Brasília, 28 de fevereiro a 4 de março de 2011 Nº 618
Data (páginas internas): 11 de março de 2011
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
Sumário
Plenário
Desapropriação e fundamentos – 1
Desapropriação e fundamentos – 2
Fungibilidade recursal e imposição de multa
ADI e piso salarial estadual – 1
ADI e piso salarial estadual – 2
ADI e piso salarial estadual – 3
Piso salarial estadual e liberdade sindical
Termo inicial do prazo para registro de aposentadoria
1ª Turma
Tribunal do Júri e nulidades
Redimensionamento da pena e prescrição
“Mula” e causa de diminuição de pena
Lei 11.689/2008: confissão espontânea e autodefesa – 1
Lei 11.689/2008: confissão espontânea e autodefesa – 2
Princípio da insignificância e furto em penitenciária
2ª Turma
Desapropriação por utilidade pública e princípio da justa indenização
“Mula” e causa de diminuição de pena
Dolo eventual e qualificadora: incompatibilidade
Repercussão Geral
Transcrições
Livramento condicional e crime superveniente (HC 105497/RJ)
Inovações Legislativas
Plenário
Desapropriação e fundamentos – 1
O Plenário iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da República, consistente em decreto que declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, propriedade rural localizada no Município de Sapé/PB. O impetrante alega que o processo que subsidiara o ato impetrado teria violado o art. 2º, § 6º, da Lei 8.629/93 (“Art. 2º A propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de desapropriação, nos termos desta lei, respeitados os dispositivos constitucionais. … §6o O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o descumprimento dessas vedações.”), já que o imóvel em questão teria sido alvo de sucessivas invasões provocadas pelo Movimento dos Sem Terra – MST, fatos comprovados por meio de sentença transitada em julgado de ação de reintegração de posse.
MS 26336/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2.3.2011. (MS-26336)
Desapropriação e fundamentos – 2
O Min. Joaquim Barbosa, relator, denegou a ordem. considerou que o conjunto probatório constante dos autos apresentaria controvérsia cuja solução não seria viável por meio de mandado de segurança, pois não estaria claro se os ocupantes das áreas em questão seriam realmente invasores, pertencentes ao MST, ou trabalhadores fixados originariamente no local. Além disso, aduziu não haver prova cabal de que a região supostamente invadida pertenceria ao impetrante. Dessa forma, concluiu inexistir direito líquido e certo a autorizar o deferimento do pedido. Em divergência, os Ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Ellen Gracie concederam a segurança. Afirmaram haver inquestionável evidência acerca da invasão à propriedade do impetrante, corroborada por sucessivas decisões judiciais. Ademais, reputaram que a vistoria que dera base ao ato impugnado ocorrera de forma ilegal, pois realizada após a ocupação das terras, fato que teria contaminado o referido Decreto. Salientaram, por fim, que o objetivo da lei seria impedir invasões e evitar conflitos no campo, o que superaria qualquer fundamento utilizado para a desapropriação. Após, pediu vista dos autos o Min. Dias Toffoli.
MS 26336/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2.3.2011. (MS-26336)
Fungibilidade recursal e imposição de multa
O Plenário, após receber embargos de declaração como agravo regimental, a este negou provimento e impôs ao recorrente a multa descrita no art. 18, caput, do CPC (“O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.”). Consignou-se o caráter eminentemente protelatório do recurso, a justificar a imposição de multa. O Min. Marco Aurélio, no ponto, salientou que, entretanto, essa multa não poderia ser a descrita no § 2º do art. 557 do CPC (“Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor.”), pois a parte não teria interposto agravo. Após, determinou-se a imediata baixa dos autos à origem. Vencido, quanto à conversão, o Min. Marco Aurélio.
RE 465383 ED-EDv-AgR-AgR/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (RE-465383)
ADI e piso salarial estadual – 1
Por reputar usurpada a competência privativa da União para legislar sobre Direito do Trabalho (CF, art. 22, I, e parágrafo único), o Plenário, em apreciação conjunta de duas ações diretas, julgou, por maioria, procedente em parte o pedido formulado na ADI 4375/RJ e integralmente procedente o na ADI 4391/RJ, propostas, respectivamente, pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo – CNC e pela Confederação Nacional da Indústria – CNI. Em conseqüência, declarou a inconstitucionalidade da expressão “que o fixe a maior”, contida no caput do art. 1º da Lei 5.627/2009, do Estado do Rio de Janeiro, a qual institui pisos salariais, no âmbito estadual, para as categorias profissionais que menciona, não definidos em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho que os fixem a maior. Inicialmente, rejeitaram-se as preliminares de ilegitimidade ativa das requerentes e de falta de pertinência temática, esta no sentido de que as autoras apenas poderiam impugnar a norma relativamente às profissões por elas representadas. Aduziu-se que os vícios de inconstitucionalidade apontados independeriam da categoria contemplada, sendo idênticos para todos os destinatários.
