração de prenome e de sexo de pessoas transgêneros.

Conteúdo da tese jurídica:

I. DIREITO À ALTERAÇÃO DE PRENOME E SEXO NO REGISTRO CIVIL. INTERPRETAÇÃO DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DO PACTO DE SAN JOSÉ DA COSTA RICA.

A Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos) define, em seu artigo 58, que o prenome é definitivo, podendo ser substituído no caso de apelidos notórios, avaliados caso a caso[1]. Ou seja, regra geral, o prenome deve ser mantido, ressalvada a possibilidade já legalmente prevista da hipótese de existência de apelido notório.

A exceção já prevista pela lei demonstra que a regra não é absoluta e indistinta em todos os casos, e, portanto, comporta aferição em termos de adequação aos preceitos constitucionais. Notadamente, no presente caso, refere-se à autorização para mudança de prenome e de sexo por se tratar de pessoa transgênero.

A parte autora é pessoa transgênero, ou seja, identifica-se, do ponto de vista psicológico, com o gênero oposto ao seu biológico e, por isso, pretende alterar seu prenome no registro civil para um que condiga com a realidade em que se apresenta e em que vive.

Ora, a parte autora, em razão do prenome constante em seus documentos, tem vivido diversas situações de constrangimento, nas quais seu nome é chamado em público, por exemplo, e as pessoas presentes demonstram incredulidade quando se levanta e se apresenta, chegando ao ponto de recusar atendimento por acreditar que se trata de alguma espécie de fraude.

O mesmo é verdadeiro em relação à sua vivência profissional. Quando envia o currículos e diplomas de qualificação, costuma atender às expectativas do seu potencial empregador e ser convocada paras as demais etapas de avaliação, inclusive entrevista. No entanto, ao ser convocada para entrevista e ser constatado que o prenome de registro e gênero assentado são distintos da manifestação de gênero, as respostas são uníssonas na reprovação ao cargo pleiteado.

Por esta razão, a parte autora vem requerer reconhecimento judicial de seu direito de alteração de seu prenome e do seu sexo, ambos constantes e assentados no seu registro civil.

A interpretação que se requer do artigo 58 da Lei de Registros Públicos é aquela em conformidade com os preceitos constitucionais e supralegais que aqui se apresenta.

Em termos constitucionais, esta interpretação se fundamenta no direito à dignidade da pessoa humana, fundamento da República, previsto no inciso III do artigo 1º da Constituição Federal[2]. Além disso, este direito se baseia no inciso X do artigo 5º da Constituição Federal, que protege a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas[3].

Segundo, informe-se que há previsão na Constituição Federal, especificamente no § 2º do artigo 5º, de que os tratados internacionais firmados pelo Brasil devem ser incluídos como direitos e garantias fundamentais.

Dentre estes direitos, há o direito ao nome, previsto no artigo 18 do Pacto de São José da Costa Rica, no qual se prevê que “toda pessoa tem direito a um prenome e aos nomes de seus pais ou ao de um destes. A lei deve regular a forma de assegurar a todos esse direito, mediante nomes fictícios, se for necessário”.

No mesmo sentido, o Pacto define que “toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica”, no artigo 3º, bem como à liberdade pessoal, previsto no artigo 7.1 do Pacto, à honra e à dignidade, previsto no artigo 11.2.

Com base nestes fundamentos, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade 4275, com acórdão de relatoria do Ministro Edson Fachin, publicado em março de 2019, decidiu-se o seguinte:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL E REGISTRAL. PESSOA TRANSGÊNERO. ALTERAÇÃO DO PRENOME E DO SEXO NO REGISTRO CIVIL. POSSIBILIDADE. DIREITO AO NOME, AO RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE JURÍDICA, À LIBERDADE PESSOAL, À HONRA E À DIGNIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO OU DA REALIZAÇÃO DE TRATAMENTOS HORMONAIS OU PATOLOGIZANTES.

1. O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero.

2. A identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la, nunca de constituí-la.

3. A pessoa transgênero que comprove sua identidade de gênero dissonante daquela que lhe foi designada ao nascer por autoidentificação firmada em declaração escrita desta sua vontade dispõe do direito fundamental subjetivo à alteração do prenome e da classificação de gênero no registro civil pela via administrativa ou judicial, independentemente de procedimento cirúrgico e laudos de terceiros, por se tratar de tema relativo ao direito fundamental ao livre desenvolvimento da personalidade.

4. Ação direta julgada procedente.

Frise-se, de imediato, que a realização de cirurgia para alteração das características sexuais primárias e secundárias é irrelevante para reconhecimento do direito de alteração de prenome e sexo, bastando a comprovação de sua identidade de gênero dissonante daquela que lhe foi designada ao nascer, por autoidentificação, firmada, por exemplo, em declaração escrita desta sua vontade.

Diante do exposto, com amparo nos dispositivos da Constituição Federal citados e nos termos da Pacto de San José da Costa Rica, requer-se o reconhecimento do direito da parte autora à alteração do seu prenome constante em registro público, bem como do seu sexo, adequando ambos à realidade de reconhecimento próprio.

*É proibida a cópia ou reprodução, total ou parcial, deste conteúdo, em qualquer meio. Fica autorizada a utilização deste conteúdo exclusivamente em petições dirigidas ao Poder Judiciário ou à Administração Pública.



[1] Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios.

[2] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III – a dignidade da pessoa humana;

[3] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Como citar e referenciar este artigo:
INVESTIDURA, Portal Jurídico. Modelo de tese jurídica – O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero, razão pela qual a pessoa transgênero tem direito à alteração do prenome e do sexo no registro civil. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2022. Disponível em: https://investidura.com.br/modelos/teses-juridicas/modelo-de-tese-juridica-o-direito-a-igualdade-sem-discriminacoes-abrange-a-identidade-ou-expressao-de-genero-razao-pela-qual-a-pessoa-transgenero-tem-direito-a-alteracao-do-prenome-e-do-sexo-no-regis/ Acesso em: 19 nov. 2024
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