Volto ao tema do livro de Olavo de Carvalho sobre Maquiavel (Maquiavel ou a Confusão Demoníaca, Vide Editorial, Campinas, 2011) porque o tema é muito
importante e porque o autor conseguiu, com o livro, elevar-se a um patamar em que estão Leo Strauss e Eric Voegelin. A chave para compreender a obra
está precisamente no subtítulo: a confusão demoníaca. O legado monstruoso de Maquiavel se estende desde que escreveu e foi um dos autores fundamentais
a fundar a modernidade.
Olavo de Carvalho lançou mais luz sobre a ciência política ao mostrar a alma aleijada que foi o florentino, uma aberração moral e um oportunista sem
sucesso. É incrível como a modernidade vai lhe dar crédito. Todos os jacobinos candidatos a novos príncipes o exaltaram, bem como seus intelectuais
acólitos. Sem a Reforma Maquiavel não teria sido mais do que uma curiosidade na história da ciência política. Entendo que a Reforma cristalizou a
rebelião contra Deus e abriu as portas para que os Estados nacionais passassem a encarnar a própria divindade e a sua lei adquirisse a pretensão de
vontade divina.
Os filhos mais diletos do florentino estão no século XX, tempo maldito. Lênin é seu discípulo, assim Hitler e todos os totalitários. Maquiavel
desdenhou da obrigação moral daqueles que chegam ao poder. O elo entre moral e poder foi descoberto por Platão e aos governantes nunca foi permitido
ignorá-lo. Maquiavel achou que dizia novidade ao proclamar a autonomia do príncipe em relação à transcendência. É apenas a subversão contra Deus na sua
dimensão mundana. A Reforma encarregou-se do resto.
O capítulo 10 do livro de Olavo de Carvalho (Inversão Paródica do Cristianismo) é bem didático ao percorrer as cambalhotas do florentino quando
pretende alavancar o pensamento da Igreja para justificar seu amoralismo. Maquiavel não passa de um anticristão bastante consciente de sua deficiência
moral. Ele foi assim o profeta dos novos tempos modernos, com seus horrores e suas subversões. O livro do Olavo de Carvalho foi muito feliz na
apresentação desse Maquiavel amaldiçoado.
* José Nivaldo Cordeiro, Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias
coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor
da ANL – Associação Nacional de Livrarias.