Crise! Caminho Para o Aprendizado
Ricardo Bergamini*
A grande depressão da década de 30 ilustra claramente a posição, economicamente, dominante dos Estados Unidos e, reforça a opinião de que as condições econômicas, nesse país, contribuem poderosamente para determinar o nível de atividade no resto do mundo. Não há dúvidas de que as forças que transformaram prosperidade e otimismo de 1929 no desemprego e pessimismo de 1932 tiveram sua origem nos Estados Unidos e, o declínio de suas atividades difundiram-se em todas as direções, até abranger a maior parte do globo, tendo sido o sustentáculo das condições, geralmente, prósperas na maior parte do mundo ou seja, o elevado nível de renda, emprego e produção dos Estados Unidos, datando de 1922. Por trás dele e, tornando possível este período de oito anos de prosperidade, encontrava-se uma explosão de investimentos de proporções recordes. O investimento, no período analisado, atingiu alturas jamais alcançadas anteriormente. Além deste amplo e contínuo investimento, induzido, principalmente, pelo rápido crescimento das indústrias relacionadas à automobilística e ao uso da energia elétrica, o país desfrutou seu maior surto de construções na História. O que terá provocado o fim desta era de bons tempos? Simples, as principais atividades com elevado grau investimento, cuja atividade acionara a de toda a economia, saturou, esgotou. A capacidade da indústria automobilística produzir carros, por volta do ano de 1929, excedia de muito sua capacidade de vendê-los. O declínio da atividade econômica foi rápido, principalmente após abalo de confiança, provocado pelo colapso da Bolsa de Valores. Com breves interrupções, investimentos, produção industrial, emprego e a renda nacional mergulhavam, verticalmente, em três anos desastrosos.
Com a diminuição, das importações e empréstimos externos norte-americanos, em um grande número de países desencadeou-se redução na produção e no nível de emprego. Com o reforço causado pelo funcionamento do multiplicador, suas rendas e importações caíram bruscamente, difundindo depressão por círculos cada vez mais amplos.
A reação técnica para esses países periféricos seria à introdução imediata do controle cambial, conjugado com restrições discriminatórias nas importações, visando à fonte da depressão. Essas medidas externas deveriam ser combinadas com medidas internas de despesas governamentais crescentes para sustentar a renda e o emprego. Porém a devoção desses países ao LAISSEZ-FAIRE (palavra atual globalização) ainda era muito forte.
Em fins de 1931, parecia que a deflação, mesmo sendo um método doloroso de reajustamento, estava operando. O padrão-ouro se mantinha intacto na Europa Ocidental e nos Estados Unidos. A depreciação cambial não tinha se propagado além dos nove país originais, nem foram estendidos os controles cambiais. Havia alguns sinais promissores no horizonte, nos primeiros meses de 1931, a produção industrial recuperou-se, ligeiramente, na Alemanha e Estados Unidos. As taxas de juros eram baixas na Alemanha, o crédito era fácil nos principais centros financeiros. Havia perspectiva de que a recuperação poderia finalmente afirmar-se. O otimismo hesitante da primavera do ano de 1931 foi abalado pelo desencadeamento de um pânico financeiro internacional. Começou não em um centro financeiro importante, mas na pequena Áustria. Uma reavaliação de ativos do Credit-Anstalt, o maior banco de Viena, mostrou que o mesmo havia se depreciado a ponto de tornar um banco insolvente. Um importante banco alemão faliu no inicio de julho, a corrida intensificou-se e, para não ver esgotada as reservas de ouro e moeda estrangeira o governo criou o controle cambial. A escolha alemã do controle cambial foi ditada pelo fato de que o público foi induzido a acreditar que a desvalorização cambial provocaria inflação interna.
Durante a crise, a taxa de juros na Alemanha tinha sido elevada somente para 4,5%. Os críticos afirmavam que se tivesse sido estabelecida uma taxa de 8% a 10%, a corrida sobre Londres poderia, perfeitamente, ter sido estancada. Este argumento era insensato. De que valem rendimentos de 10% perante a perspectiva de uma perda de 30% a 40% do capital? Nas circunstâncias de 1931, uma taxa de juros de 10% teria sido interpretada muito mais como um sinal de fraqueza.
Ao abandonar o padrão-ouro, a Grã- Bretanha carregou consigo um grande número de países que, uma vez que a Inglaterra era seu principal mercado e Londres seu centro de reserva, não suportariam a depreciação da libra contra suas moedas. Depois da depreciação da libra e da formação da área esterlina, somente cinco países permaneceram solidamente aderentes ao padrão-ouro. Foram os Estados Unidos, França, Suíça, Bélgica e Holanda.
A depreciação na área esterlina e em certos países de fora desta (notadamente o Japão) reforçou esta tendência, principalmente entre as nações que empregaram os controles cambiais para manter inalterado o valor nominal em ouro de suas moedas. Pois, de forma bastante independentes dos acontecimentos monetários, dentro destas nações, suas moedas tornaram-se então supervalorizadas relativamente aquelas que se tinham depreciado. Suas exportações foram deprimidas e importações estimuladas. Os controles tinham, portanto, que serem apertados e, procurados mercados alternativos para suas exportações, bem como fontes de importações por meio de acordos bilaterais de comércio.
Podemos resumir os efeitos da crise financeira internacional dizendo que ela provocou, principalmente, o rompimento do sistema monetário internacional e sua substituição por três blocos bastante distinto, um constituído de cinco países ainda no padrão-ouro, um outro grupo muito maior com moedas flutuantes, mas conversíveis, e um outro grande grupo sujeito a controles cambiais. Em segundo lugar em grande parte pelos efeitos desta divisão, o comércio internacional começou a desintegra-se, na medida em que as barreiras tarifárias se multiplicavam, se concentrando, cada vez mais, em canais bilaterais.
A deflação nos Estados Unidos havia sido especialmente severa. Entre 1929 e 1932, os preços de atacado caíram 32%, enquanto a renda nacional foi cortada pela metade. Os empréstimos totais de todos os bancos, no final de 1932, tinham-se contraído em 42%.
A medida em que a fraca posição dos bancos se tornou mais aparente, gerou-se uma onda de entesouramento de moeda e ouro, provocando pânico. No início de 33 o Presidente Roosevelt declarou feriado bancário nacional em 16 de março de 1933, impondo embargo nas exportações de ouro e prata e flutuando o dólar.
Com o objetivo de combater a depressão americana, Roosevelt promulgou a “Lei de Recuperação Industrial Nacional proibindo reduções de preços, estabelecendo limites mínimos e, elevando salários. Em antecipação à salários mais altos, os industriais expandiram a produção em 50% em relação aos níveis de 29. A legislação agrícola pagava aos fazendeiros para produzir, gerando compras especulativas de produtos agrícolas. As medidas complementares repousavam, muito mais, no aumento das despesas do governo, substituindo o contraído componente da renda e, foram muito mais bem sucedidas.
A desvalorização do dólar americano acrescida à depreciação da libra e moedas relacionadas, intensificou a deflação nas restantes nações adotantes do padrão-ouro aumentando a pressão sobre o Balanço de Pagamentos daqueles países com moedas supervalorizadas, sustentadas por controles cambiais.
Anulando em parte estes acontecimentos adversos, havia o estímulo gerado pela depreciação cambial e abandono do padrão-ouro, à expansão interna. A liberação dos países seguidores desta política do medo de perder reservas, permitiu-lhes introduzir políticas fiscais e de créditos mais liberais. No início de 1932, o Banco da Inglaterra reduziu sua taxa de juros de 6% para 2%, e aumentou as reservas dos bancos comerciais, mediante compras no mercado aberto. A Suécia também adotou esta política de dinheiro barato e elevou as despesas governamentais. Nestes e em outros países da área esterlina que adotaram medidas idênticas a produção industrial recuperou-se, rapidamente, atingindo por volta de 1936, nível substancialmente acima do ápice anterior de 1929. A produção e a renda ascendentes, nestes países, incrementaram seu comércios, especialmente nas relações mútuas, ou bilaterais.
Serve este breve resumo de história econômica para estudarmos algumas decisões tomadas pelos principais países do mundo ao enfrentarem a crise de 29 e, definitivamente, aprendermos algumas regras econômicas para saídas de crises. O aprendizado destes países com crises anteriores (1929 e 1971), desenvolveram mecanismos econômicos de defesa de contaminação, os colocando quase que imunes às atuais crises, haja vista Estados Unidos, com superávit fiscal por anos consecutivos, crescimento econômico, inflação baixa e, os onzes principais países europeus implementando a moeda única denominada “EURO”.
Os estudos e acordos políticos, entre os países desenvolvidos criando mecanismos de defesa de possíveis contaminações de crises cíclicas internacionais, tanto nos Estados Unidos, quanto nos principais países europeus, iniciaram-se no ano de 1971 ao constatarem a falência dos mecanismos do “FMI” em resolver problemas de desequilíbrios de Balanço de Pagamentos. Para quem não sabe o “FMI” foi criado para funcionar como estrutura preventiva de desequilíbrios de Balanço de Pagamentos, entre seus países membros. Teriam grandes quantidades de recursos (quotas DES) e poder político para resolver, preventivamente, os problemas à nível de Câmara de Compensação Automática, e não como tem sido sua atuação, com uma estrutura falida, sobrevivendo às custas da Lei de Parkinson, com atuações posteriores as crises, apagando incêndios de países corruptos e perdulários, através de recursos obtidos com “vaquinhas” entre os 7G.
O sinal dado pelo mundo capitalista desenvolvido será o de que poucos países terão autonomia para terem suas próprias moedas, visto serem poucos os que tratam sua moeda, consequentemente, sua política monetária, fiscal e tributária com a disciplina e austeridade necessária, isentas das influências políticas e corporativas.
Não é admissível, no mundo econômico moderno digital, países como o Brasil, que para manterem uma moeda nacional agonizante, pratiquem juros como os atuais, gerando déficit público, recessão e desemprego, num eterno círculo vicioso. Como brasileiro fico triste em constatar nossa realidade porém, como profissional, devo reconhecer nossa total incapacidade em ter nossa moeda. Haja vista todas as tentativas de planos econômicos dos últimos quinze anos (Cruzado I, II, III, Fiscais do Sarney, Verão I, II, III, Bresser, Maílson, Real). Todos fracassados pelo maldito despreparo de nossos políticos sobre o assunto.
Florianópolis, 30 de janeiro de 2000
* Economista, formado em 1974 pela Faculdade Candido Mendes no Rio de Janeiro, com cursos de extensão em Engenharia Econômica pela UFRJ, no período de 1974/1976, e MBA Executivo em Finanças pelo IBMEC/RJ, no período de1988/1989. Membro da área internacional do Lloyds Bank (Rio de Janeiro e Citibank (Nova York e Rio de Janeiro). Exerceu diversos cargos executivos, na área financeira em empresas como Cosigua – Nuclebrás – Multifrabril – IESA Desde de 1996 reside em Florianópolis onde atua como consultor de empresas e palestrante, assessorando empresas da região sul.
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