Informativo STF
Brasília,
27 de setembro a 1º de outubro de 2010 – Nº 602.
Este
Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das
Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo
Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora
seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após
a sua publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Ação Penal: Apropriação Indébita e Sonegação
Previdenciárias – 1
Ação Penal: Apropriação Indébita e Sonegação
Previdenciárias – 2
Ação Penal: Apropriação Indébita e Sonegação
Previdenciárias – 3
Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 12
Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 13
IPI e Creditamento: Insumos Isentos, Não Tributados ou
Sujeitos à Alíquota Zero – 4
IPI e Creditamento: Insumos Isentos, Não Tributados ou
Sujeitos à Alíquota Zero – 5
Conflito de Atribuições e Falsificação de Documento
Público
Dupla Identificação do Eleitor e Princípios da
Proporcionalidade e da Razoabilidade – 1
Dupla Identificação do Eleitor e Princípios da Proporcionalidade
e da Razoabilidade – 2
Evento Esportivo e Ausência de Licitação – 1
Evento Esportivo e Ausência de Licitação – 2
1ª Turma
Rádio Comunitária Clandestina: Princípio da
Insignificância e Excepcionalidade
Crimes contra a Dignidade Sexual: Nulidade e
Assistência à Acusação
Pena Restritiva de Direitos e Prescrição
Prisão Cautelar e Excesso de Prazo – 2
Lei 11.719/2008: Interrogatório e “Tempus Regit Actum”
Lei de Imprensa e Causa Interruptiva de Prescrição
2ª Turma
Reincidência: Agravamento de Pena e Recepção pela
CF/88
Remissão e Necessidade de Oitiva do Ministério Público
Crime Militar e Princípio da Insignificância
Prescrição e Prazo entre a Citação e o Interrogatório
Repercussão Geral
Clipping do DJ
Transcrições
CODESP e Imunidade (RE 253472/SP)
Inovações Legislativas
PLENÁRIO
Ação
Penal: Apropriação Indébita e Sonegação Previdenciárias – 1
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação penal promovida pelo
Ministério Público Federal para condenar Deputado Federal pela prática dos
crimes tipificados no art. 168-A, § 1º, I e art. 337-A, III, c/c o art. 71,
caput e art. 69, todos do CP, à pena de 7 anos de reclusão e ao pagamento de 60
dias-multa, calculados na base de meio salário-mínimo vigente em agosto de 2002
(término da continuidade delitiva), atualizados monetariamente. No caso, a
partir de ação fiscal realizada em empresa de propriedade do acusado, ele e
sócia foram denunciados pela suposta ausência de repasse, ao Instituto Nacional
do Seguro Social – INSS, de valores arrecadados a título de contribuições
incidentes sobre a remuneração de empregados, relacionados em folha de pagamento
mensal e rescisões de contrato de trabalho. A inicial acusatória também
descrevera a omissão de fatos geradores de contribuições previdenciárias na
Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações à
Previdência Social – GFIP. Preliminarmente, afastou-se a ocorrência de extinção
da punibilidade pela prescrição da pena em abstrato. Ao salientar que esta
operaria em 12 anos (CP, art. 109, III) e que a pena máxima cominada aos crimes
imputados aos réus seria de 5 anos de reclusão, para ambos os tipos penais,
afirmou-se que os fatos delituosos teriam sido perpetrados no período de
janeiro de 1995 a agosto de 2002, sendo o crédito tributário definitivamente
constituído em abril de 2003. Em seguida, absolveu-se a co-ré, ao fundamento de
que não haveria como lhe atribuir a responsabilidade penal pelos fatos
imputados na denúncia. Consignou-se não ter ficado demonstrado, durante a
instrução criminal, que ela detivesse poder de mando ou que houvesse exercido
qualquer atividade na empresa, sendo esta gerida pelo parlamentar, o qual
exercia todos os atos de administração necessários ao seu funcionamento.
AP 516/DF, rel. Min. Ayres Britto, 27.9.2010. (AP-516)
Ação
Penal: Apropriação Indébita e Sonegação Previdenciárias – 2
Logo após, reconheceu-se a materialidade delitiva das condutas atribuídas ao parlamentar,
tendo em conta a existência de farta documentação, detalhada nas notificações
fiscais de lançamento de débito. Ressaltou-se, inclusive, que a empresa sequer
impugnara o débito fiscal na esfera administrativa. Rejeitou-se a alegação de
que os crimes exigiriam a comprovação do animus rem sibi habendi. Enfatizou-se
que a orientação da Corte encontra-se consolidada no sentido de que, para a
caracterização dos aludidos tipos penais, é suficiente a demonstração do dolo
genérico, sendo dispensável um especial fim de agir. Observou-se, também, que o
“recibo de pedido de parcelamento” da Lei 11.941/2009, juntado pela defesa, não
se prestaria para a pretendida suspensão da pretensão punitiva estatal,
porquanto o pagamento da primeira parcela fora efetuado mais de 6 meses após o
seu vencimento. Relativamente à autoria, mencionou-se que a situação contratual
da empresa permanecera inalterada desde sua constituição, embora esta se
encontrasse atualmente desativada, sem baixa registrada na junta comercial. Destacou-se
que a mera participação no quadro societário como sócio-gerente não poderia
significar a automática responsabilização penal. Nada obstante, repeliu-se a
assertiva de que, apesar de o parlamentar figurar no contrato social como único
responsável pela gerência da sociedade, a efetiva administração teria sido
delegada a seu filho. Afirmou-se que tal outorga de poderes de representação
não conferira exclusividade ao outorgado, de modo que o acusado teria
preservado seus poderes. Ademais, asseverou-se que inexistira alteração
contratual válida que o excluísse do quadro societário da empresa.
Enfatizou-se, no ponto, inclusive, que o acusado ainda responde a uma ação
penal por suposta falsidade de modificação contratual no registro de junta
comercial. Assinalou-se que a prova testemunhal carreada não infirmaria a
condição do parlamentar de responsável pela administração de sua empresa, haja
vista que a defesa somente arrolara pessoas que não tinham contato direto ou
vínculo com a sociedade empresária. Refutou-se, também, o argumento de
não-ocorrência do crime de sonegação previdenciária (CP, art. 337-A), por
inexigibilidade de conduta diversa, em função das dificuldades financeiras da
empresa. Verificou-se que a supressão ou redução da contribuição social e de
quaisquer acessórios são implementados por meio de condutas fraudulentas
instrumentais à evasão, incompatíveis com a boa-fé necessária para tal
reconhecimento. Além disso, o conjunto probatório não revelaria a precária
condição financeira da empresa.
AP 516/DF, rel. Min. Ayres Britto, 27.9.2010. (AP-516)
Ação Penal: Apropriação
Indébita e Sonegação Previdenciárias – 3
No tocante à dosimetria da pena, prevaleceu o voto do Min. Joaquim Barbosa,
revisor, que estabeleceu a pena-base em 3 anos de reclusão e 30 dias-multa,
para cada delito, e, ante a ausência de circunstâncias atenuantes e agravantes,
aplicou, para ambas as penas provisórias, o aumento de 1/6, em razão da
continuidade delitiva, tornando-as definitivas em 3 anos e 6 meses de reclusão
mais 30 dias-multa, as quais, somadas (CP, art. 69), totalizaram 7 anos de
reclusão e 60 dias-multa. Em conseqüência, fixou o regime semi-aberto para o
cumprimento inicial da pena. Entendeu incabível a substituição da pena
privativa de liberdade por restritivas de direitos, em virtude do montante da
pena aplicada e, pela mesma razão, o sursis. Deixou, contudo, de aplicar o
disposto no art. 92, I, b, do CP, por reputar que não se trataria de efeito
automático, e que, no caso, a reprimenda imposta revelar-se-ia suficiente. Por
fim, determinou que, após o trânsito em julgado, seja dada a ciência à Justiça
Eleitoral e inscrito o nome do réu no rol dos culpados. Vencidos os Ministros
Ayres Britto, relator, Cármen Lúcia e Marco Aurélio relativamente à fixação da
pena e ao seu regime inicial de cumprimento, que assentavam a pena-base em 3
anos de reclusão e 126 dias-multa, e 3 anos e 6 meses de reclusão e 180
dias-multa, respectivamente, para os crimes previstos nos artigos 168-A, § 1º,
I e 337-A, III, ambos do CP. Ademais, em virtude da continuidade delitiva,
impunham o aumento de metade, para o delito de apropriação indébita
previdenciária, e de 1/3, para o de sonegação previdenciária, a perfazer 9 anos
e 2 meses de reclusão e 429 dias-multa, pena esta a ser cumprida em regime
inicial fechado.
