STF

Informativo nº 604 do STF

Informativo STF

Brasília, 11 a 15 de outubro de
2010 – Nº 604.


Este Informativo, elaborado a partir de notas
tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos
não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos
ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste
trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da
Justiça.

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SUMÁRIO


Plenário
Conflito de Atribuições e Pronaf
Conflito de Atribuições e Fundef
Recebimento de Denúncia: Suspensão Preventiva
Automática e Devido Processo Legal

Vinculação de Receita de Custas e Emolumentos:
Prejudicialidade

Cancelamento de Naturalização e Via Jurisdicional – 1
Cancelamento de Naturalização e Via Jurisdicional – 2
Cancelamento de Naturalização e Via Jurisdicional – 3
Decisão Judicial e Suspensão de Efeitos pelo CNJ
Repercussão Geral
Atividade Policial: Aposentadoria e Recepção da LC
51/85

1ª Turma
2ª Turma
Repercussão Geral
Clipping do DJ
Transcrições
Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substituição de
Pena Privativa de Liberdade por Restritivas de Direitos (HC 97256/RS)


PLENÁRIO

Conflito
de Atribuições e Pronaf


O Plenário resolveu conflito negativo de atribuição entre o Ministério Público
do Estado de São Paulo e o Ministério Público Federal, no sentido de reconhecer
a atribuição do segundo para conduzir as investigações de supostas
irregularidades na execução do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar – Pronaf em município paulista e promover as medidas
judiciais eventualmente cabíveis. Considerou-se a presença de verbas públicas
federais, as quais decorreriam de convênios, para o Pronaf.
ACO 1281/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.10.2010.
(ACO-1281)

Conflito
de Atribuições e Fundef


O Plenário iniciou julgamento de ação cível originária em que o Ministério
Público Federal suscita conflito negativo de atribuição relativamente ao
Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte para a investigação de
supostas irregularidades concernentes à gestão de recursos oriundos do Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério – Fundef. No caso, fora instaurado inquérito civil, a pedido do
Conselho Municipal de Acompanhamento e Controle Social do Fundef, pelo parquet
estadual da Comarca de João Câmara/RN, visando apurar a existência de
irregularidades no Município de Bento Fernandes/RN no tocante às ordens de
despesas à conta do Fundef. O Min. Marco Aurélio, relator, reconheceu a
atribuição do Ministério Público Federal. Aduziu que o fato de não haver aporte
de recursos federais, a título de complementação, não afastaria a sua
atribuição, porquanto tal fundo é composto de valores decorrentes do Imposto
sobre Produtos Industrializados – IPI proporcional às importações e de quota
alusiva à desoneração de exportações. Após, pediu vista dos autos o Min.
Ricardo Lewandowski.
ACO 1394/RN, rel. Min. Marco Aurélio, 13.10.2010.
(ACO-1394)

Recebimento
de Denúncia: Suspensão Preventiva Automática e Devido Processo Legal


O Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela
Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL para declarar a
inconstitucionalidade do art. 51 da Lei 15.301/2004, do Estado de Minas Gerais.
Tal preceito determina a aplicação imediata da suspensão preventiva disposta no
art. 20, VII, da Lei 5.406/69 (Estatuto da Polícia Civil do Estado de Minas
Gerais) ao servidor da polícia civil mineira assim que for recebida, pelo Poder
Judiciário, denúncia contra ele oferecida decorrente da prática de crime
hediondo, tortura, tráfico de entorpecentes e drogas afins e terrorismo; crime
contra o sistema financeiro ou de lavagem ou ocultação de bens, direitos e
valores; extorsão ou corrupção passiva ou ativa. O dispositivo impugnado ainda
prevê o recolhimento das armas de propriedade do Estado e o da própria
identidade policial. Entendeu-se que a aplicação automática da suspensão
preventiva estaria em confronto com os princípios do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa. O Min. Celso de Mello ressaltou em seu voto,
ademais, que a declaração de inconstitucionalidade da Lei 15.301/2004 não
impedirá que a Administração Pública adote a suspensão preventiva, tendo em
conta que o citado Estatuto da Polícia Civil mineira prevê que, no curso do
processo administrativo disciplinar, poderão ser aplicadas, como medidas
acessórias, a prisão administrativa e a suspensão preventiva, com eficácia
temporal limitada a 90 dias. Observou que, nesse caso, entretanto, sempre se
dará ao servidor, contra quem instaurado um procedimento administrativo disciplinar,
a oportunidade de exercer as prerrogativas inerentes ao devido processo.
Salientou, ainda, que o referido Estatuto alcança situações outras que não
apenas aquelas concernentes aos episódios delituosos previstos na lei
adversada.
ADI 3288/MG, rel. Min. Ayres Britto, 13.10.2010.
(ADI-3288)

Vinculação
de Receita de Custas e Emolumentos: Prejudicialidade


O Plenário julgou prejudicadas duas ações diretas de inconstitucionalidade
ajuizadas, respectivamente, pela Associação dos Notários e Registradores do
Brasil – ANOREG e pelo Procurador Geral da República contra os artigos 49 e 50
da Lei 4.847/93, do Estado do Espírito Santo. Os dispositivos impugnados
atribuem percentual da receita proveniente da arrecadação de custas e
emolumentos remuneratórios de serviços judiciários e extrajudiciais a titulares
de serventias, a órgãos de administração do Poder Judiciário e a entidades de
classe e assistenciais de natureza privada. Concluiu-se pela superveniente
perda de objeto das ações, diante do advento da Lei Complementar capixaba
219/2001 que, ao reestruturar o Fundo Especial do Poder Judiciário do Estado do
Espírito Santo – FUNDEPJ — para o qual seriam destinados taxas judiciárias,
custas judiciais e emolumentos remuneratórios dos serviços judiciários e
extrajudiciais oficializados —, cujo art. 11 revogou expressamente os preceitos
questionados nas ações diretas.
ADI 1298/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 13.10.2010.
(ADI-1298)

ADI 1378/ES, rel. Min. Dias Toffoli,
13.10.2010.(ADI-1378)


Cancelamento
de Naturalização e Via Jurisdicional – 1


O Plenário iniciou julgamento de recurso ordinário em mandado de segurança no
qual se discute a possibilidade, ou não, de o Ministro de Estado da Justiça,
por meio de ato administrativo, cancelar a concessão de naturalização quando
embasada em premissas falsas (erro de fato). Trata-se, na espécie, de recurso
ordinário interposto contra acórdão do STJ que denegara pedido de anulação da
Portaria 361/2008, daquela autoridade, que cancelara a naturalização do
recorrente. Essa Corte, com fundamento no Enunciado 473 da Súmula do STF,
afirmara que a Administração poderia rever o ato administrativo a qualquer
tempo, pois eivado de vício insanável. No caso, o Ministério de Estado da
Justiça, em virtude de pleito extradicional formulado pelo país de origem do
recorrente, instaurara processo administrativo em que constatado que ele
emitira declaração falsa, consistente na omissão da existência de condenação em
momento anterior a sua naturalização, razão pela qual anulara esta.
RMS 27840/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.10.2010. (RMS-27840)

Cancelamento
de Naturalização e Via Jurisdicional – 2


O Min. Ricardo Lewandowski, relator, desproveu o recurso por reputar possível o
aludido cancelamento pela via administrativa, quando descobertos vícios no seu
processo. Inicialmente, enfatizou que a naturalização, em sua forma ordinária
(CF, art. 12, II, a), caracterizar-se-ia por ser ato discricionário da
Administração relativamente àqueles que atendam aos requisitos estabelecidos na
Lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro). Em seguida, aduziu que, à época do
advento do mencionado estatuto, havia a previsão de que o Presidente da
República decretasse a perda da nacionalidade brasileira obtida em fraude
contra a lei (CF/69, art. 146, parágrafo único), não sendo a norma repetida
pela CF/88. Nada obstante, isso não significaria a sua extirpação do
ordenamento jurídico e tampouco a não recepção do art. 112, §§ 2º e 3º, da Lei
6.815/80 (“Art. 112. São condições para a concessão da naturalização: …
§ 2º Verificada, a qualquer tempo, a falsidade ideológica ou material de
qualquer dos requisitos exigidos neste artigo ou nos arts. 113 e 114 desta Lei,
será declarado nulo o ato de naturalização sem prejuízo da ação penal cabível
pela infração cometida. § 3º A declaração de nulidade a que se refere o
parágrafo anterior processar-se-á administrativamente, no Ministério da
Justiça, de ofício ou mediante representação fundamentada, concedido ao
naturalizado, para defesa, o prazo de quinze dias, contados da
notificação.”). Observou que a nova ordem constitucional estabelecera que
a naturalização válida somente poderia ser perdida, mediante sentença judicial,
em razão de atividade nociva aos interesses nacionais (“Art. 12. … § 4º
– Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que: I – tiver
cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade
nociva ao interesse nacional;”).
RMS 27840/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.10.2010. (RMS-27840)

