SUMÁRIO
1. ANÁLISE HISTÓRICA – DIREITO DE EMPRESA
a. Fase subjetiva
b. Fase objetiva – teoria dos atos de comércio
c. Fase objetiva moderna ou empresarial
d. Direito comercial no Brasil
2. CONCEITO DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA
a. Sociedades Não Personificadas
b. Sociedades Personificadas:
3. DAS SOCIEDADES PERSONIFICADAS
a. Sociedade em nome coletivo
b. Sociedade em comandita
b.1 Simples
b.2 Por ações
c. Sociedade Anônima
d. Sociedade Limitada
e. Da Sociedade Unipessoal (Lei da Liberdade Econômica)
4. DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – DA RESPONSABILIZAÇÃO DOS SÓCIOS PELAS OBRIGAÇÕES SOCIETÁRIAS COM O PATRIMÔNIO PESSOAL
a. Da Responsabilidade Civil nas relações regidas pelo Código Civil
b. Responsabilidade civil nas relações consumeristas
c. Responsabilidade dos sócios nas relações trabalhistas
d. Responsabilidade dos sócios pelas dívidas tributárias
e. Responsabilidade dos sócios retirantes por alienação da sociedade ou por alienação de suas quotas
f. Responsabilidade civil oriundas de práticas criminosas
f.1 Lei Antitruste (Lei 8.884/94).
f.2 Lei de Crimes Ambientais de 9.605/98
f.3 Lei Anticorrupção – 12.843/2013
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Análise Histórica – Direito De Empresa
a. Fase subjetiva
Surge na idade média, quando mercadores se desvencilham do Direito Civil, criando suas próprias regras mercantis, pautadas em USOS e COSTUMES especiais. Destas regras especiais surge o Direito Comercial.
Os comerciantes (senhores burgueses – aqueles que habitavam os burgos – cidades – e se ocupavam em acumular riquezas de capital), passaram a financiar os monarcas da época, que, em contrapartida, passaram a regular, através de leis especiais, as atividades mercantis. Daí, surgem os Estados Modernos. Isso porque, repita-se, o Direito Civil existente na época, era insuficiente para regular estas relações (comerciais), que em muitas vezes, ultrapassavam as fronteiras dos Estados.
É neste contexto que surgem os direitos consuetudinário e internacional, uma vez que, quem atuava no ramo mercantil deveria obedecer a tais regras, que nem sempre (ou quase nunca), estavam escritas.
Chama-se esta fase de FASE OBJETIVA, porque COMERCIANTE era aquele que se matriculava na CORPORAÇÃO DE OFÍCIO.
b. Fase objetiva – teoria dos atos de comércio
Marcaram esta fase a Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) e o Império Napoleônico. Isso porque esta fase não se coadunava com a fase de privilégios de uma classe que estava “matriculado” nas corporações de ofício.
Face a este embate (o de não privilegiar classe em razão de uma matrícula), mas de tratar a todos com a máxima aristotélica, surge o primeiro “Código Comercial”, que foi promulgado pelo então grande imperador do velho continente (Napoleão Bonaparte). Tal código retira os privilégios dos “MATRICULADOS” e os dá a quem efetivamente exerce a atividade comercial – por isso, fase objetiva, também chamada de FASE DA TEORIA DOS ATOS DE COMÉRCIO. É nesta fase que o OLIGOPÓLIO sucumbe.
c. Fase objetiva moderna ou empresarial
Em 1942, na Itália, a proteção do direito comercial deixa de recair sobre OS ATOS DE COMÉRCIO e passa a recair sobre A EMPRESA, surgindo, assim, a TEORIA DA EMPRESA.
Esta teoria tem como expoente o italiano Alberto Asquine, e visava proteger superar a VINCULAÇÃO ENTRE SUJEITO E OBJETO do Direito Empresarial, pois dizia que ERA POSSÍVEL O OBJETO (empresa), SOBREVIVESSE INDEPENDENTEMENTE DO DESTINO DO SUJEITO (empresário). Para este autor, a proteção do Direito Comercial deveria recair sobre a empresa (que era definida como: a atividade empresarial, com fins lucrativos, organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços).
Nesta fase, o que se deve preservar é a empresa, pois esta é um importante instrumento de desenvolvimento do Estado. Também é chamada de fase subjetiva, mas acrescentada da expressão MODERNA, porque nela também se se regula a atividade (a empresa), mas incide sobre o empresário.
Isso passa a ser contrário ao que se pregava na revolução francesa, pois nesta se evitava privilegiar classes, mas aqui há um motivo relevante para isso (a subsistência do próprio Estado). Isto não trouxe de volta o privilégio de poucos sobre muitos (próprio do oligopólio), mas por razões de crescimento estatal e expansão comercial.
d. Direito comercial no Brasil
A Carta Régia de 1808, que determinou a abertura dos portos no Brasil para o comércio com outras Nações (embora esta abertura fática era apenas para os ingleses, que dominavam os mares), deu início ao Direito Comercial Brasileiro.
