EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ….. ZONA ELEITORAL – COMARCA DE … – MUNICÍPIO DE … – ESTADO DE ….
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, por intermédio do Órgão de Execução in fine assinado, diante dos elementos probatórios contidos nos documentos em anexo (ofício em 04 laudas encaminhado a Promotoria de Justiça Eleitoral pelo Partido da Frente Liberal – Diretório Municipal de … – SE – acompanhado de uma fita de vídeo cassete VHS) vem respeitosamente perante V. Ex.ª, com fulcro nos artigos 1.º, alíneas “d” e “h” e 22, da Lei Complementar n.º 64/90; artigos 73, incisos I e IV c/c §§ 4.º, 5.º e 7.º, do mesmo dispositivo legal e 74, todos da Lei n.º 9.504/97, oferecer
REPRESENTAÇÃO ELEITORAL
em face de
….., brasileiro (a), menor, representado por sua mãe ….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG n.º ….. e do CPF n.º ….., residente e domiciliado (a) na Rua ….., n.º ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., ….., brasileiro (a), menor, representado por sua mãe ….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG n.º ….. e do CPF n.º ….., residente e domiciliado (a) na Rua ….., n.º ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., ….., brasileiro (a), menor, representado por sua mãe ….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG n.º ….. e do CPF n.º ….., residente e domiciliado (a) na Rua ….., n.º ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
Nos dias 15, 16 e 17 de setembro do ano em curso a Prefeitura Municipal de … promoveu a festa popular intitulada “FESTA DO JEGUE”, oportunidade em que várias bandas de música se apresentaram ao público, todas contratadas pelo Poder Público, de acordo com a programação em anexo.
Tudo não deveria passar de mais uma festa tradicional, de um momento de lazer proporcionado aos munícipes pelo Executivo local, todavia, durante as apresentações das bandas “AQUARIUS” e “MASTRUZ COM LEITE” houve um verdadeiro comício em favor dos candidatos à reeleição, Srs. R. F. e S. S. E tudo de forma escancarada, é claro, como todo ato de propaganda.
Basta assistir à fita de vídeo acostada para constatar o uso do dinheiro público, do poder político, em proveito dos candidatos supracitados.
Observe-se que todos os integrantes da banda “AQUARIUS” realizaram o espetáculo com camisetas nas quais contava: “(Número) – DR. R. – VICE: S.”
Como se não bastasse, durante a apresentação do grupo “MASTRUZ COM LEITE” o vocalista da banda interrompeu a música e anunciou: “Por gentileza, o prefeito de vocês”, oportunidade em que o Sr. R. assumiu o microfone falando à plateia, ad verbum:
“Quero apenas aqui registrar a presença do nosso grande governador aqui (…) A. F., sem ele também nós não realizaríamos esta festa. Um grande abraço, registrar a presença do Deputado U. A., dos nossos vereadores e da Prefeita em exercício D. G.”
Encerrando a campanha, o vocalista da banda formulou uma pergunta aos presentes, já consignando, não por acaso, a resposta, verbis:
“Qual o nome do futuro ou do atual e também do futuro prefeito de vocês? E qual o número dele no dia 1.º de outubro?”
DO DIREITO
1. Evolução Social e Jurídica
Paulatinamente a sociedade vem mudando sua postura ético-moral, revendo seus valores, reformulando seus conceitos, precipuamente no que diz respeito à moralidade pública.
A ciência do Direito, por seu turno, diante de sua natureza eminentemente social, não fica alheia a tais mutações.
Não foi por acaso que a população brasileira, devidamente organizada pela Igreja Católica, promoveu importante inovação na legislação eleitoral, com o advento do disposto no art. 41 – A, da Lei n.º 9.504/97, introduzido pela Lei n.º 9.840/99 – de iniciativa popular.
Com o escopo de resguardar os princípios constitucionais, as leis vêm se tornando cada vez mais rígidas, reflexo dos anseios populares. E os operadores do direito, por outro lado, cada vez mais atentos e exigentes no cumprimento de suas funções.
A situação está melhorando; basta ter paciência e atenção para vislumbrar os avanços.