Cancelamento de Naturalização e Via Jurisdicional –
3


Em divergência, o Min. Marco Aurélio proveu o recurso para assentar que, uma
vez formalizado o deferimento da naturalização, seu desfazimento apenas poderia
ocorrer mediante processo judicial. Asseverou que a cláusula do inciso I do §
4º do art. 12 da CF seria abrangente — no que revelaria que o cancelamento da
naturalização deveria ocorrer por sentença judicial — e que a referência feita
em sua parte final, ao apontar uma causa, seria simplesmente exemplificativa,
haja vista a infinidade de situações que podem surgir, a desaguarem no
cancelamento da naturalização. O Min. Dias Toffoli seguiu a divergência.
Consignou expressamente a não-recepção, pela CF/88, do art. 112, §§ 2º e 3º da
Lei 6.815/80 e proveu o recurso para o fim de declarar nula a Portaria
361/2008, do Ministro da Justiça, restabelecendo, assim, a situação do
recorrente como brasileiro naturalizado em todos os órgãos públicos, sem
prejuízo de que sua condição de naturalizado seja analisada judicialmente, nos
termos do art. 12, § 4º, I, da CF. Após, pediu vista a Min. Cármen Lúcia.
RMS 27840/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
13.10.2010. (RMS-27840)

Decisão
Judicial e Suspensão de Efeitos pelo CNJ


O Conselho Nacional de Justiça – CNJ, sob pena de atuação ultra vires, não pode
interferir em atos de conteúdo jurisdicional, emanados de quaisquer magistrados
ou de Tribunais da República. Com base nesse entendimento, o Plenário desproveu
agravos regimentais em que se pretendia a desconstituição de decisões
liminares, proferidas pelo Min. Celso de Mello, em mandados de segurança dos quais
relator. As decisões impugnadas suspenderam a eficácia de deliberações
administrativas emanadas do Corregedor Nacional de Justiça, cujo dispositivo
declarara ineficazes julgamentos de tribunal de justiça concessivos de mandados
de segurança impetrados perante a referida Corte. Preliminarmente, rejeitou-se
a alegação de prejudicialidade de um dos writs, porquanto a desistência
homologada nos autos referir-se-ia a outra impetração e não à presente,
favorável a uma das ora agravadas. No mérito, reputou-se que, embora o CNJ
esteja incluído na estrutura constitucional do Poder Judiciário, sua natureza
seria meramente administrativa e sua competência teria sido definida, de modo
rígido, pela EC 45/2004, que introduzira o art. 103 – B na CF. Salientou-se que
esse artigo, em seu § 4º, II, estabelece que o referido órgão tem o poder de
“apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos
administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário”.
Aduziu-se que as deliberações administrativas, objetos dos casos em apreço,
seriam impregnadas de conteúdo jurisdicional e que o Supremo já assentara
posicionamento no sentido de não caber àquele órgão nenhuma competência cujo
exercício fosse capaz de interferir no desempenho da função típica do Poder
Judiciário (ADI 3367/DF, DJU de 25.4.2005). Competir-lhe-ia, porém, dentre
outras atribuições, fiscalizar o exercício dos deveres funcionais por parte do
magistrado, e não a atividade jurisdicional dele. Outros precedentes citados:
MS 27148/DF (DJe de 25.5.2010) e MS 28537 MC/DF (DJe de 21.5.2010).
MS 28598 AgR-MC/DF, rel. Min. Celso de Mello,
14.10.2010. (MS-28598)

MS 28611 AgR-MC/MA, rel. Min. Celso de Mello,
14.10.2010.(MS-28611)

REPERCUSSÃO GERAL

Atividade
Policial: Aposentadoria e Recepção da LC 51/85


O Plenário negou provimento a recurso extraordinário interposto, pelo Instituto
de Previdência do Estado do Acre – ACREPREVIDÊNCIA, contra acórdão de tribunal
de justiça local que concedera a servidor público policial o direito a
aposentadoria especial conforme a Lei Complementar 51/85, que dispõe, nos
termos do art. 103 da Constituição anterior, sobre a aposentadoria do
funcionário policial. Na origem, delegado de polícia civil estadual impetrara
mandado de segurança no qual pleiteara a aplicação da referida lei
complementar, mesmo após a edição da EC 20/98 — que, dentre outras
providências, modificou o § 4º do art. 40 da CF/88. A ordem fora denegada em
primeira instância, o que ensejara apelação do impetrante à Corte estadual que,
provida, culminara neste recurso extraordinário. Registrou-se que, depois do
reconhecimento da repercussão geral da questão constitucional suscitada neste
recurso, houvera o julgamento da ADI 3817/DF (DJe de 3.4.2009), no qual
concluíra-se que a Constituição atual recepcionara a LC 51/85, especificamente
o seu art. 1º, I [“Art. 1º – O funcionário policial será aposentado: … I
– voluntariamente, com proveitos integrais, após 30 (trinta) anos de serviço,
desde que conte, pelo menos 20 (vinte) anos de exercício em cargo de natureza
estritamente policial”]. Resolveu-se, inicialmente, reafirmar a recepção
da LC 51/85. Em seguida, aduziu-se que o acórdão adversado baseara-se na
recepção do diploma legal e examinara se ao recorrido era aplicável a lei,
consideradas as condições de fato da prestação de serviço e, portanto, a
submissão dele às condições de periculosidade pela permanência na carreira.
Observou-se que rediscutir, diante dos fatos, se o recorrido preencheria as
exigências legais para a aposentadoria especial não seria cabível em sede de
recurso extraordinário. Quanto ao argumento do recorrente de que a aplicação da
norma não seria automática, ressaltou-se que, na situação descrita nos autos,
as instâncias de mérito, responsáveis pelo exame de provas, teriam comprovado
que ele cumpriria rigorosamente as condições do aludido art. 1º. Por fim, o
Min. Gilmar Mendes frisou que o exercício deve ocorrer em cargo de natureza
estritamente policial para se atenderem aos requisitos do dispositivo legal.
RE 567110/AC, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.10.2010.
(RE-567110)

1ª parte
2ª parte
3ª parte

PRIMEIRA TURMA

Não houve sessão ordinária da 1ª Turma em 12.10.2010.

SEGUNDA TURMA

Não houve sessão ordinária da 2ª Turma em 12.10.2010.

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

13.10.2010

14.10.2010

35

1ª Turma

2ª Turma




R E P E R C U S S Ã O  G E R A L


DJe de 15 de outubro de 2010

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 804.209-MS
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Juros. Limitação em 12% ao ano. Contratos celebrados após o advento da Emenda
Constitucional n. 40/2003. Legislação Infraconstitucional. Inexistência de
repercussão geral.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 540.829-SP
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Recurso extraordinário. Tributário. ICMS. Importação. Arredamento Mercantil.
Fato gerador. Repercussão geral reconhecida.

Decisões Publicadas: 2


C L I P P I N G  D O  DJ


15 de setembro de 2010

ACO N. 789-PI
RED. P/ O ACÓRDÃO: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA
Tributário. Imunidade recíproca. Art. 150, VI, “a”, da Constituição
Federal. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Empresa pública
prestadora de serviço público. Precedentes.
1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, desde o julgamento do RE nº
407.099/RS, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 6/8/04, firmou-se no
sentido de que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, empresa pública
prestadora de serviço público, é beneficiária da imunidade tributária recíproca
prevista no art. 150, VI, “a”, da Constituição da República. Esse
entendimento foi confirmado pelo Plenário desta Corte na ACO nº 765/RJ, Redator
para o acórdão o Ministro Menezes Direito.
2. Ação cível originária julgada procedente.

ACO N. 814-PR
RED. P/O ACÓRDÃO: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA
Tributário. Imunidade recíproca. Art. 150, VI, “a”, da Constituição
Federal. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Empresa pública
prestadora de serviço público. Precedentes.
1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, desde o julgamento do RE nº
407.099/RS, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 6/8/04, firmou-se no
sentido de que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, empresa pública
prestadora de serviço público, é beneficiária da imunidade tributária recíproca
prevista no art. 150, VI, “a”, da Constituição da República. Esse
entendimento foi confirmado pelo Plenário desta Corte na ACO nº 765/RJ, Redator
para o acórdão o Ministro Menezes Direito.
2. Ação cível originária julgada procedente.

RE N. 417.200-SP
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
REMUNERAÇÃO – SERVIDOR DO EXECUTIVO ESTADUAL – TETO – EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
19/98 – EFICÁCIA PROJETADA NO TEMPO – ARTIGO 37, INCISO XI, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, NA REDAÇÃO PRIMITIVA – SUBSISTÊNCIA DO TETO REVELADO PELA REMUNERAÇÃO DE
SECRETÁRIO DE ESTADO. A eficácia do inciso XI do artigo 37 da Constituição
Federal, na redação decorrente da Emenda Constitucional nº 19/98, ficou jungida
à fixação, por lei de iniciativa conjunta do Presidente da República, do
Presidente do Supremo, do Presidente da Câmara e do Presidente do Senado, do
subsídio, persistindo a vigência do texto primitivo da Carta, no que
contemplado o teto por Poder, consideradas as esferas federal e estadual.

