STF

Informativo nº 575 do STF

 

Brasília, 15 a 19 de fevereiro de 2010

 

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

 

 

 

PLENÁRIO

 

 

Supressão de Gratificação e Contraditório

O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União – TCU que suprimira, sem observância do contraditório, vantagem pessoal incorporada aos vencimentos do impetrante. No caso, após ocupar o cargo de analista de finanças do Ministério da Fazenda, o impetrante integrara-se ao quadro funcional do TCU, sendo-lhe deferida a averbação do tempo de serviço prestado em função comissionada no citado Ministério, para fins de vantagem pessoal (“quintos”). Requer o servidor a nulidade do ato administrativo que implicara a revogação dessa vantagem. Inicialmente, rejeitou-se a preliminar suscitada pelo Min. Marco Aurélio, relator, sobre a ausência de quórum para julgamento de matéria constitucional. Em seguida, o relator afastou as preliminares de incompetência do STF para julgar o writ, dado que a autoridade apontada como coatora seria o Presidente do TCU, e de decadência, porquanto impetrado dentro do prazo legal. No mérito, concedeu a segurança para assentar a nulidade do processo. Aduziu que o impetrante alcançara situação remuneratória posteriormente retirada do cenário jurídico sem que se lhe desse oportunidade para manifestar-se. Enfatizou que a Corte já proclamara que a anulação de ato administrativo cuja formalização haja repercutido no campo de interesses individuais não prescinde da observância da instauração de processo administrativo que viabilize a audição daquele que teria a situação jurídica modificada. Salientou que cumpriria dar ciência ao servidor, não vingando a óptica segundo a qual a autotutela administrativa poderia afastar o próprio direito de defesa, pouco importando a observância dos cinco anos previstos na Lei 9.784/99. Consignou, ainda, que o vício não teria sido convalidado com o fato de o impetrante ter interposto, depois de já estar decidido o processo que implicara a glosa do direito, recurso para a autoridade maior. Após, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Dias Toffoli.

MS 25399/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 17.2.2010.  (MS-25399)

 

Mandado de Segurança: Impedimento e Feitos Diversos – 1

O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança, impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União – TCU, em que se sustenta a ilegalidade de julgamento por ele proferido, na medida em que relatado por Ministro supostamente impedido. Alega a impetração que o relator já se manifestara sobre as irregularidades imputadas ao impetrante enquanto representante do parquet junto à Corte de Contas, confirmando posição já exarada, em face dos mesmos fatos, atuando, portanto, sucessivamente, como representante do Ministério Público e Ministro do TCU. Sustenta o seu impedimento para participar do feito, por afronta ao inciso VIII do art. 39 do Regimento Interno do TCU (“Art. 39. É vedado ao ministro do Tribunal: … VIII – atuar em processo de interesse próprio, de cônjuge, de parente consangüíneo ou afim, na linha reta ou na colateral, até o segundo grau, ou de amigo íntimo ou inimigo capital, assim como em processo em que tenha funcionado como advogado, perito, representante do Ministério Público ou servidor da Secretaria do Tribunal ou do Controle Interno.”).

MS 25630/DF, rel. Min. Ayres Britto, 17.2.2010.  (MS-25630)

 

Mandado de Segurança: Impedimento e Feitos Diversos – 2    

O Min. Ayres Britto, relator, por reputar serem diversos os processos em que o Ministro supostamente impedido atuara como representante do parquet e como Ministro do TCU, denegou a segurança. Ressaltou que o primeiro processo cuidaria de auditoria realizada na área de pessoal de Fundação de Universidade Federal, e o segundo — instaurado três anos depois do primeiro — trataria da prestação de contas da mencionada Fundação. Asseverou, destarte, não se aplicar ao caso em exame a vedação do inciso VIII do art. 39 do RITCU, dado que o Ministro não atuara no mesmo processo em que funcionara como membro do Ministério Público junto ao TCU. Consignou que, enquanto em um dos processos, o TCU, com base no inciso IV do art. 71 da CF, apreciara relatório de auditoria na específica área de pessoal e referente a atos de 1993, no outro, julgara a prestação de contas do administrador público no exercício de 1995, com fundamento no inciso II do mesmo art. 71 da Carta da República. Salientou, ademais, que a atuação do antigo membro do Ministério Público junto à Corte de Contas se dera na condição de custos legis, protagonização funcional em que se faz imperiosa total imparcialidade no exame jurídico das causas. Destacou, por fim, que nenhum prejuízo sofrera o impetrante, haja vista que o Ministro apenas atuara no processo a partir do julgamento do recurso de divergência, quando o TCU já havia reprovado as contas da citada Fundação e imposto multa ao responsável. Após, foi indicado adiamento.

MS 25630/DF, rel. Min. Ayres Britto, 17.2.2010.  (MS-25630)

 

Redução de Proventos: Devolução de Parcelas e Contraditório – 1

O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança coletivo impetrado pela Associação Nacional de Delegados de Polícia Federal – ADPF e outra no qual se questiona ato do Tribunal de Contas da União – TCU que suspendera o pagamento da Gratificação de Atividade pelo Desempenho de Função – GADF — recebida cumulativamente com parcela relativa a décimos e quintos — a aposentados e pensionistas filiados daquela entidade e determinara a devolução do montante recebido a tal título nos últimos cinco anos. A impetrante afirma a boa-fé dos favorecidos e sustenta que a Administração teria decaído do direito de anular os atos administrativos praticados, ante a passagem de mais de cinco anos (Lei 9.784/99, art. 54). Alega que seus filiados seriam beneficiários porque obtiveram o direito antes da derrogação do art. 193 da Lei 8.112/90 [“O servidor que tiver exercido função de direção, chefia, assessoramento, assistência ou cargo em comissão, por período de 5 (cinco) anos consecutivos, ou 10 (dez) anos interpolados, poderá aposentar-se com a gratificação da função ou remuneração do cargo em comissão, de maior valor, desde que exercido por um período mínimo de 2 (dois) anos.”] e que teria havido lesão ao devido processo legal. Inicialmente, rejeitou-se a preliminar suscitada pelo Min. Marco Aurélio, relator, sobre a ausência de quórum para julgamento da matéria constitucional.

MS 25561/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 17.2.2010.  (MS-25561)

 

Redução de Proventos: Devolução de Parcelas e Contraditório – 2

Em seguida, o relator, após rejeitar a preliminar de decadência, reputou parcialmente procedente a de ilegitimidade das impetrantes relativamente às pensionistas, pois, diferentemente do que ocorreria com os inativos — que não perdem a qualidade de associados —, quanto a elas, não existiria previsão no estatuto da ADPF, sendo certa tal perda pelo associado falecido. No mérito, indeferiu o writ. Consignou a reiteração de pronunciamentos do Supremo no sentido de não se exigir, quanto à tramitação do processo de aposentadoria, a bilateralidade, o contraditório, a audição do servidor envolvido, citando o Verbete Vinculante 3 (“Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.”). No tocante à acumulação das parcelas, asseverou que a Lei 8.538/92 fora explícita ao afastá-la (“Art. 6º  A Gratificação de Atividade pelo Desempenho de Função – GADF não poderá ser paga cumulativamente com a parcela incorporada nos termos do § 1º do art. 14 da Lei Delegada nº 13/92, com a redação dada pelo art. 5º desta lei, ressalvado o direito de opção cujos efeitos vigoram a partir de 1/11/92.”), evitando-se que parcelas integrantes da remuneração tivessem o mesmo móvel e incidências recíprocas. Mencionou, a propósito, haver o reconhecimento de que a GADF serviria de base ao cálculo de parcelas denominadas “quintos”. Enfatizou, ademais, que o conflito retratado na espécie não envolveria incorporação, mas sim ausência do direito à cumulatividade, o que tornaria irrelevante a incorporação anteriormente versada no art. 193 da Lei 8.112/90. Quanto à devolução das parcelas recebidas, assinalou que a Administração Pública faz-se regida pelo princípio da legalidade estrita e que somente podem ser satisfeitos valores quando previstos em lei. Na situação dos autos, aduziu que o próprio diploma que instituíra o direito à GADF excluíra a percepção cumulativa e que o TCU assentara no acórdão impugnado que o tema deveria ser apreciado em cada caso concreto. Após, pediu vista dos autos o Min. Dias Toffoli.