ADI 4375/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4375)
ADI 4391/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4391)
ADI e piso salarial estadual – 2
No mérito, enfatizou-se que a discussão não seria nova no STF. Registrou-se que a norma em apreço daria continuidade a uma série de leis que fixariam, desde 2000, pisos salariais naquela unidade federativa e que inovaria somente quanto à expressão “que o fixe a maior”. Entendeu-se que a mencionada inclusão extrapolaria os limites da delegação legislativa conferida pela Lei Complementar federal 103/2000, a qual autoriza os Estados-membros e o Distrito Federal a instituir o piso salarial a que se refere o art. 7º, V, da CF, por aplicação do disposto no parágrafo único do seu art. 22. Consignou-se que a referida lei complementar permitiria aos Estados fixar piso salarial para os trabalhadores não abrangidos por lei federal ou por alguma forma de negociação coletiva. Assim, salientou-se inexistir norma autorizadora da instituição de piso salarial estadual para categorias que já possuíssem piso definido em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho. Asseverou-se que lei estadual que ultrapasse as balizas da lei delegadora de competência privativa da União seria inconstitucional por ofensa direta às regras constitucionais de repartição de competência legislativa. Assinalou-se, ainda, não ser o caso de aplicação do postulado da norma mais favorável ao trabalhador (CF, art. 7º, caput), pois não se estaria diante de conflito de normas trabalhistas. Repeliu-se, ademais, a pretendida modulação de efeitos, uma vez que a expressão questionada estaria com a sua eficácia suspensa desde 9.2.2010, por decisão proferida pela Corte local, em sede de representação de inconstitucionalidade.
ADI 4375/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4375)
ADI 4391/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4391)
ADI e piso salarial estadual – 3
No que concerne à ADI 4375/RJ, que impugnava a lei carioca em sua integralidade, afastou-se a assertiva de que tal norma não poderia instituir o mesmo piso salarial para atividades profissionais de diferentes planos econômicos sem observância da extensão e da complexidade do trabalho (CF, art. 7º, V). Realçou-se que a lei não teria atualizado os valores dos níveis de piso salarial anteriormente fixados e nem aumentado o número de patamares (de 3 para 9) de forma aleatória. Afirmou-se, também, a inexistência de violação ao art. 8º, I, da CF, dado que o diploma normativo em tela não comprometeria a atuação das entidades sindicais, que poderão continuar atuando nas negociações coletivas para estabelecer o salário das categorias profissionais que representam. Rechaçou-se, ainda, o argumento de que a lei fluminense ofenderia o art. 114, § 2º, da CF, porquanto não teria previsto o dissídio coletivo como exceção ao piso salarial. Reiterou-se que a lei questionada não incidiria sobre os empregados que possuiriam piso salarial definido em lei federal, convenção ou acordo coletivo, reproduzindo a limitação imposta pela Lei Complementar 103/2000. Por fim, considerou-se não se ter malferido o princípio da isonomia (CF, art. 5º, caput), haja vista que a norma estadual estaria em consonância com os objetivos que se visaria atender mediante a adoção de pisos salariais por via legislativa, qual seja, a proteção de certas categorias específicas de trabalhadores. Vencidos os Ministros Ayres Britto que assentava a improcedência de ambos os pleitos e Marco Aurélio que, no tocante à aludida ADI 4375/RJ, declarava o pedido integralmente procedente ao fundamento de que a norma contestada teria fixado verdadeiro salário mínimo.
ADI 4375/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4375)
ADI 4391/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4391)
Piso salarial estadual e liberdade sindical
Por considerar violado o princípio constitucional da liberdade sindical (art. 8º, I), o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta proposta pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo – CNC para declarar a inconstitucionalidade da expressão “com a participação do Governo do Estado de Santa Catarina”, contida no parágrafo único do art. 2º da Lei Complementar 459/2009, dessa mesma unidade federativa. O preceito impugnado estabelece que a atualização dos pisos salariais fixados naquele diploma legislativo serão objeto de negociação coletiva entre as entidades sindicais dos trabalhadores e empregadores, com a participação do governo estadual. Entendeu-se que a exigência da participação do governo nessas negociações coletivas, ainda que os valores dos pisos salariais tivessem sido fixados por via legislativa, implicaria restrição à autonomia sindical, uma vez que competiria aos interlocutores sociais, e não ao Estado-membro, a iniciativa autônoma de inaugurar, desenvolver e concluir as negociações coletivas. No mais, aplicou-se a orientação firmada no caso acima relatado.
ADI 4364/SC, rel. Min. Dias Toffoli, 2.3.2011. (ADI-4364)
Termo inicial do prazo para registro de aposentadoria
O termo a quo do prazo de 5 anos para que o Tribunal de Contas da União – TCU examine a legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões, conta-se a partir da data de chegada do processo administrativo na própria Corte de Contas. Essa a conclusão do Plenário que, em votação majoritária, concedeu parcialmente mandado de segurança para, cassada a decisão do TCU, assegurar ao impetrante o contraditório e a ampla defesa no julgamento da legalidade e registro de sua aposentadoria. Tratava-se, na espécie, de writ impetrado contra decisão daquele tribunal que, por reputar ilegal uma das três aposentadorias do impetrante, com recusa do registro, determinara a suspensão do benefício e a restituição das importâncias recebidas. Considerou-se o fato de que o impetrante estaria recebendo o benefício de aposentadoria há mais de 10 anos quando do seu cancelamento. Aduziu-se que, no caso, ter-se-ia a anulação do benefício, sem que oportunizada a possibilidade de defesa. Enfatizou-se, ainda, não constar dos autos informação relativa à má-fé do impetrante, de modo a não se poder inferir que ele tivesse conhecimento da precariedade do ato praticado pelo órgão público. Consignou-se, por fim, a não devolução das quantias já recebidas. Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, Dias Toffoli e Marco Aurélio, que concediam a ordem apenas para isentar o impetrante da devolução dos valores, e Cezar Peluso, Presidente, que a concedia totalmente por reconhecer a decadência.
