Brasília, 16 a 19 de novembro de 2010
Data (páginas internas): 25 de novembro de 2010
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
Sumário
Plenário
Lei 8.880/94: demissão sem justa causa e indenização adicional – 2
Registro de aposentadoria: garantias constitucionais e anistia
Repercussão Geral
Contribuição previdenciária de inativos e pensionistas: período compreendido entre a EC 20/98 e a EC 41/2003
Contratação sem concurso público e direito ao FGTS – 1
Contratação sem concurso público e direito ao FGTS – 2
Extinção de execução fiscal de pequeno valor: autonomia municipal e acesso à jurisdição – 1 Extinção de execução fiscal de pequeno valor: autonomia municipal e acesso à jurisdição – 2
Composição de órgão colegiado: juízes convocados e princípio do juiz natural
1ª Turma
Homicídio e competência da Justiça Federal
Tribunal do Júri e nulidades – 1
Tribunal do Júri e nulidades – 2
2ª Turma
Pedido de extensão: falsidade ideológica e descaminho – 1
Pedido de extensão: falsidade ideológica e descaminho – 2
Pedido de extensão: falsidade ideológica e descaminho – 3
Clipping do DJ
Transcrições
Reforma Agrária – Produtividade Fundiária – Controvérsia – Valor das Informações Oficiais – Esbulho Possessório (MS 25017/DF)
Contribuição previdenciária de inativos e pensionistas: período compreendido entre a EC 20/98 e a EC 41/2003 (RE 580871 QO/SP)
Plenário
Lei 8.880/94: demissão sem justa causa e indenização adicional – 2
Em conclusão, o Plenário, por maioria, desproveu recurso extraordinário interposto por sociedade anônima contra acórdão do TST, que mantivera decisão na qual se determinara o pagamento de indenização a obreiro, demitido sem justa causa, com base no art. 31 da Lei 8.880/94, que estabelece que a indenização adicional, nas demissões sem justa causa, durante o período de vigência da Unidade Real de Valor – URV, é equivalente a 50% da última remuneração recebida — v. Informativo 379. Julgou-se inexistente o alegado vício formal a contaminar a norma. Asseverou-se que a indenização adicional prevista no art. 31 da Lei 8.880/94 cuidaria de regra de ajustamento do sistema monetário, e teria sido inserida num contexto macroeconômico de combate à inflação. Ao enfatizar que a aludida norma não possuiria conotação específica e direta com a proteção da relação de emprego, exigência prevista no art. 7º, I, da CF, pelo que se teria matéria de competência legislativa privativa da União, concluiu-se ser desnecessária a adoção de lei complementar. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que dava provimento ao recurso por entender que a norma em questão feriria o art. 7º, I, da CF — que exige lei complementar para dispor sobre indenização compensatória nos casos de despedida arbitrária ou sem justa causa — bem como o art. 10, I, do ADCT — que limita o valor da referida indenização em até quatro vezes a percentagem fixada no art. 6º, caput e § 1º, da Lei 5.107/66, isto é, 40% do saldo do FGTS.
RE 264434/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 17.11.2010. (RE-264434)
Registro de aposentadoria: garantias constitucionais e anistia
O Plenário, por maioria, concedeu parcialmente mandado de segurança para anular acórdão do Tribunal de Contas da União – TCU e restabelecer a percepção dos proventos de aposentadoria da impetrante, até que nova decisão seja proferida, em processo no qual lhe sejam garantidos a ampla defesa e o contraditório. Tratava-se, na espécie, de writ impetrado contra decisão da Corte de Contas que negara registro à aposentadoria da impetrante ao fundamento de que ela não teria comprovado vínculo com a Administração Pública antes de ser beneficiada por anistia (26.5.89), outorgada com amparo na EC 26/85, em que determinada a sua reintegração ao serviço público. Por conseguinte, o TCU desconstituíra o ato concessivo de anistia e cassara seus efeitos. Salientou-se que a apreciação, para fins de registro, do ato de concessão inicial de aposentadoria da impetrante fora realizada pelo TCU passados mais de 10 anos de sua efetivação. Nesse sentido, rememorou-se a orientação firmada pelo STF no julgamento do MS 26116/DF (j. em 8.9.2010, v. Informativo 599) em que assentada a necessidade de se assegurar aos interessados as garantias do contraditório e da ampla defesa caso decorridos mais de 5 anos da apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. Aduziu-se, ainda, que a negativa de registro da aposentadoria invalidara a própria anistia concedida à impetrante 15 anos antes e sem que observados os princípios do contraditório e da ampla defesa. Consignou-se que, se a Administração Pública tivesse, por meio de procedimento administrativo autônomo, procedido à revisão da anistia, teria que proporcionar à impetrante o contraditório e a ampla defesa. Assim, não faria sentido que — no bojo do procedimento de apreciação, para fins de registro, do ato de aposentadoria — pudesse fazê-lo sem considerar essas mesmas garantias. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Joaquim Barbosa que concediam a ordem em maior extensão por não reconhecerem ao TCU a atribuição de examinar a licitude, ou não, da anistia.
MS 26053/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 18.11.2010. (MS-26053)
Repercussão Geral
Contribuição previdenciária de inativos e pensionistas: período compreendido entre a EC 20/98 e a EC 41/2003
O Plenário resolveu questão de ordem suscitada em recurso extraordinário no sentido de: a) reconhecer a repercussão geral da questão constitucional nele debatida — repetição de contribuição previdenciária (e afins) cobrados de servidor civil inativo ou pensionista no período referente à vigência da EC 20/98 até a publicação da EC 41/2003; b) reafirmar a jurisprudência da Corte segundo a qual é devida a devolução aos pensionistas e inativos, perante o competente Juízo da execução, da contribuição previdenciária indevidamente recolhida no aludido período, sob pena de caracterização de enriquecimento ilícito; e c) negar provimento ao recurso. Leia o inteiro teor do voto do relator na seção “Transcrições” deste Informativo.
RE 580871 QO/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.11.2010. (RE-580871)
Contratação sem concurso público e direito ao FGTS – 1
O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade, ou não, do art. 19-A da Lei 8.036/90, acrescido pelo art. 9º da Medida Provisória 2.164-41/91, que assegura direito ao FGTS à pessoa que tenha sido contratada sem concurso público. A Min. Ellen Gracie, após rejeitar as preliminares, deu provimento ao recurso, reconheceu a inconstitucionalidade do aludido dispositivo legal, por violação ao art. 37, II, e § 2º, da CF, e julgou improcedente a reclamação trabalhista proposta na origem. Citou jurisprudência da Corte no sentido de que a nulidade da investidura impede o surgimento dos direitos trabalhistas — resguardado, como único efeito jurídico válido resultante do pacto celebrado, o direito à percepção do salário referente ao período efetivamente trabalhado, para evitar o enriquecimento sem causa do Estado —, não havendo, por conseguinte, direito do empregado aos depósitos em conta vinculada a título de FGTS. Esclareceu que o FGTS não seria mera contraprestação estrita pelo trabalho realizado, mas um dos direitos fundamentais sociais (CF, art. 7º, III), ao lado de outros como o da proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, o seguro-desemprego, o décimo terceiro salário e o aviso prévio. Asseverou que os depósitos em conta vinculada constituiriam direito trabalhista autônomo, que teria surgido como uma alternativa à estabilidade no emprego, posteriormente se consolidado como direito de qualquer empregado e se erigido à condição de direito fundamental social. Aduziu, ao final, que, reconhecida a nulidade do vínculo, estaria automaticamente afastada a obrigação de recolhimento da contribuição ao FGTS pelo Estado no que respeita às investiduras nulas.
RE 596478/RR, rel. Min. Ellen Gracie, 17.11.2010. (RE-596478)
Contratação sem concurso público e direito ao FGTS – 2
Em divergência, o Min. Dias Toffoli desproveu o recurso por entender que o art. 19-A da Lei 8.036/90 não afrontaria a Constituição Federal. Salientou estar-se tratando, na espécie, de efeitos residuais de um fato jurídico que existiu, não obstante nulo, inválido. Mencionou que o Tribunal tem levado em consideração essa necessidade de se garantir a fatos nulos, mas existentes juridicamente, os efeitos. Ressaltou, ainda, que a manutenção desse dispositivo legal como norma compatível com a Constituição consistiria, inclusive, em um desestímulo aos Estados que queiram fazer burla ao concurso público. Após os votos da Min. Cármen Lúcia, que seguia a relatora, e dos Ministros Gilmar Mendes e Ayres Britto, que acompanhavam a divergência, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.
