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RECURSO ESPECIAL Nº 727.131 – SP (2005/0029322-9)
RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : JOSÉ ROBERTO DE ARAÚJO PELOSINI
ADVOGADO : CÂNDIDO DA SILVA DINAMARCO E
OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
SÃO PAULO
INTERES. : ARON GALANTE
ADVOGADO : MARIA ÂNGELA DIAS CAMPOS E
OUTRO(S)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESSARCIMENTO DE
DANOS AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. PRAZO
PRESCRICIONAL DA AÇÃO POPULAR. ANALOGIA
(UBI EADEM RATIO IBI EADEM LEGIS DISPOSITIO).
PRESCRIÇÃO RECONHECIDA.
1. A Ação Civil Pública e a Ação Popular veiculam
pretensões relevantes para a coletividade.
2. Destarte, hodiernamente ambas as ações fazem
parte de um microssistema de tutela dos direitos difusos onde
se encartam a moralidade administrativa sob seus vários
ângulos e facetas. Assim, à míngua de previsão do prazo
prescricional para a propositura da Ação Civil Pública,
inafastável a incidência da analogia legis, recomendando o
prazo quinquenal para a prescrição das Ações Civis Públicas,
tal como ocorre com a prescritibilidade da Ação Popular,
porquanto ubi eadem ratio ibi eadem legis dispositio.
Precedentes do STJ:REsp 890552/MG, Relator Ministro José
Delgado, DJ de 22.03.2007 e REsp 406.545/SP, Relator
Ministro Luiz Fux, DJ 09.12.2002.
3. Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público
Estadual em face de ex-prefeito e co-réu, por ato de
improbidade administrativa, causador de lesão ao erário
público e atentatório dos princípios da Administração Pública,
consistente na permuta de 04 (quatro) imóveis públicos,
situados no perímetro central de São Bernardo do Campo-SP,
por imóvel localizado na zona rural do mesmo município, de
propriedade de do co-réu, objetivando a declaração de nulidade
da mencionada permuta, bem como a condenação dos
requeridos, de forma solidária, ao ressarcimento ao erário do
prejuízo causado ao município no valor Cz$ 114.425.391,01
(cento e quatorze milhões, quatrocentos e vinte e cinco mil
cruzeiros e trezentos e noventa e um centavos), que, atualizado
pelo Parquet Estadual por ocasião do recurso de apelação,
equivale a R$ 1.760.448,32 (um milhão, setecentos e sessenta
mil, quatrocentos e quarenta e oito reais e trinta e dois
centavos) (fls. 1121/1135).
4. A Medida Provisória 2.180-35 editada em
24/08/2001, no afã de dirimir dúvidas sobre o tema, introduziu
o art. 1º- C na Lei nº 9.494/97 (que alterou a Lei 7.347/85),
estabelecendo o prazo prescricional de cinco anos para ações
que visam a obter indenização por danos causados por agentes
de pessoas jurídicas de direito público e privado prestadores de
serviço público, senão vejamos:
“Art. 4o A Lei no 9.494, de 10 de setembro de 1997,
passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos:
“Art. 1.º-C. Prescreverá em cinco anos o direito de
obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas
jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito
privado prestadoras de serviços públicos.” (NR)
5. A Lei 8.429/92, que regula o ajuizamento das ações
civis de improbidade administrativa em face de agentes
públicos, dispõe em seu art. 23:
“Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as
sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I – até cinco
anos após o término do ercício de mandato, de cargo em
comissão ou de função de confiança; II – dentro do prazo
prescricional previsto em lei específica para faltas
disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público,
nos casos de ercício de cargo efetivo ou emprego.
6. A doutrina do tema assenta que: “Trata o art. 23 da
prescrição das ações civis de improbidade
administrativa.(…).O prazo prescricional é de 5 anos para
serem ajuizadas contra agentes públicos eleitos ou ocupantes
de cargo de comissão ou de função de confiança, contados a
partir do término do mandato ou do ercício funcional (inciso
I).O prazo prescricional em relação aos demais agentes
públicos que erçam cargo efetivo ou emprego público, é o
estabelecido em lei específica para as faltas disciplinares
puníveis com demissão a bem do serviço público (inciso II).No
âmbito da União, é de 5 anos e começa a correr da data em
que o fato tornou-se conhecido, não pendendo causa
interruptiva ou suspensiva, e dos Estados ou Municípios, no
prazo previsto nas leis por eles editadas sobre essa matéria.
No caso de particulares acionados por ato de improbidade
administrativa, por serem coniventes com o agente público
improbo, tendo induzido-os ou concorrendo para a sua
prática, entendo eu, que observa a regra dos incisos I ou II,
conforme a qualificação do agente público envolvido. (…)”
Marino Pazzaglini Filho, in Lei de Improbidade Administrativa
Comentada, Atlas, 2007, p. 228-229
7. Sob esse enfoque também é assente que:
“(…)No entanto, não se pode deir de trazer à baila,
disposições a respeito da Ação Civil Pública trazidas pela Lei
8.429/92, que visa o controle da probidade administrativa,
quando o ato de improbidade é cometido por agente público
que erça mandato, ou cargo em comissão com atribuições de
direção, chefia e assessoramento, ou função de confiança.
O art. 23 da Lei 8.429/92 dispõe: “Art. 23. As ações
destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei
podem ser propostas: I – até cinco anos após o término do
ercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de
confiança;II – dentro do prazo prescricional previsto em lei
específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a
bem do serviço público, nos casos de ercício de cargo efetivo
ou emprego.