MS 25561/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 17.2.2010.  (MS-25561)

 

Alteração de Aposentadoria: Aditamento e Desnecessidade de Contraditório

O Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União – TCU que, sem prévia manifestação do impetrante, excluíra dos seus proventos de aposentadoria o pagamento de “quintos”. Na espécie, a Corte de Contas reputara legal a aposentação originária do impetrante, ocorrida em 1995. Entretanto, em 1997, a fundação que concedera a aposentadoria ao impetrante incluíra, de maneira superveniente, o pagamento de “quintos”, parcela remuneratória esta não examinada naquela oportunidade, por não constar do processo. Ocorre que, submetida tal inclusão ao TCU, este a considerara ilegal ante a insuficiência de tempo de serviço do impetrante para auferi-la. Inicialmente, rejeitou-se a preliminar suscitada pelo Min. Marco Aurélio, relator, sobre a ausência de quórum para julgamento da matéria constitucional. Em seguida, afastou-se a preliminar de decadência ao fundamento de que o prazo de cinco anos previsto no art. 54 da Lei 9.784/99 teria sido observado. No ponto, ressaltando que o ato de aposentadoria seria complexo, aduziu-se que o termo a quo para a contagem do referido prazo seria a data em que aperfeiçoada aquela. No mérito, consignou-se que, na situação dos autos, fora encaminhada ao TCU alteração introduzida posteriormente nos proventos de aposentadoria do impetrante e que o órgão competente glosara o que praticado na origem, modificando os parâmetros da aposentadoria então registrada. Mencionou-se, ademais, que o procedimento referente à alteração estaria ligado ao registro. Asseverou-se que, uma vez procedido o registro da aposentadoria pelo TCU, fixando-se certos parâmetros a nortearem os proventos, alteração realizada pelo órgão de origem em benefício do aposentado implicaria aditamento e, então, não haveria necessidade de estabelecer-se contraditório.

MS 25525/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 17.2.2010.  (MS-25525)

 

Anulação de Aposentadoria: Contagem de Tempo como Aluno-Aprendiz e Súmula 96 do TCU – 1

O Tribunal concedeu mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União – TCU, consubstanciado em acórdão que anulara ato de aposentadoria do impetrante, por considerar indevido o aproveitamento do tempo por ele trabalhado como aluno-aprendiz em escola técnica. Na espécie, o impetrante se aposentara, em 12.4.94, como auditor fiscal do trabalho. Para o reconhecimento desse direito, valera-se de certidão emitida por escola técnica, pela qual comprovara a freqüência como aluno-aprendiz, recebendo, por normas regulamentares da escola, fardamento, alimentação e material escolar, além de perceber, a título de remuneração, parcela da renda auferida com a execução de encomendas para terceiros, despesas estas pagas com recursos provenientes da União. Em 12.2.2008, o TCU recusara o registro da aposentadoria em razão da irregularidade na contagem de tempo de serviço de aluno-aprendiz. Determinara fosse descontado o tempo de aluno-aprendiz e concluíra que o impetrante poderia permanecer aposentado com proventos proporcionais, desde que emitido novo ato excluindo o referido período, ou retornar à atividade para completar o tempo necessário à aposentadoria integral. Sustentava o impetrante que a decisão do TCU não levara em conta que, à época do ato de sua aposentadoria, existia apenas a Súmula 96 daquele Tribunal (“Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros.”).

MS 27185/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 17.2.2010.  (MS-27185)

 

Anulação de Aposentadoria: Contagem de Tempo como Aluno-Aprendiz e Súmula 96 do TCU – 2

Entendeu-se que, depois de quase 14 anos da publicação da aposentadoria do impetrante, o TCU não poderia negar o registro respectivo por mudança de seu próprio entendimento ocorrida posteriormente àquele ato, sob pena de serem malferidos os princípios constitucionais da segurança jurídica, da confiança e da boa-fé. Após fazer retrospectiva da legislação nacional sobre o aluno-aprendiz, observou-se que não teria ela apresentado alteração no tocante à natureza dos cursos de aprendizagem nem no conceito de aprendiz, e que a única mudança havida seria a nova redação dada à Súmula 96 do TCU (“Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária à conta do Orçamento.”), aprovada, em 8.12.94, e publicada no DOU, em 3.1.95.

MS 27185/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 17.2.2010.  (MS-27185)

 

Reclamação: Aposentadoria Espontânea e Extinção do Contrato de Trabalho – 1

O Tribunal iniciou julgamento de reclamação ajuizada por empresa pública estadual contra decisão proferida pelo Juízo da 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis-SC que, nos autos de reclamação trabalhista, ao deferir pedido de tutela antecipada, assegurara a manutenção, em seus empregos, de trabalhadores aposentados pelo Regime Geral de Previdência, sob o fundamento de que a aposentadoria concedida aos empregados não é causa de extinção do contrato de emprego, nem implica acumulação de proventos vedada por lei. Na espécie, a reclamante comunicara àqueles trabalhadores seu desligamento do quadro de pessoal, em razão da impossibilidade de acumulação de proventos de aposentadoria com salários. Por vislumbrar afronta à autoridade da decisão proferida pelo Supremo nas ações diretas de inconstitucionalidade 1721/DF (DJU de 29.6.2007) e 1770/DF (DJU de 1º.12.2006), a Min. Ellen Gracie, relatora, julgou procedente o pedido formulado para cassar a decisão impugnada, autorizando a reclamante a efetuar demissões de empregados que se aposentaram espontaneamente, fazendo-o com o pagamento das respectivas verbas rescisórias trabalhistas.

Rcl 8168/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 18.2.2010.  (Rcl-8168)

 

Reclamação: Aposentadoria Espontânea e Extinção do Contrato de Trabalho – 2

Considerou que o Supremo, ao julgar os referidos precedentes, de fato declarara a inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 453 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT [“Art. 453 – No tempo de serviço do empregado, quando readmitido, serão computados os períodos, ainda que não contínuos, em que tiver trabalhado anteriormente na empresa, salvo se houver sido despedido por falta grave, recebido indenização legal ou se aposentado espontaneamente. § 1º Na aposentadoria espontânea de empregados das empresas públicas e sociedades de economia mista é permitida sua readmissão desde que atendidos aos requisitos constantes do art. 37, inciso XVI, da Constituição, e condicionada à prestação de concurso público. § 2º O ato de concessão de benefício de aposentadoria a empregado que não tiver completado 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, ou trinta, se mulher, importa em extinção do vínculo empregatício.”]. Observou que, no julgamento da ADI 1721/DF, a Corte reputara inconstitucional o § 2º do art. 453 da CLT por criar esse dispositivo modalidade de despedida arbitrária, haja vista não considerar a possibilidade de o empregador querer continuar com seu empregado, ressaltando o fato de que o direito à aposentadoria se perfaz de forma objetiva e constitui uma relação jurídica entre o segurado e o INSS, e não entre o empregado e o empregador. No que se refere ao julgamento da ADI 1770/DF, o Tribunal concluíra pela inconstitucionalidade do § 1º do art. 453 da CLT, regra aplicável aos empregados das empresas públicas, também por se fundar na idéia de que a aposentadoria espontânea poria fim abruptamente ao vínculo empregatício entre empregado e empregador.