RE 596478/RR, rel. Min. Ellen Gracie, 17.11.2010. (RE-596478)
Extinção de execução fiscal de pequeno valor: autonomia municipal e acesso à jurisdição – 1
O Plenário deu provimento a recurso extraordinário para anular sentença e determinar o prosseguimento da execução fiscal de IPTU, movida por Município do Estado de São Paulo, a qual extinta por falta de interesse de agir, em razão de seu pequeno valor. A decisão impugnada invocara a Lei paulista 4.468/84 que autoriza o Poder Executivo a não executar os débitos com valor igual ou inferior a 30% do Maior Valor de Referência (MVR). Asseverou-se, de início, que, como instrumento para as autonomias administrativa e política, a competência tributária de cada ente federado seria indelegável (CTN, art. 7º), e que o titular dessa competência teria, com exclusividade, a competência legislativa plena tanto para a instituição do tributo, observado o art. 150, I, da CF, como para eventuais desonerações, conforme disposto no art. 150, § 6º, da CF. Dessa forma, não se admitiria qualquer interferência de um ente político relativamente à competência tributária alheia. Ressaltou que o art. 156, I, da CF, ao conferir ao Município a competência para instituir imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, teria concedido apenas a ele, de modo exclusivo, a possibilidade de legislar sobre os aspectos da respectiva norma tributária impositiva, sobre eventuais desonerações, parcelamentos, moratórias e qualquer outro aspecto que tivesse repercussão na sua cobrança. Salientou-se que somente o Município, por lei municipal, poderia dispensar a inscrição em dívida e o ajuizamento dos seus créditos de pequeno valor, o que não se dera na espécie. Nem mesmo poder-se-ia aplicar, por analogia, legislação federal ou estadual, haja vista que a limitação das inscrições em dívida ativa e do ajuizamento de ações de créditos de pequeno valor implicaria disposição sobre esses ativos. Assim, a Lei 4.468/84 do Estado de São Paulo só poderia ser aplicada aos débitos correspondentes a créditos do próprio Estado de São Paulo, sob pena de violação à competência tributária outorgada ao Município pelo art. 156, I, da CF, fundamento, no caso, suficiente para prover o recurso.
RE 591033/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 17.11.2010. (RE-591033)
Extinção de execução fiscal de pequeno valor: autonomia municipal e acesso à jurisdição – 2
Além disso, considerou-se que a extinção da execução sob análise infringiria, ainda, o art. 5º, XXXV, da CF. Explicou-se que todo o movimento do Judiciário brasileiro seria no sentido de ampliar o acesso à jurisdição em observância ao mandamento inscrito nesse preceito. Aduziu-se que, no sistema brasileiro, em que não é dado ao Executivo proceder à chamada “execução administrativa”, a fase de cobrança extrajudicial restringir-se-ia à notificação do contribuinte para pagar voluntariamente seu débitos, inexistindo instrumentos de expropriação à disposição do Fisco, razão por que a via da execução fiscal seria a desejável e deveria ser a ele assegurada. Acrescentou-se que, tendo sido atribuído ao Poder Judiciário somente o dever de distribuir justiça, não sendo outorgada, sequer ao próprio Estado, a possibilidade de buscar autotutela, impor-se-ia que se garantisse, de modo efetivo, também a quaisquer entes federados, a concretização da garantia constitucional de que nenhuma lesão ou ameaça a direito será excluída da apreciação do Poder Judiciário. No que se refere à alegação do magistrado a quo de que as execuções seriam, via de regra, infrutíferas, frisou-se que isso não justificaria a negativa do acesso do credor ao Judiciário, e que, se a Justiça é ineficaz, caberia ao próprio Judiciário atuar no sentido de encontrar procedimentos mais efetivos, utilizando-se de meios mais ágeis. Registrou-se, no ponto, que para isso o Conselho Nacional de Justiça teria fixado metas a serem alcançadas pelos órgãos jurisdicionais. Concluiu-se que o magistrado em questão, ao entender pela ausência de interesse processual, o teria confundido com o resultado econômico da ação.
RE 591033/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 17.11.2010. (RE-591033)
Composição de órgão colegiado: juízes convocados e princípio do juiz natural
São válidos os julgamentos realizados pelos tribunais com juízes convocados, ainda que estes sejam maioria na sua composição. Ao reafirmar esse entendimento, o Plenário desproveu, em votação majoritária, recurso extraordinário no qual alegada a ofensa aos princípios do juiz natural e do duplo grau de jurisdição na convocação de juízes federais para integrarem colegiado do Tribunal Regional Federal respectivo. Inicialmente, enfatizou-se que a Constituição passou a prever, como um dos direitos e garantias fundamentais inscritos no seu art. 5º, a duração razoável do processo (LXXVIII). Em seqüência, consignou-se que, no caso especifico dos Tribunais Regionais Federais, haveria norma a permitir essa convocação de juízes federais ou de juízes federais substitutos, em caráter excepcional, quando o acúmulo de serviço o exigisse (Lei 9.788/99, art. 4º). Afastou-se, desse modo, o argumento de transgressão ao princípio do juiz natural, por não se tratar de um juízo ad hoc. Verificou-se, por fim, a obediência aos princípios do contraditório, da ampla defesa, do duplo grau de jurisdição e do devido processo legal. Vencido o Min. Marco Aurélio que provia o recurso por reputar ter havido verdadeira clonagem, haja vista que a convocação somente seria cabível na hipótese de substituição.
RE 597133/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 17.11.2010. (RE-597133)
Primeira Turma
Homicídio e competência da Justiça Federal
A 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se alegava a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar pronunciado, como mandante, pela suposta prática do crime de homicídio de cidadão brasileiro, juiz de direito, perpetrado no Paraguai. As instâncias ordinárias reconheceram a competência da Justiça Federal em razão da existência de indícios de que o referido homicídio estaria relacionado ao tráfico internacional de drogas. Entendeu-se que a discussão acerca da correta fixação da competência e da ocorrência de conexão do homicídio com o crime de tráfico de drogas exigiria o exame aprofundado de fatos e provas, inviável em habeas corpus. Vencido o Min. Marco Aurélio que concedia a ordem, tendo em conta o fato de o réu estar respondendo exclusivamente pelo delito de homicídio e de o juiz de direito não exercer atribuição própria aos interesses da União a atrair a competência da Justiça Federal.
HC 100154/MT, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.11.2010. (HC-100154)
Tribunal do Júri e nulidades – 1
A 1ª Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que a defesa sustenta a ocorrência de duas nulidades que teriam maculado o julgamento de condenado, pelo Tribunal do Júri, em razão da prática de homicídio em concurso de pessoas. A primeira nulidade residiria no fato de, no dia do julgamento, haver sido apresentada prova supostamente nova. Esta consistiria em fita cassete, com o interrogatório de co-réu, e sua degravação, as quais, trazidas por uma das testemunhas arroladas pela acusação — o delegado de polícia que teria conduzido as investigações —, demonstrariam a autoria intelectual do crime imputada ao paciente. Essa versão degravada seria, conforme alegado, destoante do interrogatório juntado aos autos do inquérito e a referida autoridade policial teria mantido o objeto em seu poder, secretamente, durante 3 anos, até expô-lo no julgamento. A outra nulidade apontada seria a suposta intromissão do Presidente do Tribunal do Júri no julgamento da causa, ao exprimir sua convicção pessoal acerca do interrogatório prestado pelo co-réu, no relatório apresentado aos jurados, no sentido de que o ato teria ocorrido sem coação ou tortura.
HC 101806/MS, rel. Min. Dias Toffoli, 16.11.2010. (HC-101806)
Tribunal do Júri e nulidades – 2
O Min. Dias Toffoli, relator, indeferiu a ordem, no que foi acompanhado pela Min. Cármen Lúcia. Reputou, inicialmente, não haver ilicitude na prova colhida a partir da fita cassete exibida no julgamento. Registrou que ela seria mero instrumento magnético de uma prova que já constaria dos autos, qual seja, o interrogatório. Aduziu, também, que o delegado utilizara esse dispositivo apenas para provar que o ato não teria sido realizado mediante tortura e que maior aprofundamento na questão implicaria reexame de fatos e provas, inadmissível na via eleita. Ressaltou, em relação a essa suposta nulidade, não haver sido demonstrado o prejuízo sofrido pelo paciente. Considerou, acerca do argüido vício de linguagem no relatório apresentado aos jurados, não haver parcialidade nas palavras proferidas pelo Juiz Presidente, que apenas teria fundamentado o deferimento da citada prova por reputá-la lídima, sem, entretanto, haver influenciado a íntima convicção dos jurados sobre o caso. Em divergência, o Min. Marco Aurélio deferiu o writ. Aduziu inexistir justificativa para que o delegado de polícia mantivesse a fita cassete em seu poder por mais de 3 anos, para apenas apresentá-la no dia do julgamento, e que o prejuízo suportado pelo paciente residiria na sua condenação. Ademais, asseverou que o magistrado teria abandonado a eqüidistância exigida ao Estado-Juiz, ao classificar o interrogatório como imaculado de ilicitude e afirmar tal juízo perante os jurados. Após, pediu vista dos autos o Min. Ricardo Lewandowski.
