Reexame de Sentença. Mandado de Segurança. Personalidade jurídica. Ilegitimidade ad causam.
Fernando Machado da Silva Lima*
EGRÉGIA XXXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA
PROCESSO : XXXXXX
RECURSO: REEXAME DE SENTENÇA
SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA XX VARA DA COMARCA DE MOJU
SENTENCIADO: XXXXXXX
SENTENCIADO: XXXXXXXXX
SENTENCIADO: XXXXXXX
RELATORA: EXMA. DESA. XXXXXXXXX
PROCURADORA DE JUSTIÇA: XXXXXXXXXXXX
Ilustre Desembargadora Relatora:
Tratam os presentes autos do mandado de segurança impetrado pelo CLUBE XXXXXXXX, contra ato do Sr. Prefeito do Município de XXXXXX e do Delegado de Polícia Civil, Dr. XXXXXXXXX
Em síntese, os autos informam que:
1 – O Clube XXXXXXX impetrou mandado de segurança contra ato da Prefeitura do Município de XXXXXX e do Delegado de Polícia Civil da mesma comuna, que determinou o seu fechamento com base nos incisos I e V do artigo 63 da Lei Municipal nº 024/93 (Código de Postura Municipal). Alega o Impetrante que as autoridades referidas agiram de forma ilegal, violando seu direito, haja vista que o mesmo desenvolve suas atividades desde o ano de 1990, sempre cumprindo as determinações do salientado código, nunca recebendo qualquer tipo de advertência. Pede a concessão de liminar.
2 – A MMa. Juíza de Direito da Comarca do Município de XXXXXX/Pa, Dra. XXXXXXXXXXXXX, indeferiu o pedido de liminar, em razão do não preenchimento dos requisitos inseridos no inciso II, do artigo 7º da Lei nº 1. 533/51.
3 – A Prefeitura Municipal de XXXXXXX, às fls. 17, prestou as informações solicitadas pelo Juízo. Levantou a preliminar de ilegitimidade ad causam ativa do Impetrante, por entender que o mesmo não preenche os requisitos necessários para ser caracterizado como uma pessoa jurídica. Argumenta outrossim a ausência de conflito de interesses, em razão do impetrante não ter recorrido, inicialmente, à via administrativa. Em relação ao mérito, afirma que agiu dentro da lei, acobertada pelo princípio do poder de polícia administrativa, motivo pelo qual sustenta a inexistência de direito líquido e certo por parte do Impetrante.
4 – O Ilustre Promotor de Justiça da Comarca de XXXXXXX, Dr. XXXXXXXX, manifestou-se pela extinção do processo, sem julgamento do mérito, sustentando a carência da ação, em decorrência da ilegitimidade ad causam ativa, bem como pela falta de legitimidade ad processum.
5 – Às fls. 59, a MM. Julgadora acolheu a preliminar de ilegitimidade ad causam ativa, extinguindo o processo, sem o julgamento do mérito, com fulcro no inciso IV, do artigo 267, do Código de Processo Civil.
6 – Conforme Certidão inserida às fls. 65, não houve interposição de recurso.
É o relatório. Esta Procuradoria passa a opinar:
Primeiramente, achamos por bem recorrer aos elucidativos estudos da eminente professora de Direito Civil da PUCSP, Maria Helena Diniz que, acerca do começo da existência legal da pessoa jurídica de direito privado, assim se manifesta:
O processo genérico da pessoa jurídica de direito privado apresenta duas fases: 1) a do ato constitutivo, que deve ser escrito, e 2) a do registro público.
Na primeira fase tem-se a constituição da pessoa jurídica por ato jurídico unilateral inter vivos ou causa mortis nas fundações e por ato jurídico bilateral ou plurilateral inter vivos nas associações e sociedades. Há uma manifestação de vontade, para cuja validade devem ser observados os requisitos de eficácia dos negócios jurídicos. Segundo o disposto no art. 82 do Código Civil, para que o ato jurídico seja perfeito é imprescindível: agente capaz (CC, arts. 5º e 6º); objeto lícito, de modo que seriam nulas as sociedades que tivessem por objeto a fabricação de moedas falsas, e forma prescrita em lei, logo, devem ser contratadas por escrito e, se for o caso, obter prévia autorização governamental para funcionarem.
A segunda fase configura-se no registro (CC, art. 16, § 1º), pois para que a pessoa jurídica de direito privado exista legalmente é necessário inscrever os contratos, estatutos ou compromissos no seu registro peculiar, regulado por lei especial; o mesmo deve fazer quando conseguir a imprescindível autorização governamental (CC, arts. 18 e 19; Lei nº 6.015/73, arts. 114 a 121, com alteração da Lei nº 9. 042/95; Lei nº 8.934/94, regulamentada pela Dec. nº 1. 800/96)
Percebe-se destarte que o Impetrante CLUBE XXXXXXXX, pelo menos no âmbito destes autos, não demonstrou sua existência legal, como pessoa jurídica, na forma como foi acima comentada. O alvará de funcionamento, expedido pela Secretaria de Segurança Pública, não é instrumento idôneo para constituir uma pessoa jurídica de direito privado.
Pois bem, em razão disso, outra questão precisa ser ventilada, qual seja, a ilegitimidade ad processum do Impetrante. Tal legitimidade configura-se como um pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo. Só a pessoa jurídica devidamente registrada, possui capacidade de gozo, que para o processual civil, denomina-se capacidade de ser parte. Certo também que não se pode aplicar ao caso, o disposto no inciso VII, do art. 12 do CPC, pois não existem elementos nos autos, que demonstrem que o CLUBE XXXXXXXXXX seja uma sociedade de fato, e que o Sr. XXXXXXXXXXXX seja o responsável pela administração dos seus bens, ou, na falta destes, seu administrador de fato. Sobre a capacidade de ser parte, ensina o professor Moacyr Amaral Santos:
“Todo homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil” (Cod. Civil, art. 2º). Trata-se de capacidade jurídica, ou capacidade de gozo, regulada pelo direito civil. Assim, todo homem é capaz de direitos e deveres processuais, isto é, de ser sujeito da relação processual, e, pois, tem capacidade de ser parte. Têm-na, também, as pessoas jurídicas, pois, também dotadas de capacidade jurídica. (Moacyr Amaral Santos – Primeiras Linhas de Direito Processual Civil).
A capacidade de gozo, para as pessoas naturais, inicia-se com o nascimento com vida, sendo que antes o que existe é apenas uma expectativa de direito para o nascituro. Para as pessoas jurídicas tal capacidade para contrair direitos e obrigações começa com o registro do seu estatuto ou contrato. Caso isso não ocorra, a mesma não adquirirá personalidade jurídica, não podendo ser parte, quer como autora, quer como ré, em nenhum processo, salvo no caso de sociedade despersonalizada, como foi aludido. Dessa forma, o CLUBE XXXXXXXXXXXXX não possui capacidade de ser autor da ação mandamental, em razão de não possuir personalidade jurídica, motivo pelo qual deve ser extinto o processo, sem julgamento do mérito, com fulcro no inciso IV, do art. 267 do CPC, ante a ausência do pressuposto processual denominado de legitimidade ad processum pertinente à capacidade de ser parte, ou de gozo.
Ex positis, este Órgão Ministerial manifesta-se pela manutenção integral da sentença.
É O PARECER.
Belém, janeiro de 2000
* Professor de Direito Constitucional da Unama
Home page: www.profpito.com
Compare preços de Dicionários Jurídicos, Manuais de Direito e Livros de Direito.