Rcl 8168/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 18.2.2010.  (Rcl-8168)

 

Reclamação: Aposentadoria Espontânea e Extinção do Contrato de Trabalho – 3

Não obstante, a Min. Ellen Gracie entendeu que esses precedentes não impediriam as empresas públicas e as sociedades de economia mista de efetivar a adequação de seus quadros e, para isso, promover, quando necessária, a demissão de seus empregados, aposentados espontaneamente, ou não, pagando-lhes as devidas verbas rescisórias. Reportou-se à decisão proferida na Rcl 5679/SC (DJE de 7.10.2008) nesse sentido. Concluiu que, no caso, o juízo trabalhista conferira aos aludidos precedentes extensão indevida, ao gerar uma extraordinária “estabilidade no emprego” para os empregados aposentados pela Previdência Social. Afirmou que o que revelado pelos autos seria problema da necessidade de renovação da força de trabalho das empresas públicas e sociedades de economia mista, responsáveis por parte significativa do desenvolvimento nacional. Esclareceu que se as empresas públicas e as sociedades de economia mista não pudessem demitir seus empregados, na forma da legislação trabalhista em vigor, dificilmente haveria renovação de quadros, o que poderia ensejar sérios problemas estruturais em relação à prestação de serviços essenciais à população brasileira. Isso, por outro lado, não implicaria obrigatoriedade de demissão desses empregados já aposentados, porquanto o vínculo laboral permanece vigente e subsiste a possibilidade de essas empresas desejarem manter a colaboração de seus experientes empregados aposentados pelo regime geral. Em suma, afirmou que as empresas públicas e as sociedades de economia mista não estão obrigadas a manter seus empregados, inclusive aqueles aposentados pela Previdência Social, podendo, portanto, conforme a necessidade de sua política de recursos humanos, optar pela sua demissão. Após o voto do Min. Ayres Britto, que acompanhava a relatora, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.

Rcl 8168/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 18.2.2010.  (Rcl-8168)

 

“Habeas Corpus” e Falta de Interesse de Agir

O Tribunal não conheceu de habeas corpus em que se apontava como autoridade coatora o Procurador-Geral da República. Na espécie, o Procurador-Geral da República requisitara a instauração de procedimento investigatório para apurar a ocorrência de crimes contra a ordem tributária supostamente praticados pelo paciente, Deputado Federal. Acolhida a requisição ministerial, instaurara-se inquérito, tendo sido atribuída relatoria à Min. Cármen Lúcia, a qual exarara decisão na qual fizera expressa referência ao enquadramento dos fatos com caracterizadores, em tese, do crime previsto no art. 1º da Lei 8.137/90. Alegava o impetrante que não poderia ser investigado pela suposta prática desse delito por inexistir auto de infração anteriormente lançado. Requeria, liminarmente, a imediata suspensão do aludido procedimento investigatório e, no mérito, o arquivamento do inquérito. Registrou-se, inicialmente, que a autoridade apontada como coatora seria o Procurador-Geral da República, não obstante os pedidos formulados buscarem o trancamento de inquérito cuja instauração decorrera de decisão fundamentada proferida por Ministra do Tribunal. Tendo em conta informação prestada pela Min. Cármen Lúcia, no sentido de que a matéria objeto deste writ não teria sido suscitada nos autos daquele inquérito, entendeu-se que não poderia ser conhecida a impetração por falta de interesse de agir do impetrante, uma vez que os fundamentos fáticos e jurídicos motivadores do habeas corpus não teriam sido submetidos à apreciação da relatora do inquérito cuja regularidade estaria sendo manifestamente questionada neste feito. Citou-se a jurisprudência da Corte segundo a qual, para caracterizar-se o interesse de agir na via do habeas corpus, é necessário que a pretensão posta no writ seja previamente levada à avaliação do relator do feito questionado. Observou-se, inclusive, que tal entendimento foi objeto do Enunciado 692 da Súmula do STF (“Não se conhece de ‘habeas corpus’ contra omissão de relator de extradição, se fundado em fato ou direito estrangeiro cuja prova não constava dos autos, nem foi ele provocado a respeito.”), o qual, destinado aos processos de extradição, aplicar-se-ia, mutatis mutandis, ao presente caso. Assim, tratando o habeas corpus de suposta irregularidade ocorrida no curso de inquérito, imprescindível que a causa de pedir seja veiculada nos autos respectivos diretamente ao relator, dando-lhe oportunidade de conhecer, sanar ou, ao menos, se manifestar a respeito da pretensão deduzida.

HC 92702/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 18.2.2010.  (HC-92702)

 

Construção de Estacionamento de Supermercado por Município e Art. 1º, II, do Decreto-lei 201/67 – 1

O Tribunal retomou julgamento de inquérito instaurado pela Procuradoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Norte em que se imputa a Senadora e outro a suposta prática do crime descrito no art. 1º, II, do Decreto-lei 201/67. Na espécie, a primeira denunciada, então Prefeita do Município de Mossoró/RN, celebrara um “Protocolo de Intenções” com o segundo denunciado, sócio-gerente de supermercado, por meio do qual a denunciada se obrigara a executar os serviços de pavimentação asfáltica da área de estacionamento lateral da loja desse estabelecimento comercial, bem como promover, mediante solicitação da empresa, a realização de cursos de capacitação e treinamento de mão-de-obra necessária à operação do empreendimento. Na sessão de 6.8.2009, o Min. Ayres Britto, relator, rejeitara a denúncia por não vislumbrar ilícito penal. Salientando que o estacionamento construído não seria de serventia exclusiva dos clientes do supermercado, considerara que, no caso, haveria um aspecto social preponderante sobre o aspecto puramente mercantil ou econômico do empreendimento. Afirmou estar-se diante de empresa beneficiária de pequeno porte, e que a atividade estaria inserida na organização do abastecimento alimentar, para a qual o Estado teria competências materiais explícitas. Enfatizara, ademais, que o fato de o supermercado criar centenas de empregos diretos no Município teria grande significado social e que seria ínfimo o valor do dispêndio publico, qual seja, inferior a quatro mil reais, não estando caracterizada nenhuma discrepância, nenhum superfaturamento entre esse valor e a área construída. Concluíra, por derradeiro, que, se ilícito houvesse, seria mais de caráter administrativo.

Inq 2646/RN, rel. Min. Ayres Britto, 18.2.2010.  (Inq-2646)

 

Construção de Estacionamento de Supermercado por Município e Art. 1º, II, do Decreto-lei 201/67 – 2

Na presente assentada, o Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista, recebeu a denúncia por entender que os fatos nela narrados se enquadram no tipo penal previsto no art. 1º, II, do Decreto-lei 201/67. Explicou que, ainda que se admitisse a premissa de que a denunciada, ao firmar o “Protocolo de Intenções” com o denunciado, tivera como objetivo promover o desenvolvimento econômico do Município de Mossoró, contribuindo para uma melhor qualidade de vida da população local, não se poderia negar o fato de que as obrigações assumidas pela municipalidade beneficiariam uma única pessoa, em detrimento de todas as demais que eventualmente tivessem interesse em se estabelecer na localidade, com os mesmos incentivos. Observou, ainda, que o estacionamento em questão não seria público, nem seria utilizado por outras pessoas além dos próprios clientes do supermercado do denunciado. Assim, o pacto celebrado entre os denunciados teria sido elaborado de forma flagrantemente leonina e prejudicial à municipalidade, havendo indícios robustos de que a então prefeita de Mossoró teria se utilizado, indevidamente, em proveito do co-denunciado, de bens, rendas e serviços públicos. Após os votos dos Ministros Dias Toffoli, Ellen Gracie e Gilmar Mendes, Presidente, que acompanhavam o relator, e dos votos dos Ministros Cármen Lúcia, Cezar Peluso e Marco Aurélio, que acompanhavam a divergência, o julgamento foi adiado, em face do empate, para serem colhidos os votos dos Ministros Celso de Mello, licenciado, Eros Grau e Ricardo Lewandowski, ausentes justificadamente.

Inq 2646/RN, rel. Min. Ayres Britto, 18.2.2010.  (Inq-2646)

 

Advogado: Inexistência de Sala de Estado Maior e Prisão Domiciliar

O Tribunal iniciou julgamento de reclamação ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de São Paulo contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara das Execuções Criminais da capital que indeferira pedido de prisão domiciliar formulado por advogada, que tivera sua prisão provisória decretada em sentença condenatória recorrível. No caso, a advogada se encontrava presa em penitenciária feminina em cela separada de outras detentas, tendo-lhe sido deferida liminar pela Presidência do Supremo para determinar sua prisão domiciliar. A Min. Cármen Lúcia, relatora, salientando que a advogada não se encontrava numa sala e sim numa cela, e que haveria apelação pendente de julgamento, confirmou a liminar concedida e julgou procedente o pedido formulado, para que se assegure o cumprimento da norma prevista no art. 7º, V, da Lei 8.906/94 — que confere aos advogados o direito de não serem recolhidos presos, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, e, na sua falta, em prisão domiciliar — devendo ser especificadas, pelo juízo reclamado, as condições para esse cumprimento, até ser possível, se for o caso, a transferência da advogada para uma sala de Estado Maior, nos termos do que definido na ADI 1127/DF (DJU de 25.6.2006) — na qual declarada a constitucionalidade parcial do referido dispositivo legal — e na Rcl 4535/ES (DJU de 15.6.2007), assim permanecendo ela até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória ou enquanto estiver inscrita como advogada na OAB, o que ocorrer primeiro. Após o voto do Min. Dias Toffoli, que acompanhava a relatora, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.