HC 101806/MS, rel. Min. Dias Toffoli, 16.11.2010. (HC-101806)
Segunda Turma
Pedido de extensão: falsidade ideológica e descaminho – 1
A 2ª Turma denegou dois habeas corpus impetrados — ambos em favor dos mesmos pacientes — contra acórdãos proferidos em writs diversos no STJ. Nas situações dos autos, eles foram denunciados, com outros réus, em várias ações penais resultantes de uma operação policial. Num dos habeas, o STJ concedera a ordem para trancar, no que tange ao delito de falsidade ideológica (CP, art. 299), uma ação penal, cuja denúncia fora recebida também quanto ao crime de descaminho, estendendo a decisão aos demais co-réus. No outro, aquela Corte determinara, quanto aos pacientes, o trancamento da mesma ação sobre o crime de descaminho (CP, art. 334). Inicialmente, observou-se que os casos não seriam exatamente iguais, apesar da proximidade das matérias. Em seguida, acrescentou-se que, no HC 104314/PR, pleiteara-se a extensão dos efeitos da decisão favorável aos pacientes para trancar as demais ações em trâmite que também tratassem de acusação relativamente aos delitos de falsidade ideológica. Já no HC 100875/PR, requerera-se a extensão para aquelas referentes aos crimes de descaminho. Repeliu-se, nos dois habeas corpus, o pedido de extensão dos writs — sob a alegação de haver identidade de acusações, de réus e conexão probatória entre os feitos, a reclamar julgamento uniforme — formulado com base na interpretação sistemática do art. 580 do CPP. Destacou-se que tal dispositivo conferiria, em caráter excepcional, efeito extensivo às decisões benéficas com o objetivo de dar efetividade, no plano jurídico, à garantia de eqüidade. Explicitou-se que esta diria respeito ao tratamento igualitário aos agentes do delito quando houvesse concurso de pessoas, uma vez que o direito penal pátrio teria adotado a teoria monista ou unitária, segundo a qual todos aqueles que concorressem para a prática do crime sujeitar-se-iam às penas a ele cominadas. Consignou-se que a conexão seria o liame que as coisas, pessoas e fatos guardariam entre si; que tal instituto estaria ligado às regras de fixação da competência e não encontraria relação com regras do julgamento propriamente dito, razão pela qual não importaria necessariamente em julgamentos iguais. Além disso, asseverou-se que cada fato imputado aos pacientes, apesar da conexão, deveria ser julgado individualmente, de acordo com o livre convencimento motivado do magistrado.
HC 104314/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.11.2010. (HC-104314)
HC 100875/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.11.2010. (HC-100875)
Pedido de extensão: falsidade ideológica e descaminho – 2
Com relação ao crime de falsidade ideológica (HC 104314/PR), frisou-se manifestação da Procuradoria Geral da República, no sentido de que: a) o STJ, ao negar o pedido de extensão, concluíra que os fatos referentes às ações penais, embora semelhantes, quanto ao modus operandi, seriam diversos daqueles discutidos na ação penal cujo trancamento parcial fora determinado; b) o falsum, nas ações penais que se pretenderia ver trancadas, poderia extrapolar totalmente o campo deduzido e até mesmo integrar outra espécie de ilicitude que tivesse atingido não só a ordem tributária. Verificou-se, ainda, que — a despeito de a maior parte dos processos instaurados imputarem aos pacientes a prática dos delitos contidos nos artigos 299 e 334 do CP — em três denúncias a eles se atribuíra somente a primeira infração em continuidade delitiva. Inferiu-se, portanto, que as falsificações em tese perpetradas não poderiam ser entendidas, em todas as ações penais, apenas como meio para a execução do crime de descaminho. Ademais, assentou-se que reconhecer todas as imputações de prática do crime de falsidade ideológica, como meio para a execução de outros delitos, implicaria antecipação desse juízo, a inviabilizar a atividade do Ministério Público de comprovar as imputações. Por fim, não se vislumbrou, na hipótese, ausência de justa causa ou flagrante ilegalidade demonstrada em inequívoca prova pré-constituída, a justificar o trancamento da ação penal.
HC 104314/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.11.2010. (HC-104314)
HC 100875/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.11.2010. (HC-100875)
Pedido de extensão: falsidade ideológica e descaminho – 3
No tocante ao HC 100875/PR, entendeu-se que não haveria de prevalecer a posição adotada no STJ que, ao decidir o writ referente a uma das ações penais, considerara aplicável ao crime de descaminho o mesmo tratamento dado aos delitos mencionados no art. 1º da Lei 8.137/90. Reputou-se que o descaminho não deveria ter o tratamento aplicado aos crimes contra a ordem tributária. Desse modo, seria desnecessário o encerramento do processo administrativo fiscal para o desencadeamento da ação penal. Enfatizou-se que a consumação do crime em comento ocorreria com a importação ou exportação de mercadoria sem o pagamento, no todo ou em parte, do imposto devido por sua entrada ou saída, logo, tratar-se-ia de crime formal, a não exigir resultado naturalístico. Afirmou-se, entretanto, não ser possível a reforma do mencionado acórdão do STJ, inclusive, já transitado em julgado. A respeito do argumento de que seria aplicável às demais ações a solução jurídica determinada por essa Corte, naquele writ, tendo em conta a conexão entre elas, reportou-se ao que decidido na presente assentada. Salientou-se a conexão entre as ações em virtude do concurso de crimes. Por fim, não se conheceu do pleito de extensão dos efeitos do habeas corpus no STJ aos co-réus na ação penal trancada, o qual apresentado mediante petição no HC 100875/PR. No ponto, consignou-se não ser possível apreciar o pedido sob pena de supressão de instância. O Min. Ayres Britto registrou, ainda, que para chegar à conclusão de haver uma rigorosa identidade de situação no plano fático-processual seria necessário amplo revolvimento de fatos e provas, inadmissível na via eleita.
HC 104314/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.11.2010. (HC-104314)
HC 100875/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 16.11.2010. (HC-100875)
Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos
Pleno 17.11.2010 18.11.2010 44
1ª Turma 16.11.2010 — 8
2ª Turma 16.11.2010 — 184
C l i p p i n g d o DJ
16 a 19 de novembro de 2010
RE N. 592.619-RS
RELATOR MIN. GILMAR MENDES
Recurso Extraordinário. 2. Alegação de ofensa ao art. 87 do ADCT e ao § 4º do art. 100 da Constituição Federal. Ocorrência. 3. Fracionamento do valor de precatório em execução de sentença, com o objetivo de efetuar o pagamento das custas processuais por meio de requisição de pequeno valor (RPV). Impossibilidade. 4. Recurso extraordinário provido.
*noticiado no Informativo 599
INQ N. 2.027-RO
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: PENAL. INQUÉRITO. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. FINANCIAMENTO OBTIDO JUNTO AO BANCO INTERNACIONAL PARA A RECONSTRUÇÃO E O DESENVOLVIMENTO – BIRD. APLICAÇÃO PELO ESTADO DE RONDÔNIA EM FINALIDADE DIVERSA DA ESTABELECIDA NO CONTRATO DE FINANCIAMENTO. PROVA DE MATERIALIDADE. INDÍCIOS DE AUTORIA. CLASSIFICAÇÃO TÍPICA CORRETA. DENÚNCIA RECEBIDA.
1. Os fatos narrados pela denúncia se subsumem ao tipo do art. 20 da Lei n° 7.492/86. O BIRD é instituição financeira oficial, tendo fornecido as verbas do financiamento ao ente federativo em questão, através da União, para aplicação em Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia – PLANAFLORO -, mas os recursos foram retirados da conta vinculada do Convênio e utilizados em finalidades desconhecidas. 2. A denúncia encontra-se devidamente instruída com provas da materialidade do crime – documentos bancários e ofícios determinando a transferência dos recursos vinculados ao PLANAFLORO para a Conta Única do Governo – e indícios suficientes de autoria, colhidos ao longo do inquérito. A expressiva soma, em tese, desviada – quase seis milhões e meio de reais – e a continuidade dos saques, ao longo de um ano, concentrados em período de campanha eleitoral, afastam a possibilidade de se acolher, nesta fase, a alegação de desconhecimento do então Governador. 3. É irrelevante se os indiciados têm ou não atribuição de ordenar despesas, uma vez que o Ministério Público Federal não os acusa de determinar uma despesa indevida, mas sim de empregar os recursos provenientes de financiamento do BIRD em finalidade diversa da prevista contratualmente. Todos os indiciados assumiram compromisso de observar os termos do convênio, assinado, de próprio punho, pelo então Governador, no momento do repasse das verbas. 4. O elemento subjetivo do crime é o dolo simples, bastando, para sua configuração, a consciência e a vontade dos agentes de utilizar recursos vinculados por convênio em finalidade diversa da contratada. Precedentes. 5. Denúncia recebida.
