Apelação Cível. Mandado de Segurança Preventivo. Direito de crédito do ICMS. Lei estadual restritiva. Pedido de liminar para evitar a inscrição na dívida ativa. Carência de ação. Impossibilidade jurídica do perdido. Ilegitimidade ad causam.
Fernando Machado da Silva Lima*
EGRÉGIA XXXXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA
PROCESSO : N° XXXXXXXXX
APELAÇÃO CÍVEL
APELANTE: XXXXXXXX LTDA.
APELADO: ESTADO DO PARÁ
RELATORA : EXMA. DESA. XXXXXXXXXXXX
PROCURADORA DE JUSTIÇA : XXXXXXXXXXX
Ilustre Desembargadora Relatora :
Trata o presente do recurso de Apelação interposto por XXXXXXXXXXX Ltda., nos Autos do processo de Mandado de Segurança Preventivo, ajuizado contra ato em vias de ser praticado pelo Sr. Delegado Regional da Fazenda Estadual da XXª Região Fiscal.
Em síntese, os Autos informam que :
Em sua Exordial, de fls. 3 a 22, a Impetrante, ora Apelante, disse que industrializa e comercializa frutas tropicais, explorando, ainda, atividades agrícolas em geral. Disse que sempre procurou cumprir corretamente suas obrigações tributárias, mas foi surpreendida com a lavratura do auto de infração nº 3570, sob a alegação de crédito extemporâneo de ICMS relativo à correção monetária de saldo credor. Disse que impugnou tempestivamente a exigência, mas a decisão lhe foi desfavorável e que assim apresentou tempestivamente recurso voluntário. Disse que o recurso foi improvido, e que o débito se acha na iminência de ser inscrito na Dívida Ativa do Estado. Falou sobre o cabimento do Mandado de Segurança. Citou doutrina e jurisprudência. Transcreveu a Ementa do Acórdão administrativo nº 453, que lhe foi desfavorável. Disse que a necessidade de prévia anuência do Fisco afronta o princípio constitucional da não cumulatividade. Falou sobre esse princípio, transcrevendo normas constitucionais e doutrina. Disse que o direito de crédito do ICMS é constitucional. Disse que a Constituição fixou as únicas exceções ao princípio constitucional da não cumulatividade. Citou o art. 6o do CTN. Disse que o art. 45, II da Lei estadual nº 5530/89 não poderia condicionar, reduzir ou eliminar o direito de crédito do ICMS. Falou sobre a entrada de mercadorias consumidas no processo de industrialização e disse que tem direito a creditar-se do imposto relativo a essas entradas. Citou jurisprudência. Citou decisões de Secretarias de Fazenda. Citou doutrina a respeito de correção monetária. Disse que a proibição do lançamento dos créditos corrigidos monetariamente prejudica o contribuinte e causa uma indevida vantagem para o Estado, além de causar aumento de tributação sem lei autorizativa. Citou Parecer da Advocacia Geral da União e Acórdãos do STJ e do STF. Pediu a concessão da liminar. Juntou documentos (fls. 23 a 40).
A autoridade coatora, ora Apelada, apresentou informações, às fls. 44 – 79. Historiou os fatos. Disse que o crédito tributário discutido já foi inscrito na Dívida Ativa, em 29.05.98, e que já foi proposta, em 29.06.98, ação executiva contra o impetrante. Preliminarmente, alegou a carência de ação. Falou sobre a impossibilidade de dilação probatória e a impossibilidade jurídica do pedido. Citou doutrina e jurisprudência. Alegou a ilegitimidade passiva ad causam. Alegou a ausência de pressuposto processual. Citou jurisprudência. No mérito, alegou a inexistência de direito líquido e certo. Falou sobre a constitucionalidade do Convênio ICMS 66/88. Citou jurisprudência e doutrina. Citou o art. 31 do Convênio e o art. 45 da Lei Estadual 5530/89. Disse que o impetrante utilizou, portanto, créditos indevidos. Falou sobre o princípio da não-cumulatividade e seus limites. Citou doutrina. Disse que até a vigência da Lei Complementar 87/96, era adotado o regime do crédito físico, sendo posteriormente adotado o regime do crédito financeiro. Falou sobre a irretroatividade da Lei Complementar nº 87/96. Falou sobre a falta de previsão legal que permita o crédito da correção monetária. Citou jurisprudência. Citou diversas normas a respeito da necessidade de que o fisco concordasse com o lançamento do crédito extemporâneo. Disse que o contribuinte não apresentou a documentação comprobatória. Falou sobre a perda de objeto do Writ, porque o débito já está inscrito na Dívida Ativa.
O Ministério Público apresentou Parecer, às fls. 84- 85. Manifestou-se pela extinção do processo sem o julgamento do mérito.
O MM. Juiz a quo decidiu, às fls. 101 – 106. Relatou o processo. Disse que a demora do julgamento é de culpa exclusiva da própria impetrante. Disse que com a inscrição do débito na Dívida Ativa, ocorreu o perecimento do objeto. Disse que a defesa deve ser feita na via própria, dos embargos do executado. Decidiu pela extinção do processo sem o julgamento do mérito.
A Impetrante apelou (fls. 107 – 112). Disse que o pedido principal do processo se referia à garantia do direito líquido e certo da Impetrante ao crédito, mesmo que extemporâneo, dos valores do ICMS pagos na aquisição de produtos intermediários, matérias primas e correção monetária do saldo credor. Disse que a inscrição do débito na Dívida Ativa não impede a apreciação desse pedido. Disse que a demora na decisão se deveu ao Juízo a quo. Disse que o Mandamus é cabível, porque foi utilizado para impugnar abuso de poder e ato ilegal praticado por autoridades fiscais, e que a interposição de embargos ainda exigirá a garantia do juízo. Citou doutrina e jurisprudência. Prequestionou a violação do art. 38 da Lei 6830/80 e do art. 1o da Lei 1533/51. Pediu a reforma da Sentença, para que seja julgado o mérito da questão, nos termos da Inicial. Juntou documentos (fls. 113 – 121).
A Apelação foi recebida apenas no efeito devolutivo (fls. 122).
O Estado do Pará apresentou Contra-Razões, às fls. 123 – 142. Historiou os fatos. Disse que a decisão decorreu das mudanças ocorridas após a impetração do Mandamus. Disse que a Ação visava a anulação da inscrição na dívida ativa. Insistiu nas teses de carência de ação, impossibilidade de dilação probatória e impossibilidade jurídica do pedido. Transcreveu jurisprudência. Citou a Lei Complementar nº 87/96. Falou sobre a ilegitimidade passiva ad causam. Falou sobre a ausência de pressuposto processual. Pediu a confirmação da extinção do processo sem julgamento do mérito.
Distribuídos os Autos, vieram a esta Procuradoria de Justiça, para exame e parecer.
É o Relatório. Esta Procuradoria passa a opinar.
A Apelante alega que pediu o reconhecimento de seu direito líquido e certo ao crédito, mesmo que extemporâneo, dos valores do ICMS, e que esse pedido não foi examinado pelo MM. Juiz a quo. Disse, ainda, que o arquivamento do processo administrativo seria uma conseqüência, e não o pressuposto da análise do mérito da questão (fls. 109).
Na realidade, a Impetrante, ora Apelante, pediu em sua Exordial, liminarmente (fls. 21), que a autoridade fiscal se abstivesse da prática do ato coator consubstanciado na remessa à inscrição em dívida ativa de seu débito e pediu também a concessão em definitivo da segurança, para que fosse garantido seu direito líquido e certo ao crédito, mesmo que extemporâneo, dos valores do ICMS e determinando como conseqüência (fls. 22) o arquivamento do processo e o cancelamento do auto de infração.
Os pedidos são, evidentemente, indissociáveis, porque se o MM. Juiz decidisse, pelo exame do mérito, de modo favorável ao direito líquido e certo da impetrante, deveria determinar o arquivamento do processo e o cancelamento do auto de infração. Entender de forma contrária seria atribuir à concessão do Mandamus uma função meramente consultiva, de elucidação de dúvidas doutrinárias, ou entender que essa Ordem poderia ter, meramente, efeitos declaratórios.
No entendimento desta Procuradoria, não ocorreu a violação das normas legais indicadas, conforme preqüestionado pela Apelante.
Mereceriam prosperar as preliminares alegadas pela Apelada, pela impossibilidade de dilação probatória em sede de Mandado de Segurança e pela impossibilidade jurídica do pedido. A matéria discutida, por sua complexidade, requer dilação probatória, pertinente ao direito da impetrante à apropriação dos créditos decorrentes das aquisições de mercadorias e produtos que não integram a composição dos custos do produto final do contribuinte. O exame do caso concreto, para a verificação do direito da impetrante, em face do princípio constitucional da não cumulatividade e de suas limitações legais, não pode ser feito em sede de mandamus, pela impossibilidade de dilação probatória. A empresa Impetrante, ora Apelante, na realidade, não apresentou provas de suas alegações, não tendo conseguido provar, conseqüentemente, a existência do pretenso direito líquido e certo.
Esta Procuradoria não nega a possibilidade de que a Impetrante, ora Apelante, tenha direito ao crédito pretendido, mas tão somente que esse direito se apresente, nos presentes Autos, sob a forma de direito líquido e certo, para que possa caber a concessão do remédio heróico do Mandado de Segurança contra o ato apontado como ilegal, e praticado pela autoridade fiscal com abuso de poder.
A via mandamental não pode ser utilizada para desconstituir a dívida objeto de execução fiscal, ficando assim evidente a perda de objeto da presente ação, que pretendia impedir a inscrição do débito da Apelante na Dívida Ativa. Somente através dos Embargos à Execução poderão ser apresentadas todas as provas cabíveis, para que o contribuinte possa fazer valer o direito que alega possuir.
Não merece qualquer reparo, portanto, o r. Decisum a quo, no sentido de que a presente ação mandamental perdeu o seu objeto, em decorrência da inscrição do débito na dívida ativa, e do ajuizamento da competente execução fiscal, devendo conseqüentemente, ser extinta sem o julgamento do mérito, pela falta de interesse processual, de acordo com as disposições do art. 267, VI, do Código de Processo Civil.
Ex positis, esta Procuradoria de Justiça, considerando o exame de todos os elementos do Presente, se manifesta pelo conhecimento, e no mérito, pela improcedência do pedido da Apelante, para que seja integralmente mantida a r. Sentença a quo, por seus próprios fundamentos.
É O PARECER.
Belém, janeiro de 2.001.
* Professor de Direito Constitucional da Unama
Home page: www.profpito.com
Compare preços de Dicionários Jurídicos, Manuais de Direito e Livros de Direito.