Com a independência do Brasil em 7 de setembro de 1822, passou-se a adotar as legislações Portuguesas para regência do Direito Comercial Brasileiro. Esta, por sua vez, adotava a legislação das Nações “Iluminadas”, ou seja, a Espanhola e a Francesa (Código Comercial Francês), além da “Lei da Boa Razão”, que era, no que se pode comparar hoje, a aplicação de regras da Boa Fé Objetiva.
Mas, após se verificar que tamanha legislação dispersa não atendia aos anseios nacionais, começou-se a discutir sobre uma lei nacional própria que regulasse as atividades comerciais. Daí, em 1850, mais precisamente em 1º de julho, foi promulgado O Código Comercial.
Este Código acolhia a Teoria dos Atos de Comércio, mas de forma IMPLÍCITA vez que, em um regulamente (737/1850), trazia uma relação de atividades que se sujeitavam ao tribunal comercial. Assim, passa-se a proteger e regular as atividades dispostas na relação pré-estabelecidas, como consideradas comerciais, não sobre os sujeitos que as desenvolviam.
Esta teoria (TEORIA DOS ATOS DE COMÉRCIO), vigorou no Brasil até o Código Civil de 2002, quando (tardiamente), adotou-se no direito pátrio a TEORIA DA EMPRESA de origem, diga-se de passagem, Italiana.
Nesta, a empresa tem perfis: subjetivo (interesse pessoal no desenvolvimento de uma atividade econômica que gere lucro e riqueza), objetivo (ou patrimonial, pois uma atividade empresária, com seus lucros, acostará bens e riquezas, possuindo-as de forma autônoma e que acumularão bens hábeis ao desenvolvimento de suas atividades), corporativa (uma vez que pessoas se reunirão com objetivos comuns (corporativismo), no intuito de gerarem riquezas que serão partilhadas ao corpo gerador), e funcional (que apresentará a atividade em si como fonte propulsora de movimentação de riquezas e renda).
O professor Fabio Ulhoa Coelho diz que a teoria da empresa, apesar de não se coadunar com o Estado hodierno, não pode ser desprezada, pois é a mais moderna evolução do Direito Comercial, uma vez que se desvencilhou das noções de um direito exclusivo de comerciantes e se desfez das amarras da teoria dos atos de comércio.
2. Conceito de Sociedade Empresária
É a reunião de pessoas que tem como objetivo exercer profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, visando o lucro, que deve ser compartilhado.
Agora é bom frisar que eu nem toda sociedade é uma empresa, da mesma forma que nem todas as empresas são sociedades. E atualmente, nem toda a sociedade é composta por mais de uma pessoa, face a existência da Sociedade Unipessoal.
Quando falamos do tema “responsabilidade dos sócios”, as sociedades empresarias se dividem em:
a. Sociedades Não Personificadas:
a.1 Sociedade Comum, também conhecida como Sociedade Irregular
Nesta face a irregularidade do registro, os sócios respondem ilimitadamente pelas obrigações.
a.2 Sociedade em Conta de Participação
Neste tipo societário, apesar de não se exigir o registro, parte dos sócios não responderão pelas obrigações assumidas pela sociedade.
Assim, temos duas espécies de sócios:
I – O Sócio oculto (ou participante), que só responde conforme contrato que detém com a outra espécie de sócio deste tipo societário.
II – O Sócio Ostensivo, que responde ilimitadamente pelas obrigações assumidas pela sociedade.
Os negócios são realizados, apenas, em nome do primeiro, que atua empresário individual ou sociedade empresária, e, sobre o qual recai a responsabilidade ilimitada pelas obrigações assumidas. O sócio oculto ou participante não aparece perante terceiros, respondendo, apenas, perante o sócio ostensivo, conforme previsto em contrato.
Desta forma, na conta de participação o tipo societário se caracteriza pela existência de um sócio ostensivo, que em seu próprio nome desenvolve as atividades sociais, se valendo das contribuições que os sócios participantes fazem para a formação dos fundos sociais. Estes, por conta das contribuições que fizeram ao desenvolvimento do objeto social, têm por direito a uma participação nos resultados.
É importante frisar que, ao iniciar as atividades sem o registro, os sócios ficam sujeitos a responsabilização de seus atos. Assim, de primeira mão o credor executará os bens pertinentes a sociedade. Caso não obtenha êxito, vai para os bens dos sócios de forma subsidiaria, mas, nesta espécie de sociedade, só o ostensivo responderá.
a.3 Do Microempreendedor Individual
Uma questão relevante, quando se fala em Personalidade Jurídica, diz respeito ao Microempreendedor Individual, o famoso MEI. É este Pessoa Jurídica de Direito Privado? Se não, por que possui CNPJ, para fins de Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ)?
Ora, estas perguntas são relevantes face aos erros que se cometem quando há litígio envolvendo um microempreendedor em juízo. Este, por vezes, é tratado como Pessoa Jurídica pelas partes (e até pelo juízo), o que não é.