*noticiado no Informativo 595
HC N. 101.300-SP
RELATOR : MIN. AYRES BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. ROUBO. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E APLICAÇÃO DA LEI PENAL. PRISÃO PREVENTIVA EMBASADA NA CONTEXTURA FACTUAL DOS AUTOS. RISCO CONCRETO DE REITERAÇÃO NA PRÁTICA DELITUOSA. ACAUTELAMENTO DO MEIO SOCIAL. PACIENTE QUE PERMANECEU FORAGIDO POR MAIS DE DOIS ANOS. ALEGAÇÃO DE FALTA DE PROVAS IDÔNEAS PARA A CONDENAÇÃO. ORDEM DENEGADA.
1. O conceito jurídico de ordem pública não se confunde com incolumidade das pessoas e do patrimônio (art. 144 da CF/88). Sem embargo, ordem pública se constitui em bem jurídico que pode resultar mais ou menos fragilizado pelo modo personalizado com que se dá a concreta violação da integridade das pessoas ou do patrimônio de terceiros, tanto quanto da saúde pública (nas hipóteses de tráfico de entorpecentes e drogas afins). Daí sua categorização jurídico-positiva, não como descrição do delito nem cominação de pena, porém como pressuposto de prisão cautelar; ou seja, como imperiosa necessidade de acautelar o meio social contra fatores de perturbação que já se localizam na gravidade incomum da execução de certos crimes. Não da incomum gravidade abstrata desse ou daquele crime, mas da incomum gravidade na perpetração em si do crime, levando à consistente ilação de que, solto, o agente reincidirá no delito. Donde o vínculo operacional entre necessidade de preservação da ordem pública e acautelamento do meio social. Logo, conceito de ordem pública que se desvincula do conceito de incolumidade das pessoas e do patrimônio alheio (assim como da violação à saúde pública), mas que se enlaça umbilicalmente à noção de acautelamento do meio social. 2. É certo que, para condenar penalmente alguém, o órgão julgador tem de olhar para trás e ver em que medida os fatos delituosos e suas coordenadas dão conta da culpabilidade do acusado. Já no que toca à decretação da prisão preventiva, se também é certo que o juiz valora esses mesmos fatos e vetores, ele o faz na perspectiva da aferição da periculosidade do agente. Não propriamente da culpabilidade. Pelo que o quantum da pena está para a culpabilidade do agente assim como o decreto de prisão preventiva está para a periculosidade, pois é tal periculosidade que pode colocar em risco o meio social quanto à possibilidade de reiteração delitiva (cuidando-se, claro, de prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem pública). 3. Na concreta situação dos autos, o fundamento da garantia da ordem pública, tal como lançado, basta para validamente sustentar a prisão processual do paciente. Não há como refugar a aplicabilidade do conceito de ordem pública se o caso em análise evidencia a necessidade de acautelamento do meio social quanto àquele risco da reiteração delitiva. Situação que atende à finalidade do art. 312 do CPP. 4. Não há que se falar em inidoneidade do decreto de prisão, se este embasa a custódia cautelar a partir do contexto empírico da causa. Até porque, sempre que a maneira da perpetração do delito revelar de pronto a extrema periculosidade do agente, abre-se ao decreto prisional a possibilidade de estabelecer um vínculo funcional entre o modus operandi do suposto crime e a garantia da ordem pública. Precedentes: HCs 93.012 e 90.413, da relatoria dos ministros Menezes Direito e Ricardo Lewandowski, respectivamente. 5. No caso, a prisão preventiva também se justifica na garantia de eventual aplicação da lei penal. Isso porque o paciente permaneceu foragido por mais de dois anos. 6. A via processualmente contida do habeas corpus não é o locus para a discussão do acerto ou desacerto na análise do conjunto factual probatório que embasa a sentença penal condenatória. 7. Ordem denegada.
HC N. 102.777-PE
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
Ementa: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO PACIENTE E REDUÇÃO DAS PENAS IMPOSTAS. QUESTÕES NÃO ANALISADAS PELO STJ. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. DEMORA DA ANÁLISE DE MEDIDA LIMINAR E DO MÉRITO DA IMPETRAÇÃO AJUIZADA NO STJ. APOSENTADORIA DO MINISTRO RELATOR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL VERIFICADO. NECESSIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO DO FEITO. WRIT PARCIALMENTE CONHECIDO. ORDEM DENEGADA NESSA PARTE.
I – Os pedidos de absolvição do paciente e de redução do quantum das penas aplicadas não foram examinados pelo Superior Tribunal de Justiça. Logo, a sua análise, por esta Corte, levaria a indevida supressão de instância e ao extravasamento dos limites de competência do STF descritos no art. 102 da Constituição Federal.
II – No caso dos autos, a situação caracterizava evidente constrangimento ilegal, uma vez que, passado mais de um ano do ajuizamento do habeas corpus no STJ, a medida liminar pleiteada sequer tinha sido analisada e o feito encontrava-se sem qualquer movimentação em razão da aposentadoria do Ministro Relator, o que justificou a concessão da cautelar nesta Corte.
III – O habeas corpus impetrado no STJ foi redistribuído e teve o pedido liminar analisado, nos exatos termos da cautelar concedida. Além disso, foram solicitadas informações e remetidos os autos para vista do Ministério Público Federal, indicando que o mandamus voltou a tramitar normalmente e que deverá ter seu mérito apreciado em breve.
IV- A despeito da liminar concedida, a concessão da ordem para determinar o imediato julgamento do writ na Corte a quo poderia redundar na injustiça de ordenar-se que a impetração manejada em favor do paciente seja colocada em posição privilegiada com relação a de outros jurisdicionados.
V – Habeas corpus parcialmente conhecido e, na parte conhecida, denegada a ordem.
HC N. 103.733 – SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
Ementa: PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. LIVRAMENTO CONDICIONAL. REQUISITOS SUBJETIVOS. FUGA DO CONDENADO. FALTA GRAVE. NECESSIDADE DO EXAME CRIMINOLÓGICO. POSSIBILIDADE. DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO NESTA SEDE. JURISPRUDÊNCIA DO STF. ORDEM DENEGADA.
I – A alteração do art. 112 da Lei de Execuções Penais pela Lei 10.792/2003 não proibiu a realização do exame criminológico. Precedentes.
II – Não se exige do órgão judicante que a decisão seja exaustivamente fundamentada. O que se busca é que o julgador explicite de forma clara as razões de seu convencimento, como se deu na espécie.
III – A modificação legislativa não afastou a necessidade de comprovação do comportamento satisfatório durante a execução da pena previsto no art. 83, III, do Código Penal, inocorrente no caso em exame, pela falta grave cometida pelo paciente com a fuga do estabelecimento prisional.
IV – Ordem denegada.
HC N. 103.787-MG
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
Ementa: HABEAS CORPUS. PENAL. PRÁTICA DA MENDICÂNCIA E CORRUPÇÃO DE MENOR. ABOLITIO CRIMINIS. ATIPICIDADE SUPERVENIENTE DOS FATOS ATRIBUÍDOS AO PACIENTE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL. WRIT PREJUDICADO.
I – A alegada ocorrência da abolitio criminis da imputação feita ao paciente não foi examinada pelo STJ no acórdão ora atacado, não podendo esta Suprema Corte analisá-la, sob pena de indevida supressão de instância e de extravasamento dos limites de competência do STF descritos no art. 102 da Constituição Federal.
II – O caso, porém, apresenta peculiaridades que recomendam a concessão da ordem, de ofício.
III – A Lei 12.015/2009 revogou a Lei 2.252/1954, que tratava da corrupção de menores, todavia, inseriu o art. 244-B no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990), cuja redação é a mesma da norma revogada.
IV – O art. 60 do Decreto-Lei 3.688/1941 (Lei das Contravenções Penais), por sua vez, foi revogado pela Lei 11.983/2009, descriminalizando, assim, a conduta antes descrita como mendicância.