AP 516/DF, rel. Min. Ayres Britto, 27.9.2010. (AP-516)
Lei
da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 12
Em conclusão, o Tribunal declarou extinto, sem julgamento do mérito, processo
no qual pleiteado o deferimento do registro de candidatura do primeiro
recorrente ao cargo político de Governador do Distrito Federal. Tratava-se, na
espécie, de recursos extraordinários interpostos, com base no art. 102, III, a,
da CF, contra acórdão do Tribunal Superior Eleitoral – TSE que, ao enfatizar a
aplicabilidade imediata das alterações introduzidas pela LC 135/2010, concluíra
pela inelegibilidade do candidato a cargo de Governador, nos termos da alínea k
do inciso I do art. 1º da LC 64/90, acrescentado pela aludida LC 135/2010
[“Art. 1º São inelegíveis: I – para qualquer cargo: … k) o Presidente da
República, o Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros
do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas, da Câmara Legislativa, das
Câmaras Municipais, que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de
representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por
infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual,
da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as
eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o
qual foram eleitos e nos 8 (oito) anos subseqüentes ao término da
legislatura.”] — v. Informativo 601.
RE 630147 QO/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/
o acórdão Min. Marco Aurélio, 29.9.2010. (RE-630147)
Lei da “Ficha Limpa”:
Inelegibilidade e Renúncia – 13
O Min. Ayres Britto, relator, tendo em conta a renúncia do candidato à
pretensão de obter o registro de sua candidatura, submeteu ao Colegiado, em
questão de ordem, o exame de petição formulada pelos recorrentes, em que
requeriam a desistência dos recursos ou, alternativamente, a declaração da
perda de seu objeto. Inicialmente, manteve-se o reconhecimento da repercussão
geral da questão constitucional concernente ao art. 1º, I, k, da LC 64/90, com
a redação dada pela LC 135/2010. Em passo seguinte, rejeitou-se o pedido de
desistência dos recursos, haja vista que já iniciado o julgamento, e, embora
não declarado o seu resultado, proferidos os votos de todos os Ministros da
Corte. Entretanto, ao enfatizar que o escopo dos recorrentes seria o registro
da candidatura, aduziu-se que, ante a mencionada desistência, inexistiria
objeto a ser analisado pela Justiça Eleitoral e, conseqüentemente, não haveria
lugar para a prolação de sentença de mérito. Dessa forma, asseverou-se que, na
situação em apreço, ter-se-ia uma hipótese de extinção anômala do processo
principal por perda superveniente de objeto e de interesse, sem que resolvida a
própria controvérsia suscitada no recurso em questão. Vencidos, no ponto, os
Ministros Ayres Britto, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa que
assentavam a perda de objeto dos recursos extraordinários. O relator
assinalava, ainda, o conseqüente trânsito em julgado do acórdão recorrido.
RE 630147 QO/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/
o acórdão Min. Marco Aurélio, 29.9.2010. (RE-630147)
IPI e
Creditamento: Insumos Isentos, Não Tributados ou Sujeitos à Alíquota Zero – 4
Em conclusão de julgamento, o Tribunal desproveu recurso extraordinário
interposto contra acórdão do TRF da 4ª Região que negara a contribuinte do IPI
o direito de creditar-se do valor do tributo incidente sobre insumos adquiridos
sob regime de isenção, não tributados ou sujeitos à alíquota zero.
Sustentava-se ofensa ao princípio da não-cumulatividade (CF, art. 153, § 3º,
II) — v. Informativos 554 e 591. Inicialmente, consignou-se que o STF, ao
apreciar os recursos extraordinários 353657/PR (DJE de 6.3.2008) e 370682/SC
(DJE de 19.12.2007), referentes à aquisição de insumos não tributados ou
sujeitos à alíquota zero, aprovara o entendimento de que o direito ao crédito
pressupõe recolhimento anterior do tributo, cobrança implementada pelo Fisco.
Enfatizou-se que tal raciocínio seria próprio tanto no caso de insumo sujeito à
alíquota zero ou não tributado quanto no de insumo isento, tema não examinado
nos precedentes citados. Contudo, julgou-se inexistir dado específico a
conduzir ao tratamento diferenciado. No tocante à definição
técnica-constitucional do princípio da não-cumulatividade, afirmou-se que esse
princípio seria observado compensando-se o que devido em cada operação com o
montante cobrado nas anteriores, ante o que não se poderia cogitar de direito a
crédito quando o insumo entra na indústria considerada a alíquota zero.
RE 566819/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 29.9.2010.
(RE-566819)
IPI e Creditamento:
Insumos Isentos, Não Tributados ou Sujeitos à Alíquota Zero – 5
Relativamente à questão alusiva ao valor do crédito e do imposto final,
asseverou-se que a pretensão da recorrente colocaria em plano secundário a
sistemática pertinente ao IPI, no que voltada a evitar a cumulatividade, o
tributo seqüencial. Ressaltando a seletividade do IPI, expôs-se que, uma vez
adquirido o insumo mediante incidência do tributo com certa alíquota, o
creditamento far-se-ia diante do que realmente recolhido, gerando a saída final
do produto novo cálculo e, então, como já ocorrido o creditamento quanto ao que
recolhido na aquisição do insumo, a incidência da alíquota dar-se-ia sobre o
preço (valor total). Mencionou-se que não se comunicariam as operações a serem
realizadas, deixando-se de individualizar insumos e produtos, pois, se assim não
fosse, instalar-se-ia um pandemônio escritural. Assinalou-se que o sistema
consagrador do princípio da não-cumulatividade, presente quer o IPI quer o
ICMS, implica crédito e débito em conta única e que o argumento desenvolvido a
respeito do que se denomina crédito do IPI presumido, considerada a entrada de
insumo, resultaria em subversão do sistema nacional de cobrança do tributo,
partindo-se para a adoção do critério referente ao valor agregado. Dessa forma,
reputou-se que isso potencializaria a seletividade, a qual geraria vantagem, à
margem de previsão, para o contribuinte, que passaria a contar com um crédito
inicial, presente a entrada do insumo tributado, e, posteriormente, haveria a
apuração do que agregado para se estipular valor que não seria o do produto
final. Considerou-se que esse raciocínio revelaria desprezo pelo sistema pátrio
de cobrança do tributo, assim como discreparia das balizas próprias à
preservação dos princípios da não-cumulatividade, que direcionam, no
concernente ao produto final, à aplicação da alíquota levando-se em conta o
valor respectivo, porquanto já escriturado o crédito decorrente da satisfação
do tributo com relação ao insumo. Concluiu-se que, em última análise, ante o
critério seletivo, com o tributo final menor, passar-se-ia a ter jus a uma
segunda diferença relativa ao que recolhido a maior anteriormente e já objeto
do creditamento. Por fim, deu-se por prejudicada a discussão referente à
prescrição, dado que esta somente teria utilidade se o recurso viesse a ser
provido, o mesmo ocorrendo com a atualização monetária. Vencido o Min. Cezar
Peluso, Presidente, que provia o recurso.
RE 566819/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 29.9.2010.
(RE-566819)
Conflito de Atribuições
e Falsificação de Documento Público
O Tribunal, ao resolver conflito de atribuições entre o Ministério Público
Federal e Ministério Público estadual, reconheceu a atribuição do primeiro para
apurar possível prática do crime de falsificação de papéis públicos (CP, art.
293), consistente na apresentação de guias de recolhimento (DARF) supostamente
irregulares à Secretaria da Receita Federal – SRF. Reputou-se que, ao versar os
fatos sobre imputação contrária ao bom serviço federal, incumbiria ao parquet
federal atuar. Salientou-se pouco importar a existência, ou não, de dano
patrimonial. Consignou-se, ademais, que o recolhimento do tributo devido —
posteriormente à apresentação das guias de recolhimento irregulares — não
obstaria a continuidade das investigações, haja vista a necessidade de se saber
qual o delito perpetrado, ou seja, se teria havido crime de falso, crime tributário
em sentido estrito ou se a falsidade teria consistido em meio para a consumação
do crime contra a ordem tributária. Vencido o Min. Dias Toffoli, que concedia a
ordem de ofício para encerrar o procedimento investigatório, tendo em conta a
quitação do tributo, o qual extinguiria a punibilidade.
PET 4680/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 29.9.2010.