Uma simples leitura do artigo 44 do Código Civil, assim nos leva a entender:
Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
I – as associações;
II – as sociedades;
III – as fundações.
IV – as organizações religiosas;
V – os partidos políticos.
VI – as empresas individuais de responsabilidade limitada.
Ora, onde está o microempreendedor individual neste rol? Não está. Assim, o MEI não é pessoa jurídica de direito privado por falta de previsão legal.
Aliás, para quem quer atuar como pessoa jurídica mas não quer ter sócio(s), já havia a previsão da EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada), no inciso VI do aludido artigo 44 do Código Civil Brasileiro. Porém, tal sociedade personificada tem seus óbices e limites, uma vez que impõe condições que muitas vezes se torna inviável sua criação.
Hoje, com a Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019), há, conforme se verificará no tema “Sociedades Personificadas”, a chamada Sociedade Unipessoal.
Com isso, as exigências que se faz para a abertura de uma EIRELI, que muitas vezes se torna inviável a sua criação, não são requisitos da Sociedade Unipessoal, o que, caso alguém queira atuar sozinho como empresário e ter seu patrimônio pessoal protegido, e não dispor das condições exigidas na EIRELI, poderá criar uma Sociedade Unipessoal.
Portanto, o MEI não é pessoa jurídica de direito privado, atuando o “empresário” como pessoa física no mercado, sendo sua inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, mera condição administrativa para recolhimento de impostos e outras vantagens que, caso atuasse sem cadastro, não possuiria.
b. Sociedades Personificadas:
b.1 Sociedade em Nome Coletivo;
b.2 Sociedade em Comandita Simples;
b.3 Sociedade Anônima;
b.4 Sociedade Limitada;
b.5 Comandita por Ações;
b.6 Sociedade Unipessoal
3. Das Sociedades Personificadas
a. Sociedade em nome coletivo
Somente pessoas físicas podem tomar parte na sociedade em nome coletivo, respondendo todos os sócios, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais. Mas podem os sócios, sem prejuízo da responsabilidade perante terceiros, no ato constitutivo ou por unânime convenção posterior, limitar entre si a responsabilidade de cada um.
b. Sociedade em comandita
É um tipo societário onde duas ou mais pessoas (sendo ao menos uma comerciante), se associam para fins comerciais, obrigando-se uns como sócios responsáveis solidária e ilimitadamente e outros como prestadores de capital. Quando isso acontece, tem-se então uma sociedade de natureza “em comandita”.
b.1 Simples
Neste tipo societário, tomam parte sócios de duas categorias:
1. os comanditados, pessoas físicas, responsáveis solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais; e
2. os comanditários, obrigados somente pelo valor de sua quota.
É no Contrato que está discriminado os comanditados e os comanditários.
b.2 Por Ações
Historicamente, pode-se dizer que a sociedade em comandita por ações surgiu fundada na necessidade de tornar limitada a responsabilidade de alguns sócios. Ao lado da sociedade anônima, a sociedade em comandita por ações é um dos dois tipos de sociedade por ações admitidos no direito brasileiro.
Sua Origem, no entanto, se deu em virtude da proibição do art. 37 do Código de Comércio de se constituírem sociedades anônimas sem a já mencionada autorização governamental. Assim, para facilitar a formação de sociedades em que vários sócios poderiam ostentar a posição de acionistas, o art. 38 do mesmo código permitiu que nas sociedades em comandita os sócios comanditários pudessem dividir o seu capital em ações, mas, obedecendo ao regime das sociedades anônimas. Nos dias atuais, o Código de Sociedades francês (Lei nº 66-537/1966) manteve-a.
Somente em 1882, com a edição da Lei nº 3.150, que tratava das sociedades anônimas, foi permitido à divisão em ações o capital dos sócios comanditários. Adotou-se, então, o modelo de sociedades em comandita por ações criadas pelo direito francês.
Atualmente, contrariando boa parte da doutrina que prega a extinção desse tipo de estrutura societária, dado o seu desuso, o direito brasileiro manteve o tratamento dado às sociedades em comandita por ações. Em todo o território nacional não existem mais que dez sociedades em comandita por ações ainda em atividade.
Poderíamos dizer que a Sociedade em comandita por ações, é aquela em que o capital social é dividido em ações, sendo que os acionistas respondem apenas pelo valor delas subscritas ou adquiridas, mas tendo os administradores (diretores), responsabilidade subsidiária, ilimitada e solidária, em razão das obrigações sociais.
A representação da sociedade se dá pelos diretores, que deverão ser necessariamente acionistas. O diretor é nomeado por tempo indeterminado no ato constitutivo e a sua responsabilidade é subsidiária e ilimitada frente às obrigações da sociedade. A sociedade em comandita por ações tem o capital dividido em ações, regendo-se pelas normas relativas à sociedade anônima, sem prejuízo das normas especificadas no Código Civil, e opera sob firma ou denominação.