HC N. 102.351-SP
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTE.
POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE
DIREITOS.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal assentou serem inconstitucionais os
arts. 33, § 4º, e 44, caput, da Lei 11.343/2006, na parte em que vedavam a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em
condenação pelo crime de tráfico de entorpecentes (HC 97.256, Rel. Min. Ayres
Britto, sessão de julgamento de 1º.9.2010, Informativo/STF 598).
2. Ordem concedida.

HC N. 99.114-SC
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. TRÊS ROUBOS SUJEITOS À COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
COMUM E UM ROUBO DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE
TODOS ELES. QUESTÃO NÃO EXAMINADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PORQUE NÃO
FOI SUBMETIDA AO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. ORDEM DENEGADA.
I – Impossibilidade de o Superior Tribunal de Justiça analisar a questão
relativa à continuidade delitiva entre todos os crimes de roubo praticados pelo
paciente (quatro), tanto os de competência da justiça estadual quanto o da
justiça federal, sob pena de supressão de instância.
II – O fato de o writ ter sido impetrado, no STJ, simultaneamente, contra os
acórdãos proferidos pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Tribunal
de Justiça do Estado de Santa Catarina, que julgaram as respectivas apelações,
não exime o impetrante de suscitar a questão, antes, nas instâncias inferiores.
III – Embora a matéria tenha sido discutida no julgamento da apelação
interposta no TJ/SC, o mesmo não ocorreu no âmbito da justiça federal, porque,
nesse caso, tratava-se de roubo único e de formação de quadrilha.
IV – Não foi por outro motivo que o acórdão ora atacado limitou-se a apreciar a
continuidade delitiva em relação aos roubos julgados pela justiça comum.
V – O pedido de continuidade delitiva dos quatros crimes de roubo somente foi
examinado, posteriormente, pelo juízo da execução, que o indeferiu sob o
argumento de que teriam sido cometidos de maneira autônoma e não continuada,
não sendo interposto qualquer recurso contra essa decisão.
VI – Não configurada a negativa de prestação jurisdicional por parte do
Superior Tribunal de Justiça.
VII – Ordem denegada.

HC N. 102.937-RS
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ALEGAÇÃO DE DEMORA NO JULGAMENTO DO
MÉRITO DE WRIT PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. EXCESSO DE IMPETRAÇÕES NA
CORTE SUPERIOR PENDENTES DE JULGAMENTO. FLEXIBILIZAÇÃO DA DESEJÁVEL CELERIDADE
NO JULGAMENTO QUE SE MOSTRA COMPREENSÍVEL. ORDEM DENEGADA.
I – O excesso de trabalho que assoberba o STJ permite a flexibilização, em
alguma medida, da desejável celeridade processual.
II – A concessão da ordem para determinar o julgamento do writ na Corte a quo
poderia redundar na injustiça de determinar-se que a impetração manejada em
favor do paciente seja colocada em posição privilegiada com relação a de outros
jurisdicionados.
III – Nada obsta que a defesa formule pedido de preferência diretamente ao novo
Relator daquela impetração, sem que seja necessária a interferência desta
Suprema Corte na gestão dos feitos submetidos àquele Tribunal Superior.
IV – Ordem denegada.

HC N. 103.131-SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL MILITAR. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTOS DA CUSTÓDIA CAUTELAR DECRETADA NO INÍCIO DA AÇÃO PENAL.
SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. TRÂNSITO EM JULGADO PARA A DEFESA.
WRIT PREJUDICADO. RECOMENDAÇÃO AO JUÍZO DE ORIGEM. BENEFÍCIOS DA EXECUÇÃO DA
PENA.
I – Busca-se, neste writ, a revogação da prisão cautelar, sob o argumento de
que a segregação foi decretada sem a individualização da conduta do paciente e
sem a fundamentação exigida pelo art. 93, IX, da Constituição Federal.
II – Superveniência de sentença penal condenatória, com trânsito em julgado
para a defesa.
III – Prisão decorrente, agora, do próprio édito condenatório, que constitui um
título prisional definitivo.
IV – Habeas corpus prejudicado, com recomendação ao juízo de origem, quanto à
possibilidade de o paciente obter os benefícios próprios da fase de execução.

HC N. 103.532-SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSO PENAL. CONDENAÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO
HÁ MAIS DE QUINZE ANOS. NULIDADES. ALEGAÇÃO. PREJUÍZO. AUSÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO. PRECLUSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE ADMITIR-SE O WRIT
CONSTITUCIONAL COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE NULIDADE
FLAGRANTE. ORDEM DENEGADA.
I – Esta Corte já firmou entendimento o sentido de que não se declara nulidade
se a alegação não vier acompanhada de prova do efetivo prejuízo sofrido pelo
réu. Precedentes.
II – Inexistindo nulidade ou ilegalidade flagrante a ser sanada, não se pode
admitir o habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal, ante a verificação
do trânsito em julgado do acórdão que tornou definitiva a condenação.
III – Habeas corpus denegado.

HC N. 95.418-GO
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Habeas Corpus. 2. Pedido de extensão. Impossibilidade. 3. Prisão Preventiva.
Decisão judicial devidamente motivada em elementos concretos. 4.
Constrangimento ilegal não caracterizado. 5. Ordem denegada.

HC N. 96.861-SP
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
ROUBO QUALIFICADO – ARMA – PERÍCIA. Prescinde de apreensão e perícia da arma de
fogo a qualificadora decorrente de violência ou ameaça com ela implementadas –
artigo 157, § 2º, inciso I, do Código Penal.

Acórdãos Publicados: 181


T R A N S C R I Ç Õ E S

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma
compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço
trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial
o interesse da comunidade jurídica.

Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substituição de
Pena Privativa de Liberdade por Restritivas de Direitos (Transcrições)

(v. Informativo 598)

HC 97256/RS*

RELATOR: Min. Ayres Britto


VOTO: Feito o relatório, passo ao voto. Ao fazê-lo, de logo anoto que, pela
primeira vez, o texto normativo do art. 44 da Lei 11.343/06 é focadamente
submetido ao Plenário do Supremo Tribunal Federal. Texto que veda
expressamente, em tema de tráfico ilícito de entorpecentes, a possibilidade de
conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos.
8. A Defensoria Pública da União, conforme visto, sustenta a
inconstitucionalidade do referido preceito, sob a alegação de ofensa aos
seguintes incisos do art. 5º da Magna Carta: inciso XXXV, ao argumento da
inafastabilidade de apreciação, pelo Poder Judiciário, de lesão ou ameaça de
lesão a direito; inciso XLVI, consagrador da individualização da pena; e inciso
LIV, veiculador de proporcionalidade da resposta estatal ao delito.
9. Eis a redação do dispositivo legal impugnado:

Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1.º, e 34 a 37 desta Lei
são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e
liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de
direitos.
Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o
livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua
concessão ao reincidente específico.

10. Calha relembrar que, por todo o período de vigência da Lei 6.368/76,
revogada pela Lei 11.343/06, e mesmo com o advento da Lei 8.072/90, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se manteve firme no sentido de
admitir a conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de
direitos. Ao reverso, dava pela compatibilidade jurídica entre a aplicação da
pena privativa de liberdade e a previsão de regime penitenciário totalmente
fechado. Isso nos originários termos da Lei de Crimes Hediondos, posteriormente
tida por inconstitucional por esta Casa de Justiça. (Cf. HC 96.149/SP, Segunda
Turma, de relatoria do ministro Eros Grau, DJ 11/09/2009; HC 93.857/RS, Segunda
Turma, de relatoria do ministro Cezar Peluso, DJ 16/10/2009; HC 91.600/RS,
Primeira Turma, de relatoria do ministro Sepúlveda Pertence, DJ 06/09/2007; HC
90.871/MG, Primeira Turma, de relatoria da ministra Cármen Lúcia, DJ
25/05/2007.)
11. Externando o mesmo pensamento, eis o núcleo do meu voto no julgamento do HC
85.894/RJ (Tribunal Pleno, DJ 28/09/2007), de relatoria do ministro Gilmar
Mendes, mas ainda à luz da Lei 8.072/90:

[…] não há óbice à substituição de penas privativas de liberdade por outras
restritivas de direitos, nos casos de crimes hediondos e de tráfico de drogas.
Isso porque o momento da definição da espécie de pena aplicável é — bem disse o
eminente relator — antecedente àquele da estipulação do modo pelo qual se dará
o respectivo cumprimento. Leia-se: somente após fixada a espécie de pena (se
privativa de liberdade ou restritiva de direito) é que se pode cogitar do
regime de seu cumprimento. A substituição da pena deve preceder à incidência do
regime de seu cumprimento, não havendo que se cogitar da aplicação da Lei nº
8.072/90 como óbice ao pedido de substituição.
5. Esse raciocínio homenageia, sobretudo, o princípio da individualização da
pena, naquela tessitura que se dá em dois momentos: no momento judicial da
fixação e no instante administrativo da execução da reprimenda. Não foi por
outro motivo que acompanhei o Min. Cezar Peluso, no julgamento do HC 84.928,
ocasião em que o Min. Pertence ressaltou a viragem na jurisprudência do
Tribunal, já agora na linha do voto que fora vencido no HC 80.010 (Rel. Min.
Octavio Gallotti). De se ver:
Entendo que há, na individualização da pena, momentos distintos: a substituição
da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, se faz na
sentença – é o momento judicial da individualização da pena; outro,
inteiramente inconfundível, a meu ver, data vênia, é o problema da progressão,
ou não, na execução da pena.