V – Segundo o art. 244-B do ECA, pratica o crime de corrupção de menor quem corrompe ou facilita a corrupção de menor de dezoito anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la.
VI – O objetivo desse dispositivo é a proteção do menor em relação à influência negativa de adultos em uma fase de formação da personalidade, evitando, com isso, sua inserção precoce no mundo do crime.
VII – Deixando de ser a mendicância infração penal, desaparece, no caso sob exame, o objeto jurídico tutelado pelo ECA, uma vez que não mais existe a contravenção que os menores foram levados a praticar, ocorrendo, por consequência, a abolitio criminis em relação aos dois delitos imputados ao paciente.
VIII – Ordem concedida de ofício para, reconhecendo a atipicidade fatos atribuídos ao paciente, trancar a ação penal relativamente às duas imputações (mendicância e corrupção de menor).
IX – Habeas corpus prejudicado.
*noticiado no Informativo 606
HC N. 104.237-SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/2006 EM SEU GRAU MÁXIMO (2/3). AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO PARA APLICAR A REDUÇÃO EM 1/6. INOCORRÊNCIA. REPRIMENDA ADEQUADA PARA REPROVAÇÃO E PREVENÇÃO DO CRIME. IMPOSSIBILIDADE DE AVALIAR-SE, NA VIA DO HABEAS CORPUS, A PENA ADEQUADA AO FATO PELO QUAL FOI CONDENADO O PACIENTE. ORDEM DENEGADA.
I – O Superior Tribunal de Justiça não deixou de justificar a aplicação da causa de diminuição em seu grau mínimo, pois reconheceu que a grande quantidade de droga apreendida era fundamento hábil para reduzir a pena no patamar mínimo, ou seja, em 1/6.
II – O juiz não está obrigado a aplicar o máximo da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas quando presentes os requisitos para a concessão desse benefício, tendo plena discricionariedade para aplicar a redução no patamar que entenda necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, segundo as peculiaridades de cada caso concreto. Do contrário, seria inócua a previsão legal de um patamar mínimo e um máximo.
III – O habeas corpus não pode ser utilizado como forma de verificar a pena adequada para os delitos pelos quais o paciente foi condenado, visto que representaria um novo juízo de reprovabilidade.
IV – Ordem denegada.
HC N. 104.853 – PR
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
Ementa: HABEAS CORPUS. PENAL MILITAR. PACIENTES CONDENADOS PELO CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES E ATENUADO PELA RESTITUIÇÃO DOS BENS FURTADOS. ABSOLVIÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. RAZOÁVEL GRAU DE REPROVABILIDADE DA CONDUTA. FURTO INSIGNIFICANTE. FURTO PRIVILEGIADO. DISTINÇÃO. ORDEM DENEGADA.
I – A aplicação do princípio da insignificância de modo a tornar a conduta atípica exige, além da pequena expressão econômica dos bens que foram objeto de subtração, um reduzido grau de reprovabilidade da conduta do agente.
II – Convém distinguir, ainda, a figura do furto insignificante daquele de pequeno valor. O primeiro, como é cediço, autoriza o reconhecimento da atipicidade da conduta, ante a aplicação do princípio da insignificância. Já no que tange à coisa de pequeno valor, criou o legislador a causa de diminuição referente ao furto atenuado, prevista no art. 240, § 1º, do Código Penal Militar.
III – É relevante e reprovável a conduta de um militar que, durante o cumprimento de punição disciplinar no quartel, furta bens, de valores expressivos, do armário de um colega de farda, demonstrando desrespeito às leis e às instituições de seu País.
IV – A restituição dos bens furtados não conduzem à aplicação do princípio da insignificância, sendo certo que já foi considerada pelo juízo sentenciante para aplicar a atenuante prevista no § 2º do art. 240, conforme estabelece o § 7º, do mesmo artigo, do Código Penal Militar. Precedentes.
V – Ordem denegada.
Acórdãos Publicados: 207
Transcrições
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Reforma Agrária – Produtividade Fundiária – Controvérsia – Valor das Informações Oficiais – Esbulho Possessório (Transcrições)
MS 25017/DF*
RELATOR: Min. Celso de Mello
EMENTA: REFORMA AGRÁRIA. DESAPROPRIAÇÃO-SANÇÃO. ALEGADA PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL RURAL. AFIRMAÇÃO CONTESTADA PELA AUTORIDADE IMPETRADA. SITUAÇÃO DE DÚVIDA OBJETIVA. INADMISSIBILIDADE DE SEU EXAME NA VIA SUMARÍSSIMA DO PROCESSO MANDAMENTAL. VALOR JURÍDICO DAS INFORMAÇÕES OFICIAIS PRESTADAS EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA. PRESUNÇÃO “JURIS TANTUM” DE VERACIDADE. INEXISTÊNCIA DE PROVA IDÔNEA EM SENTIDO CONTRÁRIO. MAGISTÉRIO DA DOUTRINA. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A NOÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. CONCEITO EMINENTEMENTE PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA EM SEDE MANDAMENTAL. DOUTRINA. JURISPRUDÊNCIA. ALEGAÇÃO DE ESBULHO POSSESSÓRIO. A REPULSA DO ORDENAMENTO JURÍDICO E DA JURISPRUDÊNCIA DA SUPREMA CORTE A ESSA PRÁTICA ILÍCITA DE VIOLAÇÃO POSSESSÓRIA (MS 23.759/GO, REL. MIN. CELSO DE MELLO, v.g.). FATO QUE TERIA OCORRIDO APÓS A DECLARAÇÃO EXPROPRIATÓRIA, EM CONTEXTO NO QUAL NÃO AFETADOS OS ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL RURAL. NÃO CONFIGURAÇÃO DA PRETENDIDA NULIDADE DO DECRETO PRESIDENCIAL. PRECEDENTES. MANDADO DE SEGURANÇA INDEFERIDO.
DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança impetrado com a finalidade de invalidar declaração expropriatória, consubstanciada em decreto presidencial (fls. 140) – Decreto de 24 de junho de 2004 -, fundada em razões de interesse social, para fins de reforma agrária, referente ao imóvel rural denominado **, situado no Município de Lagoa Grande, Estado de Minas Gerais (fls. 03).
Para justificar a sua pretensão mandamental, o autor deste “writ” alega que o “INCRA, motivado por denúncias infundadas (…), acabou por vistoriar o imóvel (…)” e, “(…) muito embora reconhecidamente produtivo, sendo mesmo um exemplo da moderna prática de agricultura na região, o imóvel (…) acabou sendo classificado como improdutivo, baseado em laudo administrativo eivado de erros (…)” (fls. 02/09 – grifei).
A empresa impetrante informa, ainda, que, “com o resultado da vistoria administrativa realizada pelo INCRA”, propôs ação cautelar de produção antecipada de provas, “baseada em Laudo Técnico Agronômico que confirmou a alegada produtividade do imóvel” (fls. 03). Entretanto, “procurada pelo INCRA, que buscava um acordo, a autora, de boa-fé, concordou em peticionar, solicitando, ao MM. Juiz, a suspensão do feito aqui mencionado”, mas o INCRA, “em flagrante deslealdade processual, ao invés de perseguir o acordo que ele mesmo houvera proposto, preferiu (…) encaminhar à Presidência da República solicitação de desapropriação do imóvel em comento” (fls. 03 – grifei).
A autora da presente ação mandamental sustenta a inviabilidade jurídica do procedimento expropriatório ora questionado, seja em face de alegada produtividade fundiária, seja, ainda, em decorrência de suposta inobservância da regra inscrita no § 6º do art. 2º da Lei nº 8.629/93, eis que, “inexplicavelmente”, o imóvel em referência teria sido invadido “exatamente na data da edição do decreto expropriatório, 24 de junho de 2004” (fls. 04).
Após a manifestação da autoridade impetrada, indeferi o pedido de medida liminar e determinei a remessa dos autos ao Ministério Público Federal, que, em seu douto pronunciamento, formulou parecer consubstanciado na seguinte ementa (fls. 293):
“Mandado de segurança. Desapropriação. Argumentações do ‘writ’ defendem a produtividade das terras. Anunciam também a invasão das terras após a publicação do Decreto Presidencial. Suposto descumprimento pelo INCRA de acordo firmado em juízo com o impetrante. Alegações que não se confirmam nos documentos dos autos. Produtividade é tema controverso no caso, insuscetível de exame em mandado de segurança. A invasão, além de ser um fato marcado por pesadas incertezas, teria tomado corpo após a vistoria do bem, em nada afetando os índices de produtividade, portanto. Não há qualquer indicação de desrespeito a acordo judicial. A cautelar que paralisava o procedimento administrativo foi cassada em vista de falta do impetrante, que deixou de ajuizar a ação principal.
Parecer pela denegação da ordem.” (grifei)
Sendo esse o contexto, passo a examinar a presente controvérsia mandamental, registrando, no entanto, em caráter preliminar, as observações que se seguem.
O Supremo Tribunal Federal, mediante edição da Emenda Regimental nº 28, de 18 de fevereiro de 2009, delegou expressa competência ao Relator da causa, para, em sede de julgamento monocrático, denegar ou conceder a ordem de mandado de segurança, desde que a matéria versada no “writ” em questão constitua “objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal” (RISTF, art. 205, “caput”, na redação dada pela ER nº 28/2009).
Ao assim proceder, fazendo-o mediante interna delegação de atribuições jurisdicionais, esta Suprema Corte, atenta às exigências de celeridade e de racionalização do processo decisório, limitou-se a reafirmar princípio consagrado em nosso ordenamento positivo (RISTF, art. 21, § 1º; Lei nº 8.038/90, art. 38; CPC, art. 544, § 4º) que autoriza o Relator da causa a decidir, monocraticamente, o litígio, sempre que este referir-se a tema já definido em “jurisprudência dominante” no Supremo Tribunal Federal.
Nem se alegue que essa orientação implicaria transgressão ao princípio da colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
A legitimidade jurídica desse entendimento – que vem sendo observado na prática processual desta Suprema Corte (MS 27.649/DF, Rel. Min. CEZAR PELUSO – MS 27.962/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.) – decorre da circunstância de o Relator da causa, no desempenho de seus poderes processuais, dispor de plena competência para exercer, monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, justificando-se, em conseqüência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar (RTJ 139/53 – RTJ 168/174-175 – RTJ 173/948), valendo assinalar, quanto ao aspecto ora ressaltado, que o Plenário deste Tribunal, em recentíssima decisão (25/03/2010), reafirmou a possibilidade processual do julgamento monocrático do próprio mérito da ação de mandado de segurança, desde que observados os requisitos estabelecidos no art. 205 do RISTF, na redação dada pela Emenda Regimental nº 28/2009:
“AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA. INDEFERIMENTO DE PEDIDO FORMULADO POR PROCURADOR-REGIONAL DA REPÚBLICA PARA PARTICIPAR EM CONCURSO DE REMOÇÃO PARA O PREENCHIMENTO DE VAGA DESTINADA A PROCURADOR DA REPÚBLICA. INADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LIQUIDEZ E CERTEZA NO DIREITO PLEITEADO. SEGURANÇA DENEGADA. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
…………………………………………………
III – Nos termos do art. 205 do Regimento Interno do STF, pode o Relator julgar monocraticamente pedido que veicule pretensão incompatível com a jurisprudência consolidada desta Corte ou seja manifestamente inadmissível.
IV – Agravo regimental improvido.”
(MS 27.236-AgR/DF, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Pleno – grifei)
Tendo em vista essa delegação regimental de competência ao Relator da causa, impõe-se reconhecer que a controvérsia mandamental ora em exame ajusta-se à jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria em análise, o que possibilita seja proferida decisão monocrática sobre o litígio em questão.
Entendo que as razões expostas na inicial desta impetração não autorizam o acolhimento da pretensão deduzida nesta sede mandamental, especialmente se se considerar, como bem destacado nas informações prestadas pela autoridade impetrada, que “(…) o único argumento da impetrante contra o Decreto tem por fundamento a produtividade do imóvel, mas essa circunstância, conquanto possa ser discutível, face ao laudo (…) torna o tema insuscetível de deslinde na via mandamental” (fls. 158/159).
Não foi por outro motivo que a douta Procuradoria Geral da República, ao opinar pela denegação do presente mandado de segurança, destacou que “não há dados objetivos e incontroversos nos autos que admitam declarar, sem sombra de dúvida, que o imóvel seja efetivamente produtivo. Seria essa uma imposição indispensável ao acolhimento do pleito do impetrante, contudo, descumprida” (fls. 295 – grifei).
Com efeito, a parte ora impetrante justifica sua pretensão mandamental com a afirmação, não comprovada, de que o imóvel rural em questão seria “reconhecidamente produtivo” (fls. 03), sendo certo, no entanto, que as informações prestadas pelo Senhor Presidente da República, especialmente naqueles pontos ressaltados pelo eminente Consultor-Geral da União (fls. 158), esclarecem que “o laudo agronômico deu o imóvel como grande propriedade improdutiva”, a indicar, portanto, que a solução da controvérsia mandamental depende, essencialmente, de esclarecimentos fáticos pertinentes à comprovação da alegada produtividade do imóvel rural afetado pela declaração expropriatória.
Isso significa, portanto, que a situação de fato exposta pela parte impetrante – alegada produtividade do imóvel rural – apresenta-se destituída da necessária liquidez.
Não se pode perder de perspectiva que a discussão em torno da alegada produtividade do imóvel rural em questão, notadamente se confrontada a pretensão da parte impetrante com as informações presidenciais, introduz, no âmbito desta causa, situação de dúvida objetiva, que se revela incompatível com a via sumaríssima do processo de mandado de segurança.
Não constitui demasia rememorar, no ponto, que as informações oficiais prestadas por autoridades públicas, mesmo em sede de “habeas corpus” ou, como na espécie, de mandado de segurança, revestem-se de presunção “juris tantum” de veracidade.
E a razão é uma só: precisamente porque constantes de documento subscrito por agente estatal, tais informações devem prevalecer, pois, como se sabe, as declarações emanadas de servidores públicos gozam, quanto ao seu conteúdo, da presunção de veracidade, salvo quando desautorizadas por prova idônea em sentido contrário, consoante assinala o magistério da doutrina (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 373, item n. 59, 13ª ed., 2001, Malheiros; MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, “Direito Administrativo”, p. 182/184, item n. 7.6.1, 20ª ed., 2007, Atlas; DIOGENES GASPARINI, “Direito Administrativo”, p. 63, item n. 7.1, 1989, Saraiva; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Direito Administrativo Brasileiro”, p. 54, item n. 43, 1999, Forense; JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, “Manual de Direito Administrativo”, p. 116, item n. 2, 12ª ed., 2005, Lumen Juris).
Esse entendimento – que põe em evidência o atributo de veracidade inerente aos atos emanados do Poder Público e de seus agentes – tem o beneplácito da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 86/212 – RTJ 133/1235-1236 – RTJ 161/572-573, v.g.), notadamente quando tais declarações compuserem e instruírem, como no caso, as informações prestadas pela própria autoridade apontada como coatora:
“- As informações prestadas em mandado de segurança pela autoridade apontada como coatora gozam da presunção ‘juris tantum’ de veracidade.”
(MS 20.882/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Cumpre ter presente, ainda, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal – pronunciando-se, especificamente, sobre a questão da produtividade fundiária e, também, sobre a qualificação do imóvel rural, como improdutivo, para efeito de reforma agrária (RTJ 128/1129 – RTJ 129/69) – tem ressaltado ser absolutamente imprópria a utilização da via processual do mandado de segurança, quando ausente, como ocorre no caso, prova pré-constituída:
“A controvérsia documental em torno do índice de produtividade do imóvel rural basta para descaracterizar a necessária liquidez dos fatos subjacentes ao direito subjetivo invocado pelos impetrantes, tornando impertinente, por ausência de um de seus requisitos essenciais, a utilização da via processual do mandado de segurança. Precedentes.”
(RTJ 168/163, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
“MANDADO DE SEGURANÇA. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DESAPROPRIATÓRIO. INOCORRÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. POSSIBILIDADE LEGAL DE EDIÇÃO DO DECRETO DESAPROPRIATÓRIO NA PENDÊNCIA DE RECURSO ADMINISTRATIVO. INADEQUAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA PARA AVERIGUAÇÃO DE EVENTUAIS EQUÍVOCOS NO RELATÓRIO DE PRODUTIVIDADE. SITUAÇÃO DE FORÇA MAIOR NÃO RECONHECIDA COMO JUSTIFICATIVA DA BAIXA PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL.
……………………………………………….
3. O mandado de segurança não é meio adequado para a resolução de controvérsia sobre a produtividade de imóvel rural objeto da desapropriação. Matéria controvertida que exige dilação probatória. Precedentes.”