(PET-4680)
Dupla Identificação do
Eleitor e Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade – 1
Por vislumbrar aparente ofensa aos postulados da proporcionalidade e da
razoabilidade, e ressaltando a iminência das eleições marcadas para o dia
3.10.2010, o Tribunal, por maioria, concedeu medida cautelar em ação direta de
inconstitucionalidade, ajuizada pelo Diretório Nacional do Partido dos
Trabalhadores, para, mediante interpretação conforme conferida ao art. 91-A da
Lei 9.504/97, na redação dada pela Lei 12.034/2009 — e ao art. 47, § 1º, da
Resolução TSE 23.218/2010 —, reconhecer que somente a ausência de documento
oficial de identidade com fotografia trará obstáculo ao exercício do direito de
voto. Os dispositivos impugnados determinam que, no momento da votação, sejam
apresentados o título de eleitor e um documento de identificação com foto. Após
breve retrospecto da legislação brasileira sobre essa dupla exigência,
consignou-se que ela já teria sido inserida no ordenamento pátrio (Lei
9.100/95, art. 75), sendo posteriormente revogada, ante a dificuldade excessiva
ao eleitorado. Registrou-se a problemática no sistema eleitoral relativamente à
identificação dos eleitores. Salientou-se, nesse sentido, a inexistência de
unificação entre as identidades civil e eleitoral ou de um título eleitoral com
foto. Citou-se, inclusive, manifestação do TSE — em processo administrativo que
ensejara a expedição da aludida Resolução 23.218/2010 — quanto à possibilidade
de se admitir o exercício do voto pelo eleitor que apenas apresentasse o
documento comprobatório de identidade, em razão do extravio, perda ou inutilização
de seu título após o término do prazo para a solicitação de 2ª via. Aquela
Corte assentara a necessidade do incremento dos esforços de ampla divulgação da
novidade legal, bem como o seu imediato aparelhamento para que os títulos
eleitorais extraviados ou inutilizados fossem reimpressos.
ADI 4467 MC/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 29 e 30.9.2010. (ADI-4467)
Dupla
Identificação do Eleitor e Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade –
2
Afirmou-se, ainda, que a apresentação do título de eleitor, nos moldes
estabelecidos hoje, não ofereceria garantia de lisura nesse momento crucial de
revelação da vontade do eleitorado e que as experiências das últimas eleições
demonstrariam maior confiabilidade na identificação aferida com base em
documentos oficiais de identidade com foto. Aduziu-se que os preceitos
adversados, embora objetivassem maior segurança no reconhecimento dos
eleitores, estabeleceriam uma exigência desmedida, a qual afastaria a finalidade
que a norma pretendera alcançar. Asseverou-se não ser cabível tomar-se o art.
91-A da lei em apreço como impedimento ao voto do eleitor que, ainda que se
encontrasse apto a prestar identificação mediante apresentação de um documento
oficial com fotografia, não estivesse portando, naquele momento, seu título de
eleitor. Concluiu-se que se deveria apresentar, no momento da votação, tanto o
título de eleitor como documento oficial de identificação com fotografia.
Contudo, enfatizou-se que apenas a frustração na exibição deste último é que
teria o condão de impedir o exercício do voto. O Min. Dias Toffoli, ao
ressaltar que não concedia a cautelar com fundamento nos princípios referidos,
porquanto eles seriam técnicas de solução, reputou que o dispositivo
restringiria o exercício da cidadania, em afronta ao art. 1º, II, c/c o art.
14, caput, ambos da CF. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso,
Presidente, que indeferiam a concessão da medida cautelar por considerar que o
porte obrigatório do título de eleitor não esvaziaria ou restringiria o direito
fundamental ao voto de forma desarrazoada ou desproporcional, tendo o
legislador atuado dentro de sua margem de ação, sem ofensa ao texto
constitucional.
ADI 4467 MC/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 29 e
30.9.2010. (ADI-4467)
Evento Esportivo e
Ausência de Licitação – 1
O Tribunal, por maioria, recebeu denúncia oferecida pelo Ministério Público
Federal em desfavor de Deputado Federal, e outros co-denunciados, pela suposta
prática do delito de dispensa ou inexigibilidade de licitação. Relata a
denúncia que o parlamentar, então prefeito, e seu secretário de comunicação
social teriam contratado os serviços de determinada empresa de publicidade para
realizar, em 2003, evento esportivo na municipalidade, sem o devido
procedimento licitatório. A conduta dos agentes públicos e a do particular
beneficiado com a contratação fora enquadrada, respectivamente, no art. 89 e no
seu parágrafo único, da Lei 8.666/93 (“Dispensar ou inexigir licitação fora das
hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à
dispensa ou à inexigibilidade: … Parágrafo único. Na mesma pena incorre
aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade,
beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com
o Poder Público.”). De início, salientou-se que o parquet sustentava a
ocorrência de burla ao preceito contido no art. 25, III, do mesmo diploma legal
(“Art. 25. É inexigível a licitação quanto houver inviabilidade de competição,
em especial: … III – para contratação de serviços técnicos enumerados no art.
13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória
especialização, vedada a exigibilidade para serviços de publicidade e
divulgação.”).
Inq 3016/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 30.9.2010. (Inq-3016)
Evento
Esportivo e Ausência de Licitação – 2
Em seguida, reputou-se que, nesta etapa processual, haveria substrato mínimo a
sustentar a deflagração da ação penal, e que a defesa não conseguira infirmar a
plausibilidade da peça acusatória. Aduziu-se que a circunstância de o contrato
firmado pelos agentes públicos contar com o aval e a aprovação da Procuradoria
do Município não elidiria a responsabilidade dos acusados, haja vista que o
parecer não conteria carga opinativa e não vincularia o administrador público.
Ademais, afastou-se a assertiva de que os preços oferecidos pela empresa do
co-réu seriam condizentes com os cobrados no mercado, dado que isso demandaria
análise da matéria de fundo. De igual modo, entendeu-se inviável o exame da
alegação de inexistência de dolo dos investigados. Consignou-se, no ponto, que
a dilação probatória reconstruiria, historicamente, os fatos e que ela também
permitiria a apreciação relativa à exigência, ou não, de finalidade específica
para a configuração do tipo penal. Destacou-se, ainda, que a peça acusatória
não poderia ser rejeitada em face da suposta falta de prejuízo, porquanto o
crime em apreço caracterizar-se-ia pelo simples “dispensar” ou “inexigir” o
certame, não podendo o resultado naturalístico ser considerado condição
imprescindível à consumação do delito. Refutou-se o argumento de atipicidade da
conduta do empresário, haja vista que demonstrado pela acusação que, embora a
marca do evento tivesse sido registrada perante o INPI, isso não implicaria a
conclusão de ser o prestador de serviço um especialista de natureza singular.
Observou-se que, não obstante os eventos de 1996 a 2000 terem ocorrido sem licitação,
o Tribunal de Contas já se manifestara, em 2002, sobre a necessidade do certame
no evento de 1999, o que, ao que parece, sinalizaria terem os investigados
arriscado realizar algo irregular. Por derradeiro, assinalou-se que a
manifestação do Ministério Público sobre o arquivamento do caso na esfera
cível, rejeitando as ponderações da Corte de Contas estadual, não impediria a
investigação e deflagração da ação penal, ante a independência das instâncias.
Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente,
que, por falta de justa causa, rejeitavam a denúncia, quanto ao empresário
beneficiado, ao não vislumbrarem a existência de descrição mínima de sua
suposta participação no delito.
Inq 3016/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 30.9.2010.
(Inq-3016)
PRIMEIRA
TURMA
Rádio Comunitária
Clandestina: Princípio da Insignificância e Excepcionalidade
Ante o empate na votação, a Turma deferiu habeas corpus para, em face da
atipicidade da conduta, cassar o acórdão proferido pelo STJ e restabelecer a
sentença absolutória que aplicava o princípio da insignificância. Na espécie,
os pacientes foram denunciados, por supostamente operarem rádio comunitária sem
autorização legal, como incursos nas sanções do art. 183 da Lei 9.472/1997
[“Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação: Pena – detenção
de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa
de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem,
direta ou indiretamente, concorrer para o crime”]. Registrou-se que, nos termos
da norma regulamentadora (Lei 9.612/98), o serviço de radiodifusão comunitária
utilizado pela emissora seria de baixa potência — 25 watts e altura do sistema
irradiante não superior a 30 metros — não tendo, desse modo, capacidade de
causar interferência relevante nos demais meios de comunicação. Ressaltou-se a
excepcionalidade do caso concreto e aduziu-se que a rádio era operada em
pequena cidade no interior gaúcho, com cerca de dois mil habitantes, distante
de outras emissoras de rádio e televisão e de aeroportos, o que demonstraria
ser remota a possibilidade de causar algum prejuízo para outros meios de
comunicação. Acresceu-se que, em comunidades localizadas no interior de tão
vasto país, nas quais o acesso à informação não seria amplo como nos grandes
centros, as rádios comunitárias surgiriam como importante meio de divulgação de
notícias de interesse local, de modo que não se vislumbraria, na situação em
apreço, reprovabilidade social da ação dos pacientes. Ademais, observou-se que
fora pleiteada, ao Ministério das Comunicações, a autorização para execução do
serviço de radiodifusão em favor da mencionada rádio. Concluiu-se que, em
virtude da irrelevância da conduta praticada pelos pacientes e da ausência de
resultado lesivo, a matéria não deveria ser resolvida na esfera penal e sim nas
instâncias administrativas. Vencidos os Ministros Cármen Lúcia e Marco Aurélio
que denegavam a ordem, tendo em conta a falta do licenciamento exigido para o
serviço de radiodifusão comunitária e o teor de laudo pericial que teria
concluído pela possibilidade de o funcionamento da referida rádio interferir em
outras freqüências. O Min. Marco Aurélio salientava que o bem protegido seria
da maior valia e a Min. Cármen Lúcia lembrava que algumas emissoras poderiam
prestar desserviços, por exemplo, quando utilizadas por facções criminosas.
HC 104530/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
28.9.2010. (HC-104530)
Crimes contra a
Dignidade Sexual: Nulidade e Assistência à Acusação
A Turma, em votação majoritária, indeferiu habeas corpus no qual o réu,
absolvido em 1ª instância das acusações de estupro e atentado violento ao
pudor, por ausência de prova da materialidade delitiva, fora condenado pelo
tribunal local, em virtude do provimento de apelo interposto por assistente de
acusação. A defesa alegava nulidade no acórdão que julgara improcedente revisão
criminal, haja vista a participação, na qualidade de relator designado para
redigir o acórdão, de desembargador que tomara parte no julgamento da apelação.
Inicialmente, rejeitou-se a tese de ilegitimidade do assistente de acusação
para recorrer de sentença absolutória quando o Ministério Público se queda
inerte, nos termos do art. 598 do CPP (“Nos crimes de competência do Tribunal
do Júri, ou do juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo
Ministério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas
enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente,
poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo”). Vencido, no
ponto, o Min. Marco Aurélio, que entendia inconcebível a atuação da assistência
se o Ministério Público não recorresse da absolvição do paciente. Repeliu-se,
de igual modo, a alegada nulidade do julgamento da revisão criminal. Aduziu-se
que a vedação constante do art. 625 do CPP (“O requerimento será distribuído a
um relator e a um revisor, devendo funcionar como relator um desembargador que
não tenha pronunciado decisão em qualquer fase do processo”) não impediria que,
vencidos o relator e o revisor, fosse designado, para lavrar o acórdão
denegatório da revisão criminal, o desembargador que funcionara como revisor da
apelação, por ter sido o autor do primeiro voto vencedor. Afirmou-se que foram
designados como relator e revisor da ação revisional desembargadores distintos
do redator do acórdão. Precedente citado: HC 102085/RS (DJe de 27.8.2010).
HC 100243/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
28.9.2010. (HC-100243)
Pena Restritiva de
Direitos e Prescrição
A Turma indeferiu habeas corpus em que alegada a prescrição da pena de
suspensão de habilitação para dirigir — imposta cumulativamente com pena
privativa de liberdade — a condenado pela prática do crime de homicídio culposo
na direção de veículo automotor (CTB, art. 302). Afirmou-se que a prescrição da
pretensão punitiva, após o trânsito em julgado da condenação, regular-se-ia
pela pena aplicada (CP, art. 109) e que não se teria operado o lapso
prescricional. Reputou-se, ademais, que à pena restritiva de direitos seria
aplicável o mesmo prazo previsto para a pena privativa de liberdade a ela
cumulada, nos termos do art. 109, parágrafo único, do referido código. Por fim,
enfatizou-se que penas mais leves prescrevem com as mais graves (CP, art. 118),
de modo que o cálculo da prescrição de ambas as sanções seria feito com base na
privativa de liberdade.
HC 104234/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
28.9.2010. (HC-104234)
Prisão Cautelar e
Excesso de Prazo – 2
Em conclusão, nos termos do voto médio proferido pelo Min. Dias Toffoli, a
Turma julgou prejudicadas duas impetrações, mas concedeu as ordens, de ofício,
para tornar definitiva a liberdade dos pacientes. Tratava-se de habeas corpus
em que se alegava, em suma, constrangimento ilegal imposto aos pacientes em
virtude da ausência/insuficiência de fundamento do decreto prisional e de
excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal — v. Informativo
600. O redator para o acórdão mencionou que realizara diligência e, em consulta
ao sítio do tribunal de justiça estadual, verificara a superveniência de
sentença condenatória, o que tornaria superada a questão quanto ao excesso de
prazo, e o fato de estar a ação penal em fase de apelação. Consignou que o
referido édito condenatório mantivera a segregação cautelar de vários co-réus,
mas se silenciara a respeito da necessidade de prisão dos pacientes destes
writs. Ressaltou a inexistência, no momento, de título prisional idôneo
embasador das constrições cautelares, que não poderiam subsistir. Vencidos os
Ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski que denegavam a ordem, por
considerarem idôneo o fundamento do decreto das prisões preventivas e
inexistente o excesso de prazo, tendo em conta a complexidade do feito e a
circunstância de o Estado não ter permanecido inerte. Ademais, ressaltavam o
fato de não haver notícia no aludido sítio eletrônico de que o magistrado, ao
condenar os pacientes, deixara de se manifestar acerca de suas prisões.
Vencido, em parte, o Min. Marco Aurélio, relator, que, por reputar configurado
o excesso de prazo, deferia o HC 97013/SE, para tornar definitivo o relaxamento
da prisão implementado em medida acauteladora, e estendia a ordem ao paciente
do outro habeas.
HC 97013/SE, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/o
acórdão Min. Dias Toffoli, 28.9.2010. (HC-97013)
HC 98402/SE, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/o
acórdão Min. Dias Toffoli, 28.9.2010. (HC-98402)
Lei 11.719/2008:
Interrogatório e “Tempus Regit Actum”
A Turma indeferiu habeas corpus em que se pleiteava renovação de interrogatório
para observância da novel redação do art. 400 do CPP, conferida pela Lei
11.719/2008 [“Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo
máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do
ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa,
nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos
esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas,
interrogando-se, em seguida, o acusado”]. Observou-se que o interrogatório fora
realizado em data anterior à vigência daquela lei, o que, pelo princípio tempus
regit actum, excluiria a obrigação de se renovar ato validamente praticado sob
a égide de lei anterior, para que o paciente fosse interrogado ao final da
audiência de instrução e julgamento. Por fim, reafirmou-se o entendimento do
Supremo segundo o qual não se declara a nulidade de ato processual se a
alegação não vier acompanhada de prova do efetivo prejuízo sofrido pelo
paciente.
HC 104555/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
28.9.2010. (HC-104555)
Lei de Imprensa e Causa
Interruptiva de Prescrição
Aplicam-se aos crimes regulados pela Lei de Imprensa as regras para a contagem
de prazo prescricional dispostas no Código Penal. Ao reafirmar esse
entendimento, a Turma denegou habeas corpus em que condenado por crimes da Lei
de Imprensa alegava a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva, haja
vista o transcurso do lapso de 2 anos previsto no art. 41 da Lei 5.250/67 (“A
prescrição da ação penal, nos crimes definidos nesta Lei, ocorrerá 2 anos após
a data da publicação ou transmissão incriminada, e a condenação, no dôbro do
prazo em que fôr fixada”). Registrou-se que a prescrição da pretensão punitiva
ocorre antes do trânsito em julgado da condenação e regula-se pela pena máxima
cominada ao crime (CP, art. 109). Ademais, asseverou-se que em nenhuma das
ações penais teria transcorrido o prazo de 2 anos, previsto no referido art.
41, entre as causas legais de interrupção do prazo prescricional do CP, não
havendo, portanto, falar-se em prescrição da pretensão punitiva.
HC 103855/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
28.9.2010. (HC-103855)
SEGUNDA
TURMA
Reincidência:
Agravamento de Pena e Recepção pela CF/88
A Turma afetou ao Plenário o julgamento de uma série de habeas corpus em que se
discute eventual ofensa ao art. 5º, XLVI, da CF, decorrente da suposta
existência de bis in idem em razão do agravamento de pena pela reincidência.
Consignou-se que o tema encontra-se em discussão no RE 591563/RS, de relatoria
do Min. Cezar Peluso, cuja repercussão geral fora reconhecida.
HC 94361/RS, rel.
Min. Gilmar Mendes, 28.9.2010. (HC-94361)
HC 93815/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.9.2010. (HC-93815)
HC 94711/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.9.2010.
(HC-94711)
HC 93411/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.9.2010.
(HC-93411)
Remissão e Necessidade
de Oitiva do Ministério Público
É imprescindível a manifestação do Ministério Público para a concessão, pelo
magistrado, de remissão extintiva em procedimento judicial de apuração de ato
infracional. Com base nessa orientação, a Turma indeferiu habeas corpus no qual
se sustentava a possibilidade de outorga desse benefício ao paciente sem a
prévia oitiva do parquet. Asseverou-se que tal ausência implicaria nulidade do
ato, conforme preceituam os artigos 186, § 1º, e 204, do ECA (“Art. 186.
Comparecendo o adolescente, seus pais ou responsável, a autoridade judiciária
procederá à oitiva dos mesmos, podendo solicitar opinião de profissional
qualificado. § 1º Se a autoridade judiciária entender adequada a remissão,
ouvirá o representante do Ministério Público, proferindo decisão. … Art. 204.
A falta de intervenção do Ministério Público acarreta a nulidade do feito, que
será declarada de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado”).
HC 96659/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.9.2010.
(HC-96659)
Crime Militar e
Princípio da Insignificância
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se discute a incidência do
princípio da insignificância em crime de furto tentado, praticado por militar,
em detrimento de instituição castrense. No caso, o paciente fora acusado de
tentar sair de arsenal da Marinha levando consigo 2 válvulas e um tarugo, ambos
de metal, avaliados em R$ 1.410,00. Ocorre que o STM, ao prover recurso do
Ministério Público, reformara, em parte, sentença absolutória que reputara o
fato infração disciplinar. Em conseqüência, condenara o paciente apenas pela
tentativa de furto do tarugo. O Min. Joaquim Barbosa, relator, concedeu a ordem.
Considerou que a res furtiva, um tarugo “velho e inútil”, encontrar-se-ia
armazenado em paiol durante cerca de 4 anos, em desuso, até que subtraído. Além
disso, seu valor econômico — calculado em R$ 503,00 — seria insignificante.
Afirmou que o tratamento interna corporis dado pela instituição militar à
conduta seria suficiente para sua correção e que a esfera criminal deveria
cuidar apenas dos atos mais gravosos perpetrados contra os bens jurídicos
sujeitos à tutela penal, daí a aplicação do referido postulado. Após, pediu
vista a Min. Ellen Gracie.
HC 101709/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.9.2010.
(HC-101709)
Prescrição e Prazo
entre a Citação e o Interrogatório
A Turma concedeu, em parte, habeas corpus para declarar extinta a punibilidade
de um dos réus, pela ocorrência da prescrição, o qual condenado a 2 anos de
reclusão, por furto qualificado (CP, art. 155 § 4º, IV). No caso, tendo em
vista que esse réu possuía menos de 21 anos à época do fato e que o prazo
prescricional deveria ser reduzido pela metade, assentou-se o transcurso de
mais de 2 anos da condenação sem o início do cumprimento da pena. Entretanto,
rejeitou-se o outro fundamento da impetração concernente à nulidade dos
interrogatórios dos pacientes e de todos os atos processuais que se seguiram,
em decorrência do exíguo prazo de 4 dias entre a citação deles e o
interrogatório. Entendeu-se que o referido prazo seria suficiente para que os
acusados se preparassem para o interrogatório, pois, à época, ainda não estava
em vigor a Lei 11.719/2008, e o réu era citado apenas para ser interrogado, mas
não para apresentar resposta por escrito. Por fim, entendeu-se não ser
aplicável a mesma solução dada no HC 84373/BA (DJe de 26.6.2009), haja vista a
diversidade de situação, qual seja, a ocorrência, nesse precedente, do
interrogatório apenas um dia após a citação do réu.
HC 103682/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.9.2010.
(HC-103682)
Sessões |
Ordinárias |
Extraordinárias |
Julgamentos |
Pleno |
29.9.2010 |
27 e |
9 |
1ª Turma |
28.9.2010 |
— |
33 |
2ª Turma |
28.9.2010 |
— |
204 |
R E P E R C U S S Ã O G E R A L
DJE de 1º de outubro de 2010
REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 765.567-SP
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Direito do Consumidor. Responsabilidade do Fornecedor. Indenização por danos
morais e materiais. Prestação de serviço. Ineficiência. Matéria
infraconstitucional. Repercussão geral rejeitada.
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 603.136-RJ
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Recurso extraordinário. Tributário. ISS. Franquia. Fato gerador. Lei
Complementar 116/2003. Repercussão geral reconhecida.
Decisões Publicadas: 2
1º de outubro de 2010
ADI N. 3.944-DF
RELATOR: MIN. AYRES BRITTO
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 7º A 10 DO DECRETO 5.820,
DE 29 DE JUNHO DE 2006, EXPEDIDO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. ADOÇÃO DO
SISTEMA BRASILEIRO DE TELEVISÃO DIGITAL (SBTVD). CONSIGNAÇÃO DE MAIS UM CANAL
DE RADIOFREQÜÊNCIA ÀS CONCESSIONÁRIAS E “AUTORIZADAS” DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE
RADIODIFUSÃO DE SONS E IMAGENS, SEM APRECIAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL. DIFERENÇA
ENTRE AUTORIZAÇÃO DE USO DO ESPECTRO DE RADIOFREQÜÊNCIAS E CONCESSÃO DO SERVIÇO
PÚBLICO DE RADIODIFUSÃO DE SONS E IMAGENS. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO § 5º DO
ART. 220 E AO ART. 223, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. As normas impugnadas por esta ação direta de inconstitucionalidade são
apenas as veiculadas pelos arts. 7º a 10 do Decreto federal 5.820/2006. Embora
sustentadas na petição inicial, não se conhece de teses jurídicas que não
tenham pertinência com os dispositivos impugnados, a saber: a) a de que um
“memorando de entendimento”, assinado pelo Ministro das Relações Exteriores do
Brasil e pelo Chanceler do Japão, não passara pelo controle do Congresso
Nacional; b) a de que deixou de ser publicado o relatório do Comitê de
Desenvolvimento do Sistema Brasileiro de TV Digital, referido pelo inciso VIII
do art. 3º do Decreto 4.901/2003, caracterizando omissão imprestabilizadora da
escolha feita pelo Poder Executivo quanto ao modelo japonês de televisão
digital (ISDB).
2. O Decreto 5.820/2006, pelo menos quanto aos dispositivos objeto da ação
direta, ostenta um coeficiente de generalidade, abstração e impessoalidade que
afasta a alegação de se cuidar de ato de efeito concreto. Até porque “a
determinabilidade dos destinatários da norma não se confunde com a sua
individualização, que, esta sim, poderia convertê-lo em ato de efeitos
concretos, embora plúrimos” (ADI 2.137-MC, da relatoria do ministro Sepúlveda
Pertence). Precedentes.
3. Consignação de canal de radiofreqüência (ou autorização de uso de espectro
de radiofrequência) não se confunde com concessão ou autorização do serviço
público de radiodifusão de sons e imagens. A primeira (consignação), regulada
pela Lei 9.472/97, é acessória da segunda (concessão ou permissão).
4. A norma inscrita no art. 7º do Decreto 5.820/2006 (e também nos arts. 8º a
10) cuida de autorização de uso do espectro de radiofreqüências, e não de
outorga de concessão do serviço público de radiodifusão de sons e imagens. O
que se deu, na verdade, foi o seguinte: diante da evolução tecnológica, e para
a instituição no país da tecnologia digital de transmissão de sons e imagens,
sem interrupção da transmissão de sinais analógicos, fez-se imprescindível a
consignação temporária de mais um canal às atuais concessionárias do serviço de
radiodifusão de sons e imagens. Isso para que veiculassem, simultaneamente, a
mesma programação nas tecnologias analógica e digital. Tratou-se de um ato do
Presidente da República com o objetivo de manter um serviço público adequado,
tanto no que se refere à sua atualidade quanto no tocante à sua continuidade.
Ato por isso mesmo serviente do princípio constitucional da eficiência no
âmbito da Administração Pública.
5. A televisão digital, comparativamente com a TV analógica, não consiste em
novo serviço público. Cuida-se da mesma transmissão de sons e imagens por meio
de ondas radioelétricas. Transmissão que passa a ser digitalizada e a comportar
avanços tecnológicos, mas sem perda de identidade jurídica.
6. Os dispositivos impugnados na ação direta não autorizam, explícita ou
implicitamente, o uso de canais complementares ou adicionais para a prática da
multiprogramação, pois objetivam, em verdade, “permitir a transição para a
tecnologia digital sem interrupção da transmissão de sinais analógicos” (caput
do art. 7º do Decreto 5.820/2006). Providência corroborada pelo item 10.3 da
Portaria 24, de 11 de fevereiro de 2009, do Ministro das Comunicações. Ademais,
a multiprogramação só é tecnicamente viável, dentro da faixa de 6 Mhz do
espectro de radiofreqüências, quando a transmissão ocorrer na definição padrão
de áudio e vídeo (SD – Standard Definition). Para a transmissão de sons e
imagens em alta definição (HD – High Definition), necessária se faz a
utilização de quase toda a mencionada faixa de 6 Mhz. O que significa dizer que
a consignação do canal “inteiro” de 6 Mhz é imprescindível para a adequada
transição tecnológica.
7. O Decreto 5.820/2006 não outorga, não modifica, nem renova concessão,
permissão ou autorização de serviço de radiodifusão de sons e imagens. Tampouco
prorroga qualquer prazo. Inexistência de violação ao art. 223 da Constituição
Federal. Também não há ofensa ao § 5º do art. 220 da Carta da República. Se
monopólio ou oligopólio está a ocorrer, factualmente, nos meios de comunicação
brasileiros, não é por conta do decreto ora impugnado, cuja declaração de
inconstitucionalidade seria inútil para afastar a suposta afronta ao Texto Magno.
8. Ação que se julga improcedente.
* noticiado no Informativo 594
EXT. N. 1.174-CONFEDERAÇÃO HELVÉTICA
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: EXTRADIÇÃO. GOVERNO DA SUÍÇA. EXTRADITANDO QUE ESTÁ SENDO PROCESSADO,
NO BRASIL, PELOS MESMOS FATOS. IMPROCEDÊNICA DO PEDIDO EXTRADICIONAL. Estando o
estrangeiro a responder, na Justiça brasileira, pelos mesmos fatos, impõe-se o
indeferimento do pedido de extradição, nos termos do art. 77, V, da Lei
6.815/1980. Pedido de extradição indeferido.
* noticiado no Informativo 599
MS N. 25.391-DF
RELATOR : MIN. AYRES BRITTO
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. VIABILIDADE DA
ANÁLISE DOS VÍCIOS DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DO INCRA. PRELIMINAR
REJEITADA. EXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE A PESSOA QUE RECEBEU A NOTIFICAÇÃO DA
VISTORIA PRÉVIA TINHA PODERES DE REPRESENTAÇÃO. REGULARIDADE DA INTIMAÇÃO DA
ATUALIZAÇÃO CADASTRAL. POSSIBILIDADE DE DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL LOCALIZADO EM
ÁREA DE FLORESTA AMAZÔNICA PARA ASSENTAMENTO AGROEXTRATIVISTA. A INEXISTÊNCIA
DE PROVA DO CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 7º DA LEI 8.629/93 AFASTA A
PROTEÇÃO CONFERIDA AO IMÓVEL RURAL OBJETO DE IMPLANTAÇÃO DE PROJETO TÉCNICO.
DESNECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DE ENTIDADE DE CLASSE (ART. 2º DO DECRETO 2.250/97)
SOBRE A VISTORIA PRÉVIA. INVASÃO DA PROPRIEDADE, POSTERIORMENTE À VISTORIA.
1. Vícios eventuais do procedimento administrativo se expõem à análise pelo
Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento de mandado de segurança
impetrado contra o decreto presidencial. Preliminar afastada.
2. Não há nenhuma ilegalidade na notificação da vistoria prévia, dado que, além
de a impetrante não haver demonstrado que a pessoa que a recebera não detinha
poderes de representação, há nos autos prova em sentido contrário.
3. A impetrante foi regularmente intimada da atualização cadastral do imóvel
rural. O endereço para o qual se enviou a correspondência consta da matrícula
do imóvel e do próprio laudo agronômico. A autora deixou de afirmar,
categoricamente, não haver recebido a intimação.
4. O imóvel rural situado em área de cobertura florestal primária, incidente no
Ecossistema da Floresta Amazônica, é passível de desapropriação para fins de
reforma agrária, desde que as terras sejam destinadas à criação de projetos de
assentamento agroextrativista (parágrafo único do art. 1º da Portaria/MEPF
88/99 e § 6º do art. 37-A do Código Florestal).
5. A proteção conferida pelo art. 7º da Lei 8.629/93 ao imóvel objeto de
implantação de projeto técnico não se aplica quando desatendidos os requisitos legais.
Não comprovado, pela impetrante, o cumprimento de tais requisitos. Há, ao
contrário, indícios de falsificação de documento.
6. A intimação da entidade de classe (art. 2º do Decreto 2.250/97) apenas é
necessária se ela própria houver indicado a área a ser desapropriada.
Precedentes: MS 23.312/PR, MS 23.889/MS, MS 25.185/DF.
7. A invasão do imóvel rural, após a ocorrência da vistoria prévia, não é óbice
a sua desapropriação. Precedentes: MS 25.186/DF, MS 24.484/DF.
8. Segurança denegada. Remessa de cópia dos autos ao MPU, para apurar
ocorrência de crime.
* noticiado no Informativo 586
HC N. 100.184-MG
RELATOR: MIN. AYRES BRITTO
EMENTA: PROCESSO PENAL. CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E USO DE
DOCUMENTO FALSO (ARTS. 297 E 304 DO CÓDIGO PENAL). PACIENTE NÃO LOCALIZADO NO
ENDEREÇO CONSTANTE DOS AUTOS. CITAÇÃO POR EDITAL. RÉU QUE NÃO COMPARECEU AO
RESPECTIVO INTERROGATÓRIO E DEIXOU DE NOMEAR DEFENSOR PARA A CAUSA. SUSPENSÃO
DO PROCESSO E DO CURSO DO LAPSO PRESCRICIONAL. ART. 366 DO CPP. PRISÃO PREVENTIVA
DECRETADA. ART. 312 DO CPP. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. ORDEM CONCEDIDA.
1. O art. 366 do Código de Processo Penal estabelece que, “se o acusado, citado
por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o
processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção
antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar a prisão
preventiva, nos termos do disposto no art. 312”.
2. Na concreta situação dos autos, o paciente não foi localizado no endereço
constante dos autos. Citado por edital, não compareceu a Juízo nem constituiu
advogado para o patrocínio da causa. Pelo que o magistrado processante decretou
a suspensão tanto do processo quanto do respectivo lapso prescricional.
Magistrado que entendeu desnecessária a prisão cautelar.
3. Isso não obstante, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais decretou
a prisão preventiva do paciente, ao acolher recurso em sentido estrito,
manejado pelo Ministério Público. Prisão preventiva que se acha embasada
exclusivamente na citação editalícia do acusado, como fator de risco para a
própria aplicação da lei penal e por conveniência da instrução criminal. O que,
segundo reiterada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não é o
suficiente para atingir a finalidade do art. 312 do Código de Processo Penal.
Precedentes: HC 79.392, da relatoria do ministro Sepúlveda Pertence; HC 86.140,
da relatoria do ministro Cezar Peluso; e HC 86.599, da relatoria do ministro
Marco Aurélio. É dizer: a prisão decretada pelo Tribunal mineiro não atende ao
dever jurisdicional de fundamentação real das decisões. Decisão que se embasou
exclusivamente na suspensão do processo-crime e respectivo lapso prescricional.
Necessidade de uma concreta demonstração da imperiosidade da segregação
processual, a partir de dados empíricos convincentes. Quadro que não se extrai
dos autos.
4. Em matéria de prisão preventiva, a garantia da fundamentação das decisões
judiciais implica a assunção do dever da demonstração de que o aprisionamento
satisfaz pelo menos a um dos requisitos do art. 312 do Código de Processo
Penal. Sem o que se dá a inversão da lógica elementar da Constituição, segundo
a qual a presunção de não-culpabilidade prevalece até o momento do trânsito em
julgado da sentença penal condenatória.
5. Ordem concedida.
HC N. 103.646-GO
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A VIDA. JULGAMENTO.
DESAFORAMENTO. ALEGAÇÕES DE POSSÍVEL PARCIALIDADE DO JÚRI E DE RISCO À
SEGURANÇA DO RÉU. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
CARACTERIZADO. DENEGADA.
I – O desaforamento constitui medida excepcional, que somente terá lugar quando
presente um dos seguintes motivos: i) interesse da ordem pública; ii) risco
para a segurança do réu; iii) dúvida sobre a imparcialidade do júri.
II – No caso sob exame não se faz presente nenhuma das hipóteses elencadas, o
que torna inviável o acolhimento do pleito.
III – Ordem denegada.
* noticiado no Informativo 597
HC N. 91.716-PR
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: Penal e processo penal. Recurso especial. Decisão monocrática,
proferida por ministro do STJ, que julga parcialmente procedente o recurso.
Alegação de ofensa ao princípio da colegialidade. Liberalidade prevista no art.
557, §1º-A, do CPC. Ausência de nulidade a ser reparada por habeas corpus.
Crime de estelionato previdenciário. Prescrição. Marco inicial. Alteração de
jurisprudência do STF. Precedentes. Ordem concedida de ofício.
Decisão singular em Recurso Especial que, examinando o mérito da causa, deu
parcial provimento para diminuir a pena imposta ao réu, excluindo o aumento de
pena decorrente das certidões consideradas para fins de maus antecedentes.
Insurgência do impetrante quanto à parte da decisão que negou provimento ao
recurso com base no art. 557, §1º-A, do CPC, e em conformidade com a
jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça.
Ausência de ofensa ao princípio da colegialidade. Faculdade outorgada pela
norma que possibilita ao relator dar provimento ao recurso quando a decisão
recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência
dominante do Tribunal Superior. Ausência de ilegalidade a ser reparada por
habeas corpus.
Crime de estelionato previdenciário. Mudança de orientação da jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, que passou a considerar o marco inicial da prescrição
a data em que ocorreu o pagamento indevido da primeira parcela. Precedentes.
Habeas corpus concedido, de ofício, para o fim de reconhecer, no caso concreto,
a aplicação do novo entendimento jurisprudencial em matéria de prescrição.
* noticiado no Informativo 598
Acórdãos Publicados: 398
T R A
N S C R I Ç Õ E S
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma
compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço
trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial
o interesse da comunidade jurídica.
CODESP e Imunidade (Transcrições)
(v. Informativo 597)
RE 253472/SP*
Redator para o acórdão: Min. Joaquim Barbosa
EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE RECÍPROCA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA CONTROLADA
POR ENTE FEDERADO. CONDIÇÕES PARA APLICABILIDADE DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRAÇÃO PORTUÁRIA. COMPANHIA DOCAS DO ESTADO DE SÃO PAULO (CODESP).
INSTRUMENTALIDADE ESTATAL. ARTS. 21, XII, f, 22, X, e 150, VI, a DA
CONSTITUIÇÃO. DECRETO FEDERAL 85.309/1980.
1. IMUNIDADE RECÍPROCA. CARACTERIZAÇÃO. Segundo teste proposto pelo ministro
relator, a aplicabilidade da imunidade tributária recíproca (art. 150, VI, a da
Constituição) deve passar por três estágios, sem prejuízo do atendimento de
outras normas constitucionais e legais:
1.1. A imunidade tributária recíproca se aplica à propriedade, bens e serviços
utilizados na satisfação dos objetivos institucionais imanentes do ente
federado, cuja tributação poderia colocar em risco a respectiva autonomia
política. Em conseqüência, é incorreto ler a cláusula de imunização de modo a
reduzi-la a mero instrumento destinado a dar ao ente federado condições de
contratar em circunstâncias mais vantajosas, independentemente do contexto.
1.2. Atividades de exploração econômica, destinadas primordialmente a aumentar
o patrimônio do Estado ou de particulares, devem ser submetidas à tributação,
por apresentarem-se como manifestações de riqueza e deixarem a salvo a
autonomia política.
1.3. A desoneração não deve ter como efeito colateral relevante a quebra dos
princípios da livre-concorrência e do exercício de atividade profissional ou
econômica lícita. Em princípio, o sucesso ou a desventura empresarial devem
pautar-se por virtudes e vícios próprios do mercado e da administração, sem que
a intervenção do Estado seja favor preponderante.
2. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. EXPLORAÇÃO DE SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO
PORTUÁRIA. CONTROLE ACIONÁRIO MAJORITÁRIO DA UNIÃO. AUSÊNCIA DE INTUITO
LUCRATIVO. FALTA DE RISCO AO EQUILÍBRIO CONCORRENCIAL E À LIVRE-INICIATIVA.
Segundo se depreende dos autos, a Codesp é instrumentalidade estatal, pois:
2.1. Em uma série de precedentes, esta Corte reconheceu que a exploração dos
portos marítimos, fluviais e lacustres caracteriza-se como serviço público.
2.2. O controle acionário da Codesp pertence em sua quase totalidade à União
(99,97%). Falta da indicação de que a atividade da pessoa jurídica satisfaça
primordialmente interesse de acúmulo patrimonial público ou privado.
2.3. Não há indicação de risco de quebra do equilíbrio concorrencial ou de
livre-iniciativa, eis que ausente comprovação de que a Codesp concorra com
outras entidades no campo de sua atuação.
3. Ressalva do ministro-relator, no sentido de que “cabe à autoridade fiscal
indicar com precisão se a destinação concreta dada ao imóvel atende ao
interesse público primário ou à geração de receita de interesse particular ou
privado”.
Recurso conhecido parcialmente e ao qual se dá parcial provimento.
VOTO-VISTA: Trata-se de recurso extraordinário interposto de acórdão do extinto
Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo que estabeleceu a
validade da incidência do Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana – IPTU
sobre propriedade imóvel que compõe o acervo do Porto de Santos, bem como da
cobrança de Taxas de Conservação, Limpeza e Iluminação de Logradouros Públicos.
Sustenta a recorrente que o acórdão viola os arts. 21, XII, f, 22, X, e 150,
VI, a, da Constituição. Segundo entende, a propriedade imóvel dos bens
destinados às atividades portuárias é imune à incidência do IPTU, pois tais
serviços são inerentes à União (bens públicos de uso especial), e a Codesp
somente tem a guarda, a responsabilidade e a gestão do acervo patrimonial.
Iniciado o julgamento, na sessão de 20.09.2006, o eminente relator, Ministro
Marco Aurélio, após examinar os pressupostos gerais e específicos de
admissibilidade do recurso extraordinário, concluindo pela ausência de prequestionamento
da alegada violação dos arts. 21, XII, f, 22, X, da Constituição, bem como da
questão atinente à validade da incidência das taxas, votou pelo desprovimento
do recurso, na parte conhecida.
Ponderou Sua Excelência que a matriz constitucional do IPTU abrange como fatos
geradores admissíveis, além da propriedade imóvel em si, o domínio útil e a
posse. Tal circunstância caracterizaria a recorrente como sujeito passivo do
tributo. Por outro lado, o uso dos bens imóveis em jogo na exploração econômica
desenvolvida por empresa de economia mista descaracteriza a imunidade
recíproca, nos termos do art. 150, § 3º da Constituição.
Pedi vista dos autos para examinar com mais profundidade a questão, tendo em
vista que sou relator de dois outros recursos extraordinários que versam sobre
o alcance da imunidade, especificamente em relação aos templos de qualquer
culto e à propriedade imóvel cedida a particular, para exploração de atividade
econômica privada.
Passo ao voto.
De início, anoto que a Codesp é uma sociedade de economia mista, cujo objetivo
é realizar a administração e a exploração comercial do Porto de Santos e dos
demais portos ou instalações portuárias que já estejam ou vierem a lhe ser
incorporados. Trata-se de atividade cuja exploração está a cargo da União, de
forma direta ou mediante autorização, concessão ou permissão (art. 21, XII, f,
da Constituição). Ademais, nos termos do Relatório de Administração para o
exercício de 2006, a União é acionista majoritária da empresa, com 99,97% das
ações.
Por outro lado, a propriedade imóvel que a recorrida pretende tributar integra
o acervo das instalações portuárias e, segundo a recorrente, submete-se ao
regime instituído pelo Decreto 85.309/1980.
Para confirmar a sujeição passiva da recorrente ao IPTU, a decisão recorrida
adotou dois fundamentos.
O primeiro diz respeito à extensão da imunidade recíproca. Entendeu o Tribunal
de origem que a circunstância de a propriedade imóvel que se pretende tributar
pertencer à União não firma por si mesma a imunidade, pois, como dispõe o art.
150, § 3º da Constituição, o patrimônio relacionado com exploração de
atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos
privados, ou em que haja contraprestação pelo pagamento de preços ou tarifas
pelo usuário, não estão abrangidas pela exoneração.
O segundo argumento presente na decisão recorrida diz respeito à possibilidade
de a Codesp ser tida como sujeito passivo do IPTU, na medida em que a
caracterização da imunidade recíproca não transcende a personalidade jurídica
da União, e o fato gerador do tributo também abrange a posse a qualquer título
(arts. 32 e 34 do Código Tributário Nacional).
Portanto, a questão de fundo submetida ao crivo da Corte se resume ao exame do
alcance dos requisitos para reconhecimento da imunidade recíproca, pois, como
observou o ministro-relator, as questões relativas à violação dos arts. 21,
XII, f, 22, X, e em relação à validade das taxas, não foram prequestionadas.
Passo ao exame das razões do recurso.
Parto de três constatações para compor o teste de adequação constitucional da
salvaguarda tributária, assim enumerados:
1) A imunidade tem por objetivo impedir que os entes federados utilizem a
tributação para retaliar uns aos outros, para induzir comportamento político
desejado ou para obter vantagens capazes de pôr em risco o adequado
desenvolvimento regional, previsto no art. 3º da Constituição.
2) A salvaguarda é oferecida em detrimento do direito de outros entes
arrecadarem recursos úteis à obtenção de seus objetivos institucionais;
3) A proteção refere-se aos interesses públicos primários, distanciados da
questão da capacidade contributiva e do intuito de aumento patrimonial
individual.
Com base em tais constatações, concluo que a aplicabilidade da imunidade
recíproca depende da superação ou aprovação em teste de três estágios, presente
a Constituição como parâmetro de controle, quais sejam:
1) A imunidade é “subjetiva”, isto é, ela se aplica à propriedade, bens e
serviços utilizados na satisfação dos objetivos institucionais imanentes do
ente federado, cuja tributação poderia colocar em risco a respectiva autonomia
política. Em conseqüência, é incorreto ler a cláusula de imunização de modo a
reduzi-la a mero instrumento destinado a dar ao ente federado condições de
contratar em condições mais vantajosas, independentemente do contexto;
2) Atividades de exploração econômica, destinadas primordialmente a aumentar o
patrimônio do Estado ou de particulares, devem ser submetidas à tributação, por
apresentarem-se como manifestações de riqueza e deixarem a salvo a autonomia
política. Em decorrência, a circunstância de a atividade ser desenvolvida em
regime de monopólio, por concessão ou por delegação, é de todo irrelevante;
3) A desoneração não deve ter como efeito colateral relevante a quebra dos
princípios da livre-concorrência e do exercício de atividade profissional ou
econômica lícita. Em princípio, o sucesso ou a desventura empresarial devem
pautar-se por virtudes e vícios próprios do mercado e da administração, sem que
a intervenção do Estado seja favor preponderante.
No caso em exame a parte-recorrente passa nos três estágios do teste.
Concordo com a premissa adotada pelo Tribunal de origem que entende que a
circunstância objetiva de o imóvel tributado pertencer à União não justifica,
de per se, a aplicação da imunidade tributária. Coerente, ademais, a
constatação de que o exercício de atividades puramente econômicas não atrai a
proteção conferida pela imunidade.
O equívoco, a meu sentir, está na caracterização da atividade desempenhada pela
empresa-recorrente.
Em uma série de precedentes, esta Corte reconheceu que a exploração dos portos
marítimos, fluviais e lacustres caracteriza-se como serviço público (cf. o RE
172.816; rel. min. Paulo Brossard, DJ de 13.05.1994; o RE 356.711, rel. min.
Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ de 07.04.2006; o RE 253.394, rel. min. Ilmar
Galvão, Primeira Turma, DJ de 11.04.2003 e o RE 265.749 rel. min. Maurício
Corrêa, Segunda Turma, DJ de 12.09.2003). A matéria, contudo, tem raízes bem
mais antigas, que datam da Constituição de 1891, como registrou FRANCISCO
CAMPOS (Direito Constitucional, v. I. São Paulo: Freitas Bastos, 1956, págs.
8-134) ao examinar a aplicação da imunidade à “Companhia Docas de Santos”,
antecessora da Codesp.
Confirmariam a lesão à livre-iniciativa, à livre-concorrência e ao dever
fundamental de pagar tributos três quadros hipotéticos.
Em primeiro lugar, se a participação privada no quadro societário da Codesp
fosse relevante, o intuito lucrativo sobrepor-se-ia à exploração portuária como
instrumentalidade do Estado. Não é o caso dos autos, dado que a União detém
99,97% das ações da empresa, segundo relatório de 2007. Mantida a relevância da
instrumentalidade estatal, não se vislumbra violação do dever fundamental de
pagar tributos e de custeio dos demais entes federados.
Por outro lado, os autos também não indicam que a Codesp opere com intuito
primordial de auferir vantagem econômica para simples aumento patrimonial da
União, como ocorre com outras empresas que exploram atividades sujeitas a
monopólio, concessão ou delegação (e.g., a Petrobrás, RE 285.716-AgR, de minha
relatoria, Segunda Turma, DJe de 26.03.2010).
Em segundo lugar, se a Codesp operasse em mercado de livre-acesso, o
reconhecimento da imunidade violaria os postulados da livre-concorrência e da
livre-iniciativa. Também não é o caso dos autos, já que não há indicação de que
a Codesp tenha concorrentes em sua área de atuação específica (Porto de
Santos).
Por fim, em terceiro lugar, considero importante examinar se a propriedade imóvel
em questão é utilizada diretamente pela entidade imune em sua atividade-fim, ou
se ao contrário, é cedida a terceiro, entidade privada que se dedica a
explorá-la com intuito lucrativo.
Eu não teria dúvida em confirmar o acórdão recorrido se a propriedade da União
fosse explorada economicamente por particular, com intuito lucrativo. Cheguei a
esta conclusão durante o julgamento do RE 451.152, relatado pelo Ministro
Gilmar Mendes, na sessão de 22.08.2006 na Segunda Turma. Naquela assentada,
ponderei que a tributação do imóvel pertencente à União, mas explorado
economicamente por particular, não traria risco algum ao equilíbrio entre os
entes federados. Ademais, não se pode negar que a dedicação de particular à
exploração de atividade econômica em caráter privado constitui signo
demonstrativo de capacidade contributiva objetiva.
Naquele caso, o que se tinha era o particular deixando de concorrer com outros
empreendedores em igualdade de condições por força de disposição constitucional
impertinente ao exercício privado de atividades econômicas (imunidade
recíproca), pondo de lado, assim, as questões econômicas ou de gerenciamento
próprias do mercado. O valor do IPTU, naquela situação, deixa de ser um custo
e, portanto, ou aumenta o lucro do negócio, ou diminui o preço do serviço.
No caso em exame não há tal risco, pois a recorrente é uma instrumentalidade da
União. Ou seja: cuida-se de uma entidade derivada, criada com a finalidade de
executar um mister que a Constituição atribuiu à própria União.
Em síntese, cabe à autoridade fiscal indicar com precisão se a destinação
concreta dada ao imóvel atende ao interesse público primário ou à geração de
receita de interesse particular ou privado. Não bastasse a grande quantidade de
obrigações acessórias capazes de auxiliar a Administração em tal objetivo, o
lançamento por ofício traz instrumentos eficientes para indicar se o imóvel é
utilizado por particular em seu próprio interesse, de modo integral ou em
fração ideal.
Do exposto, pedindo vênia ao eminente ministro-relator, conheço parcialmente do
recurso extraordinário, tão-somente no que se refere à incidência do IPTU, e,
na parte conhecida, dou-lhe parcial provimento, para reconhecer a imunidade do
imóvel pertencente à União, mas afetado à Codesp, utilizado em suas atividades-fim.
É como voto.
* acórdão pendente de publicação
INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
27 de setembro a 1º de outubro de 2010
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) -Prazo Processual – Feriado Forense
Portaria nº 310/STF, de 22 de setembro de 2010 – Transfere para 29 de outubro
de 2010, sexta-feira, as comemorações alusivas ao Dia do Servidor Público.
Comunica que nessa data e nos dias 1º e 2 de novembro de 2010 não haverá
expediente na Secretaria do Tribunal. Os prazos que porventura devam iniciar-se
ou completar-se nesses dias ficam automaticamente prorrogados para o dia 3
subsequente (quarta-feira). Publicada no DJe/STF de 28.9.2010, n.182, p.107.
SEGURANÇA PÚBLICA – Servidor Público – Cooperação – Participação
Decreto nº 7.318, de 28 de setembro de 2010 – Altera e acresce dispositivo ao
Decreto no 5.289, de 29 de novembro de 2004, para regulamentar a participação
de servidores civis nas atividades desenvolvidas no âmbito da cooperação
federativa prevista na Lei nº 11.473, de 10 de maio de 2007. Publicado no DOU de
29.9.2010, Seção 1, p. 2.
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