6. Neste rumo de idéias também se posicionam Luiz Regis Prado e Francisco de
Assis Toledo, in verbis:

Em se tratando de delito previsto na Lei nº 8.072 (Lei dos Crimes Hediondos),
cabe dizer que a exigência constante nesse diploma – a saber, cumprimento
integral da pena privativa de liberdade aplicada em regime fechado (art. 2º, §
1º ) – não constitui óbice à eventual substituição da pena privativa de
liberdade imposta por penas restritivas de direitos. E isso porque a fixação do
regime se limita às hipóteses de cumprimento efetivo da pena de prisão, e a
substituição desta por penas restritivas de direitos afasta, a princípio, a
possibilidade de ter início a execução da pena privativa de liberdade
determinada na sentença. Demais disso, deve-se ter presente que a substituição
da pena imposta por pena restritiva de direitos deve atender,
concomitantemente, aos requisitos objetivos e subjetivos listados no artigo 44
do Código Penal. E apenas quando preenchidas as exigências legais será possível
a substituição. O rótulo do delito como hediondo não pode figurar como
empecilho à substituição, desde que cabível. Em tese, admitiriam a referida
substituição alguns dos delitos elencados na Lei 8.072/90, desde que
satisfeitos os requisitos impostos à concessão da medida, visto que não consta
da legislação especial – e tampouco do Código Penal – qualquer dispositivo em
contrário.
[PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro, volume 1: parte geral:
arts. 1º a 120. 3a ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2002, p. 494/495.]

7. Acresce que este Plenário já decidiu pela inconstitucionalidade do § 1º do
art. 2º da Lei nº 8.072/90 (HC 82.959), pelo qual se sustentava a
impossibilidade de aplicação do regime de substituição das penas aos delitos
hediondos e de tráfico de entorpecentes. Razão por que, mesmo o Min. Joaquim
Barbosa, que inaugurou a divergência no presente julgamento, passou a conceder
medidas liminares em casos que tais (HC 88.319).
8. Por tudo quanto posto, acompanho o relator para deferir o habeas corpus, no
reconhecimento de que é juridicamente possível substituir pena privativa de
liberdade por outras restritivas de direitos, mesmo nos julgamentos de crime de
tráfico ilícito de entorpecentes. O que faço com a ressalva de que a gravidade
do crime e a suficiência da pena restritiva de direito hão de ser apreciadas em
concreto pelo juiz sentenciante.

12. Confirmo, então, que o centrado desafio temático deste voto é saber se a
proibição estabelecida pela nova lei, isto é, a Lei 11.343/06, encontra ou não
encontra suporte no sistema de comandos da Constituição Federal. O que
demandará elaboração teórica mais cuidadosa para a perfeita compreensão da
natureza e do alcance da garantia constitucional da individualização da pena.
Com o que teremos condições objetivas de inferir se o modelo adotado pela Lei
de Tóxicos, ao estabelecer a vedação em causa (a título de regulação da
matéria), extravasa ou não extravasa o núcleo significativo dessa garantia da
individualização da reprimenda penal. Reprimenda enquanto reação estatal ao
tráfico ilícito de entorpecentes, que é modalidade integrante do rol dos crimes
hediondos, a meu ver, ou dos delitos a ele assemelhados, segundo a
classificação de alguns penalistas.
13. Leia-se a figura do crime hediondo, tal como descrita no inciso XLIII do
art. 5º da Constituição Federal:

XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou
anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins, o terrorismo e os definidos como hediondos, por eles respondendo os
mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

14. Daqui já se pode vocalizar um primeiro juízo técnico: em tema de vedações
de benefícios penais ao preso, ou, então, ao agente penalmente condenado, o
Magno Texto Federal impõe à lei que verse por modo igual os delitos por ele de
pronto indicados como hediondos e outros que venham a receber a mesma tarja.
Sem diferenciação entre o que já é hediondo por qualificação diretamente
constitucional e hediondo por descrição legal. Isonomia interna de tratamento,
portanto, antecipadamente assegurada pela nossa Constituição.
15. Um novo e complementar juízo: embora o Magno Texto Federal habilite a lei
para completar a lista dos crimes hediondos, a ela impôs um limite material: a
não-concessão dos benefícios da fiança, da graça e da anistia para os que
incidirem em tais delitos. É como dizer, a própria norma constitucional cuidou
de enunciar as restrições a ser impostas àqueles que venham a cometer as
infrações penais adjetivadas de hediondas. Não incluindo nesse catálogo de
restrições a vedação à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva
de direitos. Ponto pacífico. Percepção acima de qualquer discussão ou
contradita.
16. Insista-se na idéia: no tema em causa, a Constituição da República fez
clara opção por não admitir tratamento penal ordinário mais rigoroso do que o
nela mesma previsto. Subtraiu do legislador comum a possibilidade de
estabelecer constrições sobejantes daquelas já preestabelecidas pelo próprio
legislador constituinte. É como penso, atento ao postulado de que a norma
constitucional restritiva de direitos ou garantias fundamentais é de ser
contidamente interpretada, inclusive em sua primária aplicação pelo legislador
comum.
17. Foi além a Magna Carta, porque também não fez diferenciação constritiva
entre os crimes por ela nominados. Nenhuma diferenciação restritiva avançou
quanto aos benefícios penais ou às causas excludentes de criminalidade que
optou por retirar do âmbito dos crimes ali expressamente indicados. Basta
pensar na determinação da imprescritibilidade, que ficou limitada à prática do
racismo (inciso XLII do art. 5º) e à ação de grupos armados, civis ou
militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático (inciso XLIV do
art. 5º). Também assim a pena de morte, que somente incide nos casos de guerra
declarada (alínea a do inciso XLVII do art. 5º). Já no campo da vedação à
extradição, dele foi excluído o brasileiro naturalizado quanto ao comprovado
envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da
lei, ou em caso de crime comum praticado antes da naturalização (inciso LI do
art. 5º).
18. Numa frase, em matéria de crimes hediondos, não há como reforçar o discurso
da própria Constituição da República quanto às excludentes de punibilidade ou à
proibição de benefício penal a quem responder pela autoria deles. Afinal, o que
se tem como próprio do capítulo versante sobre direitos e garantias individuais
– historicamente oponíveis ao Estado, inclusive ao Estado-legislador – é
ampliar a esfera de liberdade das pessoas naturais. Não é estreitar ou por
qualquer modo encurtar esse espaço de movimentação humana. Tanto é assim que
toda a nominata dos direitos e garantias constitucionais do indivíduo é
expressamente circundada pelo que se convencionou chamar de cláusula pétrea
(inciso IV do § 4º do art. 60 da CF). Nunca implicando demasia recordar que
mesmo a pessoa condenada pelo mais infamante dos delitos não decai jamais de
sua dignidade intrínseca de ser humano. Não se animaliza perante o Direito e
muito menos há de ser tratado como coisa ou anódico objeto.
19. Por outro aspecto, quanto à garantia mesma da individualização da pena,
mais uma proposição nos parece cabível: sem impor a essa garantia qualquer
restrição por conta própria, a Carta Magna preceitua no inciso XLVI do seu art.
5º:

XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos.

20. Analisando esse dispositivo, no HC 82.959/SP (Tribunal Pleno, DJ
01/09/2006), tive a oportunidade de pontuar que, embora o preceito não
prescinda da intercalação de diploma legal, o núcleo semântico da garantia à
individualização da pena não pode ser por ele nulificado. Eis o que verbalizei
em linhas gerais:

É certo que o inciso XLVI do art. 5º da Constituição não regulou, por si mesmo,
as condições ou os requisitos da individualização da pena. Convocou o
legislador de segundo escalão para fazê-lo (a lei regulará a individualização
da pena (…). Mas não é menos certo que se cuida de um transpasse de poder
normativo que não priva o dispositivo constitucional de toda e qualquer
dimensão eficacial imediata. É exprimir: o preceito constitucional em exame não
prescinde da intercalação da lei comum, é fato, porém não é de ser nulificado
por ela. Se compete à lei indicar os parâmetros de densificação da garantia
constitucional da individualização do castigo, a esse diploma legal não é
permitido se desgarrar do núcleo significativo binário que exsurge da
Constituição mesma: o momento concreto da aplicação da pena privativa de
liberdade, seguido do instante igualmente concreto do respectivo cumprimento em
recinto penitenciário. Ali, busca da justa medida entre ação criminosa dos
sentenciados e reação coativa do Estado. Aqui, a mesma procura de uma justa
medida, só que no transcurso de uma outra relação de causa e efeito: de uma
parte, a resposta crescentemente positiva do encarcerado ao esforço estatal de
recuperá-lo para a normalidade do convívio social; de outra banda, a passagem
de um regime prisional mais severo (porque integralmente fechado) para outro
menos rigoroso (porque já incorporante de saídas do presídio e retorno a ele em
horas certas).