(MS 24.487/DF, Rel. Min. AYRES BRITTO – grifei)
“CONSTITUCIONAL. AGRÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. NOTIFICAÇÃO DO PROPRIETÁRIO. AVISO DE RECEBIMENTO. ASSINATURA. EMPREGADO COM PODERES OUTORGADOS POR PROCURAÇÃO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ESBULHO POSSESSÓRIO POSTERIOR À VISTORIA. INAPLICABILIDADE DO ART. 2º, § 6º, DA LEI N. 8.629/93. COMPOSIÇÃO NA AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DESCARACTERIZAÇÃO DA INVASÃO. PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. DILAÇÃO PROBATÓRIA. APRECIAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE.
……………………………………………….
5. A impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança torna insuscetível de apreciação a questão relativa à produtividade do imóvel rural. Precedente [MS n. 24.518, Relator o Ministro CARLOS VELLOSO, DJ 30.04.2004 e MS n. 25.351, Relator o Ministro EROS GRAU, DJ 16.09.2005].”
(MS 25.360/DF, Rel. Min. EROS GRAU – grifei)
Na realidade, o tema pertinente à qualificação objetiva do imóvel rural – notadamente no que concerne à sua alegada condição de bem produtivo – envolve o exame necessário de matéria de fato, que se revela insuscetível de discussão em sede mandamental, especialmente quando se pretende questionar a inadmissibilidade da declaração expropriatória, sob o fundamento de que esta teria incidido sobre bem que, supostamente, realizaria, de modo pleno, a função social que lhe é inerente.
A possibilidade dessa análise, na via do mandado de segurança, quando presente uma situação de controvérsia objetiva, tem sido rejeitada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 158/510-511, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA – RTJ 168/163, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 22.075/MT, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – MS 22.077/RS, Rel. Min. MOREIRA ALVES – MS 22.150/CE, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – MS 22.290/PR, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, v.g.).
É que refoge, aos estreitos limites da ação mandamental, o exame de fatos despojados da necessária liquidez, pois o “iter” procedimental do mandado de segurança não comporta a possibilidade de instauração incidental de um momento de dilação probatória, consoante adverte a doutrina (ALFREDO BUZAID, “Do Mandado de Segurança”, vol. I/208, item n. 127, 1989, Saraiva) e proclama o magistério jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal:
“Refoge, aos estreitos limites da ação mandamental, o exame de fatos despojados da necessária liquidez, pois o iter procedimental do mandado de segurança não comporta a possibilidade de instauração incidental de uma fase de dilação probatória.
– A noção de direito líquido e certo ajusta-se, em seu específico sentido jurídico, ao conceito de situação que deriva de fato certo, vale dizer, de fato passível de comprovação documental imediata e inequívoca.”
(MS 20.882/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
“O exame de situações de fato controvertidas – como aquelas decorrentes de dúvida fundada sobre a extensão territorial do imóvel rural ou sobre o grau de produtividade fundiária – refoge ao âmbito da via processual do mandado de segurança, que não admite, ante a natureza especial e sumaríssima de que se reveste o ‘writ’ constitucional, a possibilidade de qualquer dilação probatória.”
(RTJ 176/692-693, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Vê-se, desse modo, que a jurisprudência desta Suprema Corte tem advertido, em inúmeras decisões (RTJ 124/948, v.g.), que “O mandado de segurança não é meio idôneo para o exame de questões cujos fatos não sejam certos” (RTJ 142/782, Rel. Min. MOREIRA ALVES).
Insista-se, pois, presente o contexto que emerge desta causa, que a simples existência de matéria de fato controvertida – a tornar questionável a própria caracterização do direito líquido e certo (noção que não se confunde com a de direito material, cuja tutela se busca obter em sede mandamental) – revela-se bastante para tornar inviável a utilização do “writ” constitucional (RTJ 83/130 – RTJ 99/68 – RTJ 99/1149 – RTJ 100/90 – RTJ 100/537).
O Supremo Tribunal Federal, ao pronunciar-se sobre esse específico aspecto do tema, deixou consignado que a discussão em torno do próprio significado de direito líquido e certo – que traduz requisito viabilizador da utilização do “writ” mandamental – veicula matéria de caráter eminentemente processual, mesmo porque a noção de liquidez, “(…) que autoriza o ajuizamento do mandado de segurança, diz respeito aos fatos” (RTJ 134/681, Rel. p/ o acórdão Min. CARLOS VELLOSO – RTJ 171/326-327, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 195.192/RS, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – RMS 23.443/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RMS 23.720/GO, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):
“O ‘direito líquido e certo’, pressuposto constitucional de admissibilidade do mandado de segurança, é requisito de ordem processual, atinente à existência de prova inequívoca dos fatos em que se basear a pretensão do impetrante e não à procedência desta, matéria de mérito (…).”
(RTJ 133/1314, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)
“A formulação conceitual de direito líquido e certo, que constitui requisito de cognoscibilidade da ação de mandado de segurança, encerra (…) noção de conteúdo eminentemente processual.”
(RTJ 134/169, Rel. p/ o acórdão Min. CELSO DE MELLO)
Cabe enfatizar, ainda, como ressaltado, que o conceito de direito líquido e certo, para os fins da ação civil de mandado de segurança, não constitui noção redutível à categoria do direito material reclamado pelo impetrante do “writ”. Tal como precedentemente assinalado, a formulação conceitual de direito líquido e certo, que constitui requisito de cognoscibilidade da ação de mandado de segurança, encerra, por isso mesmo, no plano de nossa dogmática jurídica, uma noção de conteúdo eminentemente processual.
Daí o incensurável magistério do saudoso CELSO RIBEIRO BASTOS (“Do Mandado de Segurança”, p. 15, 1978, Saraiva), para quem “(…) o direito líquido e certo é conceito de ordem processual, que exige a comprovação dos pressupostos fáticos da situação jurídica a preservar. Conseqüentemente, direito líquido e certo é ‘conditio sine qua non’ do conhecimento do mandado de segurança, mas não é ‘conditio per quam’ para a concessão da providência judicial”.
Registre-se que esta Corte, em sucessivas decisões, deixou assinalado que o direito líquido e certo, apto a autorizar o ajuizamento da ação de mandado de segurança, é, tão-somente, aquele que concerne a fatos incontroversos, constatáveis, de plano, mediante prova literal inequívoca (RE 269.464/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO):
“(…) direito líquido e certo é o que resulta de fato certo, e fato certo é aquele capaz de ser comprovado, de plano, por documento inequívoco.”
(RTJ 83/130, Rel. Min. SOARES MUÑOZ – grifei)
“O mandado de segurança labora em torno de fatos certos e como tais se entendem aqueles cuja existência resulta de prova documental inequívoca…”
(RTJ 83/855, Rel. Min. SOARES MUÑOZ – grifei)
É por essa razão que a doutrina acentua a incomportabilidade de qualquer dilação probatória no âmbito desse “writ” constitucional, que supõe – insista-se – a produção liminar, pelo impetrante, das provas literais pré-constituídas, destinadas a evidenciar a incontestabilidade do direito público subjetivo invocado pelo autor da ação mandamental.
Por isso mesmo, adverte HUMBERTO THEODORO JÚNIOR (“O Mandado de Segurança Segundo a Lei n. 12.016, de 09 de agosto de 2009”, p. 19, item n. 9, 2009, Forense), que “O que importa não é a maior ou menor complexidade da tese jurídica, mas a prova pré-constituída (documental) do seu suporte fático. Se a demonstração do direito do impetrante estiver na dependência de investigação probatória, ainda a ser feita em juízo, o caso não é de mandado de segurança. Terá de ser resolvido pelas vias ordinárias” (grifei).
Alega-se, ainda, nesta impetração, a ilicitude jurídica do esbulho possessório “ocorrido em propriedades alegadamente improdutivas” (fls. 05).
No que concerne a esse específico ponto da impetração, já afirmei, em outros julgamentos (MS 23.759/GO, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), que a prática ilícita do esbulho possessório, quando afetar os graus de utilização da terra e de eficiência em sua exploração, comprometendo os índices fixados por órgão federal competente, qualifica-se, em face do caráter extraordinário que decorre dessa anômala situação, como hipótese configuradora de força maior, constituindo, por efeito da incidência dessa circunstância excepcional, causa inibitória da válida edição do decreto presidencial consubstanciador da declaração expropriatória, por interesse social, para fins de reforma agrária, notadamente naqueles casos em que o coeficiente de produtividade fundiária – revelador do caráter produtivo da propriedade imobiliária rural e assim comprovado por registro constante do Sistema Nacional de Cadastro Rural – vem a ser descaracterizado como decorrência direta e imediata da ação predatória desenvolvida pelos invasores, cujo comportamento, frontalmente desautorizado pelo ordenamento jurídico, culmina por frustrar a própria realização da função social inerente à propriedade.