Nessa linha de esperança, otimismo e raciocínio, percebemos que os fatos descritos alhures são vedados pela legislação eleitoral. Mas não apenas vedados; são veementemente censurados e severamente punidos com a cassação do registro ou diploma, em razão do abuso do poder político ou de autoridade. Vejamos:
2. Legitimidade passiva
Devem figurar no polo passivo da presente relação processual, tanto o agente público responsável diretamente pela prática do ato, quanto o(s) candidato(s) beneficiados pelo mesmo.
Interpretação diversa contraria a própria evolução jurídico-social salientada no tópico anterior.
Expondo o tema com maestria, ADRIANO SOARES DA COSTA (1) , com espeque, outrossim, na jurisprudência, leciona, ipsis litteris:
“Questão de interesse surge quanto a legitimidade passiva ad causam, ou seja sobre quem pode ser acionado através da AIJE”.
Durante muito tempo se compreendeu que os efeitos da AIJE apenas alcançariam aquelas pessoas efetivamente culpadas pela prática do ato vergastado, não podendo alcançar os que tivessem concorrido para o abuso de poder econômico, ou uso ilegal de transporte, nada obstante fossem beneficiados por esses fatos ilícitos. Mas desde o advento do Ac. 12.030 (rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 16.09.1991), houve uma nova linha jurisprudencial adotada pelo TSE, segundo a qual:
´A perda de mandato que pode decorrer da ação de impugnação, não é uma pena cuja imposição devesse resultar da apuração de crime eleitoral de responsabilidade do mandatário, mas, sim, consequência do comprometimento da legitimidade da eleição, por vício de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. Por isso, nem o art. 14, § 10 (da Constituição), nem o princípio do due process of law, ainda que se lhe empreste o conceito substantivo que ganhou na América do Norte, subordinam a perda do mandato à responsabilidade pessoal do candidato eleito nas práticas viciosas que, comprometendo o pleito, a determinem´
…
Por essa razão, fica evidenciado que a ação de investigação judicial eleitoral pode ser proposta contra:
– os candidatos beneficiados pelo abuso do poder econômico e político…
– qualquer pessoa, candidato ou não candidato, que beneficie ilicitamente algum candidato… – acrescentamos negrito.
Com a aprovação da Lei n.º 9.840/99 – que deu nova redação ao § 5.º do art. 73 da Lei n.º 9.504/97 – foi definitivamente agasalhado tal pensamento do TSE, porquanto o dispositivo legal faz expressa referência ao responsabilizar o “candidato beneficiado, agente público ou não”.
Faz-se mister, portanto, a formação do litisconsórcio passivo necessário, como proposto nesta peça.
3. Violação do disposto no art. 1.º, alíneas “d” e “h” e 22, ambos da Lei Complementar n.º 64/90
Estudando o tema, procuremos – de início – conceituar “abuso de poder político ou de autoridade”, destacando mais uma vez, os ensinamentos do jovem e competente autor ADRIANO SOARES DA COSTA (2), ipsis litteris:
“Abuso de poder político é o uso indevido de cargo ou função pública, com a finalidade de obter votos para determinado candidato. Sua gravidade consiste na utilização do munus público para influenciar o eleitorado, com desvio de finalidade. É necessário que os fatos apontados como abusivos, entrementes, se encartem nas hipóteses legais de improbidade administrativa (Lei n.º 8.429/92), de modo que o exercício de atividade pública possa se caracterizar como ilícita do ponto de vista eleitoral”. Destacamos com negrito.
Com efeito, dispõe o art. 22 da Lei das Inelegibilidades, in verbis:
“Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso de poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político.” – incluímos negrito.
Bastaria tal previsão normativa para acolher a pretensão ora deduzida em Juízo, tendo em vista que a atual Prefeita de … usou indevidamente, desviou e abusou do poder de sua autoridade ao contratar em nome do município e com dinheiro público, bandas musicais que realizaram propaganda eleitoral do candidato de sua preferência à sucessão municipal, com a nítida intenção de obter votos para o mesmo.
Com tais condutas, o eleitorado foi influenciado indevidamente, com desvio de finalidade.
Por outro ângulo, cumpre-nos registrar que os fatos apontados como abusivos configuram hipóteses legais de improbidade administrativa, nos termos do art. 11 caput e inciso I, da Lei n.º 8.429/92.
Primeiro, porque os comportamentos combatidos feriram, a talhe de foice, os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade (art. 37 da CF), violando os deveres de honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições.