21. Nesse diapasão é que Luiz Luisi (Os Princípios Constitucionais Penais,
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2ª ed., 2003, p. 52), citando
Nelson Hungria, ensina que se deve entender por individualização da pena o
processo que visa a retribuir o mal concreto do crime com o mal concreto da
pena, na concreta personalidade do criminoso.
22. É isso mesmo. Por um modo convergente, os doutrinadores compreendem que o
processo de individualização da pena é um caminhar no rumo da personalização da
resposta punitiva do Estado, desenvolvendo-se em três momentos individuados e
complementares: o legislativo, o judicial e o executório ou administrativo.
Discorrendo sobre cada um desses momentos, ou, melhor dizendo, cada uma dessas
etapas do conceito individualizador, todas destinadas a garantir o axioma da
pena particularizada ou rigorosamente personalizada, inextensível, portanto, a
qualquer outro indivíduo. O mesmo Luiz Luisi (ob. cit., p. 52, 53 e 55) aduz
que:

Na primeira etapa através de lei, – que fixa para cada tipo penal uma ou mais
penas proporcionais a importância do bem tutelado e a gravidade da ofensa. Não
se trata de penas com quantitativos fixos e certos. Também prevê as espécies de
pena e muitas vezes as prevê de forma alternativa, e mesmo, em outras ocasiões,
dispõe a sua aplicação cumulada. Em outros textos normativos viabiliza as
substituições da pena, geralmente as mais graves por espécies mais atenuadas.
Todavia a lei penal não se limita às previsões normativas mencionadas mas,
também, fixa regras que vão permitir as ulteriores individualizações. Assim ao
estabelecer as regras que o juiz deve obedecer para chegar, em cada caso,
considerando suas peculiaridades, à fixação da pena definitiva e concreta. Como
é, ainda, na lei que se hão de encontrar as diretrizes balizadoras da execução
as sanções penais.
O segundo momento é o da individualização judiciária. Tendo presente as nuanças
da espécie concreta e uma variedade de fatores que são especificamente
previstas pela lei penal, o juiz vai fixar qual das penas é aplicável, se
previstas alternativamente, e acertar o seu quantitativo entre o máximo e o
mínimo fixado para o tipo realizado, e inclusive determinar o modo de sua
execução.
A individualização judiciária, embora as regras que a devem orientar estejam na
lei, enseja ao Juiz uma indiscutível discricionariedade.
[…]
O juiz, pois, nos limites que a lei impõe realiza uma tarefa de ajustamento da
resposta penal em função não só das circunstâncias objetivas, mas
principalmente da pessoa do denunciado, e, também, do comportamento da vítima.
[…]
Aplicada a sanção penal pela individualização judiciária, a mesma vai ser
efetivamente concretizada com sua execução. ‘Aí’, – como observa Aníbal Bruno,
– é que a sanção penal, ‘começa verdadeiramente a atuar sobre o delinqüente,
que se mostrou insensível à ameaça contida na cominação’.
[…]
Nos quadros da nossa orientação constitucional e ordinária pode se entender ter
prevalecido o que se poderá chamar de ‘polifuncionalidade’ da sanção penal, ou
seja, uma concepção eclética em que se integram as instâncias retributivas e as
da reinserção social.