Nota-se que simplesmente limitar-se a dizer que as
ações civis públicas não prescrevem, não nos parece
cientificamente correto afirmar, haja vista que o inc. I do art.
23 se refere ao prazo prescricional da Ação Civil Pública,
quando o ato de improbidade administrativa tiver sido
cometido por agente político, ercente dos cargos públicos e
funções disciplinadas na citada lei.
Em relação aos casos não previstos no artigo acima
citado, Mateus Eduardo Siqueira Nunes, citando Hely Lopes
Meirelles, que entende que diante da ausência de previsão
específica, estariam na falta de lei fiora do prazo
prescricional, não pode o servidor público ou o particular
ficar perpetuamente sujeito a sanção administrativa por ato ou
fato praticado há muito tempo. A esse propósito, O STF já
decidiu que “a regra é a da prescritibilidade”. Entendemos
que, quando a lei não fi o prazo da prescrição
administrativa, esta deve ocorrer em cinco anos, à semelhança
da prescrição das ações pessoais contra a Fazenda Pública
Superior Tribunal de Justiça
DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO
Edição nº 125 Brasília, quarta-feira, 23 de abril de 2008
(Dec. 20.910/32), das punições dos profissionais liberais (lei
6.838/80 e para a cobrança do crédito tributário (CTN, art.
174)” Fábio Lemos Zanão in Revista do Instituto dos
Advogados de São Paulo, RT, 2006, p 33-34
8. A egese dos dispositivos legais atinentes à
questão sub emine conduz à conclusão de que o ajuizamento
das ações de improbidade em face de agentes públicos eleitos,
ocupantes de cargo em comissão ou de função de confiança,
submetem-se ao prazo prescricional de 5 anos, cujo termo a
quo é o término do mandato ou do ercício funcional,
consoante a ratio essendi do art. 23, inciso I, da Lei 8429/92.
9. In casu, o mandato do co-réu, à época Prefeito do
Município de São Bernardo do Campo, expirou em 31.12.1988
(fl. 1117), a lavratura da escritura pública relativa à permuta de
04 (quatro) imóveis públicos, situados no perímetro central de
São Bernardo do Campo-SP, por imóvel localizado na zona
rural do mesmo município, efetivou-se em 23.10.1988 (fls.
1114) e Ação Civil Pública foi ajuizada em 28.05.1999 (fl.
33/56), o que revela a inarredável ocorrência da prescrição.
10. A conduta antijurídica imputada ao requerido, ora
recorrente, foi eminada pelo Tribunal local, litteris:
“Possível, desde já, o julgamento pelo mérito
principal (§ 3° do artigo 515 do Código de Processo Civil, por
aplicação analógica, já versar causa a não se trata de que
elusivamente questão de direito). É que a matéria de fato foi
suficientemente discutida; desnecessária a prova requerida
pelo réu Aron (ff. 1.000/1.001), além de que cabia a ele fazer a
juntada do documento pretendido, que ele mesmo poderia ter
requerido junto à Câmara (artigos 396 e 397, ambos do
Código de Processo Civil) e o réu José Roberto requereu
expressamente esse julgamento, com o que ficou sem efeito o
pedido de prova pericial que anteriormente fizera (f. 998).
Ainda que a notícia do fato tenha sido levada ao
conhecimento do Ministério Público por repulsivo espírito
oportunismo e de vingança de lojistas prejudicados com a
permuta, não se pode afastar a necessidade de se verificar se
realmente houve dano também ao erário.
A prova não permite dúvida a respeito de que os réus
causaram dano ao patrimônio de municipal e que a permuta
decorreu de improbidade.
O laudo extrajudicial com que o autor instruiu a
inicial foi elaborado mediante pesquisa de ofertas feitas em
jornais da época da permuta (f.520), o que não foi
contraditado pelos réus, e mostrou o prejuízo sofrido pela
Municipalidade.
Nem se pode falar em critérios de oportunidade e
conveniência (artigo 2° da Constituição da República). O
desvio de finalidade aparece cristalino quando se vê que a
alegada justificativa para a permuta (um clube náutico para
advogados, que prestigiaria o Município) nem foi tentada, e
que inicialmente outro seria o destino da gleba rural (f. 354:
parque municipal do trabalhador), quando de primeira
remessa de projeto de aprovação da permuta à Câmara
Municipal. Nem afasta a certeza do desvio de finalidade,
permuta no interesse do particular, a cópia de f. 388, que dá
notícia de comparecimento da Dra Presidente da 39ª
Subsecção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil.
Não aprovada a permuta em benefício do parque do
trabalhador, tentou-se, com êxito, fazê-la para outro destino,
mas que não foi dado à gleba, ocupada por arrendatários.
Todavia, declarada a nulidade da permuta, como
pedido, o prejuízo do patrimônio público, em face do pedido,
será só da quantia que a Municipalidade voltou ao particular,
e não da soma dessa quantia mais a diferença de valor.” (fls.
1330/1331)
11. O elemento subjetivo constante no dolo é
imperioso nos delitos de improbidade, por isso que a
autorização legislativa obtida, in casu, o afasta, conjurando a
fortiori o ilícito imputado.
12. Recurso Especial provido para acolher a
prescrição qüinqüenal da Ação Civil Pública, mercê da
inexistência de prova de dolo, restando prejudicada a
apreciação das demais questões suscitadas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e
das notas taquigráficas a seguir, após o voto-vista do Sr. Ministro José Delgado,
por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Denise Arruda e José
Delgado (voto-vista) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Não participou do julgamento o Sr. Ministro Francisco Falcão (RISTJ,
art. 162, § 2º, primeira parte).
Brasília (DF), 11 de março de 2008(Data do Julgamento)