Desta forma, Sociedade em comandita por ações é aquela em que o capital, tal como nas sociedades anônimas, se divide em ações, respondendo os acionistas apenas pelo preço das ações subscritas ou adquiridas, assumindo os diretores responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações sociais”
A sociedade em comandita por ações rege-se pela lei 6.404/76, especificamente nos artigos 280 e 284, e também no código civil de 2002. Este tipo de sociedade, opera por firma ou denominação, a responsabilidade é do diretor de forma ilimitada e subsidiariamente, conforme o art. 1091, CC/02, in verbis:
“Somente o acionista tem qualidade para administrar a sociedade e, como diretor, responde subsidiária e ilimitadamente pelas obrigações da sociedade”.
No caso de existirem mais de um diretor, todos responderão de forma solidária e ilimitada. O diretor destituído ou exonerado continua, durante dois anos, responsável pelas obrigações sociais contraídas sob sua administração, conforme estabelece o artigo 1.091 § 3, CC/02.
c. Sociedade Anônima
A Sociedade Anônima, também chamada de companhia ou sociedade por ações, é nome dado a uma empresa com fins lucrativos que tem seu capital dividido em ações e a responsabilidade de seus sócios (acionistas) limitada ao preço da emissão das ações subscritas (lançadas para aumento de capital) ou adquiridas. Os sócios são chamados de acionistas e têm responsabilidade limitada ao preço das ações adquiridas.
d. Sociedade Limitada
Como o próprio nome diz a ideia principal relacionada à sociedade limitada é a limitação da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais, vale dizer, os sócios não respondem com seus patrimônios pessoais pelas dívidas da sociedade, em regra.
O Código Civil, no artigo 1.052 assim determina:
Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.
Pelo que se denota da leitura do artigo, a regra geral quanto às sociedades limitadas é a da não responsabilização pessoal dos sócios pelas dívidas da sociedade. Ou seja, a sociedade empresária é a responsável por suas obrigações, e os sócios, em princípio, têm seu patrimônio pessoal protegido pela limitação da responsabilidade.
Na lição de Fábio Ulhoa Coelho:
A personalização da sociedade limitada implica a separação patrimonial entre a pessoa jurídica e seus membros. Sócio e sociedade são sujeitos distintos, com seus próprios direitos e deveres. As obrigações de um, portanto, não se podem imputar ao outro. Desse modo, a regra é a da irresponsabilidade dos sócios da sociedade limitada pelas dívidas sociais. Isto é, os sócios respondem apenas pelo valor das quotas com que se comprometeram, no contrato social (CC, art. 1.052). É esse o limite de sua responsabilidade. (COELHO, Fábio Ulhoa. A sociedade limitada no novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2003).
e. Da Sociedade Unipessoal
Criada pela MP 881/2019, que depois foi convertida na Lei 13.874 de setembro de 2019, permitiu que somente um pessoa participe do quadro de sócios de uma sociedade limitada. Com isso, se tornou possível abrir uma empresa sozinho e proteger o patrimônio particular e sem que fosse necessário realizar altos investimentos.
Neste tipo societário, o empresário atua sozinho, sem a necessidade de limite mínimo de capital social aportado no CNPJ (o que acontece com a EIRELI), passando a responder limitadamente pelas obrigações assumidas pela empresa.
Foi uma inovação trazida pela Lei 13.874/19 que acabou com a injustiça de exigência mínima de capital social para se dar limitação a responsabilidade de quem quer atuar legalmente no mercado. Aliás, as razões para a imposição de capital mínimo para se atuar sozinho como empresário sem responder de forma ilimitada, era sem nexo, uma vez que aquele que infringir as regras estabelecidas na lei civil na atuação como empresário, já tem a remoção do famoso “véu”, respondendo com seu patrimônio pessoal.
4. Da Desconsideração da Personalidade Jurídica – Da Responsabilização dos Sócios pelas Obrigações Societárias com O Patrimônio Pessoal
No âmbito civil, temos duas espécies de RESPONSABILIZAÇÃO dos sócios perante obrigações societárias perante terceiros, respondendo com o patrimônio particular, ou seja, além de suas participações nas mesmas.
a. Da Responsabilidade Civil nas relações regidas pelo Código Civil
Preconiza o artigo 50 do Código Civil Brasileiro que:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.
§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:
I – Cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;
II – Transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e
III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
Assim, ressalvadas as sociedades onde, por sua natureza e pela lei, seus sócios respondem ilimitadamente, a responsabilização ilimitada dos sócios é uma exceção à regra.
Numa relação civil, os sócios só responderão pelas obrigações societárias até o limite de sua participação na mesma, exceto se comprovada o ABUSO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
Este abuso da personalidade jurídica deve ser caracterizado por duas situações:
1. Desvio de finalidade;
2. Confusão patrimonial;
Antes da alteração da lei civil, havia muita confusão sobre o que vinha a ser DESVIO DE FINALIDADE e CONFUSÃO PATRIMONIAL.
Atualmente, a lei veio e transcreveu o que isso representa.
Haverá DESVIO DE FINALIDADE quando houver a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.
Já CONFUSÃO PATRIMONIAL restará presente quando houver a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:
1. Cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;
2. Transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante;
3. Outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
O problema está, justamente, nos “outros atos”. O legislador acabou por não pôr fim a discussão, vez que “outros atos” poderá ser estendido as velhas e odiosas discussões de fato.
Analisando a história da quebra da personalidade jurídica, tal ocorreu pela primeira vez no direito anglo-saxão, dentro do sistema da Common Law, a possibilidade de desconsiderá-la, para que com isso os sócios sejam responsabilizados com o seu patrimônio pessoal pelas obrigações assumidas pela sociedade, sendo essa possibilidade posteriormente difundido para vários outros países.
Assim, presentes quaisquer das situações que configurem DESVIO DE FINALIDADE ou CONFUSÃO PATRIMONIAL, os sócios responderão com seus patrimônios, mas de forma SUBSIDIÁRIA.
Mas o Código Civil de 2002 não foi o pioneiro neste instituto. Vejamos abaixo outras relações que, embora consideradas cíveis lato sensum, já previam “rasgar o véu” da personalidade para que os sócios respondessem com seus bens pessoais por obrigações das sociedades as quais faziam parte.
b. Responsabilidade civil nas relações consumeristas
O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº. 8078/1990), estabeleceu outros limites de responsabilidades dos sócios na gestão e participação nas sociedades.
Ora, apesar do Código Civil dispor sobre a desconsideração da personalidade jurídica, o mesmo não se aplicará quando houver relação de consumo entre empresa e seus consumidores.
Assim preconiza o CDC:
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
§ 1° (Vetado).
§ 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.
§ 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.
§ 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.
§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
Interessante observar como esta lei foi um marco na história da responsabilização dos sócios pelas ações das empresas em que tenham participação. Este artigo 28 expandiu as possibilidades de responsabilização pessoal dos mesmos.
Vamos analisar, então.
Primeiro, é importante que se verifique que não é dever do magistrado a decisão da desconsideração, mas uma faculdade (poder). Alguns sustentam que seria um poder/dever, mas os tribunais entendem que o magistrado é livre para decidir se quebra ou não a barreira da personalidade da empresa. O que deve fazer é FUNDAMENTAR sua decisão, conforme estabelece a CR/88, art. 93, inciso IX.
Saliente-se que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica foi tipificada em lei, pela primeira vez, no CDC, mais precisamente no artigo in comentum, que visa proteger o consumidor contra o abuso de direito de um fornecedor no uso da sua personalidade jurídica, quando ela for um empecilho ao ressarcimento dos danos causados em uma relação consumerista.
Vejamos que o Parágrafo Quinto do aludido artigo ampliou a possibilidade desta desconsideração. Tal poderá ser determinada “…sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
Ou seja, a simples falta de recursos na indenização do consumidor, ensejará a desconsideração (o que é mais comum).
Assim, mesmo que a empresa não tenha fraudado ou violado qualquer regra estabelecida no Contrato; mesmo que esteja agindo com a amis perfeita lisura, se não tiver capital para ressarcir o consumidor de seus prejuízos, seus sócios responderão com o patrimônio pessoal na indenização.
Também, é importante frisar que as regras do atual Código Civil sobre responsabilização de empresas que compõem grupo econômico, não têm aplicação nas relações consumeristas.
Assim diz o CC/2002:
Artigo 50…
§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.
O CDC assim dispõe:
Art. 28…
§ 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.
§ 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.
§ 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.
Isso quer dizer que, nas relações consumeristas, se aplicará a lei especial, só devendo se comprovar a culpa (imperícia, negligência ou imprudência) das sociedades coligadas. A principal responde objetivamente. As demais, subjetivamente.
Ainda deve-se atentar que o código consumerista possibilita a inversão do ônus da prova, quando o juiz poderá impor a empresa fornecedora do produto ou serviço a obrigação de provar que sua personalidade jurídica não está, de alguma forma, obstaculizando o ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
c. Responsabilidade dos sócios nas relações trabalhistas
Como bem já observamos, os sócios, ao constituírem a sociedade sob a forma limitada (artigos 1.052 e seguintes do Novo Código Civil), baseados no direito societário, limitam sua responsabilidade aos aportes que realizam para a formação do capital social – objetivando restringir sua participação no pagamento dos débitos sociais, desde que não pratiquem atos com excesso de mandato, violação da lei ou do contrato social.
Dispõe a CLT que, qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados (CLT, art. 9º). Desta forma, no caso do sócio administrador, a responsabilização pode se dar não apenas nos casos de formação ou dissolução fraudulenta da sociedade, mas também nos casos de extrapolação dos poderes conferidos pelo contrato social ou estatuto societário.
Vejamos este julgado do TST, cuja ementa é:
AÇÃO RESCISÓRIA. COISA JULGADA. OFENSA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
1. Ação rescisória contra acórdão proferido em agravo de petição que mantém a desconsideração da personalidade jurídica da empresa Executada e declara subsistente penhora em bens de ex-sócio.
2. Não viola os incisos II, XXXV, XXXVI, LIV e LVII do art. 5º da Constituição Federal a decisão que desconsidera a personalidade jurídica de sociedade por cotas de responsabilidade limitada, ao constatar a insuficiência do patrimônio societário e, concomitantemente, a dissolução irregular da sociedade, decorrente de o sócio afastar-se apenas formalmente do quadro societário, no afã de eximir-se do pagamento de débitos. A responsabilidade patrimonial da sociedade pelas dívidas trabalhistas que contrair não exclui, excepcionalmente, a responsabilidade patrimonial pessoal do sócio, solidária e ilimitadamente, por dívida da sociedade, em caso de violação à lei, fraude, falência, estado de insolvência ou, ainda, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. Incidência do art. 592, II, do CPC, conjugado com o art. 10 do Decreto 3.708, de 1919, bem assim o art. 28 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).
3. Recurso ordinário a que se nega provimento.
Processo: ROAR – 727179-44.2001.5.03.5555 – Data de Julgamento: 13/11/2001, Relator Ministro: João Oreste Dalazen, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DJ 14/12/2001.
No entanto, o sócio que não é administrador da sociedade por quotas de responsabilidade limitada não pode ser responsabilizado com seu patrimônio pessoal pelas dívidas trabalhistas da sociedade, uma vez integralizado o capital social.
A execução trabalhista contra sócio é de caráter excepcional, não podendo ser aplicada de forma leviana pelos pretendentes à execução, pois para isto precisam estar presentes a caracterização de fraude ou violação à lei.
Em resumo: a responsabilidade do sócio pelas dívidas trabalhistas da empresa, na qual tenha integralizado a sua parte das quotas, só pode ocorrer quando demonstrada a fraude na constituição ou desfazimento da sociedade e comprovada a insuficiência do patrimônio social para absorção das respectivas dívidas.
Com relação ao sócio retirante da sociedade, este tem responsabilidade subsidiária em relação à sociedade e solidária em relação ao sócio atual, por dois anos. Este limite temporal tem seu marco inicial a partir da averbação da alteração societária para constar à saída do sócio (Código Civil, artigo 1.003, parágrafo único).
Outro não é o que nos diz a lei trabalhista:
Art. 10-A. O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, observada a seguinte ordem de preferência: (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
I – a empresa devedora;
II – os sócios atuais; e
III – os sócios retirantes
Neste sentido, o posicionamento do TST, adiante evidenciado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – EXECUÇÃO – PENHORA. O acórdão regional liberou a penhora do numerário em exame, assentando que, em conformidade com o art. 1.003 c/c o art. 1032 do Código Civil, o cedente responde solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiro, pelas obrigações que tinha como sócio, até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, o que ficou constatado na hipótese…
Agravo de instrumento desprovido.
Processo: AIRR – 529-91.2010.5.02.0000 Data de Julgamento: 27/04/2011, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 06/05/2011.
Vale salientar que a retirada, exclusão ou morte do sócio não o exime ou a seus herdeiros das obrigações sociais contraídas pela sociedade enquanto sócio, até dois anos depois de averbada a resolução da sociedade, é o que versa o artigo 1.032 do Novo Código Civil.
Portanto, o sócio que se desliga da sociedade ainda permanece responsável, durante 2 anos, pelos débitos de natureza trabalhista dos empregados que prestaram serviços à época em que era sócio.
d. Responsabilidade dos sócios pelas dívidas tributárias
Este é um tema de grande discussão, pois a determinação do sujeito passivo da obrigação tributária principal é determinada pelo artigo 121 do Código Tributário Nacional – CTN:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
As Fazendas Públicas ao iniciarem o procedimento que resultará na execução fiscal de tributos, no momento da inscrição do débito na dívida ativa ou ainda quando da elaboração da petição inicial do processo executivo, em regra determinam a inclusão dos sócios ou administradores da empresa executada.
Porém, vejamos o que nos diz o artigo 135 do CTN:
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I – as pessoas referidas no artigo anterior;
II – os mandatários, prepostos e empregados;
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Assim, a responsabilidade destas pessoas somente ocorrerá quando demonstrados, de forma inequívoca, os elementos ligando tais pessoas aos fatos, ou seja, o fato de os sócios haverem agido com excesso de poderes ou infração à lei, contrato social ou estatutos:
Isto significa que, se o empresário ou administrador agir dentro da lei e do contrato social ou estatuto e, por circunstâncias do mercado, a empresa da qual é sócio ou administrador não cumprir com suas obrigações tributárias – seus bens particulares não respondem pela dívida tributária. Trata-se do caso de simples inadimplência de tributos, e não de sonegação ou infração à lei.
Portanto, é nula a pretensão da Fazenda em apropriar-se do patrimônio particular de sócios, sem demonstrar que estes praticaram infração à lei ou ao contrato social de sociedade limitada.
Aliás, assim tem decidido o Superior Tribunal de Justiça, conforme Informativo STJ nº 353 – 21/04 a 25/04.