Esta Suprema Corte, por mais de uma vez, pronunciando-se sobre a questão específica do esbulho possessório praticado, mediante ação coletiva, por movimentos de trabalhadores rurais, não hesitou em censurar essa ilícita manifestação de vontade política, ao mesmo tempo em que invalidava o decreto presidencial consubstanciador da declaração expropriatória de imóveis rurais, pois, com a arbitrária invasão de tais bens, não mais se viabiliza a realização de vistoria destinada a constatar se a propriedade invadida teria atingido, ou não, coeficientes mínimos de produtividade fundiária.
A hipótese destes autos, no entanto, não se ajusta à situação que venho de referir. Isso porque o esbulho teria ocorrido “logo após a publicação do decreto presidencial”, como corretamente destacou, em seu fundamentado parecer, a douta Procuradoria Geral da República (fls. 295):
“(…) Contudo, de qualquer maneira, resta evidenciado que o esbulho teria ocorrido logo após a publicação do decreto presidencial, ou seja, tempos depois da vistoria do imóvel. Dessa maneira, não há qualquer envolvimento do dito movimento com os índices de produtividade das terras. Tal circunstância, como vem acenando a jurisprudência da Corte Suprema, inviabiliza a consideração desse tópico na regularidade do procedimento administrativo (MS 24.136, Ministro MAURÍCIO CORRÊA, DJ de 8/11/2002, p. 22).” (grifei)
Cumpre ter presente, ainda, a respeito do tema, a orientação jurisprudencial resultante de julgamentos plenários do Supremo Tribunal Federal:
“(…) DESAPROPRIAÇÃO – REFORMA AGRÁRIA – INVASÃO DO IMÓVEL – ÓBICE À VISTORIA. Se a vistoria é anterior à vigência do preceito que veio a obstaculizá-la, tem-se como improcedente a causa de pedir da impetração. O Decreto nº 2.250, de 11 de junho de 1997, mostrou-se simples orientação administrativa, não gerando direito subjetivo. (…).”
(MS 25.006/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei)
“MANDADO DE SEGURANÇA. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. IMÓVEL OCUPADO POR INTEGRANTES DO MST ANTES DA VIGÊNCIA DA MEDIDA PROVISÓRIA 2.027/00. VISTORIA REALIZADA EM DATA ANTERIOR À OCUPAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
……………………………………………….
2. Vistoria realizada sete meses antes da referida ocupação, inexistindo, no ponto, óbice que possa viciar o decreto presidencial.”
(MS 23.818/MS, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, Pleno – grifei)
No que concerne, finalmente, à alegação de “deslealdade processual” do INCRA (fls. 07), tenho por suficiente, para descaracterizá-la, a seguinte passagem do parecer oferecido pela douta Procuradoria Geral da República (fls. 295/296):
“(…) Sobre a suposta deslealdade processual em que teria incorrido a autarquia federal, é tema que não encontra ressonância nos documentos dos autos. Do mesmo modo, não influi no deslinde do processo administrativo, que se mostrou regular, pois ocorrido em momento em que não havia qualquer empecilho judicial ao desenvolvimento daquele expediente. Note-se, nesse sentido, que a ação cautelar de produção antecipada de prova fora extinta sem julgamento de mérito em virtude de o requerente, ora impetrante, não haver diligenciado o ajuizamento da ação principal – fls. 137-139.
Portanto, não se identifica qualquer mácula no processo administrativo, no que resta apenas a indicação da impropriedade das alegações do ‘mandamus’.” (grifei)
Sendo assim, tendo em consideração o fato de que a situação exposta nesta causa não diverge dos precedentes ora referidos, e acolhendo, ainda, o douto parecer do eminente Procurador-Geral da República, denego o presente mandado de segurança.
Arquivem-se os presentes autos.
Comunique-se.
Publique-se.
Brasília, 05 de novembro de 2010.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
*decisão publicada no DJe de 11.11.2010
** nome suprimido pelo Informativo
Contribuição previdenciária de inativos e pensionistas: período compreendido entre a EC 20/98 e a EC 41/2003 (Transcrições)
RE 580871 QO/SP*
RELATOR: Min. Gilmar Mendes
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator): A presente questão de ordem diz respeito à aplicação do regime de repercussão geral aos recursos extraordinários nas hipóteses em que a Corte já firmou entendimento sobre a matéria debatida. A discussão trazida nestes autos refere-se à repetição de contribuição previdenciária (e afins) cobrada de servidor civil inativo ou pensionista, no período referente à vigência da EC 20/98, até a publicação da EC 41/03.
Repetida é a jurisprudência desta Corte no sentido de que as contribuições recolhidas por órgão de seguridade social dos servidores civis inativos e respectivos pensionistas após a edição da EC 20/98 são inconstitucionais, por expressa hipótese de não incidência criada pela referida emenda. Nesse contexto, o Tribunal demanda exaustivamente a devolução aos pensionistas e inativos de parcelas indevidamente recolhidas, sob pena de enriquecimento ilícito.
Ressalte-se que esta Corte, no julgamento da ADI-MC 2.010, Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 29.9.1999, entendeu que o art. 195, II, c/c o art. 40, §§ 8º e 12, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.º 20, de 16 de dezembro de 1998, vedou a instituição de contribuições sobre os proventos e rendas de servidores civis inativos e seus respectivos pensionistas.
Assim, somente após a edição da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, ao incluir o § 18 no art. 40 do texto constitucional, possibilitou-se a contribuição sobre os proventos e rendas de aposentadorias e pensões dos servidores públicos inativos. Foi o que se decidiu nas ADIs 3.105 e 3.128, Rel. Min. Ellen Gracie, Rel. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, Pleno, DJ 18.2.2005.
A reiterar o referido entendimento, os recentes julgados: AI-AgR 699.887, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJ 22.5.2009; RE-ED 504.068, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJ 26.6.2009; RE-ED 593.586, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJ 29.10.2009; RE-ED 392.121, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJ 25.6.2010.
Por fim, é de se notar que a devolução de parcelas indevidamente recolhidas dever-se-á processar perante o Juízo competente para a execução, não se afetando a matéria a esta Corte. É o que está previsto nos seguintes julgados: RE-AgR 369.018, Rel. Min. Maurício Corrêa, 2ª Turma, DJ 9.5.2003; RE-AgR 455.295, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJ 12.5.2006; RE-AgR 430.514, Rel. Min. Eros Grau, 1ª Turma, DJ 13.5.2005, este assim ementado:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INATIVOS. TRIBUTO VINCULADO À SEGURIDADE SOCIAL. SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. PRECEDENTES. 1. O artigo 195, § 4º, da Constituição do Brasil, não legitima a instituição de contribuição previdenciária de inativos. Precedentes: ADI n. 2.010, DJ de 29.9.1999; ADI n. 2.189, DJ de 9.6.2000. 2. Contribuição previdenciária. Descontos nos vencimentos dos inativos. Restituição. A eventual devolução de parcelas recolhidas indevidamente é questão a ser resolvida no juízo da execução, tendo em vista a disposição proibitiva introduzida pela Emenda Constitucional 20/98. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.” (grifei)
No que concerne ao procedimento aplicado aos casos em que já existe jurisprudência pacificada, o Plenário desta Corte, no julgamento do RE-QO 580.108, Rel. Ellen Gracie, sessão de 11.6.2008, entendeu que as matérias já sucessivamente enfrentadas por este Tribunal podem ser trazidas em questão de ordem, a fim de que se afirme de forma objetiva, e para cada uma, a aplicabilidade do regime de repercussão geral, sempre que presente a relevância sob os aspectos legais. Dessa forma, o Tribunal definiu mecanismo próprio, que permite aos Tribunais, Turmas Recursais e de Uniformização a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral, como a retratação das decisões em contrariedade com a jurisprudência desta Corte e a declaração de prejuízo dos recursos que atacam decisões conformes (§ 3º do art. 543-B, do Código de Processo Civil).
Assim, a presente questão de ordem visa a reafirmar a jurisprudência pacificada neste Tribunal segundo a qual é devida a devolução aos pensionistas e inativos, perante o competente Juízo de execução, da contribuição previdenciária indevidamente recolhida no período compreendido entre a vigência da EC 20/98, até a publicação da EC 41/03, sob pena de enriquecimento ilícito.
Pelo exposto, proponho que se reconheça a repercussão geral da questão aqui analisada e seja reafirmada a jurisprudência da Corte no sentido de ser necessária a devolução aos servidores civis inativos e respectivos pensionistas de contribuição indevidamente recolhida no período entre a EC 20/98 e a EC 41/03, sob pena de enriquecimento ilícito.
Assim, nego provimento ao presente recurso extraordinário.
É como voto.
* acórdão pendente de publicação
Secretaria de Documentação – SDO
Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD