Visão Liberal

A verdadeira questão da corrupção

Qualquer estudioso mediano de ciência política sabe que a corrupção é inerente ao exercício do poder e dele não pode ser separada. A corrupção não pode ser extirpada. Qualquer burocrata saberá sempre traduzir seu poder em mercadoria. Uma leitura atenta do que Ortega y Gasset escreveu sobre Mirabeau vai ensinar que é assim, sempre foi assim.

Bem outra coisa é haver tolerância com a corrupção. Quando ocorre isso perde-se o controle e o Estado deixa de exercer suas funções, passando, cada grupo de poder no seu interior, a atuar como facção autônoma, impedindo a funcionalidade do sistema. Nenhum Estado sobrevive se a corrupção ocorrer sem repressão e sem custos. Na raiz, está o sistema jurídico, que codifica e administra a Justiça.

A bandeira de eliminação completa da corrupção é coisa de fariseu ideologicamente tapado, perfectibilista alienado do mundo. Isso não significa a afirmação da recíproca, ou seja, a de que se seja conivente com a corrupção. Ela precisa ser combatida até onde for possível, mas nunca com a veleidade de extirpa-la, própria dos idealistas. Pensar assim é puro realismo político.

O que o PT fez ao assumir o poder, em 2002, foi ampliar a corrupção vertical, ao envolver as maiores autoridades nas operações corruptas, e também na horizontal, permitindo que escalões médios e inferiores fossem “tocados” sob a lógica de fazer caixa ilicitamente. A corrupção nunca foi tão endêmica no Brasil. Sistemas corruptos  como o mensalão e o petrolão são formas de tributação privada instituída pelos detentores do poder.

O ponto positivo é que a lei ainda vale e, diante de provas, a polícia e a Justiça precisam fazer a sua parte. E a têm feito. No processo do mensalão já havia ficado claro que o sistema jurídico não poderia ser derrogado por vontade do Poder Executivo e, mesmo, do Judiciário. Muitos réus foram condenados, alguns a penas de até 40 anos de prisão. A mão impiedosa do Estado desabou sobre os criminosos.

Se é verdade que o grupo político do mensalão teve penas mais leves, isso não diminui a realidade da dureza da lei. Eles receberam penas proporcionais às provas apresentadas. Mais não receberam porque não havia nada a sustentar essa ampliação. O caso de João Paulo Cunha, antigo presidente da Câmara de Deputados, é exemplar. Uma única prova – o cheque sacado de míseros R$ 50 mil  – serviu para que recebesse a pena prevista em lei.

Com o petrolão deverá acontecer a mesma coisa, com uma diferença: o juiz Sergio Moro está conduzindo de forma cuidadosa e técnica cada um dos processos, separando quem tem e quem não tem foro privilegiado. Quem não tem foro privilegiado terá, em breve, uma sentença de primeira instância. A chance da gangue dos empreiteiros ficar por décadas em cana é real. Os que estão com prisão preventiva decretada podem não sair da cadeia antes do julgamento. Quem não se beneficiou da delação premiada praticamente terminará seus dias na cadeia, em face do fato de que quase todos estão acima dos cinquenta anos de idade.

Um Executivo irresponsável criou a própria armadilha para seus agentes, ao permitir o liberou geral. Os petistas escorregaram em sua própria casca de banana. Eles se esqueceram da inexorabilidade da lei. Nenhum tribunal normal deixará de sentenciar os réus de acordo com as provas. Para os membros do PT terem uma pena diferenciada ou mesmo perdoada só mediante uma justiça revolucionária, que eles não têm força para implantar. Enquanto houver Estado de direito corruptos serão enjaulados. Enquanto houver imprensa livre as falcatruas virão a público.

O único antídoto contra a corrupção é a certeza de que, se for apanhada, a pessoa cumprirá a pena. Petistas e empreiteiros se comportaram como se estivessem acima da lei.

www.nivaldocordeiro.net – 11/02/2015

Como citar e referenciar este artigo:
CORDEIRO, Nivaldo. A verdadeira questão da corrupção. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2015. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/visao-liberal/a-verdadeira-questao-da-corrupcao/ Acesso em: 22 nov. 2024
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