23. Daqui se deduz que a lei comum não tem a força de subtrair do juiz sentenciante
o poder-dever de impor ao delinqüente a sanção criminal que a ele, juiz, se
afigurar como expressão de um concreto balanceamento ou de uma empírica
ponderação (mandado de otimização, diria Ronald Dworkin) de circunstâncias
objetivas com protagonizações subjetivas do fato-tipo. Implicando essa
ponderação em concreto – porque não dizer? – a opção jurídico-positiva pela
prevalência do razoável sobre o racional. É que a pura racionalidade se dá nos
colmos olímpicos da abstração mental, sempre ávida por trabalhar com categorias
tão universais quanto atemporais, que são categorias aprioristicamente válidas
para toda e qualquer situação existencial. Diferentemente do juízo de
razoabilidade, que toma em linha de conta o contexto ou a contingência das protagonizações
humanas. Atenta à elementar consideração de que o Direito é feito para a
concreta vida dos homens em sociedade, e o fato é que a concreta vida dos
homens em sociedade escapa até mesmo à mais circunstanciada ou minudente
descrição legislativa. Regida que é, tal como na particularizada esfera dos
fenômenos quânticos, pelos princípios da complementariedade e da incerteza –
para lembrar a conhecida categorização de Heizemberg. Ou como no Século V antes
de Cristo sentenciava Heráclito: o ser das coisas é o movimento (e as coisas
ditas humanas não fogem à regra). Por isso que só o impermanente é que é
permanente; somente o inconstante é que é constante, porque tudo muda
incessantemente, menos a incessante mudança.
24. Em suma, estamos a falar de uma necessária ponderação em concreto, ditada
pelo permanente esforço do juiz para conciliar segurança jurídica e justiça
material. Segurança e justiça que figuram desde o preâmbulo da Magna Carta
Federal entre os valores de pronto qualificados como valores supremos de uma
sociedade pluralista, fraterna e sem preconceitos. Saltando aos olhos que é
esse tipo de sociedade que se põe como base de inspiração do princípio da
dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1º) e, pour cause, do advento de
um sistema de direito penal humanista.
25. Noutro modo de falar sobre a mesma coisa, o momento sentencial da
dosimetria da pena não significa senão a imperiosa tarefa individualizadora de
transportar para as singularidades objetivas e subjetivas do caso concreto – a
cena empírico-penal, orteguiana por definição – os comandos genéricos,
impessoais e abstratos da lei. Vale dizer, nessa primeira etapa da concretude
individualizadora da reprimenda (a segunda etapa concreta já se dá intramuros
penitenciários), o juiz sentenciante se movimenta com ineliminável
discricionariedade entre aplicar a pena de privação ou de restrição da
liberdade de condenado e uma outra que já não tenha por objeto esse bem
jurídico maior da liberdade física do sentenciado. Sem prejuízo, claro, da proposição
de que a lei, se não pode fechar para o julgador a porta da alternatividade
sancionatório-penal, pode prever a cumulação da pena que tenha por conteúdo a
liberdade com outra desprovida de tal natureza. Como, por hipótese, a pena de
perda de bens e a multa, ambas perfeitamente compatíveis com o seu
adicionamento à perda ou então à constrição da liberdade da pessoa natural.
26. O que estamos a ajuizar não é senão o seguinte: o direito penal bem pode
cumular penas, inclusive a privativa e a restritiva da liberdade corporal (vide
o § 4º do art. 37 da CF, emblemático em tema de cumulação de sanções), mas lhe
é vedado subtrair da instância julgadora a possibilidade de se movimentar com
discricionariedade nos quadrantes da alternatividade sancionatória. Uma coisa é
a lei estabelecer condições mais severas para a concreta incidência da
alternatividade; severidade jurisdicionalmente sindicável tão-só pelos vetores
da razoabilidade e da proporcionalidade. Outra coisa, porém, é proibir ao
julgador, pura e secamente, a convolação da pena supressora da liberdade em
pena restritiva de direitos. Opção que a encarecida garantia da
individualização da reprimenda, exatamente por ser a antítese da
desindividualização, não tolera.
27. Feito luva encomendada, e ante o paradigmático precedente que declarou a
inconstitucionalidade da proibição da progressão de regime prisional em se
tratando de crimes hediondos (HC 82.959/SP, julg. cit.), o ministro Eros Grau
vocalizou que o Congresso Nacional, a quem primeiro se dirige o princípio da
individualização da pena, não pode impor regra que impeça o julgador de
individualizar, segundo sua avaliação, caso a caso, a pena do condenado que
tenha praticado qualquer dos crimes relacionados como hediondos.
28. De proposição em proposição interpretativa, tendo por objeto o inciso XLVI
do art. 5º da Constituição, chegamos a um novo patamar de intelecção: a
garantia constitucional da individualização da pena foi regrada pela
Constituição em dispositivo posterior, justamente, àquele referente aos crimes
hediondos (aqui, inciso XLVI do art. 5º; ali, inciso XLIII). Mais que isso, a
garantia em apreço antecede o próprio rol de penas que o Magno Texto
Republicano aponta como passíveis de fixação por lei. Quero dizer: ao começar o
seu discurso normativo sobre a garantia da individualização da reprimenda penal
(inciso XLVI do art. 5º, reprise-se), a Constituição brasileira o fez em termos
absolutamente assecuratórios ou proclamativos dessa garantia. Ela mesma,
Constituição Federal, sem precisar da lei comum, fez de tal garantia uma cabal
situação jurídica subjetiva de todo e qualquer indivíduo, independentemente do
crime por ele cometido ou mesmo da pena que venha a sofrer. Daí a mencionada
alocação topográfica, para significar que, perante a nossa Lei Maior, a
garantia da individualização da pena tudo recobre, no sentido de que é
permeante assim do crime quanto do castigo; ou seja, ao requestar o comando
intercalar da lei, a Lei Maior o fez apenas para que a legislação ordinária
regulasse as condições de aplicabilidade do instituto (individualização da
pena) em função de cada tipo penal. Não para excluir do âmbito desse peregrino
direito adjetivo qualquer dos tipos criminais, dado que se trata de situação
jurídica ativa concebida para incidir em face de qualquer dos delitos
legalmente descritos e do seu específico apenamento. Por isso que nela própria,
Magna Carta, nenhuma exceção foi aberta à incidência da personalização da
reprimenda. Nenhuma. Nem por ocasião do atuar legislativo do Estado nem nas
subseqüentes fases da dosimetria e do regime de execução intramuros
penitenciário. No particular, cuida-se de enunciado constitucional que escapa à
classificação das normas restringíveis (normas de eficácia contida, na
linguagem de José Afonso da Silva), pois insuscetível de contração no seu
núcleo deôntico ou de intrasigente proteção individual.
29. De se perceber, portanto, que as penas restritivas de direitos são, em
essência, uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos, estigmatizantes e
onerosos do cárcere. Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de penas
alternativas, pois essa é mesmo a sua natureza: constituir-se num substitutivo
ao encarceramento e suas sempre que possível contornáveis seqüelas.
30. Não por acaso é que a primeira das penas a que se refere o inciso XLVI do
art. 5º da Constituição Federal é justamente a mais dura de todas: a privação
ou restrição da liberdade corporal do agente. Em imediata sequência é que vêm a
perda de bens, a multa, a prestação social alternativa e a suspensão ou
interdição de direitos, todas elas, de parelha com a possibilidade da referida
aplicação cumulativa, significantes de aplicabilidade alternativa àquela de
maior dureza. Opção constitucional que, além de cultuar o vetor da
proporcionalidade entre os bens jurídicos violados e a resposta punitiva do
Estado, traduz que a pena privativa de liberdade corporal não é a única a
cumprir a função retributivo-ressocializadora ou restritivo-preventiva da
sanção penal. As demais penas também são vocacionadas para esse geminado papel
da retribuição-prevenção-ressocialização, e ninguém melhor do que o juiz
natural da causa para saber, no caso concreto, qual o tipo alternativo de
reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo, recuperar socialmente
o apenado. Além de inibir, obviamente, condutas de igual desvalia social.
Conciliando ele, juiz sentenciante, justiça material e segurança jurídica. Que
já significa fazer andar de braços dados a concreta individualização da pena e
o sistema da justiça penal eficaz. Tudo em congruente unidade. Tudo como lídima
expressão da categoria jurídico-positiva (não simplesmente lógica) da
razoabilidade.
31 . Todas essas proposições ganham em claridade se nos lembrarmos de que a
nossa Constituição prestigiou, mais que tudo, a liberdade física das pessoas,
fazendo do aprisionamento uma exceção. A regra geral que adotou foi a do
não-encarceramento, a saber: a) em primeiro lugar, enuncia que ninguém será
preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade
judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei (inciso LXI do art. 5º); b) prescreve
que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença
penal condenatória (inciso LVII do art. 5º – princípio da não-culpabilidade);
c) indica de logo a pena privativa ou restritiva da liberdade como uma espécie
de ultima ratio, por ser a mais grave entre aquelas franqueadas à conformação
por lei comum (alínea a do inciso XLVI do art. 5º). Daí que, no próprio
dispositivo em que habilita a lei ordinária a cominar pena privativa ou
restritiva de liberdade, ela, Constituição, de pronto arrola espécies de
apenamento (perda de bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou
interdição de direitos), que a lei tanto pode fazer incidir sob o regime da
cumulatividade, quanto não pode subtrair do regime de convolação; isto é, penas
que a lei não está obrigada a cumular com outras, mas que obrigatoriamente se
disponibilizam para o regime de substituição àquelas que tenham por conteúdo a
liberdade humana.
32. Foi exatamente à luz dessa vertente constitucional da convolação que, em
1998, por meio da Lei 9.714, o legislador ordinário ampliou as possibilidades
de aplicação de uma outra modalidade de pena substitutiva do aprisionamento: a
restritiva de direitos. Isso para conferir ao art. 44 do Código Penal a sua
atual redação, que fixa as balizas da substituição com base em pressupostos de
ordem objetiva e subjetiva. Com o que, reitero, a lei densificou por mais um
modo a superlativa garantia constitucional da individualização de toda e
qualquer reprimenda penal. Eis a dicção desse emblemático art. 44:

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as
privativas de liberdade, quando:
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime
não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a
pena aplicada, se o crime for culposo;
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa
substituição seja suficiente.
§ 1º (VETADO)
§ 2º Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita
por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena
privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos
e multa ou por duas restritivas de direitos.
§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição,
desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente
recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do
mesmo crime.
§ 4º A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando
ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena
privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena
restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou
reclusão.
§ 5º Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o
juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la
se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.
(Sem destaques no original)

33. Cuida-se, então, de necessário recurso à ponderação judicial de fatos-tipo
e sua autoria delituosa, na trama de um processo orteguiano de concretização
constitucional que o art. 59 do Código Penal assim veio a completar:

Art. 59 – o juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta
social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e
conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá,
conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:
I – as penas aplicáveis dentre as cominadas;
[…]
IV – a substituição da pena privativa de liberdade aplicada, por outra espécie
de pena, se cabível.

34. Já em sede doutrinária, outro não é o testemunho intelectual de Alberto
Silva Franco (Crimes Hediondos, São Paulo: RT, 6ª ed., 2007, p. 195 e 196),
para quem, mesmo ante a experiência haurida na vigência da Lei 6.368/76, era
constitucional a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos nos casos de tráfico ilícito de entorpecentes de menor potencial
ofensivo. Confira-se:

A aplicabilidade das penas restritivas de liberdade revelava-se, sobretudo,
adequada em relação a hipóteses menores de tráfico ilícito de entorpecentes,
para as quais a sanção penal se mostrava, por vezes, excessiva ou
desproporcionada. Como observa Francisco de Assis Toledo, ‘o fato de que o
tráfico ‘passou a ser tratado com extremo rigor desde o advento da Constituição
de 1988′ não constitui argumento suficiente para invalidar a opção do
legislador’. ‘Como a zona fronteiriça entre o vício e o tráfico nem sempre é
muito nítida, a possibilidade da aplicação aos casos ocorrentes da pena
substitutiva é uma boa solução, permitindo a correção ou a atenuação daqueles
excessos’. De igual teor é o parecer de Mário Magalhães Papaterra Limongi: ‘Não
se pode dizer que a legislação mais dura tem permitido a condenação dos
principais traficantes. Quem se der ao trabalho de manusear os processos que
são instaurados, verificará com facilidade que a maioria esmagadora das pessoas
presas são pequenos traficantes que, a toda evidência, não podem ser apontados
como os que dominam o comércio e a distribuição de substâncias entorpecentes.
Em verdade, com algumas exceções, a quantidade de drogas apreendidas não é
significativa, o que permite concluir que as pessoas processadas como
traficantes são, de fato, mulas, permanecendo ignorados os que vivem do odioso
negócio. Como a legislação não distingue, pratica o mesmo crime quem transporta
toneladas de cocaína como a mulher do preso que, em dia de visita, leva ao seu
companheiro pequena quantidade de maconha.’

