Brasília, 29 de maio a 2 de junho de 2017
Data de divulgação: 12 de junho de 2017
Este Informativo, elaborado com base em notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a publicação do acórdão no Diário da Justiça.
Sumário
Plenário
Paralisação de atividade econômica e meio ambiente – 2
Prerrogativa de foro e interpretação restritiva
Repercussão Geral
Repercussão geral: suspensão processual e prescrição
1ª Turma
Falsidade ideológica e acumulação de cargos públicos
2ª Turma
‘Habeas corpus’: pedido de extensão e circunstâncias fáticas incomunicáveis
Inovações Legislativas
Outras Informações
Plenário
DIREITO CONSTITUCIONAL – MEIO AMBIENTE
Paralisação de atividade econômica e meio ambiente – 2
O Plenário, por maioria, deu provimento a dois agravos regimentais para indeferir o pedido de suspensão de liminar em que se discutia a paralisação de empreendimento de mineração em Município paraense no qual existentes comunidades indígenas, tendo em conta a proteção constitucional do meio ambiente, do índio e das atividades econômicas (vide Informativo 830). Na mesma assentada, também por maioria, julgou prejudicados embargos de declaração.
Em síntese, a Corte determinou o restabelecimento da decisão proferida em antecipação de tutela recursal pelo Desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Naquela decisão foi determinada a suspensão das atividades de mineração, o depósito mensal de R$ 1.000.000,00 a cada uma das sete aldeias indígenas afetadas e a multa diária para a hipótese de descumprimento do julgado no valor de R$ 10.000,00.
No caso, o Colegiado afirmou haver um conflito entre dois valores. De um lado, o meio ambiente, presente na comunidade indígena e merecedora de proteção, nos termos da Constituição Federal de 1988; de outro, um aspecto patrimonial, que diz respeito não só à prestação de serviço, como também à arrecadação do Estado e do próprio Município.
Salientou a presença de indícios de descumprimento pela mineradora de medidas preventivas, mitigadoras e compensatórias previstas na licença ambiental. Em juízo mínimo de delibação, constatou haver evidências de danos graves causados às comunidades indígenas pela atividade de mineração. Considerou que, ainda que esses indícios não sejam posteriormente confirmados no curso da ação civil pública, são suficientes para, com fundamento no princípio da precaução, justificar a suspensão da atividade minerária.
Ademais, ressaltou que o pedido de suspensão de liminar é medida excepcional que pressupõe a existência de dano inafastável.
Tendo em vista a complexidade fática da matéria e o não cabimento da apreciação de matéria de mérito nesse tipo de ação, o Tribunal decidiu devolver a discussão da matéria para as instâncias ordinárias.
Vencidos o ministro Ricardo Lewandowski (relator), que recebia os embargos como agravo regimental e a ele negava provimento, e o ministro Gilmar Mendes, que recebia os embargos como agravo regimental e a ele dava provimento. Quanto aos demais recursos, também ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski (relator) e Gilmar Mendes, que negavam provimento aos agravos regimentais. Afirmavam que a paralisação das atividades econômicas de mineração na região poderia causar prejuízos econômicos elevados, imediatos e de difícil reparação ao Estado do Pará, inclusive com a possível e indesejável demissão de grande número de trabalhadores.
DIREITO PROCESSUAL PENAL – COMPETÊNCIA
Prerrogativa de foro e interpretação restritiva
O Plenário iniciou julgamento de questão de ordem em ação penal em que se discute o alcance do foro por prerrogativa de função.
O ministro Roberto Barroso (relator) resolveu questão de ordem no sentido de que (a) o foro por prerrogativa de função seja aplicado apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas e (b) a competência para processar e julgar as ações penais não seja mais afetada, após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para que sejam apresentadas as alegações finais, em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o que ocupava, qualquer que seja o motivo.
As ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia acompanharam o relator, e o ministro Marco Aurélio o acompanhou em parte.
O relator afirmou que a quantidade de pessoas beneficiadas pelo foro e a extensão que se tem dado a ele, a abarcar fatos praticados antes de o indivíduo ser investido no cargo beneficiado pelo foro de prerrogativa de função ou pela prática de atos sem qualquer conexão com o exercício do mandato que se deseja proteger, têm levado a múltiplas disfuncionalidades.
A primeira delas é atribuir ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma competência para a qual ele não é vocacionado. Nenhuma corte constitucional no mundo tem a quantidade de processos de competência originária em matéria penal como tem a do Brasil. E, evidentemente, na medida em que desempenha esse papel de jurisdição penal de primeiro grau, o STF afasta-se da sua missão primordial de guardião da Constituição e de equacionamento das grandes questões nacionais.
Como o procedimento no Supremo é muito mais complexo do que no juízo de primeiro grau, leva muito mais tempo para apreciar a denúncia, processar e julgar a ação penal. Consequentemente, é frequente a ocorrência de prescrição, que nem sempre ocorre por responsabilidade do Tribunal, mas por conta do próprio sistema.
Portanto, o mau funcionamento do sistema traz, além de impunidade, desprestígio para o STF. Essa impunidade faz com que o Direito Penal perca o seu principal papel de funcionar como prevenção geral.
O relator frisou que a situação atual revela a necessidade de mutação constitucional. Isso ocorre quando a corte constitucional muda um entendimento consolidado, não porque o anterior fosse propriamente errado, mas porque a realidade fática mudou, ou porque a percepção social do Direito mudou, ou porque as consequências práticas de uma orientação jurisprudencial se revelaram negativas. O ministro ressaltou, ainda, que as três hipóteses que justificam a alteração de uma linha de interpretação constitucional estão presentes na hipótese dos autos.
Consignou que a nova interpretação prestigia os princípios da igualdade e republicano, além de assegurar às pessoas o desempenho de mandato livre de interferências, que é o fim pretendido pela norma constitucional. Observou que viola o princípio da igualdade resguardar, com foro de prerrogativa, um agente público por seus atos praticados sem relação com a função para a qual se quer resguardar sua independência, porque é a atribuição de um privilégio.
Além disso, o princípio republicano tem como uma das suas dimensões mais importantes a possibilidade de responsabilização dos agentes públicos. A prescrição, o excesso de retardamento e a impunidade, que resultam do modelo de foro por prerrogativa de função, não se amoldam ao princípio republicano.
Segundo o relator, essa nova linha interpretativa deve aplicar-se imediatamente aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos praticados e todas as decisões proferidas pelo STF e pelos demais juízos com base na jurisprudência anterior.
O ministro Marco Aurélio pontuou que a fixação da competência está necessariamente ligada ao cargo ocupado na data do cometimento da prática criminosa. Essa competência, em termos de prerrogativa, é única e não é flexível. Não pode, portanto, haver deslocamento para outra instância após eleição posterior.
Divergiu do relator apenas na parte em que determinada a manutenção da competência por prerrogativa de foro após o despacho de intimação para apresentação de alegações finais, se o agente público vier a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava.
Afirmou que, fixada a competência por prerrogativa de foro e considerado o liame entre a prática delituosa e o mandato, se o detentor da prerrogativa de foro deixar o cargo, ele passa a ter o tratamento reservado aos cidadãos comuns. Sublinhou que esse entendimento foi fixado no julgamento do Inq 687 QO/SP (DJU de 9.11.2001), quando foi revogado o Enunciado 394 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.
Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos.
AP 937 QO/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 31.5.2017 e 1º.6.2017. (AP-937)
1ª Parte:
2ª Parte:
3ª Parte:
4ª Parte:
5ª Parte:
Repercussão Geral
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – SUSPENSÃO PROCESSUAL
Repercussão geral: suspensão processual e prescrição
O Supremo Tribunal Federal, iniciou julgamento de questão de ordem em recurso extraordinário em que se discutem o alcance da suspensão processual preconizada no art. 1.035, § 5º (1), do Código de Processo Civil (CPC) e os seus efeitos sobre os processos penais cuja matéria tenha sido objeto de repercussão geral reconhecida pela Corte. Questiona-se a possibilidade de suspensão – enquanto não julgado o recurso extraordinário paradigma – do prazo prescricional da pretensão punitiva de crimes ou contravenções penais objeto das ações penais sobrestadas.
A questão foi suscitada em recurso extraordinário, com repercussão geral reconhecida (Tema 924), que impugna acórdão que considerou atípica a conduta contravencional do jogo de azar, prevista no art. 50 (2) da Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei 3.688/1941).
O ministro Luiz Fux (relator) resolveu a questão de ordem no sentido de: a) que se interprete o art. 116, I (3), do Código Penal (CP) conforme a Constituição, para o fim de se entender que a suspensão do prazo prescricional para a resolução de questão externa prejudicial ao reconhecimento do crime abrange também a hipótese de suspensão do prazo prescricional nos processos criminais que, com fundamento no art. 1.035, § 5º, do CPC, por determinação do relator do recurso extraordinário adotado como paradigma, forem sobrestados em virtude da adoção da sistemática da repercussão geral; b) a partir da interpretação conforme do art. 116, I, do CP, até o julgamento definitivo pelo Supremo Tribunal Federal do recurso extraordinário adotado como paradigma, se reconheça a suspensão do prazo de prescrição da pretensão punitiva relativa a todos os crimes objeto de ações penais que, em todo o território nacional, tiverem sido sobrestados por força de vinculação ao tema 924 da repercussão geral reconhecida, sem prejuízo da extensão de tal entendimento a todos os casos em que um processo de natureza penal for suspenso por força de repercussão geral; c) como proposta adicional, deixar a critério do juiz aferir a legitimidade das medidas de constrição e a necessidade de produção de provas urgentes, mercê de suspensão do processo; d) ainda como proposta adicional, deixar a critério do juiz excepcionar da ordem de sobrestamento exarada pelo relator do processo paradigma as ações penais cujo réu esteja preso preventivamente, sem prejuízo da possibilidade de posterior suspensão do processo e do prazo prescricional respectivo quando e se vier a ser revogada a segregação cautelar.
Inicialmente, o relator citou as hipóteses de suspensão de prescrição previstas no ordenamento jurídico nacional: a) os incisos I e II do art. 116 do CP; b) o art. 366 do CPP; c) o art. 368 do CPP; d) o § 5º do art. 53 da Constituição Federal (CF); e) o § 6º do art. 89 da Lei 9.099/1995; f) o art. 9º da Lei 10.684/2003. Observou que, em todas elas, a suspensão do prazo prescricional tem sempre como pressuposto um fato que impede a atuação do Estado-acusador, o que decorre de aplicação do princípio interpretativo “ubi eadem ratio ibi eadem dispositio”.
Entretanto, reconheceu não haver, no ordenamento jurídico nacional, previsão expressa para a suspensão do prazo prescricional incidente nas ações penais que, por decisão do relator do recurso extraordinário paradigma, tiverem sido sobrestadas em virtude da sistemática da repercussão geral constitucional. Em razão disso, reputou necessário que o Supremo Tribunal Federal explicite os limites aos quais esse mecanismo – criado para a propagação da celeridade processual e uniformização das decisões judiciais – será submetido, sob pena de violação de outros princípios de igual estatura constitucional, em afronta aos postulados da unidade e da concordância prática das normas constitucionais. Para tanto, ante a ausência de previsão de suspensão do prazo prescricional dos processos criminais sobrestados, o relator propôs a aplicação da técnica hermenêutica da interpretação conforme a Constituição para a interpretação da hipótese fático-processual trazida pelo art. 116, I, do CP.
Frisou que, reconhecida a repercussão geral de questão constitucional de viés criminal, o Ministério Público fica cerceado em sua prerrogativa de promover a ação penal, visto que os processos criminais que tratam do mesmo tema ficam sobrestados, aguardando o julgamento do “leading case”. Por outro lado, continua correndo o prazo prescricional, que levará à extinção da pretensão punitiva estatal, paradoxalmente, pela demora no seu exercício. Tal situação causa o cerceamento da prerrogativa acusatória do “Parquet” e da paridade de armas que é consectário do princípio do contraditório.
Asseverou que, no caso, insta reconhecer a ofensa ao princípio constitucional da proporcionalidade, na sua vertente da vedação de proteção deficiente, na medida em que a fragilização da tutela penal do Estado, mediante o impedimento do exercício regular da ação penal, deixa descobertos direitos fundamentais como a vida, o patrimônio, a dignidade sexual, entre outros que o Estado deveria salvaguardar por meio da norma penal.
Consignou que, a despeito de o Direito Penal ser regido pelo cânone da intervenção mínima, atuando como “ultima ratio”, é imprescindível que todos os instrumentos jurídicos que lhe são inerentes preencham as condições mínimas para alcançar o fim último de resguardar os bens jurídicos que se propõem a proteger. Assim, se o legislador atua de forma a criar situações de proteção deficiente de direitos fundamentais, o intérprete pode intervir para formular regime jurídico de melhor proteção. Ademais, em face do princípio “contra non valentem agere non currit praescriptio”, a prescrição não pode correr contra quem não pode agir. A lei não pode criar situações de incompatibilidade lógica, ou seja, não é aceitável impossibilitar a parte de agir e, ao mesmo tempo, puni-la pela sua inércia. Dessa forma, na presença de obstáculo intransponível ao “ius persequendi”, a dilação do prazo prescricional é imperiosa, não se admitindo que a lei discipline mecanismo de paralisação da ação e, simultaneamente, permita a continuidade do lapso temporal.