Rcl 8668/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 18.2.2010.  (Rcl-8668)

 

 

Primeira Turma

Não houve sessão ordinária em 16.2.2010.

 

Segunda Turma

 

Não houve sessão ordinária em 16.2.2010.

 

 

Sessões           Ordinárias        Extraordinárias            Julgamentos

Pleno   17.2.2010         18.2.2010         51

1ª Turma                            

2ª Turma                            

 

C l i p p i n g  d o  DJ

            19 de fevereiro de 2010

 

MS N. 26.393-DF

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ANULAÇÃO DE ASCENSÕES FUNCIONAIS CONCEDIDAS AOS EMPREGADOS DA ECT. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVER A LEGALIDADE DAS ASCENSÕES. NECESSIDADE DE AS PARTES ATINGIDAS PELO ATO COATOR INTEGRAREM A LIDE.

1. Decadência do direito de a Administração Pública rever a legalidade dos atos de ascensão funcional dos empregados da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, praticados entre 1993 e 1995 (Art. 54 da Lei n. 9.784/1999).

2. Direito ao contraditório e à ampla defesa a ser garantido aos beneficiários de atos administrativos inerentes à sua condição funcional para a validade de decisões do Tribunal de Contas da União que importem em sua anulação ou revogação. Súmula Vinculante n. 3.Precedentes.

3. Mandado de segurança concedido.

* noticiado no Informativo 565

 

HC N. 92.497-SP

RELATOR: MIN. AYRES BRITTO

EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. ALEGADA CARÊNCIA DE ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO DELITO DE QUADRILHA OU BANDO. PLURALIDADES DE DENÚNCIAS PELO CRIME DE QUADRILHA. SIMILITUDE FÁTICA. ORDEM CONCEDIDA. 

1. O trancamento da ação penal é medida excepcional, restrita a situações que se reportem a conduta não constitutiva de crime em tese, ou quando já estiver extinta a punibilidade, ou, ainda, se não ocorrentes indícios mínimos da autoria (HC 87.310, da relatoria do ministro Carlos Ayres Britto; HC 91.005, da relatoria do ministro Carlos Ayres Britto; RHC 88.139, da relatoria do ministro Carlos Ayres Britto; HC 87.293, da relatoria do ministro Eros Grau; HC 85.740, da relatoria do ministro Ricardo Lewandowski; HC 85.134, da relatoria do ministro Marco Aurélio).

2. No caso, a increpação do delito de quadrilha ou bando não decorre pura e simplesmente do fato de sócios gerenciarem uma pessoa jurídica envolvida em crimes tributários. Há elementos indiciários consistentes o bastante para viabilizar, em tese, o prosseguimento da ação penal quanto ao delito do art. 288 do Código Penal.

3. Na concreta situação dos autos, todavia, carece de justa causa ação penal ajuizada para apurar eventual ocorrência do crime de quadrilha, pois a inicial acusatória é mera réplica de denúncia anterior, ambas com a mesma base fática. Excepcionalidade que autoriza o trancamento da ação penal.

4. Ordem concedida. 

* noticiado no Informativo 568

 

HC N. 95.443-SC

RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE

HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL ANTES DO ENCERRAMENTO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO-FISCAL. POSSIBILIDADE QUANDO SE MOSTRAR IMPRESCINDÍVEL PARA VIABILIZAR A FISCALIZAÇÃO. ORDEM DENEGADA.

1. A questão posta no presente writ diz respeito à possibilidade de instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do procedimento administrativo-fiscal.

2. O tema relacionado à necessidade do prévio encerramento do procedimento administrativo-fiscal para configuração dos crimes contra a ordem tributária, previstos no art. 1°, da Lei n° 8.137/90, já foi objeto de aceso debate perante esta Corte, sendo o precedente mais conhecido o HC n° 81.611 (Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, julg. 10.12.2003).

3. A orientação que prevaleceu foi exatamente a de considerar a necessidade do exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária (Lei n° 8.137/90, art. 1°). No mesmo sentido do precedente referido: HC 85.051/MG, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 01.07.2005, HC 90.957/RJ, rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.10.2007 e HC 84.423/RJ, rel. Min. Carlos Britto, DJ 24.09.2004.

4. Entretanto, o caso concreto apresenta uma particularidade que afasta a aplicação dos precedentes mencionados.

5. Diante da recusa da empresa em fornecer documentos indispensáveis à fiscalização da Fazenda estadual, tornou-se necessária a instauração de inquérito policial para formalizar e instrumentalizar o pedido de quebra do sigilo bancário, diligência imprescindível para a conclusão da fiscalização e, conseqüentemente, para a apuração de eventual débito tributário.

6. Deste modo, entendo possível a instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do processo administrativo-fiscal, quando for imprescindível para viabilizar a fiscalização.

7. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.

* noticiado no Informativo 573

 

HC N. 97.296-SP

RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE

HABEAS CORPUS. CRIMES DE EXTORSÃO. PEDIDO DE MODIFICAÇÃO DO REGIME INICIAL PARA CUMPRIMENTO DA PENA NÃO APRECIADO PELAS INSTÂNCIAS INFERIORES. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO PELO STF. CUSTÓDIA CAUTELAR MANTIDA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E PARA ASSEGURAR A APLICAÇÃO DA LEI PENAL. DECISÃO FUNDAMENTADA. RÉUS PRESOS DURANTE TODA A INSTRUÇÃO CRIMINAL. WRIT PARCIALMENTE CONHECIDO. ORDEM DENEGADA.

1. Inicialmente, verifico que a questão referente à substituição do regime de cumprimento da pena não foi analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, nem, sequer, pela instância imediatamente inferior.

2. Deste modo, inviável o conhecimento deste pedido, neste momento, pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de configurar supressão de instância, em afronta às normas constitucionais de competência.

3. Verifico que o magistrado fundamentou, ainda que de forma sucinta, a decisão, eis que, diante do conjunto probatório dos autos da ação penal, a manutenção da custódia cautelar se justifica para a garantia da ordem pública e para assegurar a efetiva aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.

4. Ademais, “é pacífica a jurisprudência desta Suprema Corte de que não há lógica em permitir que o réu, preso preventivamente durante toda a instrução criminal, aguarde em liberdade o trânsito em julgado da causa, se mantidos os motivos da segregação cautelar” (HC 89.824/MS, rel. Min. Carlos Britto, DJ 28-08-08).

5. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nesta parte, denegado.

 

HC N. 98.212-RJ

RELATOR: MIN. EROS GRAU

EMENTA: HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA “EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA”. ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. Dignidade da pessoa humana. art. 1º, iii, da constituição do brasil. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO STJ. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.

1. O art. 637 do CPP estabelece que “[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença”. A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

2. Daí que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210/84, além de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP.

3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar.

4. A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão.

5. Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer contemplação, nos “crimes hediondos” exprimem muito bem o sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte assertiva: “Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinqüente”.

6. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados — não do processo penal. A prestigiar-se o princípio constitucional, dizem, os tribunais [leia-se STJ e STF] serão inundados por recursos especiais e extraordinários e subseqüentes agravos e embargos, além do que “ninguém mais será preso”. Eis o que poderia ser apontado como incitação à “jurisprudência defensiva”, que, no extremo, reduz a amplitude ou mesmo amputa garantias constitucionais. A comodidade, a melhor operacionalidade de funcionamento do STF não pode ser lograda a esse preço.

