Tema: Direito Administrativo
Subtema: Servidor Público
Tese: É adequado o trancamento de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), por meio de mandado de segurança, quando caracterizada a ausência de motivos determinantes para a sua instauração.
Aplicação: Tese a ser incluída em mandado de segurança que objetiva o trancamento de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) em razão da ausência de motivos determinantes para a sua instauração, ou seja, ausência de justa causa.
Conteúdo da tese jurídica:
I. POSSIBILIDADE JURÍDICA DE TRANCAMENTO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD) POR MEIO DE MANDADO DE SEGURANÇA EM CASO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PRECEDENTES.
O Processo Administrativo Disciplinar (PAD) constitui espécie de procedimento administrativo sancionatório “destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido”, conforme define o artigo 148 da Lei Federal nº 8.112/1990.
Para o que interessa ao presente caso, cumpre destacar que o Processo Administrativo Disciplinar pode acarretar a aplicação de sanções administrativas gravíssimas ao servidor público, alcançando, inclusive, a possibilidade de resultar em seu próprio desligamento da Administração Pública, por demissão.
Diante do grande potencial de afetação negativa à esfera jurídica do servidor público, esta espécie de procedimento deve ser manejada com cautela pelas autoridades administrativas. A simples existência de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) acarreta consequências negativas na vida do servidor público, haja vista a necessidade de um grande dispêndio de energia e de recursos para apresentar a sua defesa e, quando inocente, para provar esta condição.
Daí a razão pela qual o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) deve ser extinto prematuramente, com a maior celeridade possível, nos casos em que não há justa causa para a sua instituição.
O trancamento do Processo Administrativo Disciplinar (PAD), no âmbito de mandado de segurança, quando inexistentes os motivos determinantes para a sua instauração, é uma medida reconhecida de forma pacífica na jurisprudência brasileira.
A propósito deste tema, cite-se o relevante e bem fundamento precedente jurisprudencial, em acórdão publicado em abril de 2019 pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), da lavra do eminente desembargador Rubens Rihl. Destaque para a fundamentação apresentada pelo desembargador, apoiada em trechos de importantes doutrinadores e na jurisprudência de outros tribunais, que vestem como luva ao presente caso:
O trancamento de Processo Administrativo Disciplinar por meio da impetração de Mandado de Segurança se mostra medida possível e adequada, desde que reste caracterizada a ausência de justa causa, de motivos determinantes para a instauração do procedimento, o que permitiria ao Poder Judiciário impedir o seguimento do ato administrativo em razão da ilegalidade patente.
É sempre oportuno lembrar os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles:
“Permitido é ao Poder Judiciário examinar o processo administrativo disciplinar para verificar se a sanção imposta é legítima e se a apuração da infração atendeu ao devido procedimento legal. Essa verificação importa conhecer os motivos da punição e saber se foram atendidas as formalidades procedimentais essenciais, notadamente a oportunidade de defesa ao acusado e a contenção da comissão processante e da autoridade julgadora nos limites de sua competência funcional, isto sem tolher o discricionarismo da Administração quanto à escolha da pena aplicável dentre as consignadas na lei ou regulamento do serviço, à graduação quantitativa da sanção e à conveniência ou oportunidade de sua imposição. O que se nega ao Judiciário é o poder de substituir ou modificar penalidade disciplinar a pretexto de fazer justiça, pois, ou a punição é legal, e deve ser confirmada, ou é ilegal, e há que ser anulada; inadmissível é a substituição da discricionariedade legítima do administrador por arbítrio ilegítimo do juiz” (Direito Administrativo Brasileiro, 26ª edição, atual., Malheiros, São Paulo, 2001, págs. 655/656). […]
Também, é da jurisprudência ser incabível no âmbito do Poder Judiciário reexame do mérito administrativo a implicar invasão da competência exclusiva da Administração, exceto quando demonstrado abuso de poder na atuação da autoridade processante ou a flagrante ilegalidade da punição, aplicada com base em situação fática inexistente (JTJ-Lex 188, pág. 146), o que não se verifica na espécie. […]
Nesse sentido, o Exmo. Min. Arnaldo Esteves de Lima fez constar em voto por ele proferido o alerta de que “tendo em vista a repercussão negativa na esfera funcional, familiar e pessoal do servidor público e, ainda, os princípios da boa-fé e da segurança jurídica, mostra-se indispensável a necessidade de justa causa para a abertura de sindicância ou processo disciplinar”. (MS 10.442/DF, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/08/2005, DJ 26/09/2005, p. 172)
Afirmação que é reforçada pela lição de Mauro Roberto Gomes de Matos:
“A boa-fé e a segurança jurídica retiram do administrador público a faculdade da instauração do procedimento administrativo genérico, sem que haja aparente transgressão aos princípios disciplinares que regem a vida funcional. Não funciona o processo disciplinar como “uma caixa de surpresas” onde a ausência de materialidade de uma possível falta funcional poderia proporcionar a instauração de inquérito administrativo para devassar a vida do servidor, no afã de se encontrar algo que possa ser usado contra ele. Não é assim que funciona”. (Lei nº 8.112/90 Interpretada e Comentada, 1ª ed., Rio de Janeiro, América Jurídica, 2005, p. 745).
Para o que interessa ao presente caso, registre-se que este não é um precedente isolado na jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Veja-se o seguinte julgado, também utilizado como referência no paradigma anterior:
Mandado de segurança. Processo administrativo. Autuação de municipalidade. Apuração de eventual culpa de servidor. Motivos determinantes não configurados. Trancamento do expediente. Sentença mantida. Recurso e reexame necessário desprovidos. (TJSP; Apelação Cível 1003500-09.2015.8.26.0236; Relator (a): Borelli Thomaz; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro de Ibitinga – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/09/2016; Data de Registro: 29/09/2016)
Como exposto na narrativa anteriormente apresentada, a instauração do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) no presente caso não foi acompanhada de motivos determinantes que justifiquem o prosseguimento do procedimento. Portanto, resta configurada a ausência de justa causa para a sua instauração, o que, conforme a jurisprudência aplicável, justifica o trancamento do procedimento administrativo no presente caso.
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