3.1. Princípios que regem a administração pública
A Constituição Federal, no art. 37 caput estabelece, ipsis litteris:
“A administração pública, direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”
Os princípios constitucionais – conjunto de normas que alicerçam um sistema e lhe garantem a validade – são a síntese dos valores precípuos da ordem jurídica, posto que consubstanciam suas premissas básicas indicando o ponto de partida e os caminhos que devem ser percorridos.
Ao interpretar a Constituição de 1891 Rui Barbosa afirmou que “as cláusulas constitucionais são regras imperativas e não meros conselhos, avisos ou lições”. (apud Raul Machado Horta, “Estrutura, Natureza e expansividade das Normas Constitucionais”, Revista Trimestral de Direito Público, 4/1993, Ed. RT, p. 41).
Na lição de Celso Antonio Bandeira de Mello, “Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.” (“Curso de Direto Administrativo”, Malheiros Editores, 5ª ed., 1.994, p. 451)
Os princípios constitucionais dirigem-se ao Executivo, Legislativo e Judiciário, condicionando-os e pautando a interpretação e aplicação de todas as normas jurídicas vigentes.
No Estado de Direito o que se quer é o governo das leis e não dos homens, razão pela qual os administradores têm o dever de cumprir as aspirações legais.
“É próprio do Estado de Direito que se delineie na regra geral e impessoal produzida pelo Legislativo, o quadro, o esquema, em cujo interior se moverá a Administração.” (“Desvio de Poder”, Celso Antonio Bandeira de Mello, in RDP 89/24).
Não pode o particular compactuar com atos lesivos ao erário público. Se a Administração Pública só pode fazer o que a Lei prevê (agir conforme a Lei), ao particular é vedado fazer, concorrer ou se beneficiar de atos ilegais e lesivos ao Estado (agir contra a Lei).
“O primeiro direito do administrado frente à Administração, consiste, portanto, na garantia de legalidade do comportamento administrativo e na aderência desse mesmo comportamento ao interesse público, hipoteticamente descrito na norma.” (Luciano Ferreira Leite, “Discricionariedade Administrativa e Controle Judicial”, Ed. Revista dos Tribunais, 1.981, p. 35)
Conforme o festejado Celso Antonio Bandeira de Mello, “explícita a subordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência natural da indisponibilidade do interesse público, noção esta que, conforme foi visto, informa o caráter da relação de administração.” (“Curso de Direito Administrativo”, Malheiros Editores, 5ª ed. 1.994, p. 24).
Hely Lopes Meirelles assinalou que: “A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.” (“Direito Administrativo Brasileiro”, Malheiros Editores, 19.ª ed., p. 82)
“Fora da lei, portanto, não há espaço para atuação regular da Administração. Donde, todos os agentes do Executivo, desde o que lhe ocupa a cúspide até o mais modesto dos servidores que detenha algum poder decisório, hão de ter perante a lei – para cumprirem corretamente seus misteres – a mesma humildade e a mesma obsequiosa reverência para com os desígnios normativos. É que todos exercem função administrativa, a dizer, função subalterna à lei, ancilar – que vem de ancila, serva, escrava.” (Celso Antonio Bandeira de Mello, “Discricionariedade e Controle Jurisdicional”, Malheiros Editores, 2ª ed., 1993, p. 50).
Insitos ao princípio da legalidade, dentre outros, estão os princípios da finalidade e indisponibilidade dos interesses públicos.
A finalidade pública é o bem jurídico buscado pelo ato; e o Administrador Público, bem como, todas as pessoas previstas no artigo 2.º da Lei 8.429/92, têm o dever jurídico de alcançá-la, sob pena de configurar-se o abuso de poder.
Ruy Cirne Lima escreveu sobre os princípios de direito administrativo e bem definiu o conceito de Administração. Para ele a palavra administração, tanto sob a ótica do direito privado como do direito público, designa atividade do que não é proprietário.
Prosseguindo, o mesmo autor afirma com muita propriedade que: “O fim – e não a vontade – domina todas as formas de administração. Supõe, destarte, a atividade administrativa a preexistência de uma regra jurídica, reconhecendo-lhe uma finalidade própria. Jaz, consequentemente, a administração pública debaixo da legislação que deve enunciar e determinar a regra de direito.” … “Administração, segundo o nosso modo de ver, é a atividade do que não é proprietário – do que não tem a disposição da coisa ou do negócio administrado.”…”Opõe-se a noção de administração à de propriedade visto que, sob administração, o bem não entende vinculado à vontade ou personalidade do administrador, porém, à finalidade impessoal a que essa vontade deve servir.” (“Princípios de Direito Administrativo”, Editora RT, 5ª ed., 1.982 págs. 20 e 22).