MS 24781/DF, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 2.3. 2011. (MS-24781)
Primeira Turma
Tribunal do Júri e nulidades
A 1ª Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que pretendida a mitigação da pena imposta ao paciente, condenado por 2 homicídios simples, em concurso material, à pena de 13 anos de reclusão, o que totalizara uma pena de 26 anos. Na espécie, contra a primeira decisão do Tribunal do Júri que condenara o paciente a uma pena total de 22 anos de reclusão, a defesa apelara e o parquet não se insurgira. No julgamento que se seguira, o paciente fora absolvido, o que ensejara apelação do Ministério Público, provida, com determinação de novo Júri, ao fundamento de que a absolvição seria contrária à prova dos autos. No 3º julgamento, o paciente recebera uma pena 4 anos superior àquela inicialmente proferida – acréscimo de 2 anos para cada homicídio –, em razão da sua propalada torpeza. O Min. Dias Toffoli, relator, negou provimento ao recurso, mas concedeu a ordem, de ofício, para decotar da pena o acréscimo decorrente da citada qualificadora, restabelecendo a condenação à pena de 11 anos de reclusão para cada um dos homicídios. Rejeitou as alegações de nulidade do processo por falta de fundamentação no tocante à fixação da pena-base (em piso superior ao mínimo legal) e da necessidade de reconhecimento da continuidade delitiva entre os crimes perpetrados. Salientou a jurisprudência do STF no sentido de ser suficiente a presença de uma das circunstâncias judiciais desfavoráveis para que a pena básica não fique no patamar mínimo, e, ainda, de ser incabível o reexame de matéria fático-probatória na via eleita. Por sua vez, o Min. Marco Aurélio, tendo em conta que, no 1º julgamento, o juízo fixara a pena de 11 anos para cada crime, com o silêncio do Ministério Público e, no 2º, absolvera o réu, entendeu que, no 3º julgamento o magistrado não poderia chegar a uma pena superior àquela do patamar inicial. Após, pediu vista a Min. Cármen Lúcia.
RHC 103170/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 1º.3.2011. (RHC-103170)
Redimensionamento da pena e prescrição
O acórdão de segundo grau que, ao confirmar a condenação, modifica a pena de modo a refletir no cálculo do prazo prescricional, tem relevância jurídica e, portanto, deve ser considerado marco interruptivo da prescrição da pretensão punitiva do Estado. Com base nesse entendimento, a 1ª Turma indeferiu habeas corpus em que pretendido o reconhecimento da prescrição, porquanto passados mais de 14 anos entre a data da sentença condenatória — exarada sob a égide do texto primitivo do inciso IV do art. 117 do CP — e a do julgamento do recurso no STJ. Inicialmente, observou-se que a pena de reclusão fixada em 2 anos e 6 meses, em primeira instância, fora elevada para 4 anos e 6 meses quando do julgamento do recurso de apelação. Após, consignou-se que, independentemente da discussão acerca da retroatividade, ou não, da regra trazida pela Lei 11.596/2007, na época em que prolatada a sentença, já haveria jurisprudência consolidada do STF no sentido da citada orientação. Ressaltou-se que, considerada a pena de 4 anos e 6 meses de reclusão, o prazo prescricional seria de 12 anos (CP, art. 109, III), não tendo transcorrido lapso superior entre as causas de interrupção do prazo prescricional.
HC 106222/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1º.3.2011. (HC-106222)
“Mula” e causa de diminuição de pena
A 1ª Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que se pretende seja aplicada, em favor de condenado por tráfico de entorpecentes pelo transporte 1,5 kg de cocaína, a causa de diminuição da pena do § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 e a atenuante genérica decorrente da confissão espontânea. O Min. Dias Toffoli, relator, afastou a tese da confissão espontânea e deu provimento parcial ao recurso por reputar que a quantidade de droga transportada não implicaria, por si só, participação em organização criminosa. Considerou que o paciente, sem registro de nenhuma outra ocorrência com o tráfico, seria uma simples “mula”, cuja conduta poderia ser enquadrada como traficância menor ou eventual. Após, pediu vista o Min. Ricardo Lewandowski.