Diante desse quadro, a partir da invocação dos postulados da unidade e concordância prática das normas constitucionais, o relator propôs afastar o sobredito espectro de violação a normas constitucionais e interpretar a legislação infraconstitucional que regula a suspensão dos prazos prescricionais da pretensão punitiva de modo a abranger, no que tange à regra prevista no art. 116, I, do CP, a hipótese fático-processual concernente ao sobrestamento de ações penais em decorrência do disposto no art. 1.035, § 5º, do CPC. Desse modo, entre as diversas interpretações possíveis para o inciso I do art. 116 do CP, deve-se adotar aquela que se afigure como conforme a Constituição, isto é, que melhor resguarde os demais fundamentos constitucionais potencialmente afetados (proteção da prerrogativa acusatória do Ministério Público para o exercício da pretensão punitiva estatal, proteção ao princípio da paridade de armas e vedação à proteção penal insuficiente), qual seja, a interpretação que compreenda a suspensão para aferição de repercussão geral como fator externo condicionante ao prosseguimento da persecução penal.
Segundo o relator, o prevalecimento da interpretação sugerida não descaracteriza o texto normativo nem contraria o fundamento principiológico que embasou a opção realizada pelo legislador. O inciso I do art. 116 do CP prevê como hipótese de suspensão do prazo de prescrição da pretensão punitiva a ausência de resolução, “em outro processo, de questão de que dependa a existência do crime”. A questão de repercussão geral cogitada de discussão é concernente à constitucionalidade de disposição passível de repercutir na tipicidade formal e material, antijuridicidade ou reprovabilidade de determinada conduta. Assim, segundo parâmetros literais de hermenêutica, com a seleção de um processo paradigma para julgamento da questão e o sobrestamento dos demais sobre o mesmo objeto, estará pendente de resolução, “em outro processo” (no processo paradigma), “questão de que dependa a existência do crime” que é cogitado nos processos.
O relator concluiu que o reconhecimento da repercussão geral da controvérsia constitui verdadeiro embaraço à resolução do processo. Tal óbice deve ser compatibilizado com a suspensão do prazo prescricional, justamente por ter-se formado uma barreira ao andamento regular do feito. A ação penal foi ajuizada a tempo e não foi abarcada por nenhuma hipótese caracterizadora de inércia. Então, questões estranhas ao processo que impeçam o seu fluxo regular devem acarretar também a paralisação do prazo prescricional, sob pena de quebra da organicidade do sistema jurídico.
Após, o julgamento foi suspenso.
(1) CPC/2015: “Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo. (…) § 5º Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional”.
(2) Decreto-Lei 3.688/1941: “Art. 50. Estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele: Pena – prisão simples, de três meses a um ano, e multa, de dois a quinze contos de réis, estendendo-se os efeitos da condenação à perda dos moveis e objetos de decoração do local. § 1º A pena é aumentada de um terço, se existe entre os empregados ou participa do jogo pessoa menor de dezoito anos. § 2º Incorre na pena de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis, quem é encontrado a participar do jogo, como ponteiro ou apostador. § 2o Incorre na pena de multa, de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), quem é encontrado a participar do jogo, ainda que pela internet ou por qualquer outro meio de comunicação, como ponteiro ou apostador. § 3º Consideram-se, jogos de azar: a) o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte; b) as apostas sobre corrida de cavalos fora de hipódromo ou de local onde sejam autorizadas; c) as apostas sobre qualquer outra competição esportiva. § 4º Equiparam-se, para os efeitos penais, a lugar acessível ao público: a) a casa particular em que se realizam jogos de azar, quando deles habitualmente participam pessoas que não sejam da família de quem a ocupa; b) o hotel ou casa de habitação coletiva, a cujos hóspedes e moradores se proporciona jogo de azar; c) a sede ou dependência de sociedade ou associação, em que se realiza jogo de azar; d) o estabelecimento destinado à exploração de jogo de azar, ainda que se dissimule esse destino”.
(3) CP/1940: “Art. 116. Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I – enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime”.
RE 966177 RG-QO/RS, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 1º.6.2017. (RE-966177)
Primeira Turma
DIREITO PENAL – FALSIDADE IDEOLÓGICA
Falsidade ideológica e acumulação de cargos públicos
A Primeira Turma, por unanimidade, rejeitou a denúncia oferecida contra deputado federal, em razão da ausência de justa causa necessária à instauração da ação penal [Código de Processo Penal, art. 395, III (1)].
Na peça acusatória, o “Parquet” imputa ao acusado a prática de falsidade ideológica [Código Penal, art. 299 (2)], em razão de assinatura do termo de posse no cargo de ouvidor da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), com a omissão da informação de que ocupava, desde o mês anterior, o cargo de secretário parlamentar na Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco (ALEPE). O termo de posse mencionado na exordial foi assinado tanto pelo superintendente da Sudene quanto pelo empossado (denunciado), apenas com a referência à juntada de “declaração de bens e rendimentos e, ainda, declaração quanto ao exercício ou não de outro cargo, emprego ou função pública”.
O Colegiado salientou que a inicial acusatória deve alicerçar-se em elementos probatórios mínimos que demonstrem a materialidade do fato delituoso e os indícios suficientes de autoria, em respeito aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Nesse contexto, pontuou que a denúncia não está acompanhada da mencionada “declaração quanto ao exercício ou não de outro cargo, emprego ou função pública”, que teria sido assinada pelo acusado e, assim, conferiria materialidade ao crime de falsidade ideológica.
Narrou que a referida “declaração de bens e valores” constitui um formulário preenchido pelo acusado, destinado ao controle da evolução patrimonial dos ocupantes de cargo em comissão na Sudene, no qual inexiste campo destinado à informação sobre acúmulo de cargos públicos.
Relatou que o não preenchimento, mencionado pelo “Parquet”, do item relativo aos “rendimentos recebidos de pessoas jurídicas pelo titular” está justificado no próprio documento, que orienta o subscritor, no caso de “declaração de ingresso”, a preencher unicamente alguns dos itens, entre os quais não se inclui aquele referido na denúncia.
A Turma consignou não haver qualquer dado material a comprovar a afirmação da denúncia, no sentido de que, “consciente e voluntariamente, omitiu tanto do respectivo termo quanto de seu anexo a informação de que já ocupava outro cargo público e recebia rendimentos correspondentes”. Assim, inexistindo qualquer campo no formulário sobre o acúmulo de cargos, não há justa causa para receber denúncia que imputa ao acusado a omissão dessa informação em documento público.
Ademais, o Colegiado asseverou que as decisões proferidas pelas esferas administrativas e jurisdicionais competentes são autônomas e independentes, razão por que o juízo criminal não está vinculado à decisão proferida no âmbito administrativo, seja ela contrária ou favorável ao jurisdicionado. Consectariamente, nenhuma repercussão sobre o presente feito têm as decisões proferidas no âmbito da Sudene e da Alepe quanto à ausência de prejuízo ou de má-fé do acusado, no que se refere ao acúmulo de cargos públicos. Pelas mesmas razões, a Turma ressaltou que o fato de uma mesma conduta ser sancionada por diferentes ramos do Direito não conduz à incidência do princípio da intervenção mínima, de modo a afastar a coercibilidade das normas de Direito Penal criminalizadoras da conduta.
(1) CPP/1941: “Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: (…) III – faltar justa causa para o exercício da ação penal”.
(2) CP/1940: “Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular”.
Segunda Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL – RECURSOS
‘Habeas corpus’: pedido de extensão e circunstâncias fáticas incomunicáveis
A Segunda Turma conheceu em parte, e, na parte conhecida, por unanimidade, indeferiu pedido de extensão dos efeitos do acórdão proferido neste “habeas corpus”. A ordem havia sido conferida para revogar a prisão preventiva do paciente, decretada nos autos de ações penais da 13ª Vara Federal da Seção Judiciária do Paraná, determinando sua substituição por medidas cautelares dela diversas [CPP, art. 319 (1)], a serem estabelecidas pelo juízo de origem. A Turma também não conheceu de outros pedidos de extensão no mesmo sentido formulados em favor de três réus.
Inicialmente, observou que o art. 580 (2) do Código de Processo Penal (CPP) é norma processual penal garantidora de tratamento jurídico isonômico para os corréus que apresentam idêntica situação jurídica à do réu beneficiado em seu recurso. De acordo com a referida norma, no caso de concurso de agentes, a decisão do recurso interposto por um deles aproveitará aos demais quando seus fundamentos não forem de caráter exclusivamente pessoal. Essa regra da teoria geral dos recursos é aplicável ao “habeas corpus”, porque, embora não seja recurso, é ação autônoma de impugnação e deve receber o mesmo tratamento legislativo.
A Turma asseverou defluir, ainda, do art. 580 do CPP que a extensão somente pode alcançar os que integram a mesma relação jurídico-processual daquele que foi beneficiado em seu recurso ou ação. Em razão disso, duas hipóteses de ordem objetiva não legitimam a invocação do dispositivo legal: (a) quando o requerente da extensão não participa da mesma relação jurídico-processual daquele que foi beneficiado por decisão judicial da Corte, o que evidencia a sua ilegitimidade; (b) quando se invoca extensão de decisão para outros processos que não foram examinados pela Corte, o que denuncia fórmula de transcendência dos motivos determinantes, com o propósito de promover a análise “per saltum” do título processual pelo Supremo Tribunal Federal, e expõe a risco o sistema de competências constitucionalmente estabelecido.
Desse modo, o Colegiado entendeu haver, em relação a um dos pedidos formulados, legitimidade do requerente, haja vista ele figurar como corréu do paciente beneficiado com a ordem em duas ações penais. Entretanto, julgou ser inviável a extensão na forma do art. 580 do CPP.
No que se refere à primeira dessas ações penais, registrou que o voto condutor do acórdão, ao reputar adequada a substituição da custódia do paciente por medidas cautelares diversas, considerou, além dos crimes investigados, a condição pessoal do paciente naquele contexto fático-processual. Segundo o Colegiado, não há relação de identidade com a situação do requerente. Existem, quanto a este, incomunicáveis circunstâncias fáticas na custódia processual com aquelas que viabilizaram a prisão do paciente do “habeas corpus”. Em razão disso, indeferiu-se o pedido de extensão.
No tocante à segunda ação penal, não há interesse de agir do requerente, visto que, ao contrário do que o juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba havia feito em relação ao paciente deste “habeas corpus”, não teria sido necessário decretar nova prisão cautelar do requerente.
A Turma não conheceu do pedido de extensão para outras três ações penais desse mesmo requerente, nas quais o paciente do “habeas corpus” não seria corréu. Citou, nesse sentido, o que decidido no julgamento do HC 118.533/MS (DJE de 24.4.2017). Salientou que o propósito da defesa do requerente seria o de promover, pelo mecanismo da transcendência dos motivos determinantes, o controle de legalidade, diretamente pelo STF, de decisões estranhas ao objeto do presente “writ”, em ofensa ao sistema de competências constitucionalmente estabelecido.
Por fim, a Turma também não conheceu dos pedidos de extensão de outros dois requerentes por entender que isso seria pretensão revisional do que fixado no HC 138.850/PR (DJE de 16.3.2017) e no HC 141.431/PR (DJE de 22.3.2017), cujos agravos regimentais pendem de julgamento. Frisou que, quando forem julgados os referidos agravos, o relator, com base na adequada instrução daqueles “habeas corpus”, disporá de melhores condições de reavaliar precisamente a situação prisional dos requerentes, à luz do entendimento firmado pelo Colegiado neste “habeas corpus”. Do contrário, seria decidir, por via transversa, os agravos regimentais daqueles “habeas corpus”, em manifesta usurpação da competência do juiz natural da causa.
HC 137728 EXTN/PR, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 30.5.2017. (HC-137728)
Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos Julgamentos por meio eletrônico*
1ª Turma 30.5.2017 — 2 113
2ª Turma 30.5.2017 — 10 111
* Emenda Regimental 51/2016-STF. Sessão virtual de 26 de maio a 1 de junho de 2017.
Inovações Legislativas
29 de maio a 2 de junho de 2017
Medida Provisória nº 783, de 31.5.2017 – Institui o Programa Especial de Regularização Tributária junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Publicada no DOU em 31.5.2017, Seção 1, Edição Extra nº 103, p. 9.
Outras Informações
29 de maio a 2 de junho de 2017
Decreto nº 9.069, de 31.5.2017 – Altera o Decreto nº 9.013, de 29 de março de 2017, que regulamenta a Lei nº 1.283, de 18 de dezembro de 1950, e a Lei nº 7.889, de 23 de novembro de 1989, que dispõem sobre a inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal. Publicada no DOU em 01.6.2017, Seção 1, Edição nº 104, p. 1.
Secretaria de Documentação – SDO
Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD