A ENCICLOPÉDIA JURÍDICA LEIB SOIBELMAN informa sobre a expressão férias:
(dir. trb.)
Período em que o trabalhador repousa de suas atividades normais.
Como se sabe, cada membro do Judiciário tem direito, atualmente, a 60 dias de férias.
Não irei apresentar nenhum quadro comparativo com as demais profissões, para não melindrar ninguém. Proponho-me apenas analisar a situação específica do Judiciário.
1) A complexidade do trabalho.
O trabalho dos juízes não é puramente burocrático, mecânico, automatizado, reduzível ao bater de alguns carimbos. Realmente, são pouquíssimos os processos em que a solução é simples, imediata. A imensa maioria dos casos exige estudo sobre as questões de fato e questões de Direito, que, como todo mundo sabe, são a análise das provas produzidas nos autos e do Direito aplicável.
Nem sempre é fácil a análise das questões de fato, devido, muitas vezes, à intenção condenável das partes de encobrir ou desacreditar provas produzidas pela parte contrária e destacar, ou até forjar, provas que lhe interessam.
Não pretendo dizer que todas as partes agem de forma desonesta, mas é verdade que muitas pessoas assim o fazem, o que dificulta imensamente o trabalho dos juízes de descobrir a verdade.
Também nem sempre é fácil a análise das questões de Direito. Num país como o nosso, em que o número de leis se conta às dezenas de milhares, o seu conhecimento não é tão imediato, inclusive pelas mudanças legislativas muito freqüentes… Isso sem contar a multiplicidade de interpretações jurisprudenciais…
Outro fator que dificulta o trabalho dos juízes é a tendência que muitos operadores do Direito (juízes, advogados etc.) ainda mantêm de incapacidade de sintetizar, dizer resumidamente, preferindo as exposições fastidiosas, prolixas, às vezes repetitivas…
Também se deve considerar a insuficiência de recursos materiais e humanos.
2) O elevado número de processos.
O número cada vez mais elevado de demandas torna estafante o trabalho dos juízes. Mesmo utilizando os recursos atuais da Informática (que ainda são insatisfatórios), há muita coisa que ainda depende dos meios tradicionais de trabalho, como a leitura do inteiro teor do processo na hora de prolação de sentenças e a demorada oitiva de testemunhas.
Apesar de todos os esforços e investimentos, não conseguimos sequer frear o aumento do número de feitos, quanto mais reduzi-lo…
3) O clima estressante do trabalho.
Nosso trabalho não é suave, onde aqueles que nos procuram vêm sempre à procura de soluções pacíficas e pacificadoras Se há muitos que recorrem à Justiça querendo a Paz, há muitos que querem guerrear contra seus desafetos. É expressivo o número de demandas em que a adrenalina das partes está no mais alto grau e grande o número de pessoas que almejam vantagens imerecidas, querendo utilizar a própria Justiça como meio de lesarem terceiros…
Muitos descarregam seu stress em cima dos juízes ou estressam-nos na análise de suas pretensões injustas, a ponto de, se não nos preservarmos contra esses destemperos, acabamos entrando no clima de verdadeira alucinação desses processos.
Mal suportando a sobrecarga de esforço mental e tensão emocional, muitos juízes chegam a fazer uso permanente de tranqüilizantes e medicamentos para dormir como ferramentas de apoio para suportar o dia-a-dia da profissão.
Em conclusão: se os juízes tiverem suas férias reduzidas para 30 dias (como pretendem alguns afoitos, revoltados ou inconseqüentes), não teremos condições de nos refazer do desgaste do dia-a-dia e, dentro de pouco tempo, muitos de nós estarão aposentados por invalidez com problemas cardíacos, hipertensão arterial, distúrbios do sistema nervoso etc. Então, ao invés de aumentarmos a produção e melhor atendermos os jurisdicionados, teremos exatamente o contrário, com os poucos sadios trabalhando no lugar dos inúmeros inválidos e valetudinários…
* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).