RHC 103556/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 1º.3.2011. (RHC-103556)
Lei 11.689/2008: confissão espontânea e autodefesa – 1
A 1ª Turma concedeu habeas corpus para restabelecer a condenação dos pacientes nos moldes estipulados pelo Juiz Presidente do Tribunal do Júri. Na espécie, o magistrado reconhecera, de ofício, na autodefesa, a atenuante da confissão espontânea, embora a defesa técnica não a tivesse expressamente aventado nos debates orais. A decisão ensejara apelação do Ministério Público, a qual desprovida pelo Tribunal de Justiça estadual , com base no art. 65, III, d, do CP (“Art. 65 – São circunstâncias que sempre atenuam a pena: … III – ter o agente: … d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime”). O parquet interpusera recurso especial, provido, com alicerce no art. 492, I, b, do CPP (“Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que: … I – no caso de condenação: … b) considerará as circunstâncias agravantes ou atenuantes alegadas nos debates”). De início, observou-se que a antinomia poderia ser resolvida pelos critérios da cronologia e da especialidade, a conferir ao art. 492 do CPP primazia frente ao art. 65 do CP. Explicou-se que a norma processual do Tribunal do Júri seria mais recente (incluída pela Lei 11.689/2008). Além disso, ela dispensaria tratamento específico à atenuante, a impor condições ao seu reconhecimento apenas no julgamento pelo Tribunal do Júri. Considerou-se, no entanto, que essa linha de raciocínio não se harmonizaria com o princípio constitucional da individualização da pena.
HC 106376/MG, rel. Min. Cármen Lúcia, 1º.3.2011. (HC-106376)
Lei 11.689/2008: confissão espontânea e autodefesa – 2
Em seguida, esclareceu-se que, ao impedir o reconhecimento da atenuante pelo Juiz Presidente, igualar-se-ia o agente que confessasse o crime àquele que negasse os fatos. Reputou-se que o legislador infraconstitucional, no art. 68 do CP, ao determinar que o juiz percorra, na segunda fase da dosimetria, as circunstâncias legais, consistentes nas agravantes e nas atenuantes, pretenderia enfatizar que o réu que confessasse o crime se distinguiria daquele que dificultasse a prestação jurisdicional e até não demonstrasse qualquer arrependimento. Entendeu-se que a decisão do STJ ignoraria o princípio da proporcionalidade, haja vista que estabeleceria resultado final incompatível com as circunstância que envolveriam o delito e o seu protagonista. Consignou-se que a própria natureza da atenuante em questão, a exemplo de outras, teria caráter objetivo de modo que a sua constatação independeria do subjetivismo do julgador. Ponderou-se ser impróprio determinar que se desconsiderasse aquilo que não fosse expressamente realizado pela defesa técnica, apesar de feito pelo próprio acusado. Salientou-se que, ao impor a cláusula dos debates, o legislador voltar-se-ia às agravantes de natureza subjetiva. No ponto, aduziu-se que o Juiz Presidente, então, deveria dar atenção aos dados que, a teor do art. 483 do CPP, não seriam submetidos à apreciação dos jurados, mas repercutiriam na pena. Concluiu-se que, no caso, o juiz e o Tribunal mineiro teriam acertado ao julgar que o magistrado poderia e deveria ter levado em conta a autodefesa, e que a Constituição Federal, em seu art. 5º, compreenderia toda a defesa.
HC 106376/MG, rel. Min. Cármen Lúcia, 1º.3.2011. (HC-106376)
Princípio da insignificância e furto em penitenciária
A 1ª Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus no qual se pretende a aplicação do princípio da insignificância a condenado pela tentativa de subtração de 1 cartucho de tinta para impressora do Centro de Progressão Penitenciária, em que trabalhava e cumpria pena por delito anterior. O Min. Ricardo Lewandowski, relator, negou provimento ao recurso. Asseverou que não haveria como se considerar reduzido o grau de reprovabilidade da conduta do paciente, porque durante o cumprimento da pena ele tentara, no próprio estabelecimento penitenciário, furtar um bem do Estado. Ressaltou que esse comportamento mostraria uma propensão do paciente para praticar delitos contra o patrimônio. Ademais, reputou que o encarceramento não surtira qualquer efeito no sentido de ressocializá-lo. Após, pediu vista dos autos o Min. Dias Toffoli.
RHC 106731/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1º.3.2011. (RHC-106731)
Segunda Turma
Desapropriação por utilidade pública e princípio da justa indenização
A 2ª Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário no qual se discute se o valor da justa indenização para satisfazer o direito de propriedade (CF, art. 5º, XXII e XXIV) deve, ou não, incluir, em seu bojo, as perdas do proprietário decorrentes da desvalorização de sua propriedade e de seus produtos, independentemente, da reavaliação do material fático-probatório. Na espécie, parte da propriedade do recorrente fora declarada de utilidade pública para a construção de três estações de tratamento de esgoto – ETEs, não tendo sido incluídos, nos valores pagos a título de indenização, os lucros cessantes decorrentes da desvalorização da área remanescente, utilizada no plantio e beneficiamento de laranja para fins de exportação, nos quais empregada alta tecnologia. O Min. Gilmar Mendes, relator, deu parcial provimento ao recurso para incluir na condenação os valores referentes à desvalorização das terras remanescentes. Entendeu que a discussão da tese jurídica referente à exclusão de elementos supostamente ínsitos ao princípio da justa indenização não demandaria o reexame da prova, de modo a afastar a incidência do Enunciado 279 da Súmula do STF. Aduziu que se trataria, na realidade, de intervenção administrativa na propriedade para a concretização de fins públicos e, por isso, todo prejuízo causado pela Administração, no exercício de seu ius imperii, haveria de ser recomposto ao patrimônio do expropriado. Asseverou que, sob pena de violação do núcleo essencial do postulado em apreço, em que se funda o direito de propriedade, seria inconcebível não levar em consideração a perda do valor do bem remanescente e de seus produtos. Após, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.