A divergência, na espécie, é no tocante à natureza da responsabilidade do sócio-gerente na hipótese de não-recolhimento de tributos. Esclareceu o Min. Relator que é pacífico, neste Superior Tribunal, o entendimento acerca da responsabilidade subjetiva daquele em relação aos débitos da sociedade. A responsabilidade fiscal dos sócios restringe-se à prática de atos que configurem abuso de poder ou infração de lei, contrato social ou estatutos da sociedade (art. 135, CTN). O sócio deve responder pelos débitos fiscais do período em que exerceu a administração da sociedade apenas se ficar provado que agiu com dolo ou fraude e que a sociedade, em razão de dificuldade econômica decorrente desse ato, não pôde cumprir o débito fiscal. O mero inadimplemento tributário não enseja o redirecionamento da execução fiscal. Isso posto, a Seção deu provimento aos embargos. Precedentes citados: REsp 908.995-PR, DJ 25/3/2008, e AgRg no REsp 961.846-RS, DJ 16/10/2007. EAG 494.887-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgados em 23/4/2008. (GN).
Ainda, este tema é sumulado:
Súmula 430: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”.
Entretanto, veja-se que há exceções, como expresso pelo próprio STJ na seguinte súmula:
Súmula 435: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.
Outra observação que se deve fazer é que é de 5 (cinco) anos, contados da citação da pessoa jurídica devedora, o prazo de execução contra os administradores por dívida tributária:
PRESCRIÇÃO. EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO. SÓCIO.
A Fazenda Pública tem o prazo de cinco anos, contados da citação da pessoa jurídica devedora, para promover o redirecionamento da execução fiscal contra os responsáveis tributários relacionados no art. 135, III, do CTN. Precedentes citados: EREsp 41.958-SP, DJ 28/8/2000, e REsp 142.397-SP, DJ 6/10/1997. REsp 205.887-RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 19/4/2005.
Importante observar que, se ficar comprovado que, quando da retirada do sócio, a empresa atuava de forma regular, voltamos a regra da Súmula 430 do STJ.
e. Responsabilidade dos sócios retirantes por alienação da sociedade ou por alienação de suas quotas
Para entendermos a responsabilidade dos sócios quando se retiram das sociedades, primeiro devemos entender sua responsabilidade quando a mesma é criada.
Antes do registro da formação societária no órgão competente, esta atua de forma irregular, sendo definida no Código Civil Brasileiro como Sociedade Comum, sendo regido pelo Livro II, Título II, Subtítulo I, Capítulo I do Código Civil.
Assim, de acordo com os artigos 45 e 986 do CC/2002, enquanto não inscritos os atos constitutivos, a sociedade é considerada Sociedade em Comum, ou seja, irregular, sem personalidade jurídica, respondendo TODOS OS SÓCIOS SOLIDÁRIA E ILIMITADAMENTE.
Outra observação importante é que, quem contratou pela sociedade, não pode, nem sequer, invocar o benefício de ordem disposto no artigo 1.024 do aludido diploma legal.
O Registro torna público as relações internas da sociedade e fixa a responsabilidade dos sócios, passando a mesma a ter Personalidade Jurídica própria, desvinculando-se da pessoa natural que a criou, e respondendo por “seus atos” perante terceiros (lembrando que, enquanto não totalmente integralizado o Capital Social, os sócios respondem solidariamente pelo mesmo).
De qualquer forma, devidamente registrado o contrato social e integralizado todo o capital, a responsabilidade dos sócios na Limitada não tem vínculo algum com as obrigações assumidas pela sociedade, mas somente, em tese, pela formação do capital do novo ente jurídico.
Entretanto, devemos atentar para as responsabilidades dos sócios gerentes e administradores, nos termos dos artigos 1.011 e 1.016 do CC de 2002.
Também, devemos observar as regras da exata estimação de bens conferidos ao capital social, quando os sócios responderão, solidariamente, perante terceiros, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade, bem como responderão também da mesma forma pela distribuição indevida de lucros com prejuízo do capital (art. 1.059) e por deliberação ilegal (art. 1.080).
Feitas estas observações, vamos a cessão das quotas ou alienação da sociedade.
Se um sócio pretende se retirar da sociedade, ou alienar suas quotas, tudo deve ser levada a registro, sob pena de não ter qualquer eficácia perante terceiros.
A alienação a sócio, na omissão do contrato, quer total, quer parcial, independentemente de audiência dos outros. A alienação a terceiros estranhos ao quadro societário só será possível se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social.
O sócio que se integra a sociedade, passa ter responsabilidade solidária pelas obrigações já assumidas e pelas pendentes com o sócio retirante.
Responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros até 2 (dois) anos depois de averbada a modificação do contrato. Mas apenas pelas obrigações que tinha como sócio, não podendo responder por obrigações assumidas após sua retirada.
Esta regra é aplicada em caso de retirada, exclusão ou morte do sócio, como diz o artigo 1.032 do Código Civil, inclusive, obrigando os herdeiros.
Contudo, a responsabilidade pelo período de 02 (dois) anos após a saída somente se aplica no âmbito cível, trabalhista e tributário com relação as obrigações contraídas pela sociedade durante o tempo em que este figurou como sócio. Logicamente, toda e qualquer obrigação assumida após sua saída não gera responsabilidade para o ex-sócio.
Dos referidos dispositivos se extrai que, além do prazo de dois anos de manutenção de responsabilidade, comum a todas as formas de desvinculação, esse prazo somente passa a vigorar efetivamente e gerar efeitos dentro e fora da sociedade a partir do registro ou averbação, nos órgãos de registro estatais, da alteração contratual onde consta a deliberação de dissolução parcial.
Modificação importante ocorreu em 2017 na esfera trabalhista, pois o sócio retirante passou a responder subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, mas observada a seguinte ordem de preferência:
1. A empresa devedora;
2. Os sócios atuais; e
3. Os sócios retirantes.
O sócio retirante só responderá solidariamente com os demais remanescentes, quando ficar comprovada fraude na alteração societária decorrente da modificação do contrato.
Este benefício de ordem tem uma plausividade. O adquirente das quotas ou da sociedade, tomou conhecimento das dívidas existentes, e, se assim concordou, responde primeiro com seus bens, nos casos já vistos anteriormente (pois em regra, os patrimônios não se comunicam). A responsabilidade do(s) sócio(s) retirante(s) é garantia dada a terceiros, que não poderão suportar prejuízos por negócios que não participou.
f. Responsabilidade civil oriundas de práticas criminosas
f.1 Lei Antitruste (Lei 8.884/94).
Surgiu após a grande inovação do Código do Consumidor, em seu art. 18, trouxe a previsão da desconsideração da personalidade jurídica da sociedade que vier a cometer crimes contra a ordem econômica.
Trouxe como fundamento da responsabilização dos sócios o abuso de direito, infração à lei ou aos contratos e estatutos sociais, dentre outros casos no âmbito de atuação da citada lei.
Vale dizer que, em caso de Ação Civil Ex Delicto, definida simploriamente, como uma ação ajuizada na esfera cível, requerendo a indenização de dano moral ou material juridicamente reconhecido em infração penal, poderá ocorrer a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, respondendo os sócios, com seus bens pessoais, pelas obrigações de reparar o dano.
Mas é importante frisar que tal ação somente caberá nas hipóteses em que a repercussão da infração penal também atingir a esfera da responsabilidade civil.
f.2 Lei de Crimes Ambientais de 9.605/98
Pode ser aplicada quando a personalidade jurídica for um empecilho para o ressarcimento dos danos ambientais causados por meio da atividade empresarial.
Assim dispõe a lei, em seu artigo 4º:
Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.
Veja-se que, no mesmo caminho que a lei Consumerista, para que a personalidade jurídica da empresa seja desconsiderada, atingindo o patrimônio dos sócios no ressarcimento dos danos causados ao meio ambiente, basta que sua personalidade jurídica seja OBSTÁCULO ao ressarcimento dos prejuízos.
f.3 Lei Anticorrupção – 12.843/2013
Conhecida como Lei Anticorrupção, esta prevê em seu artigo 14 a desconsideração da personalidade jurídica sempre que esta for utilizada para encobrir ou dissimular a prática dos crimes previstos na aludida lei, sendo estendidos aos sócios e administradores da sociedade os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica.
Nesta lei temos algumas novidades. A primeira é que, neste caso, a personalidade jurídica da empresa tem como motivo ENCOBRIR ou DISSIMULAR práticas criminosas. Mas não qualquer crime. Apenas os dispostos na lei 12.843/2013.
Outra novidade (mas não tão nova assim), é a ideia de afetação dos administradores que participam das decisões da empresa. Apesar da lei não dizer que é necessária a participação do administrador no ato ilícito, isto é claro quando a lei impõe a RESPONSABILIDADE SUBJETIVA, o que requer culpa em ao menos uma de suas três modalidades.
Por fim, o último diploma legal a tratar da desconsideração da personalidade jurídica, foi a lei 13.105/15, a qual regula o Novo Código de Processo Civil, onde foi trazida pela primeira vez a criação de um procedimento específico para que seja declarada a desconsideração da personalidade jurídica, garantindo assim o contraditório em favor das pessoas a serem atingidas pela desconsideração.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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4. CHAGAS, Edilson Enedino das. DIREITO EMPRESARIAL ESQUEMATIZADO. 6ª edição – São Paulo/SP: Saraiva, 2019.
5. GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. NOVO CURSO DE DIREITO CIVIL – Volume 1, 2 e 3. 3ª Edição – São Paulo/SP: Saraiva, 2013.
6. GARCIA, Leonardo de Medeiros. DIREITO DO CONSUMIDOR – 11ª Edição – Salvador/BA: Juspodivm. 2017.
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8. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL. Volume Único. 9ª edição – Salvador/BA: Juspodivm, 2017.
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10. RAMOS, André Luiz Santa Cruz. DIREITO EMPRESARIAL. 7ª Edição atualizada. Método. Rio de janeiro/RJ.