7. No RE 482.006, relator o Ministro Lewandowski, quando foi debatida a constitucionalidade de preceito de lei estadual mineira que impõe a redução de vencimentos de servidores públicos afastados de suas funções por responderem a processo penal em razão da suposta prática de crime funcional [art. 2º da Lei n. 2.364/61, que deu nova redação à Lei n. 869/52], o STF afirmou, por unanimidade, que o preceito implica flagrante violação do disposto no inciso LVII do art. 5º da Constituição do Brasil. Isso porque — disse o relator — “a se admitir a redução da remuneração dos servidores em tais hipóteses, estar-se-ia validando verdadeira antecipação de pena, sem que esta tenha sido precedida do devido processo legal, e antes mesmo de qualquer condenação, nada importando que haja previsão de devolução das diferenças, em caso de absolvição”. Daí porque a Corte decidiu, por unanimidade, sonoramente, no sentido do não recebimento do preceito da lei estadual pela Constituição de 1.988, afirmando de modo unânime a impossibilidade de antecipação de qualquer efeito afeto à propriedade anteriormente ao seu trânsito em julgado. A Corte que vigorosamente prestigia o disposto no preceito constitucional em nome da garantia da propriedade não a deve negar quando se trate da garantia da liberdade, mesmo porque a propriedade tem mais a ver com as elites; a ameaça às liberdades alcança de modo efetivo as classes subalternas.

8. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição do Brasil). É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual.

9. O não conhecimento da impetração no Superior Tribunal de Justiça inviabiliza o conhecimento deste habeas corpus. Há, contudo, evidente constrangimento ilegal, a ensejar imediata atuação desta Corte.

Habeas corpus não conhecido; ordem concedida, de ofício.

 

HC N. 99.363-ES

REDATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. CEZAR PELUSO

EMENTA: AÇÃO PENAL. Prescrição da pretensão punitiva. Ocorrência. Estelionato contra a Previdência Social. Art. 171, § 3º, do CP. Uso de certidão falsa para percepção de benefício. Crime instantâneo de efeitos permanentes. Diferença do crime permanente. Delito consumado com o recebimento da primeira prestação do adicional indevido. Termo inicial de contagem do prazo prescritivo. Inaplicabilidade do art. 111, III, do CP. HC concedido para declaração da extinção da punibilidade. Precedentes. Voto vencido. É crime instantâneo de efeitos permanentes o chamado estelionato contra a Previdência Social (art. 171, § 3º, do Código Penal) e, como tal, consuma-se ao recebimento da primeira prestação do benefício indevido, contando-se daí o prazo de prescrição da pretensão punitiva.

 

RE N. 468.523-SC

RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE

DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ALEGAÇÕES DE PROVA OBTIDA POR MEIO ILÍCITO, FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO DE PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA E EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. PODERES INVESTIGATÓRIOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, IMPROVIDO.

1. O recurso extraordinário busca debater quatro questões centrais: a) a nulidade do processo em razão da obtenção de prova ilícita (depoimentos colhidos diretamente pelo Ministério Público em procedimento próprio; gravação de áudio e vídeo realizada pelo Ministério Público; consideração de prova emprestada); b) invasão das atribuições da polícia judiciária pelo Ministério Público Federal; c) incorreção na dosimetria da pena com violação ao princípio da inocência na consideração dos maus antecedentes na fixação da pena-base; d) ausência de fundamentação para o decreto de perda da função pública. 

2. O extraordinário somente deve ser conhecido em relação às atribuições do Ministério Público (CF, art. 129, I e VIII), porquanto as questões relativas à suposta violação ao princípio constitucional da presunção de inocência na fixação da pena-base e à suposta falta de fundamentação na decretação da perda da função pública dos recorrentes, já foram apreciadas e resolvidas no julgamento do recurso especial pelo Superior Tribunal de Justiça. 

3. Apenas houve debate na Corte local sobre as atribuições do Ministério Público, previstas constitucionalmente. O ponto relacionado à nulidade do processo por suposta obtenção e produção de prova ilícita à luz da normativa constitucional não foi objeto de debate no acórdão recorrido. 

4. Esta Corte já se pronunciou no sentido de que “o debate do tema constitucional deve ser explícito” (RE 428.194 AgR/MG, rel. Min. Eros Grau, 1ª Turma, DJ 28.10.2005) e, assim, “a ausência de efetiva apreciação do litígio constitucional, por parte do Tribunal de que emanou o acórdão impugnado, não autoriza – ante a falta de prequestionamento explicíto da controvérsia jurídica – a utilização do recurso extraordinário” (AI 557.344 AgR/DF, rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJ 11.11.2005). 

5. A denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do MPF sem a necessidade do prévio inquérito policial, como já previa o Código de Processo Penal.  Não há óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal, mormente em casos graves como o presente que envolvem a presença de policiais civis e militares na prática de crimes graves como o tráfico de substância entorpecente e a associação para fins de tráfico. 

6. É perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito, ainda que a título excepcional, como é a hipótese do caso em tela. Tal conclusão não significa retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais (arts. 129 e 144) de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos supostamente delituosos, mas também a formação da opinio delicti. 

7. O art. 129, inciso I, da Constituição Federal, atribui ao parquet a privatividade na promoção da ação penal pública. Do seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia.

8. Há princípio basilar da hermenêutica constitucional, a saber, o dos “poderes implícitos”, segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Se a atividade fim – promoção da ação penal pública – foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não se concebe como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que “peças de informação” embasem a denúncia. 

9. Levando em consideração os dados fáticos considerados nos autos, os policiais identificados se associaram a outras pessoas para a perpetração de tais crimes, realizando, entre outras atividades, a de “escolta” de veículos contendo o entorpecente e de “controle” de todo o comércio espúrio no município de Chapecó. 

10. Recurso extraordinário parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido.

 

RE N. 552.111-DF

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

EMENTA: SENTENÇA. Acórdão. Não conhecimento, em parte, de embargos declaratórios. Omissão sobre ônus da sucumbência. Falta de prestação jurisdicional sobre a matéria. Ofensa ao art. 5º, XXXV, da CF. Apreciação da questão. Provimento ao recurso extraordinário para esse fim. Não se tendo manifestado, em embargos declaratórios, sobre questão da distribuição dos ônus de sucumbência, deve fazê-lo o tribunal local.

 

RMS N. 23.732-DF

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

EMENTA: Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. 2. Ato do Ministro da Justiça que estabeleceu prazo para fixação de preços diretamente nos produtos. 3. Inocorrência de ilegalidade ou inconstitucionalidade do ato impugnado. 4. Inexistência de direito líquido e certo a ser amparado. 5. Inadmissibilidade de mandado de segurança contra ato meramente normativo. 6. Recurso a que se nega provimento.

 

Acórdãos Publicados: 265

 

Transcrições

 

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

 

Carreira de Atividades Penitenciárias: Agente Penitenciário e Técnico Penitenciário do DF (Transcrições)

 

(v. Informativo 573)

 

ADI 3916/DF*

 

RELATOR: MIN. EROS GRAU

 

V O T O – V I S T A

 

A Senhora Ministra Ellen Gracie: A presente ação direta de inconstitucionalidade, proposta pelo Procurador-Geral da República, tem como objeto a Lei Distrital 3.669, de 13.9.2005, que criou, no Quadro de Pessoal do Distrito Federal, a Carreira de Atividades Penitenciárias, constituída de 1.700 cargos de Técnico Penitenciário.

O requerente impugna, em primeiro lugar, algumas atribuições específicas conferidas ao cargo de Técnico Penitenciário, descritas em dois dos doze incisos do art. 7º da Lei 3.669/2005. Para uma melhor compreensão, transcrevo o rol completo de atribuições nele disposto, no qual destaco as atividades ora contestadas:

 

“Art. 7º São atribuições gerais do Técnico Penitenciário, além de outras decorrentes do seu exercício:

I – exercer, operacionalizar tarefas de atendimento, serviço de vigilância, custódia, guarda, assistência e orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos penais do Distrito Federal;

II – acompanhar, instruir e orientar os processos de reeducação, reintegração social e ressocializaçao do detento;

III – organizar, protocolar, preparar, expedir e arquivar documentos, promover controle de pessoal, tramitar processos e expedientes dos estabelecimentos penais;

IV – arquivar, manter e atualizar a documentação dos fichários e prontuários dos internos recolhidos nos estabelecimentos penais;

V – fiscalizar as atividades de conservação e reparos das instalações e bens materiais dos estabelecimentos penais;

VI – realizar atividades assistenciais aos internos recolhidos nos estabelecimentos penais, nas áreas religiosas, sociais, educacionais e profissionais;

VII – promover, atualizar e manter os cadastros de visitantes, inclusive de familiares dos internos, autorizados a adentrarem nos estabelecimentos penais;

VIII – executar as rotinas de visitação aos presos, no cadastro de visitantes, e promover as revistas em alimentos e pertences que adentram nos estabelecimentos penais;

IX – assistir as gerências e chefias dos estabelecimentos penais;

X – realizar o serviço de expediente junto ao Poder Judiciário e demais órgãos ou entidades;

XI – fiscalizar a aquisição de suprimentos necessários aos estabelecimentos penais, bem como na entrega dos produtos;

XII – exercer outras atividades que lhe forem cometidas, compatíveis com o seu cargo.

 

Sustenta o Chefe do Ministério Público Federal que o legislador distrital, ao atribuir aos integrantes da novel Carreira de Atividades Penitenciárias as tarefas de atendimento, vigilância, custódia, guarda, assistência e orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos penais do Distrito Federal, bem como de gerenciamento de documentos, processos e expedientes e de controle de pessoal daquelas instituições, invadiu competência privativa da União para, mediante lei federal, organizar e manter a Polícia Civil do Distrito Federal (arts. 21, XIV, e 32, § 4º, da Constituição).

Demonstra, para tanto, a existência de legislação emanada do Congresso Nacional que, na reorganização da Carreira Policial Civil do Distrito Federal, a ela manteve integrado o cargo de Agente Penitenciário (Lei 9.264, de 7.2.1996 – fls. 20-22). Aponta, também, leis federais que criaram novos cargos efetivos de Agente Penitenciário (Lei 9.659, de 9.6.1998 – fl. 27) e que estipularam o subsídio como forma de remuneração exclusiva dos ocupantes de todos os cargos da Carreira Policial Civil do Distrito Federal (Lei 11.361, de 19.10.2006 – fls. 23-26).

Além disso, invocando, mais uma vez, invasão da competência própria da União no que diz respeito à organização e manutenção da Polícia Civil do Distrito Federal, o requerente aponta a inconstitucionalidade formal do art. 13 da lei ora contestada, que deslocou o exercício dos agentes penitenciários pertencentes ao Quadro da Polícia Civil do Distrito Federal para as unidades que compõem a estrutura orgânica dessa instituição, atribuindo-lhes a realização de atividades típicas de Polícia Judiciária. O referido dispositivo ainda estabeleceu, como regra de transição, a migração gradual dos agentes penitenciários – dos estabelecimentos penais para os órgãos da Polícia Civil – à medida que os cargos de técnicos penitenciários fossem sendo providos, até a data limite de 31.12.2007.

Na sessão plenária em que se iniciou o julgamento da presente ação, realizada em 7.10.2009, o eminente relator, Ministro Eros Grau, ressaltou que a Constituição Federal, em seu art. 144, § 4º, não atribuiu à Polícia Civil a função de guarda dos estabelecimentos prisionais, assunto que, por sua nítida natureza penitenciária, configurar-se-ia matéria cuja competência legislativa é exercida, de modo concorrente, pela União, Estados e Distrito Federal (art. 24, I, da Constituição). Votou S. Exa., dessa forma, pela total improcedência do pedido formulado.

Divergiram integralmente desse entendimento os eminentes Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Carlos Britto, para os quais haveria, de fato, ofensa direta aos arts. 21, XIV; e 32, § 4º, da Carta Magna.

Já a eminente Ministra Cármen Lúcia e o eminente Ministro Cezar Peluso, ao mesmo tempo em que detectaram vício formal por invasão do art. 13 do ato normativo ora atacado na estrutura organizacional da Polícia Civil do Distrito Federal, defenderam, por outro lado, a competência desse peculiar ente federativo na organização de sua administração penitenciária, o que incluiria a criação, pela via legal, de carreira com as mesmas atribuições contidas no art. 7º da Lei 3.669/2005, ou seja, vigilância, custódia e guarda das pessoas recolhidas em estabelecimentos prisionais.

Ante o surgimento das três respeitáveis posições acima descritas e para melhor estudo de tão delicada questão, pedi vista dos autos.

Passo efetivamente ao meu voto, buscando, num primeiro momento, um melhor exame do cargo de agente penitenciário da Carreira Policial Civil do Distrito Federal.

Ainda sob a vigência da ordem constitucional passada, o Decreto-Lei 2.266, de 12.3.1985, criou, no Quadro de Pessoal do Distrito Federal, a Carreira Policial Civil, composta de cargos de Delegado de Polícia, Médico-Legista, Perito Criminal, Escrivão de Polícia, Agente de Polícia, Datiloscopista Policial e, finalmente, de Agente Penitenciário. Indicou aquele ato normativo o número de vagas de cada cargo e transpôs para a nova carreira criada aqueles que integravam, naquele momento, o Grupo Polícia Civil do Distrito Federal.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, ficaram expressamente estabelecidas, no âmbito do exercício estatal da segurança pública, tanto a incumbência das polícias como um todo – a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (CF, art. 144, caput) –, como as atribuições específicas das polícias civis – o exercício das funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto militares (CF, art. 144, § 4º).

Na lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, as funções de polícia judiciária guardam estreita relação com a responsabilização dos violadores da ordem jurídica (Curso de Direito Administrativo, São Paulo, Malheiros, 22ª ed., 2007, p. 801). Julio Fabbrini Mirabete, nessa mesma linha, assevera que a polícia judiciária, diante da existência de uma infração penal, “recolhe elementos que a elucidem para que possa ser instaurada a competente ação penal contra os autores do fato” (Processo Penal, São Paulo, Atlas, 13ª ed., 2002, p. 74). Guilherme de Souza Nucci, ao comentar o art. 4º do Código de Processo Penal, afirma caber às polícias civis “conduzir as investigações necessárias, colhendo provas pré-constituídas e formar o inquérito, que servirá de base de sustentação a uma futura ação penal” (Código de Processo Penal Comentado, São Paulo, Revista dos Tribunais, 9ª ed., 2009, p. 78).

É inegável, portanto, que após o advento da ordem constitucional vigente não há mais lugar para o desempenho pelas Polícias Civis dos Estados e do Distrito Federal de funções ligadas à administração penitenciária, a envolver a guarda e a custódia das pessoas que, por força de condenação penal judicialmente imposta, já cumprem penas restritivas de liberdade em presídios e outros estabelecimentos penais.

Todavia, em visível dissonância com a atual orientação constitucional, o legislador ordinário federal, mesmo em tempos mais recentes, tem editado novas leis confirmando a presença, na estrutura organizacional da Polícia Civil do Distrito Federal, de cargos ligados às atividades de administração penitenciária, e não às funções constitucionais de polícia judiciária.

Vejamos.

Em 7.2.1996, foi editada a Lei 9.264, que, ao reorganizar a Carreira Policial Civil do Distrito Federal, não só a ela manteve integrados os cargos de Agente Penitenciário, como elevou toda a referida carreira à condição de carreira típica de Estado.

A Lei 9.659, de 9.6.1998, por sua vez, criou quatrocentos novos cargos de agente penitenciário de nível médio.

Já a Lei 11.134, de 15.7.2005, alterando a redação do art. 5º da Lei 9.264/1996, restabeleceu a exigência do curso superior completo para o ingresso em quaisquer dos cargos da Carreira Policial Civil do Distrito Federal.

Por fim, nessa exemplificação que faço, cito a Lei 11.361, de 19.10.2006, que estipulou o subsídio como forma de remuneração exclusiva dos ocupantes de todos os cargos da Carreira Policial Civil do Distrito Federal, nela incluídos os agentes penitenciários; e ainda a Lei 11.663, de 24.04.2008, que fixou o subsídio da categoria inicial dos cargos de Agente de Polícia, Escrivão de Polícia, Papiloscopista Policial e Agente Penitenciário, a partir de 1º.2.2009, em R$ 7.514,33.

É curioso notar que nenhum dos atos normativos até agora citados, referentes à Carreira Policial Civil do Distrito Federal, traz qualquer descrição das atribuições dos cargos que a compõem. Mas, o sítio eletrônico da Polícia Civil do Distrito Federal na internet informa que são atribuições de seus agentes penitenciários: 1) vigiar os detentos e reclusos, observando e fiscalizando o seu comportamento para prevenir quaisquer alterações da ordem interna e impedir eventuais fugas; 2) efetuar rondas periódicas de acordo com as escalas preestabelecidas; 3) conduzir e escoltar detentos e reclusos quando encaminhados à Justiça, Instituto Médico Legal, Hospitais, Delegacias e outros estabelecimentos; 4) proceder à contagem dos internos em suas celas; e 5) executar outras tarefas correlatas (www.pcdf.df.gov.br/pgDetalhe.aspx?sOp=2, acessado em 28.10.2009).

Verifico nos autos a existência de ato regulamentar no âmbito da Administração Pública distrital que reforça todos esses dados. A Portaria 49, de 15.9.2000, da Secretaria de Gestão Administrativa do Distrito Federal, especifica por classe, em seu anexo único, as atribuições do cargo de agente penitenciário (fls. 98-101). Nela consta, por exemplo, caber aos agentes penitenciários (1) as atividades de atendimento, serviço de vigilância, custódia, guarda, assistência e orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos penais do Distrito Federal; (2) acompanhar os processos de reeducação, reintegração social e ressocialização do detento; e (3) exercer atividades policiais inerentes ao seu mister.

Todo esse levantamento, Senhor Presidente, indica, a meu ver, a existência de situação de permanente incompatibilidade entre a missão constitucionalmente confiada às polícias civis e o complexo de leis federais que insistem em manter na Carreira da Polícia Civil do Distrito Federal cargos cujas atribuições não dizem respeito às funções de polícia judiciária, já que estão relacionadas a uma tarefa estatal executada em momento posterior à aplicação definitiva da pena e que é dotada, por isso mesmo, de natureza eminentemente penitenciária.

Em seu douto voto, proferido na assentada de 7.10.2009, o eminente relator, Ministro Eros Grau, bem lembrou de precedente no qual esta Suprema Corte, ao declarar a inconstitucionalidade do caput e do inciso II do art. 180 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, rejeitou, por ampla maioria, a tese de que no conceito de segurança pública traçado na Carta de 1988 esteja compreendida a vigilância intramuros dos estabelecimentos penais. Trata-se da ADI 236, de relatoria do eminente Ministro Octavio Gallotti, cujo julgamento de mérito encerrou-se em 7.5.1992. Do voto do ilustre relator, a quem tive a honra de suceder nesta Casa, destaco, por sua clareza, o seguinte trecho (DJ de 1º.06.2001):

 

“A ‘vigilância intramuros nos estabelecimentos penais’ pode ser até considerada uma das facetas da atividade policial (ou parte dela), mas, com ela, certamente não se confunde.

De seu turno a limitação da atividade à área interna (‘vigilância intramuros’) dos estabelecimentos não condiz o caráter público da defesa do Estado, a caracterizar a disposição que preenche o Capítulo III do Título V da Constituição Federal (art. 144, e seus oito parágrafos).

A prevalecer o elastério pretendido pelo constituinte fluminense, a vigilância dos recintos das repartições, dos museus ou coleções de arte, até mesmo de estabelecimentos de educação ou de saúde (escolas correcionais e estabelecimentos psiquiátricos, por exemplo), poderia ser matéria de segurança, em linha de identidade com o desempenho policial.

Se, nas penitenciárias, sucede o risco das fugas, como recorda a douta Advocacia Geral da União, poderá vir a tornar-se, eventualmente, necessário o concurso da polícia (civil ou militar), o que, data vênia, não significa atribuir-se caráter policial à vigilância interna de rotina, como parece ser o propósito do dispositivo impugnado.

Melhor treinamento e remuneração compatível com o árduo trabalho da guarda penitenciária, são algo que deve o Estado prover, sem necessidade de estabelecer, para tanto, uma ficção jurídica, e esta foi, em última análise, a previsão da norma estadual capaz de elastecer – para além do aceitável – o preceito ditado pela Constituição Federal.”

 

O eminente Ministro Sepúlveda Pertence, ao enfrentar a questão debatida naquele julgamento, assim se manifestou, com infalível precisão:

 

“Na espécie, a princípio – lembro-me da discussão inicial interrompida pelo pedido de vista do eminente Ministro Célio Borja –, resisti à argumentação do eminente Relator. Mas, com o desenvolvimento da primeira fase deste julgamento e, hoje, com a releitura do voto de S. Exa., convenci-me de que procede a ação direta por inconstitucionalidade material. É que, para legitimar-se, para poder introduzir-se no esquema traçado pela própria Constituição Federal à organização dos instrumentos de segurança pública nos Estados, essa guarda penitenciária só poderia encontrar abrigo como ramo de Polícia Civil. Mas a Constituição, em normas efetivamente de absorção compulsória pelos Estados, reservou à polícia civil um campo delimitado, que é o da polícia judiciária, como resulta do texto do art. 144, § 4º:

‘Art. 144…………………………….

§ 4º – Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.’

De tal modo, Senhor Presidente, como guarda penitenciária, evidentemente, não é função de polícia judiciária, nem é apuração de infrações penais, as quais, ao contrário, a sua atividade pressupõe apuradas e punidas, não há lugar para dar status policial, status de organismo de segurança pública a este serviço de vigilância penitenciária.”

 

Obviamente, Senhor Presidente, não estou aqui a declarar a inconstitucionalidade de leis federais que absolutamente não foram e nem poderão vir a ser objeto desta ação direta que ora examinamos.

Contudo, não posso fechar os olhos para o fato de que há uma inegável situação de contínua irregularidade no exercício da competência que detém a União para organizar e manter a Polícia Civil do Distrito Federal, consubstanciada na permanência, em sua estrutura, de cargos que, conforme demonstrado, não dizem respeito às atividades de polícia judiciária e à apuração de infrações penais.

Por essa circunstância, não me parece razoável que o Distrito Federal, responsável que é, como todos os Estados-membros, pela administração penitenciária em seu território, não possa, a bem do serviço público que lhe incumbe, fazer uso de sua competência legislativa para formar um quadro próprio de pessoal para a vigilância intramuros de seus estabelecimentos penais.

Em outras palavras, entendo que o Distrito Federal não pode ter o seu poder legiferante cerceado em matéria de vigilância penitenciária – alheia, portanto, à missão constitucional das polícias civis – por conta do exercício abusivo, pela União, da competência que possui para organizar e manter a Polícia Civil do Distrito Federal.

No âmbito da própria União, foi criada a Carreira de Agente Penitenciário Federal, a cujos cargos efetivos foi confiado “o exercício das atividades de atendimento, vigilância, custódia, guarda, assistência e orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos penais federais e às dependências do Departamento de Polícia Federal” (Lei 10.693, de 25.6.2003). Veja-se que nem mesmo esta carreira – criada, como todos sabem, no contexto dos esforços de operacionalização das quatro unidades de presídios federais de segurança máxima já existentes – foi integrada ao Quadro Permanente do Departamento de Polícia Federal, mas sim ao Quadro de Pessoal do Ministério da Justiça.

Nos Estados, da mesma forma, os agentes públicos responsáveis pela guarda e vigilância da população carcerária não possuem qualquer vínculo com as polícias civis daquelas unidades da Federação.

Em Minas Gerais, por exemplo, a Lei 14.695, de 30.7.2003, criou, no Quadro de Pessoal da Secretaria de Estado de Defesa Social, a carreira de Agente de Segurança Penitenciário, composta de 5.004 cargos de Agente de Segurança Penitenciário. Os integrantes da referida carreira, que nela ingressam, entre outros requisitos, mediante a comprovação de conclusão do ensino médio (art. 9º, § 2º, d), possuem, por exemplo, as funções de garantir a ordem e a segurança no interior dos estabelecimentos penais (art. 6º, I) e de neles promover ações de vigilância interna e externa, inclusive nas muralhas e guaritas que compõem as edificações (art. 6º, III), estando, para tanto, “autorizado[s] a portar arma de fogo fornecida pela administração pública, quando em serviço, exceto nas dependências internas do estabelecimento penal” (art. 6º, § 1º).