RE 567708/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 1º.3.2011. (RE-567708)
“Mula” e causa de diminuição de pena
A 2ª Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende seja aplicada, em favor de condenada por tráfico de entorpecentes pelo transporte de 951 g de cocaína, a causa de diminuição da pena do § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006. No caso, as instâncias de origem, embora tenham reconhecido que a ré seria primária, portadora de bons antecedentes e não se dedicaria à atividade criminosa, concluíram que, de fato, ela integraria organização criminosa e, portanto, não teria jus à citada causa de diminuição. O Min. Ayres Britto, relator, concedeu a ordem sob o fundamento de que o fato de transportar droga, por si só, não seria o bastante para afirmar que a paciente integraria organização criminosa. Ressaltou que as organizações criminosas se aproveitariam de pessoas vulneráveis socialmente para a arriscada tarefa de transportar entorpecentes, que tal atividade não teria reconhecimento para o mundo do tráfico e que essas pessoas seriam descartáveis para o grupo criminoso. Em divergência, a Min. Ellen Gracie, denegou a ordem, no que foi acompanhada pelos Ministros Joaquim Barbosa e Celso de Mello. Considerou que o tráfico internacional não existiria sem o transporte da droga pelas chamadas “mulas”. Após, pediu vista o Min. Gilmar Mendes.
HC 101265/SP, rel. Min. Ayres Britto, 1º.3.2011. (HC-101265)
Dolo eventual e qualificadora: incompatibilidade
São incompatíveis o dolo eventual e a qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do art. 121 do CP (“§ 2º Se o homicídio é cometido: … IV – à traição, de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido”). Com base nesse entendimento, a 2ª Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado à pena de reclusão em regime integralmente fechado pela prática de homicídio qualificado descrito no artigo referido. Na espécie, o paciente fora pronunciado por dirigir veículo, em alta velocidade, e, ao avançar sobre a calçada, atropelara casal de transeuntes, evadindo-se sem prestar socorro às vítimas. Concluiu-se pela ausência do dolo específico, imprescindível à configuração da citada qualificadora e, em conseqüência, determinou-se sua exclusão da sentença condenatória. Precedente citado: HC 86163/SP (DJU de 3.2.2006).
HC 95136/PR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.3.2011. (HC-95136)
Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos
Pleno — 2 e 3.3.2011 61
1ª Turma 1º.3.2011 — 15
2ª Turma 1º.3.2011 — 228
R e p e r c u s s ã o G e r a l
DJe 28 de fevereiro a 4 de março de 2011
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 601.967-RS
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – DIREITO DE CRÉDITO – PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE – LEI COMPLEMENTAR Nº 122/2006. Possui repercussão geral a controvérsia sobre caber ou não a lei complementar – no caso, a nº 122/06 – dispor sobre o direito à compensação de créditos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços.
REPERCUSSÃO GERAL POR QO EM AG. REG. NO RE N.614.232-RS
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
TRIBUTÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE VALORES RECEBIDOS ACUMULADAMENTE. ART. 12 DA LEI 7.713/88. ANTERIOR NEGATIVA DE REPERCUSSÃO. MODIFICAÇÃO DA POSIÇÃO EM FACE DA SUPERVENIENTE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI FEDERAL POR TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL.
1.A questão relativa ao modo de cálculo do imposto de renda sobre pagamentos acumulados – se por regime de caixa ou de competência – vinha sendo considerada por esta Corte como matéria infraconstitucional, tendo sido negada a sua repercussão geral.
2. A interposição do recurso extraordinário com fundamento no art. 102, III, b, da Constituição Federal, em razão do reconhecimento da inconstitucionalidade parcial do art. 12 da Lei 7.713/88 por Tribunal Regional Federal, constitui circunstância nova suficiente para justificar, agora, seu caráter constitucional e o reconhecimento da repercussão geral da matéria.
3.Reconhecida a relevância jurídica da questão, tendo em conta os princípios constitucionais tributários da isonomia e da uniformidade geográfica.
4. Questão de ordem acolhida para: a) tornar sem efeito a decisão monocrática da relatora que negava seguimento ao recurso extraordinário com suporte no entendimento anterior desta Corte; b) reconhecer a repercussão geral da questão constitucional; e c) determinar o sobrestamento, na origem, dos recursos extraordinários sobre a matéria, bem como dos respectivos agravos de instrumento, nos termos do art. 543-B, § 1º, do CPC.
REPERCUSSÃO GERAL POR QO EM AG. REG. NO RE N.614.406-RS
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
TRIBUTÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE VALORES RECEBIDOS ACUMULADAMENTE. ART. 12 DA LEI 7.713/88. ANTERIOR NEGATIVA DE REPERCUSSÃO. MODIFICAÇÃO DA POSIÇÃO EM FACE DA SUPERVENIENTE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI FEDERAL POR TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL.
1.A questão relativa ao modo de cálculo do imposto de renda sobre pagamentos acumulados – se por regime de caixa ou de competência – vinha sendo considerada por esta Corte como matéria infraconstitucional, tendo sido negada a sua repercussão geral.
2. A interposição do recurso extraordinário com fundamento no art. 102, III, b, da Constituição Federal, em razão do reconhecimento da inconstitucionalidade parcial do art. 12 da Lei 7.713/88 por Tribunal Regional Federal, constitui circunstância nova suficiente para justificar, agora, seu caráter constitucional e o reconhecimento da repercussão geral da matéria.
3. Reconhecida a relevância jurídica da questão, tendo em conta os princípios constitucionais tributários da isonomia e da uniformidade geográfica.
4.Questão de ordem acolhida para: a) tornar sem efeito a decisão monocrática da relatora que negava seguimento ao recurso extraordinário com suporte no entendimento anterior desta Corte; b) reconhecer a repercussão geral da questão constitucional; e c) determinar o sobrestamento, na origem, dos recursos extraordinários sobre a matéria, bem como dos respectivos agravos de instrumento, nos termos do art. 543-B, § 1º, do CPC.
Decisões Publicadas: 3
Transcrições
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Livramento condicional e crime superveniente (Transcrições)
(v. Informativo 616)
HC 105497/RJ*
RELATOR: Min. Gilmar Mendes
RELATÓRIO: Trata-se de habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado por ** e outro, em favor de **. Nestes autos, a defesa questiona decisão proferida pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça nos autos do HC n. 151.551/RJ, relator Ministro Jorge Mussi, que denegou a ordem pleiteada, nos termos da ementa abaixo transcrita:
“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DA PENA. LIVRAMENTO CONDICIONAL. SUSPENSÃO CAUTELAR DO BENEFÍCIO. NOTÍCIA DA PRÁTICA DE NOVO CRIME DURANTE A VIGÊNCIA DO PERÍODO DE PROVA. ARTIGO 145 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA.
1. O cometimento de novo delito durante o período de prova do livramento condicional autoriza a suspensão cautelar do citado benefício, consoante se extrai do art. 145 da LEP, porquanto, a teor do 86 do Código Penal, apenas a sua revogação definitiva exige condenação com trânsito em julgado. Precedentes.
2. Ordem denegada” – (HC 151.551/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, unânime, DJe 13.9.2010).
Segundo a inicial, o paciente foi condenado à pena de 8 (oito) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em razão de duas condenações oriundas das 16ª e da 31ª varas criminais da comarca do Rio de Janeiro.
Em 12 de dezembro de 2007, o Juízo das Execuções Penais do Rio de Janeiro concedeu ao sentenciado o benefício do livramento condicional.
Em 28 de janeiro de 2009, o paciente foi denunciado por infração ao art. 155, § 4º, I, do CP (Processo n. 2009.001.020602-0), tendo sido decretada sua prisão preventiva para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal.
Posteriormente, não vislumbrando mais a existência dos motivos que autorizavam a segregação cautelar, o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca da Capital/RJ concedeu liberdade provisória ao acusado.
Com a revogação da preventiva, a defesa pleiteou ao Juízo da Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro a não suspensão do livramento condicional até a prolação da sentença referente ao novo processo instaurado em desfavor do paciente.
O Juízo da Execução negou o pleito e suspendeu o livramento condicional, considerando que o apenado cometeu novo crime durante o período de prova do referido benefício, nos termos do art. 145 da LEP.
Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que denegou a ordem pleiteada.
Eis a ementa desse julgado:
“Trata-se de Habeas Corpus impetrado sob fundamento de que não há justa causa para a suspensão do livramento condicional. Paciente que cumpre pena por crime de roubo e furto e, durante o gozo do livramento condicional, é denunciado pelo cometimento de outro crime patrimonial. Suspensão cautelar do benefício que se mostra necessária, vez que o apenado, em liberdade, põe em perigo a ordem pública. Pelo disposto no artigo 145, da Lei de Execução Penal, a prática de novo delito durante o período de prova é causa forçosa da suspensão do benefício. Inexistência de constrangimento ilegal. Denegação da ordem”.
Impetrado novo habeas perante o Superior Tribunal de Justiça, este não vislumbrou ilegalidade alguma na decisão que suspendeu o livramento condicional e denegou a ordem.
Neste habeas, inicialmente, assevera a defesa que o Juízo de 1º grau somente poderia afirmar “a prática de novo crime” após o trânsito em julgado da sentença condenatória, sob pena de afronta à presunção de não culpabilidade.
Destaca, ainda, que, dado o caráter excepcional da medida, o Juízo deveria indicar que o liberado não está em condições de prosseguir no convívio social.