Destaque-se, outrossim, o intitulado Princípio da Impessoalidade, o qual no dizer de Hely Lopes Meirelles – “…nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal”.
“Esse princípio também deve ser entendido para excluir a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos sobre suas realizações administrativas (CF, art. 37, § 1º)”. (ob. cit., p. 85, grifo nosso)
O princípio da impessoalidade ou finalidade foi ferido de morte quando os requeridos permitiram (ou concorreram) que os músicos contratados pelo Poder Público – e representando a Administração Pública local – vestissem camisas de propagando política de determinado candidato, trabalhando assim, na campanha do mesmo, deixando de lado a finalidade de prestar um serviço de lazer e diversão à comunidade, de forma independente, imparcial e impessoal.
Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio Júnior(3) abordam com proficiência o princípio da impessoalidade, asseverando, ad litteram:
“Administrar é um exercício institucional e não pessoal. A conduta administrativa deve ser objetiva, imune ao intersubjetivismo e aos liames de índole pessoal, dos quais são exemplos o nepotismo, o favorecimento, o clientelismo e a utilização da máquina administrativa como promoção pessoal”.
Pautada pela lei, a conduta administrativa deve ser geral e abstrata, jamais focalizada em pessoas ou grupos. Sua finalidade é a realização do bem comum, síntese tradutora dos objetivos fundamentais do Estado Brasileiro.
…
Também é a impessoalidade afetada pelo princípio republicano que impõe ao administrador o dever de, como mero gestor da res publica, não fazer seu ou de alguns aquilo que é de todos. A prevalência do interesse social sobre eventuais anelos individuais ou grupais reclama uma conduta administrativa impessoal.
Em resumo, da indisponibilidade do interesse público decorre a impessoalidade administrativa. – Inovamos com destaques.
Infere-se, pois, que devido a flagrante, gritante, escancarada ofensa a tais postulados, o princípio da impessoalidade foi um dos mais sacrificados pelas condutas dos representados.
Por derradeiro, como ficou claro no confronto dos atos impugnados com os princípios já analisados, os réus transgrediram outrossim, o Princípio da Moralidade, que na conformidade do caput do artigo 37, da Constituição Federal, incontestavelmente constitui pressuposto de validade de todo ato administrativo.
A respeito do alcance desse princípio e citando lição de Maurice Hauriou, Hely Lopes Meirelles ressaltou que: “Não se trata da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como” o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração.” …”O certo é que a moralidade do ato administrativo juntamente com sua legalidade e finalidade constituem pressupostos de validade sem os quais toda atividade pública será ilegítima.” (ob. cit., p. 83).
Observe-se que o exame da moralidade do ato contém um decisivo componente ético. O administrador não deve cingir-se apenas à legalidade ou ilegalidade, justiça ou injustiça e à conveniência e oportunidade do ato. Deverá, também, ajustar sua conduta aos parâmetros da moralidade. Como poderia ser permitido utilizar dinheiro da Prefeitura, dinheiro público, para realizar campanha eleitoral de candidato agraciado, escolhido pelo Chefe do Executivo? Qualquer do povo sabe que as verbas públicas se destinam a todos e não a um candidato ou grupo selecionado, ao alvedrio do detentor do poder.
Em suma, o Administrador não pode deixar de atender a finalidade legal pretendida pela lei, em sintonia, outrossim, com a moralidade pública. Não tem ele a disponibilidade sobre os interesses públicos confiados à sua guarda. Quem concorre ou se beneficia de atos que não observam a finalidade legal e os demais princípios ora estudados, está incorrendo em improbidade administrativa, segundo art. 11 caput, da Lei 8.429/92.
3.2. Ato de Improbidade previsto no inciso I, do art. 11, da Lei n. 8.429/92
Além de afrontar o caput do artigo legal supracitado, os atos que os réus praticaram amoldando-se, outrossim, ao inciso I, do mesmo dispositivo, na medida em que visaram a fim proibido em lei.