Em São Paulo, a Lei Complementar 959, de 13.9.2004, reestruturando a carreira de Agente de Segurança Penitenciária criada pela Lei Complementar 498, de 29.12.1986, integrou-a ao Quadro da Secretaria da Administração Penitenciária, atribuindo aos ocupantes dos respectivos cargos “o desempenho de atividades de vigilância, manutenção da segurança, disciplina e movimentação dos presos internos em Unidades do Sistema Prisional” (art. 1º).

Já no Rio Grande do Sul, há um Quadro Especial de Servidores Pe­nitenciários, ligado à Superintendência dos Serviços Penitenciários da Secretaria da Justiça e da Segurança e formado, segundo a Lei 9.228/1991 (alterada, dentre outras, pela Lei 11.758/2002), pelos cargos de Auxiliar de Serviços Penitenciários (Grupo Serviços Auxiliares), Agente Penitenciário (Grupo Serviços de Vigilância e Custódia), Monitor Penitenciário (Grupo Processos Criminológicos Informais) e Criminólogo (Grupo Processos Criminológicos Formais).

Diante desse quadro, penso que o legislador constituinte de 1988 não pretendeu, ao atribuir à União a tarefa de organizar e manter a Polícia Civil do Distrito Federal, retirar desse ente federado a prerrogativa, usufruída por todos os demais Estados, de dar, quando necessária, pronta resposta legislativa às necessidades de reorganização de sua administração penitenciária.

Assim, Senhor Presidente, chego a este ponto de meu voto convicta de que o Distrito Federal não incorreu em inconstitucionalidade alguma ao criar, por lei própria, carreira inerente à administração penitenciária de que é responsável, atribuindo aos ocupantes dos cargos de Técnico Penitenciário as tarefas de guarda, custódia e vigilância das pessoas recolhidas aos seus estabelecimentos penais. Se essas atividades não dizem respeito às finalidades constitucionalmente atribuídas às polícias civis, não há como o Distrito Federal, nesse específico tópico, ter invadido competência organizacional reservada à União.

É bem verdade que a coincidência de atribuições dos cargos hoje existentes de agente penitenciário da Polícia Civil do Distrito Federal e de técnico penitenciário do Quadro de Pessoal do Distrito Federal poderá gerar uma série de dificuldades administrativas, notadamente no que diz respeito à hierarquia e à coordenação das atividades a serem desempenhadas. Porém, essa circunstância fática, que pode vir a ser contornada com diálogo e empenho das autoridades administrativas envolvidas, não tem força jurídica suficiente para impedir que o Distrito Federal legisle e organize seu próprio pessoal de vigilância penitenciária.

Ante todo o exposto, pedindo vênia aos colegas que manifestaram entendimento diverso, julgo improcedente o pedido de declaração de inconstitucionalidade dos incisos I e III do art. 7º da Lei Distrital 3.669, de 13.9.2005.

Já no tocante ao art. 13 da mesma Lei, não parece haver divergência quanto à impossibilidade de o legislador distrital, sob pena de ofensa ao art. 21, XIV, da Constituição, provocar alterações no exercício de cargo pertencente à carreira da Polícia Civil do Distrito Federal. O referido dispositivo legal desloca o exercício dos agentes penitenciários hoje existentes do local onde possuem razão de existir (dos estabelecimentos penais) para os órgãos da estrutura da Polícia Civil, transmudando suas atividades para aquelas que são típicas de polícia judiciária.

Além do vício formal já detectado, por invasão de competência organizativa conferida à União, enxergo, igualmente, um aproveitamento ofensivo ao art. 37, II, da Carta Magna, de cargos que, na estrutura da Polícia Civil do Distrito Federal, não estão entre aqueles que já desempenham as funções de polícia judiciária previstas em lei (Delegado de Polícia, Médico-Legista, Perito Criminal, Escrivão de Polícia, Agente de Polícia e Datiloscopista Policial). Embora lamentável a existência de cargos pertencentes à Carreira Policial Civil do Distrito Federal desprovidos das funções de polícia judiciária, não serão subterfúgios dessa natureza que promoverão a compatibilização das normas federais sobre a matéria com os ditames impostos pela Constituição de 1988.

Por essa razão, alinhando-me aos doutos votos já proferidos, julgo, nesta parte, procedente o pedido formulado e declaro, com efeitos ex tunc, a inconstitucionalidade da íntegra do art. 13 da Lei 3.669, de 13.9.2005, do Distrito Federal.

É como voto.

 

* acórdão pendente de publicação

 

Inovações Legislativas

       15 a 19 de fevereiro de 2010

 

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ)

Processo Penal – Alienação de Bem – Antecipação

Recomendação nº 30/CNJ, de 10 de fevereiro de 2010 – Recomenda a alienação antecipada de bens apreendidos em procedimentos criminais e dá outras providências. Publicada no DOU de 18/2/2010, Seção 1, p. 124. Publicada também no DJE/CNJ de 18/2/2010, n. 31, p. 2.

 

Prazo Processual – Feriado Forense

Portaria nº 15/CNJ, de 10 de fevereiro de 2010 – Comunica que não haverá expediente no Conselho Nacional de Justiça nos dias 15 e 16 de fevereiro de 2010 e que o expediente no dia 17 de fevereiro de 2010 será das 14 às 19 horas. Publicada no DJE/CNJ de 17/2/2010, n. 30, p. 2.

 

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)

Processo – Distribuição – Sorteio – Prevenção – Sistema – Processo Eletrônico – Informática Jurídica

Emenda Regimental nº 38/STF, de 11 de fevereiro de 2010 – Altera a redação do caput do art. 66 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Publicada no DJE de 18/2/2010, n. 29, p. 1.

 

EMENDA REGIMENTAL Nº 38, DE 11 DE FEVEREIRO DE 2010

 

Altera a redação do caput do art. 66 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

 

O PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL faz editar a Emenda Regimental, aprovada pelos Senhores Membros da Corte em Sessão Administrativa realizada em 10 de fevereiro de 2010, nos termos do art. 361, inciso I, alínea “a”, do Regimento Interno.

 

Art. 1º O caput do art. 66 do Regimento Interno passa a vigorar com a seguinte redação:

 

“Art. 66. A distribuição será feita por sorteio ou prevenção, mediante sistema informatizado, acionado automaticamente, em cada classe de processo.”

 

Art. 2º Esta Emenda Regimental entra em vigor na data de sua publicação.

 

Ministro GILMAR MENDES

           

Presidente do Tribunal – Recesso Forense – Prazo Processual – Férias – Urgência – Habeas Corpus

Emenda Regimental nº 37/STF, de 11 de fevereiro de 2010 – Acrescenta § 4º ao art. 105 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Publicada no DJE de 18/2/2010, n. 29, p. 1.

 

EMENDA REGIMENTAL Nº 37, DE 11 DE FEVEREIRO DE 2010

 

Acrescenta § 4º ao art. 105 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

 

O PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL faz editar a Emenda Regimental, aprovada pelos Senhores Membros da Corte em Sessão Administrativa realizada em 10 de fevereiro de 2010, nos termos do art. 361, inciso I, alínea “a”, do Regimento Interno.

 

Art. 1º O art. 105 do Regimento Interno passa a vigorar acrescido do seguinte § 4º:

 

“§ 4º Ficam inalterados, durante os recessos forenses e as férias do Tribunal, os prazos determinados pela Presidência no exercício da competência prevista no art. 13, VIII, deste Regimento Interno.”

 

Art. 2º Esta Emenda Regimental entra em vigor na data de sua publicação.

 

Ministro GILMAR MENDES

 

Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos

informativo@stf.gov.br

 

Como citar e referenciar este artigo:
STF,. Informativo nº 575 do STF. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/informativos-de-jurisprudencia/stf-informativos-de-jurisprudencia/informativo-no-575-do-stf/ Acesso em: 04 dez. 2024
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Informativo nº 908 do STF

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