Ressalta, ademais, que o paciente responde ao processo em liberdade pelo delito supostamente praticado durante o período de prova do livramento condicional, o que deslegitima a imposição da prisão, embora seja suspensa a contagem do tempo relativo a esse período.
Aduz que, “embora a prática de crime no curso do período de prova do livramento condicional importe na suspensão do benefício legal, a eventual prisão do liberado somente se justifica se motivada cautelarmente”.
Menciona, também: “afigura-se verdadeira contradição estar o paciente solto na nova ação penal, e a simples existência dessa nova ação penal dar ensejo, não só a afirmativa de que o paciente ‘cometeu novo crime’, mas também de impor sua prisão cautelar.”
Pede, liminarmente, a suspensão, até o julgamento do mérito do presente feito, dos efeitos da decisão que suspendeu o livramento condicional e determinou a prisão do paciente.
Por fim, pugna pela concessão da ordem para que, conquanto mantida a suspensão do referido benefício, seja cassada a constrição cautelar imposta até o trânsito em julgado da nova ação penal.
Indeferi a liminar em 6 de outubro de 2010.
A Procuradoria-Geral da República opinou pela denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO: No presente habeas corpus, a defesa sustenta que, a despeito de a prática de crime no curso do período de prova do livramento condicional importar na suspensão do benefício legal, “a eventual prisão do liberado somente se justifica se motivada cautelarmente”, o que não se daria no caso dos autos, na medida em que a decisão originária teria, de forma automática, imposto a segregação do paciente.Consoante relatado, o paciente foi condenado à pena de 8 (oito) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em razão de duas condenações oriundas das 16ª e da 31ª varas criminais da comarca da Capital/RJ, tendo sido contemplado, em 12 de dezembro de 2007, pelo Juízo das Execuções Penais, com o benefício do livramento condicional.
Ocorre que, em 28 de janeiro de 2009, o paciente foi denunciado e preso preventivamente por infração ao art. 155, § 4º, I, do CP (Processo n. 2009.001.020602-0), tendo o Juízo das Execuções, nos termos do art. 145 da LEP, suspendido o livramento condicional, em razão da prática desse novo crime durante o período de prova do benefício.
Com a revogação da preventiva, a defesa pleiteou ao Juízo da Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro a não suspensão do livramento condicional até a prolação da sentença referente ao novo processo instaurado em desfavor do paciente, pedido esse indeferido, ao fundamento de que o apenado cometeu novo crime durante o período de prova do referido benefício, nos termos do art. 145 da LEP.
Daí, sustentar a defesa o desacerto da decisão do Juízo de 1º grau. Para tanto, aduz que “se não há motivo para manter-se, no processo em que se apura o suposto novo crime, a segregação cautelar, obviamente, também não há para, em decorrência do mesmo fato, manter-se, no processo de execução criminal, medida preventiva de idêntica finalidade, como é a prisão no art. 145 da Lei de Execução Penal.” Salienta, ademais, que somente se poderia afirmar “a prática de novo crime” após o trânsito em julgado da sentença condenatória, sob pena de afronta à presunção de não culpabilidade.
Postas essas premissas, e atento sobretudo às peculiaridades do caso concreto, entendo que a espécie comporta a concessão da ordem, porém por motivo diverso do alegado pelo impetrante. Explico.
De fato, a prática de outro delito pelo condenado, no período de prova do livramento condicional, autoriza a suspensão cautelar do benefício, nos termos dos arts. 145 da LEP e 732 do CPP. Confira-se:
“Art. 145 da LEP: Praticada pelo liberado outra infração penal, o Juiz poderá ordenar a sua prisão, ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério Público, suspendendo o curso do livramento condicional, cuja revogação, entretanto, ficará dependendo da decisão final.”
“Art. 732 do CPP: Praticada pelo liberado nova infração, o juiz ou o tribunal poderá ordenar a sua prisão, ouvido o Conselho Penitenciário, suspendendo o curso do livramento condicional, cuja revogação ficará, entretanto, dependendo da decisão final no novo processo.”
No ponto, observo que a suspensão do livramento condicional não pode ser confundida com a sua revogação, na medida em que a própria legislação dispõe que esta última pressupõe decisão final, conforme disposto no art. 145 da LEP e no art. 732 do CPP.
Dessarte, imperioso enfatizar que, cometida outra infração pelo apenado no curso do livramento condicional, cabe, inicialmente, a suspensão do benefício, ao passo que a sua revogação, esta, sim, ficará sujeita à decisão final, com o respectivo trânsito em julgado e, portanto, irrecorrível.
Por isso é que se diz que a suspensão do livramento condicional tem natureza jurídica de medida cautelar, consoante bem enfatizado pelo Min. Sepúlveda Pertence, no julgamento do HC n. 81.879/SP, ao afirmar que “a suspensão do curso do livramento condicional até a decisão definitiva do processo resultante da imputação da prática do crime durante a sua vigência é medida cautelar, dependente de decisão judicial específica” (HC n. 81.879/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, unânime, DJe 20.9.2002).
Nesses termos, levando-se em conta que a suspensão do livramento condicional tem natureza cautelar, reputo que a decisão que a suspende, e determina o retorno do infrator ao cárcere, deve ser fundamentada tal e qual seria decisão de decreto de prisão preventiva. Não há de ser automática, e menos ainda ex vi do art. 145 da LEP. A irresignação da defesa afigura-se plausível, uma vez que o magistrado não fundamentou o novel recolhimento em suspensão ao livramento condicional, e o sistema jurídico-penal brasileiro não permite reclusões sem a devida demonstração de seu fundamento. Por oportuno, colho a decisão proferida pelo Juízo da execução para suspender o livramento condicional do paciente:
“1) Suspendo o LC, pois o apenado cometeu novo crime durante o período de prova do referido benefício, insubsistindo os argumentos defensivos de fls. 280/281, ante o disposto no artigo 145 da LEP.
Expeça-se mandado de prisão.
2) Dê-se vista ao MP e intime-se a defesa.”
Com efeito, da leitura do quanto decidido, chego à conclusão de que o Juízo das Execuções não se desincumbiu de demonstrar a real necessidade de determinar a segregação do paciente, mormente considerando-se que a prisão preventiva outrora decretada (em razão da prática de novo crime no curso do benefício) fora devidamente revogada, ante a caracterização de sua desnecessidade.
Assim, cabia ao Juízo das execuções fundamentar a imprescindibilidade de ordenar a prisão do paciente, e não a tornar medida automática, consectário lógico da prática de novo crime durante o período de prova do benefício. Essa conclusão, para mim, deriva de interpretação meramente literal do art. 145 da LEP, quando descreve que o “Juiz poderá ordenar” a prisão, suspendendo o curso do livramento. Nesse sentido, colho excerto do parecer:
“Dada a natureza cautelar da suspensão, a simples notícia da prática de outro delito não é suficiente para que o sentenciado retorne à prisão pois, para tanto, deve ficar demonstrado o periculum libertatis (o que é chamado de prisão preventiva da execução). No caso, embora cometido crime de furto durante o período de prova, a prisão preventiva por esse delito foi revogada. E o juiz, na decisão que suspendeu o curso do livramento não fez qualquer referencia à necessidade da adoção dessa medida extrema, limitando-se à constatação do cometimento de novo delito. Destarte, tem razão a impetração, pois as circunstâncias indicam que o caso é de prorrogação do momento para a decisão de extinção da pena e não de suspensão do curso do livramento condicional.
Ademais, embora a alegação de ausência da oitiva do Conselho Penitenciário e do Ministério Público não tenha sido objeto de análise das instâncias inferiores, é caso de superar a restrição atinente à supressão de instância, para conhecer do writ também neste ponto. É que o art. 145 da LEP prevê como condição da determinação de suspensão do livramento condicional exatamente a oitiva destes órgãos. Nesse sentido, Mirabete:
“Diante da gravidade do fato noticiado ou das circunstâncias que cercaram a participação do liberado, pode-se concluir que o liberado não está em condições de integrar-se socialmente. Assim, sendo o liberado indiciado em inquérito policial ou apontado como autor de infração penal em processo sumário, poderá o juiz ordenar a sua prisão imediata. Exige-se, porém, que sejam ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério Público, desde que não tenham sido esses órgãos os autores do pedido de suspensão do benefício.” – (MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal. 9ª ed., pg. 489. São Paulo: Atlas, 2000).
Por fim, cabe asseverar, ainda, que a liberdade do paciente não gerará prejuízo maior considerados os efeitos do livramento, na medida em que a espécie amolda-se à hipótese de prorrogação do livramento condicional, pois da dicção do art. 89 do CP colhe-se que “o juiz não poderá declarar extinta a pena, enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado, por crime cometido na vigência do livramento”.
Nesses termos, acolhendo o parecer ministerial, meu voto é no sentido de conceder a ordem de habeas corpus, para que “o paciente retorne ao livramento condicional, com a ressalva de que, cumprido o período de prova, a decisão de extinção da pena só poderá ser proferida após o trânsito em julgado da sentença referente ao crime superveniente”.
É como voto.
* acórdão pendente de publicação
** nomes suprimidos pelo Informativo
Inovações Legislativas
28 de fevereiro a 4 de março de 2011
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) – Prazo Processual – Expediente Forense – Presidente do Tribunal – Posse
Portaria nº 64/STF, de 25/2/2011 – Comunica que, no dia 3 de março de 2011, o expediente na Secretaria do Tribunal e de atendimento ao público externo será das 9 às 15 horas. Publicada no DJE/STF, n. 41, p. 119-120, em 2.3.2011.
SALARIO MÍNIMO – Alteração – Valorização
Lei n. 12.382, de 25.2.2011 – Dispõe sobre o valor do salário mínimo em 2011 e a sua política de valorização de longo prazo; disciplina a representação fiscal para fins penais nos casos em que houve parcelamento do crédito tributário; altera a Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996; e revoga a Lei nº 12.255, de 15 de junho de 2010. Publicada no DOU, Seção 1, p. 1, em 28.2.2011.
Secretaria de Documentação – SDO
Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD