Reflexos contábeis expressivos tendem a ocorrer em razão de mudanças operadas nas formas jurídicas e operacionais das empresas.
Não só questões de concorrência no mercado, mas, também, relativas à redução de custos, estratégias tributárias, imposições tecnológicas, conveniências políticas, podem levar empresas a situações especiais de associação, disso decorrendo mutações administrativas, financeiras, tecnológicas e patrimoniais.
Gastos podem ser minimizados a partir de agregações de empreendimentos, volume da receita ampliado, produtividade melhorada, satisfação dos clientes crescida, distribuição de produtos facilitada, nova imagem projetada, tudo como decorrência natural.
Para citar um só exemplo, segundo a “Folha On Line” de 16 de janeiro de 2009, cinco meses após a fusão dos bancos Santander e Real ocorria em defluência do evento demissão de 400 funcionários, com redução de despesas e custos operacionais.
Os objetivos maiores das empresas e que são os de obtenção de lucros, recursos para pagamentos, equilíbrio patrimonial, vitalidade, sobrevivência, ou seja, os das “funções sistemáticas patrimoniais de base” podem ser encontrados através de aglutinação de empreendimentos. Essa, em tese, a lógica.
No Brasil possuímos exemplos exuberantes de agregações de grandes companhias, de há muito, com evidentes resultados proveitosos, quer por mudança de forma, quer por aquisições ou outros meios (Aerovias Brasil e Panair, Mercearias Bandeirantes e Jumbo, Brahma e Antártica, Sadia e Perdigão, Itaú e Unibanco, Santander e Real etc.).
Pelo mundo afora os casos se multiplicam e continuam a ocorrer.
O famoso jornal francês “Le Figaro” de 14 de novembro comenta sobre a atual união de duas grandes companhias aéreas, a Ibéria e a British, referindo-se, exatamente ao mau estado em que estão operando.
Mesmo sem conhecer o mérito da questão o jornal é afirmativo em sugerir que a agregação dessas duas importantes organizações advém de situações de ineficiência financeira em ambas (isso é possível inferir em razão do noticiado).
O problema contábil de tal situação, na busca da realidade emergente, é deveras peculiar; isso implicará procedimentos especiais quando da elaboração dos balanços, não bastando para tanto operações aritméticas.
Se o caminho for o da fusão as empresas desaparecerão para que uma nova surja como decorrência, mas, o patrimônio não mais poderá ser expresso sob a ótica das situações precedentes, ou seja, aquela quando não estavam sob nossa condição.
O “novo patrimônio”, defluência de “outros patrimônios já em pleno funcionamento” irá requerer reclassificações de contas, reavaliações, ajustes, adaptações.
Não poderá ser o “novo balanço patrimonial” uma simples “soma” de valores para que possa expressar a realidade objetiva; assim leciona a doutrina do Neopatrimonialismo Contábil ao afirmar sobre as relações lógicas das forças que movimentam as riquezas dos empreendimentos.
Qualitativa e quantitativamente mudanças naturais se operam nas alterações de forma jurídica, administrativas, presença perante o mercado e o Estado, criando uma situação peculiar.
O levantamento de um balanço de fusão, incorporação, seja qual venha a ser a modalidade de agregação, não depende só de registros e demonstrativos que mostravam situações anteriores, requerendo seja realizado sob “nova ótica”; trata-se de uma “outra realidade objetiva” que não deve desconhecer, inclusive, implicações de natureza estratégica de destinação e funcionamento dos meios patrimoniais.
O evento difere substancialmente da visão de “grupo” ou das denominadas genericamente sob o conceito de “partes relacionadas”, em razão do que de afetação existe na condução da riqueza, sobre as influências na dinâmica patrimonial.
Não se trata de “consolidar balanços”, mas, de apresentar nova realidade, esta que se possui alguma semelhança com os fatos anteriores, também, tem como supremacia, nova ordem no tangente ao trato com o patrimônio.
O que foi apresentado como “combinação de negócios”, abrangendo a fusões, conforme Deliberação da Comissão de Valores Mobiliários CVM 580/2009 (Apêndice A, Glosário), merece, perante a doutrina científica da Contabilidade algumas restrições, especialmente no que tange ao denominado como “Mensuração” e que no item 18 determina que se deva avaliar os ativos identificáveis e os passivos assumidos pelos respectivos “valores justos”.
Como o entendimento de “Valor Justo” é matéria altamente contestada e contestável, prudente é reconsiderar a questão sob a ótica de nova realidade objetiva.
Segundo o noticiado em início de Novembro de 2009 (Fonte original: http://www.ft.com/cms/s/0/8c1efebc-ce4f-11de-a1ea-00144feabdc0,dwp_uuid=745008c6-741e-11dd-bc91-0000779fd18c.html?nclick_check=1), a Comunidade Européia manifestou seu total inconformismo à determinação do referido como “valor justo” de acordo com o que a IASB estabelece como norma (à qual a CVM se submete para aplicar suas orientações segundo expressamente denuncia na Resolução 580 referida, expressando ser a IFRS 3).
Em assim sendo, tão como perante a peculiaridade do evento, a questão não se situa apenas em critérios de “mercados” (aos quais se aferra o valor criticado referido), mas, em fatos endógenos das empresas que precisam ser considerados para a expressão da realidade objetiva patrimonial.
* Antônio Lopes de Sá, Nível Superior Máximo: Doutor em Letras, honoris causa, pela Samuel Benjamin Thomas University, de Londres , Inglaterra, 1999. Doutor em Ciências Contábeis pela Faculdade Nacional de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1964