35. Já vai longo o presente voto, reconheço, mas não ao ponto de sacrificar a
proposição adicional de que, mesmo no plano dos tratados e convenções
internacionais, aprovados e promulgados pelo Estado brasileiro, é conferido
tratamento diferenciado ao tráfico ilícito de entorpecentes que se caracterize
pelo seu menor potencial ofensivo. Tratamento diferenciado, esse, para
possibilitar alternativas ao encarceiramento. É o caso da Convenção Contra o
Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, incorporada ao
direito interno pelo Decreto 154, de 26 de junho de 1991, que prevê, na alínea
c do § 4º do art. 3º: Não obstante o disposto nos incisos anteriores, nos casos
apropriados de infrações de caráter menor, as Partes poderão substituir a
condenação ou sanção penal pela aplicação de outras medidas tais como educação,
reabilitação ou reintegração social, bem como, quando o delinqüente é
toxicômano, de tratamento e de acompanhamento posterior. Norma supralegal de
hierarquia intermediária, portanto, que autoriza cada Estado soberano a adotar
norma comum interna que viabilize a aplicação da pena substitutiva (a
restritiva de direitos) no aludido crime de tráfico ilícito de entorpecentes.
Donde o julgado proferido no HC 100.888/SC, Primeira Turma, de minha própria
relatoria, DJ 12/03/2010, assim ementado:

HABEAS CORPUS. SALVO-CONDUTO. PRISÃO CIVIL. DEPOSITÁRIO JUDICIAL. DÍVIDA DE
CARÁTER NÃO ALIMENTAR. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou a orientação de que só é
possível a prisão civil do ‘responsável pelo inadimplemento voluntário e
inescusável de obrigação alimentícia’ (inciso LXVII do art. 5º da CF/88).
Precedentes: HCs 87.585 e 92.566, da relatoria do ministro Marco Aurélio.
2. A norma que se extrai do inciso LXVII do artigo 5º da Constituição Federal é
de eficácia restringível. Pelo que as duas exceções nela contidas podem ser
aportadas por lei, quebrantando, assim, a força protetora da proibição, como
regra geral, da prisão civil por dívida.
3. O Pacto de San José da Costa Rica (ratificado pelo Brasil – Decreto 678 de 6
de novembro de 1992), para valer como norma jurídica interna do Brasil, há de
ter como fundamento de validade o § 2º do artigo 5º da Magna Carta. A se
contrapor, então, a qualquer norma ordinária originariamente brasileira que
preveja a prisão civil por dívida. Noutros termos: o Pacto de San José da Costa
Rica, passando a ter como fundamento de validade o § 2º do art. 5º da CF/88,
prevalece como norma supralegal em nossa ordem jurídica interna e, assim,
proíbe a prisão civil por dívida. Não é norma constitucional – à falta do rito
exigido pelo § 3º do art. 5º -, mas a sua hierarquia intermediária de norma supralegal
autoriza afastar regra ordinária brasileira que possibilite a prisão civil por
dívida.
4. No caso, o paciente corre o risco de ver contra si expedido mandado
prisional por se encontrar na situação de infiel depositário judicial.
5. Ordem concedida.

36. Ora, é esse o caso dos autos, na medida em que o paciente teve reconhecido,
em seu benefício, a causa de diminuição de pena que se lê no § 4º do art. 33 da
Lei 11.343/06, no seu limite máximo de 2/3 (dois terços) de encurtamento, em
função da favorabilidade de todas as circunstâncias judiciais. Isso aliado à
pequena quantidade e à falta de diversidade da droga apreendida, ficando a
condenação, em termos definitivos, aplicada em 1 (um) ano e 8 (oito) meses de
reclusão, sob regime prisional fechado, além de 160 (cento e sessenta)
dias-multa, cuja unidade restou fixada em seu mínimo legal. E já ficou expresso
nestas páginas que, em tema de direitos fundamentais, entre os quais se acha
inserida a garantia da individualização da reprimenda penal (devidamente
incrustada no capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos), é certo
ajuizar que a formulação adotada pela Carta Magna traduz uma garantia que opera
como inafastável elemento de contenção do poder de legislar. Não como u’a mera
orientação geral ao legislador ordinário. É o que inspiradamente pontua o
ministro Gilmar Mendes (HC 82.959/SP, julg. cit.), a propósito do regime de
progressão penitenciária da pena, verbis:

O entendimento segundo o qual a disposição constitucional sobre a individualização
estaria exclusivamente voltada para o legislador, sem qualquer significado para
a posição individual, além de revelar que se cuidaria então de norma
extravagante no catálogo de direitos fundamentais, esvaziaria por completo
qualquer eficácia dessa norma. É que, para fixar a individualização da pena in
abstracto, o legislador não precisaria sequer de autorização constitucional
expressa. Bastaria aqui o critério geral do nullum crimen, nulla poena sine
lege.
[…]
Em verdade, estou convencido de que a fórmula aberta parece indicar, tal como
em relação aos demais comandos constitucionais que remetem a uma intervenção
legislativa, que o princípio da individualização da pena fundamenta um direito
subjetivo, que não se restringe à simples fixação da pena in abstracto, mas que
se revela abrangente da própria forma de individualização (progressão).
Em outros termos, a fórmula utilizada pelo constituinte assegura um direito
fundamental à individualização da pena. A referência à lei – princípio da
reserva legal – explicita tão-somente, que esse direito está submetido a uma
restrição legal expressa e que o legislador poderá fazer as distinções e
qualificações, tendo em vista as múltiplas peculiaridades que dimanam da
situação a reclamar regulação.
É evidente, porém, que, como todos sabem, que a reserva legal também está
submetida a limites. Do contrário, ter-se-ia a possibilidade de nulificação do
direito fundamental submetido à reserva legal por simples decisão legislativa.
Este é o cerne da questão. Se se está diante de um direito fundamental à
individualização da pena e não de uma mera orientação geral ao legislador – até
porque para isso – despicienda seria a inclusão do dispositivo no elenco dos
direitos fundamentais – então há que se cogitar do limite à ação do legislador
na espécie.
Em outras palavras, é de se indagar se o legislador poderia, tendo em vista a
natureza do delito, prescrever, como o fez na espécie, que a pena privativa de
liberdade seria cumprida integralmente em regime fechado, isto é, se na autorização
para intervenção no âmbito de proteção desse direito está implícita a
possibilidade de eliminar qualquer progressividade na execução da pena.

37. Nessa toada de intelecção de normas constitucionais veiculadoras de
direitos e garantias individuais, desborda da reserva legal criminalizadora
(porque extrapolante da mera regulação) fazer distinções ainda mais severas que
as estampadas no próprio lastro formal da Constituição. A tanto não chega o
poder regulatório da lei, exatamente porque em mortal rota de colisão com esse
tão humano quanto realístico preceito do inciso XLVI do art. 5º da nossa Lei
Fundamental.
38. É como assentaram os ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso,
respectivamente, no julgamento do referido HC 82.959/SP, a propósito do regime
de aprisionamento dos sentenciados penais e quando ainda vigente a Lei
8.072/90:

Por último, há de se considerar que a própria Constituição Federal contempla as
restrições a serem impostas àqueles que se mostrem incursos em dispositivos da
Lei 8.072/90 e dentre elas não é dado encontrar a relativa à progressividade do
regime de cumprimento da pena. O inciso XLIII do rol das garantias
constitucionais – artigo 5º – afasta, tão-somente, a fiança, a graça e a
anistia para, em inciso posterior (XLVI), assegurar de forma abrangente, sem
excepcionar esta ou aquela prática delituosa, a individualização da pena. Como,
então, entender que o legislador ordinário o possa fazer? Seria a mesma coisa
que estender aos chamados crimes hediondos e assim enquadrados pela citada Lei,
a imprescritibilidade que o legislador constitucional somente colou às ações
relativas a atos de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático (inciso XLVI). Indaga-se: é possível ao
legislador comum fazê-lo? A resposta somente pode ser negativa, a menos que se
coloque em plano secundário a circunstância de que a previsão constitucional
está contida no elenco das garantias constitucionais, conduzindo, por isso
mesmo, à ilação no sentido de que, a contrario sensu, as demais ações ficam
sujeitas à regra geral da prescrição. O mesmo raciocínio tem pertinência no que
concerne à extensão, pela Lei em comento, do dispositivo atinente à clemência
ou indulto, quando a Carta, em norma de exceção, apenas rechaçou a anistia e a
graça – inciso XLIII do artigo 5º.
Destarte, tenho como inconstitucional o preceito do § 1º do artigo 2º da Lei
8.072/90, no que dispõe que a pena imposta pela prática de qualquer dos crimes
nela mencionados será cumprida, integralmente, no regime fechado.
(Ministro Marco Aurélio)

A Constituição Federal, ao criar a figura do crime hediondo, assim dispôs no
art. 5°, XLIII:

‘a lei considerará inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática
da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e
os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os
executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem’. (grifei)