Eis a redação do texto legal:
“I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;”
A toda evidência, fazer propaganda pessoal e política de candidato com dinheiro público, constitui fim proibido em lei; e mais, na Lei das Leis (art. 37 caput da Constituição Federal e seus §§).
Comentando o inciso supra transcrito, Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio Júnior(4) asseveram, ipsis verbis:
“É o desvio de finalidade, seja porque atua com fito pessoal (por exemplo, vingança, protecionismo, etc.), seja porque tem em mira a finalidade administrativa diversa da determinada em lei.”
…
Age com óbvio desvio abuso de poder, por exemplo, o agente público que orienta a entidade que administra para fim estranho a seu objeto estatutário ou de modo a favorecer interesses particulares em detrimento dos interesses sociais
…
Para que se configure o disposto no inciso, basta que o ato impugnado vise a fim ilícito ou extrapole a esfera de competência do agente público” – inovamos com negrito.
Como se não bastassem tantas violações legais, foi infringida ainda, a Lei da Eleições. Senão vejamos.
4. Violação do disposto no art. 73, incisos I e IV, da Lei n.º 9.504/97
Além da transgressão à Lei Complementar n.º 64/90, consoante demonstrado acima, a conduta da terceira ré se inclui, também, dentre aquelas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais.
Estabelece o art. 73, incisos I e IV, da Lei das Eleições, ipsis verbis:
“Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
I – ceder ou usar, em benefício de candidato, partido ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direita ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;
…
IV – fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público”. Destacamos.
Indubitavelmente, ante os comportamentos descritos alhures, a representada cedeu todos os bens móveis que integravam a estrutura da “festa do jegue” – pertencentes à administração, dentre eles, palanque, equipamentos de som, material de propaganda da festa e o próprio dinheiro público usado na contratação das bandas – em benefício dos dois candidatos também representados, afetando destarte, a igualdade de oportunidades entre os candidatos, prejudicando sobremaneira aqueles concorrentes que não são do grupo político dos réus.
De igual forma, a ré fez e permitiu (com participação direta do candidato R. F., de acordo com as imagens constantes da fita em apenso) uso promocional de serviços de caráter social custeados pelo Poder Público, em favor de candidatos e partido político, tendo em vista que uma festa popular patrocinada pelo Poder Executivo, com apresentação de espetáculos musicais, constitui um serviço de caráter social – já que o lazer é, indiscutivelmente um direito social, nos precisos termos do art. 6.º da Lex Mater.
Protesta e requer provar o alegado por todos os meios de prova admitidos no ordenamento jurídico pátrio, mormente através do depoimento pessoal dos representados, de documentos – juntados nesta oportunidade e aqueles que ainda serão anexados aos autos – e sobretudo, por meio da fita de vídeo cassete VHS ora apresentada.
DOS PEDIDOS
Ex positis, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL requer:
1. o recebimento da presente representação – ação de investigação judicial eleitoral – e a citação dos representados para oferecerem defesa no prazo de cinco dias, nos termos do art. 22, inciso I, alínea “a”, da Lei Complementar n.º 64/90;
2. seja requisitada a Prefeitura Municipal de …, através da Prefeita em exercício, cópia dos contratos firmados com as bandas musicais que prestaram serviços ao Município, com fulcro no inciso VIII, do mesmo dispositivo legal supracitado;
3. seja declarada a inelegibilidade dos representados, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as próximas eleições do dia 1.º de outubro de 2.000, bem como, para as eleições a se realizarem nos três anos subsequentes à eleição em que se verificou o abuso de poder político e de autoridade, com espeque no art. 22, inciso XIV, da Lei Complementar n.º 64/90;
4. sejam cassados os registros dos dois representados candidatos às eleições majoritárias no município de …, os quais foram beneficiados diretamente pelo desvio e abuso do poder político e de autoridade, proibindo-se, consequentemente a diplomação dos mesmos, caso eleitos no dia 01/10/2000, com supedâneo no art. 22, inciso XIV, da Lei Complementar n.º 64/90 e § 5.º, do art. 73, da Lei n.º 9.504/97;
5. na hipótese do Poder Judiciário entregar a prestação jurisdicional definitiva apenas após a diplomação dos representados (se forem eleitos), requeremos o envio das peças ao Ministério Público Eleitoral para propositura de Recurso contra Diplomação ou Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, em atenção ao mandamento contido no art. 22, inciso XV, da Lei Complementar n.º 64/90;
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]