Excepcionou, portanto, de modo nítido, da regra geral da liberdade sob fiança e
da possibilidade de graça ou anistia, dentre outros, os crimes hediondos,
vedando-lhes apenas com igual nitidez: a) a liberdade provisória sob fiança; b)
a concessão de graça; c) a concessão de anistia.
Não fez menção nenhuma a vedação de progressão de regime, como, aliás – é bom
lembrar -, tampouco receitou tratamento penal stricto sensu (sanção penal) mais
severo, quer no que tange ao incremento das penas, quer no tocante à sua
execução.
[…]
Mas não é só.
Quando o constituinte reservou o tratamento excepcional (no sentido primário de
exceção) aos crimes hediondos, não lhes vetou progressão de regime (forma de
individualização da execução da pena), nem impôs outra restrição qualquer à
incidência da regra da individualização.
J.J. GOMES CANOTIILHO, ao cuidar do regime das leis restritivas de direitos
fundamentais, ensina que compreende ele três instâncias: 1ª. delimitação do
âmbito de proteção da norma; 2ª. averiguação do tipo, natureza e finalidade da
restrição; e, 3ª. controle da observância dos limites estabelecidos pela
Constituição às leis restritivas (problema do limite de limites). Tais
instâncias funcionam como critérios de interpretação-aplicação das normas
restritivas de direitos, liberdades e garantias.
Dentro do âmbito da 3ª instância – limite de limites – enquadra-se a exigência
de autorização de restrição expressa, que, nas palavras do eminente
constitucionalista português, ‘tem como objectivo obrigar o legislador a
procurar sempre nas mesmas normas constitucionais o fundamento concreto para o
exercício de sua competência de restrição de direitos, liberdades e garantias,
e criar segurança jurídica nos cidadãos, que poderão contar com a inexistência
de medidas restritivas de direitos fora dos casos expressamente considerados
pelas normas constitucionais como sujeitos a reserva de lei restritiva.’ E,
acrescenta, ‘a exigência de autorização constitucional expressa visa exercer
uma função da advertência (Warnfunktion) relativamente ao legislador,
tornando-o consciente do significado e alcance da limitação de direitos,
liberdades e garantias, e constituir uma norma de proibição, pois sob reserva
de lei restritiva não se poderão englobar outros direitos salvo os autorizados
pela Constituição.’
A autorização constitucional para a restrição de direitos deve, pois, ser
observada à risca pelo legislador, sob pena de entrar em contraste com a
Constituição.
De modo que não resiste a tal exigência a vedação de progressão de regime
prevista no dispositivo controverso, que deve, por ambos os fundamentos, ser
declarado inconstitucional.
(Ministro Cezar Peluso)

39. Não estancam por aqui os valiosos ensinamentos do ministro Cezar Peluso (HC
82.959/SP, julg. cit.), pois de Sua Excelência ainda são as seguintes palavras:

Evidente, assim, que, perante a Constituição, o princípio da individualização
da pena compreende: a) proporcionalidade entre o crime praticado e a sanção
abstratamente cominada no preceito secundário da norma penal; b)
individualização da pena aplicada em conformidade com o ato singular praticado
por agente em concreto (dosimetria da pena); c) individualização da sua
execução, segundo a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), o comportamento
do condenado no cumprimento da pena (no cárcere ou fora dele, no caso das
demais penas que não a privativa de liberdade) e à vista do delito cometido
(art. 5º, XLVIII).

40. A tessitura desse raciocínio também se adensa em nível propriamente
doutrinário, conforme se vê da seguinte passagem de Alberto Silva Franco (ob.
cit., p. 75-77):

De um lado, situam-se as normas constitucionais de criminalização que se
resumem a indicar determinados bens jurídicos em relação aos quais o legislador
constituinte comunica ao legislador infraconstitucional sua obrigação de lhes
dar proteção penal. Ao fazê-lo, é evidente que invade a esfera de atuação
normal do legislador penal, dispensando-o implicitamente da tarefa de formular
tanto o juízo sobre a dignidade do bem jurídico a ser protegido, quanto o da
necessidade de tutela penal. São exemplos significativos desse tipo de norma
constitucional criminalizadora o inc. XLI do art. 5.º e os arts. 225, § 3.º, e
227, § 4.º, todos da Constituição da República.
De outro lado, posicionam-se as normas constitucionais de criminalização que,
além da indicação dos bens jurídicos, acrescentam expressas limitações, quer de
natureza penal, quer de natureza processual penal, que são estritamente
impostas ao legislador ordinário. Exemplificam essas obrigações constitucionais
de criminalização os incs. XLII, XLIII e XLIV do art. 5.º da Constituição
Federal. Desses incisos, interessa em particular – e será, agora, objeto de
exame – o inc. XLIII do art. 5.º da Constituição Federal, ou seja, o que trata
dos crimes hediondos e dos crimes que lhe são assemelhados.
Numa segunda abordagem, cabe observar que a norma criminalizadora do inc. XLIII
do art. 5.º alavancou um microssistema fechado e autônomo, de origem
constitucional, que se coloca ao lado do sistema penal geral e aberto,
formulado pelo legislador ordinário. Note-se que o texto constitucional não se
resumiu apenas e tão-somente ao comando de criminalizar fatos até então sem
definição na legislação penal ordinária e aos quais deu a denominação de
hediondos. Foi além. Equiparou a esses delitos desconhecidos, no momento da
formatação constitucional, os crimes de tortura, de tráfico ilícito de
entorpecentes e de drogas afins e de terrorismo. Mas o legislador constituinte
não se restringiu à explicitação desses quatro tipos penais: recorreu ao
sistema penal e ao sistema processual penal pré-existentes para deles importar
regras restritivas que necessariamente deveriam acompanhar o processo
criminalizador: não caberiam as causas excludentes de punibilidade como a
anistia e a graça, nem tampouco seria pertinente a fiança. E mais, ao inserir o
inciso XLIII no art. 5.º da Constituição Federal, ou seja, no capítulo
referente aos direitos e garantias individuais, o legislador constituinte
obstou que se pudesse excluí-lo, através de emenda constitucional (art. 60, §
4.º, inc. IV, da Constituição Federal).
[…]
Numa quarta abordagem, os delitos enquadrados no comando incriminador do inc.
LXIII do art. 5.º da Constituição Federal revelam, por seus termos, que o
legislador constituinte emprestou-lhes a mais alta gravidade – insuperável
danosidade social estabelecida em nível constitucional -, colocando-os no topo
de todo o sistema penal. Assim, pode o legislador ordinário estabelecer
gradações punitivas diversificadas, mas todos os delitos que pertencem ao rol
constitucional fazem parte de um só microssistema, com igual gravidade em
abstrato.
Numa quinta abordagem, é inequívoca a necessidade de o legislador ordinário
estar submetido às limitações penais e processuais penais procedentes do
comando constitucional. Diante delas, não lhe compete aferir se são pertinentes
ou não. Encontra-se ele diante de um expediente comunicatório de deliberação de
nível superior e só lhe cabe obedecer, incluindo, no texto legal, as restrições
preestabelecidas. O ato de conformação às limitações provindas do dispositivo
constitucional não pode, contudo, ser compensado com o alargamento dessas
limitações para efeito de excluir, radical e peremptoriamente, o eventual
infrator de qualquer dos tipos, que compõem o microssistema, de outros direitos
ou benefícios não relacionados na norma criminalizadora e que participam do
sistema penal geral.
[…] Assim, a Lei 11.343/2006, revogatória de todas as leis anteriores sobre
drogas, como se fosse um corpo estranho e nada tivesse a ver com o
microssistema criado pela norma constitucional criminalizadora do inc. XLIII do
art. 5.º da Constituição Federal, estabeleceu, no seu art. 44, um abusivo e
ampliado rol de limitações não previstas no texto constitucional. Assim, os
crimes referidos nos arts. 33, caput e § 1.º, 34 e 37 da Lei 11.343/2006 não
seriam suscetíveis, além das restrições contidas no texto originário da Lei
8.072/90, ao sursis e à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva
de direitos.

41. Por tudo quanto exposto, formato a parte dispositiva deste voto com o
reconhecimento da prejudicialidade das medidas que a Procuradoria-Geral da
República pretende concedidas de ofício. Medidas, essas, no sentido de que, em
alternativa à vedação da incidência de pena substitutiva, seja reconhecida ao
paciente a possibilidade de gozar da suspensão condicional da pena e do regime
prisional aberto. É que, no sistema trifásico de aplicação da pena, a aferição,
pelo juiz, do cabimento da conversão de pena privativa de liberdade em pena
restritiva de direitos antecede a do sursis e a do regime inicial de cumprimento
do castigo penal, como amplamente sabido.
42. No mais, concedo parcialmente o habeas corpus. Não para assegurar ao
paciente a imediata e requerida convolação, menos ainda o pronto desfrute da
sua liberdade de locomoção. Não é isso. Concedo a ordem para remover o óbice da
parte final do art. 44 da Lei 11.343/06, assim como da expressão análoga vedada
a conversão em penas restritivas de direitos, constante do § 4º do art. 33 do
mesmo diploma legal. Equivale a dizer: declaro incidentalmente inconstitucional,
com efeito ex nunc (na linha do entendimento firmado no HC 82.959/SP, julg.
cit.), a proibição de substituição da pena privativa de liberdade pela pena
restritiva de direitos. O que me leva a determinar ao Juízo da execução penal
que faça a avaliação das condições objetivas e subjetivas da convolação em
causa, na concreta situação do paciente.
43. É como voto.

*acórdão pendente de publicação


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Como citar e referenciar este artigo:
STF,. Informativo nº 604 do STF. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/informativos-de-jurisprudencia/stf-informativos-de-jurisprudencia/informativo-no-604-do-stf/ Acesso em: 22 nov. 2024
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