Karen Bianca Batalha Carvalho[1]
RESUMO
Este artigo vem lançar um olhar sobre a efetivação da CEDAW na realidade brasileira, analisando se as suas diretrizes estão sendo seguidas e os seus objetivos alcançados. Ademais, a Convenção será analisada em comparação com o instrumento normativo internacional mais importante para os direitos humanos: a D.U.D.H. Por fim, visto que se tem a intenção de se verificar a efetivação da CEDAW, serão apresentados alguns dados sobre a desigualdade salarial entre os gêneros, bem como dados sobre casos de violência contra a mulher e feminicídio. Além disso, serão abordadas algumas medidas implementadas pelo Estado do Maranhão para tentar mudar essa realidade de violência e discriminação.
Palavras-chave: Igualdade; Direito feminino; Ações afirmativas.
RESUMEN
Este artículo da una mirada a la implementación de la CEDAW en la realidad brasileña, analizando si sus directrices están siendo seguidas y sus objetivos alcanzados. Además, se analizará la Convención en comparación con el instrumento normativo internacional más importante en materia de derechos humanos: la D.U.D.H. Finalmente, dado que se pretende verificar la implementación de la CEDAW, se presentarán algunos datos sobre la desigualdad salarial entre géneros, así como datos sobre casos de violencia contra las mujeres y femicidios. Además, se abordarán algunas medidas implementadas por el Estado de Maranhão para tratar de cambiar esta realidad de violencia y discriminación.
Palabras clave: Igualdad; Derecho de la mujer; Acciones afirmativas.
ABSTRACT
This article takes a look at the implementation of CEDAW in the Brazilian reality, analyzing whether its guidelines are being followed and its objectives achieved. Furthermore, the Convention will be analyzed in comparison with the most important international normative instrument for human rights: the D.U.D.H. Finally, since it is intended to verify the implementation of CEDAW, some data on wage inequality between genders will be presented, as well as data on cases of violence against women and femicide. In addition, some measures implemented by the State of Maranhão to try to change this reality of violence and discrimination will be addressed.
Keywords: Equality; Women’s right; Affirmative actions.
1 INTRODUÇÃO
A história feminina sempre foi marcada pela incessante busca da efetivação dos seus direitos e da igualdade entre os gêneros. Nesse sentido, um importante marco internacional dessas lutas é a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher – CEDAW (1979), que ainda precisa percorrer uma boa distância até a compatibilização do seu texto com a realidade das mulheres ao redor do mundo, e é sobre essa Convenção que este artigo irá tratar.
Então, ao longo do artigo será apresentado o que é a CEDAW, quais os seus princípios e objetivos, bem como a sua aplicação prática. Além disso, se verificará que essa Convenção não deixou de ser recepcionada pelo Brasil, bem como não deixou de influenciar na elaboração de normas, constitucionais e infraconstitucionais, que visavam garantir a igualdade de gênero em todos os âmbitos sociais.
Desse modo, é impossível não comparar as diretrizes da CEDAW com a realidade brasileira e o cenário de discriminação, exclusão e violência a que as mulheres estão sujeitas nesse país. Assim, apesar dos esforços da Convenção e do ordenamento brasileiro, situação fática do Brasil não corresponde, muitas vezes, aos preceitos por eles estabelecidos.
Para tentar mudar essa realidade, o Estado do Maranhão busca implementar algumas ações afirmativas, que não deixarão de ser mencionadas neste artigo como uma forma de demonstrar o esforço estatal no combate à violência contra a mulher, na tentativa de obter a igualdade entre os gêneros e na facilitação do acesso das mulheres aos seus direitos.
2 O QUE É A CEDAW E A SUA INFUÊNCIA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA?
A Declaração Universal (1948) é um importante instrumento internacional que traz em sua redação questões pertinentes para proteção dos direitos humanos. Contudo, foi a Declaração de Direitos Humanos de Viena (1993) que veio apresentar “[…] de forma clara em seu parágrafo 18 a concepção de que os direitos das mulheres constituem parte integrante, indivisível e inalienável no âmbito global de direitos humanos […]”. (FERREIRA, 2014)
Dessa forma, o parágrafo 18 da Declaração de Direitos Humanos de Viena (1993) assim prevê que:
18. Os Direitos Humanos das mulheres e das crianças do sexo feminino constituem uma parte inalienável, integral e indivisível dos Direitos Humanos universais. A participação plena das mulheres, em condições de igualdade, na vida política, civil, econômica, social e cultural, aos níveis nacional, regional e internacional, bem como a erradicação de todas as formas de discriminação com base no sexo, constitui objetivos prioritários da comunidade internacional. […]. (NAÇÕES UNIDAS, 1993)
Vale ressaltar que “[…] com o reconhecimento dos direitos humanos das mulheres em âmbito internacional, surge a necessidade de que tais direitos sejam protegidos para que não ocorra violação dos mesmos.” (FERREIRA, 2014). É com essa perspectiva que surge a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher – CEDAW (1979), cuja origem, princípios e efetivação serão abordados a seguir.
2.1 Origem e Conceito da CEDAW
Inicialmente, é importante perceber que a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas Discriminação contra a Mulher (CEDAW) começou a ser pensada no ano de 1946, através do trabalho da Comissão da Condição Jurídica e Social da Mulher, mas só veio a obter êxito em 18 de dezembro de 1979, com a adoção de seu texto pela Assembleia Geral da ONU. Sua adoção se deu de forma gradual e foi fruto de reflexões da Comissão da Condição Jurídica e Social da Mulher, entre os anos de 1946 e meados da década de 1970, sobre as possibilidades de se criar, em âmbito internacional, normas capazes de voltar a atenção dos indivíduos para as diversas discriminações de gênero que ocorriam nos países.
A sua criação e assinatura foi alavancada pela efervescência de ideias de igualdade e inclusão, iniciadas após a Segunda Guerra Mundial, ganhando destaque na Primeira Conferência Mundial da Mulher, realizada no México em 1975, onde mulheres de diversas partes do mundo lutaram e trabalharam incansavelmente para que esse gênero tivesse voz, fossem consideradas sujeitos de direitos e, assim, pudessem gozar do pleno exercício da cidadania. Nessa perspectiva, objetivou-se comover a sociedade a pensar em mecanismos que pudessem superar essas discriminações e, consequentemente, esperava-se que isso levasse a uma transformação das leis nacionais de caráter discriminatório.
Todo esse cenário de mudança e luta por mais direitos, bem como pelo reconhecimento da titularidade dos já existentes, foi bastante importante para a criação desse documento, que é composto por 30 artigos, ao longo dos quais são previstas diversas questões como a igualdade de direitos entre homens e mulheres; a aversão a qualquer tipo de discriminação da mulher em diversos âmbitos da vida social, familiar e profissional; a responsabilidade dos estados membros em assegurar e resguardar os direitos contidos na Convenção; a criação de um comitê para avaliar os avanços da Convenção. Por esses pontos a CEDAW é um importante instrumento internacional para estabelecer de forma concisa os direitos das mulheres. (FERREIRA, 2014).
Já em seu primeiro artigo a CEDAW traz o que seria discriminação contra a mulher, afirmando que:
Artigo 1º
Para os fins da presente Convenção, a expressão “discriminação contra a mulher” significará toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher independentemente de seu estado civil com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos: político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. (NAÇÕES UNIDAS, 1979)
A convenção estabelece o que seria a discriminação da mulher no artigo 1º e ao longo dos demais artigos busca combatê-la e instaurar a igualdade entre homens e mulheres na política (artigo 7º e 8º), na educação (artigo 10º), no mercado de trabalho (artigo 11), na saúde (artigo 12), na economia (artigo 13), na área jurídica (artigo 15), nas relações familiares (artigo 16), entre outras áreas, bem como apresenta o papel do Estado como garantidor desses direitos através de ações afirmativas no combate à discriminação. (KYRILLOS, 2018). Diante de tão ampla proteção, esse instrumento normativo foi ratificado por 188 países, inclusive o Brasil, que, em 1984, ratificou essa Convenção e, em 2002, assinou o seu Protocolo Adicional.
Contudo, ela recebeu diversas reservas. Nessa linha, Piovesan (2012) aponta:
Entretanto, esta convenção é o instrumento internacional que mais fortemente recebeu reservas dentre as convenções internacionais de direitos humanos, considerando que ao menos 23 dos 100 estados-partes fizeram, no total, 88 reservas substanciais. Um universo significativo de reservas concentrou-se na cláusula relativa à igualdade entre homens e mulheres na família. Tais reservas foram justificadas com base em argumentos de ordem religiosa, cultural ou mesmo legal, […]. (PIOVESAN, 2012, p. 277)
Como apontado por Piovesan (2012), a CEDAW, na seara dos direitos humanos, foi a convenção que mais recebeu reservas, em especial em relação as cláusulas que se referem a igualdade entre homens e mulheres, o que demonstra uma certa resistência dos países em relação a essa questão e uma maior luta feminina para a efetivação dos seus direitos, já que o Estado, responsável por ações afirmativas para o alcance da igualdade entre os gêneros, dificulta a implementação de medidas nesse sentido.
2.2 Princípios e Objetivos da CEDAW
Como todo instrumento normativo, a CEDAW é carregada de princípios e foi pensada para atender alguns objetivos. Assim, destaca-se que esses princípios embasam a Convenção e os objetivos lhe dão as diretrizes de atuação para que ela atinja os fins pretendidos.
Desse modo, os princípios em que a CEDAW se baseia são: princípio da dignidade da pessoa humana; o princípio da igualdade, o princípio da não-discriminação e o princípio da responsabilidade estatal. Não pode deixar de se notar que eles se relacionam entre si, pois é de responsabilidade estatal, para garantir a efetivação dos demais princípios, a criação de mecanismos e ações afirmativas – entendidas como o conjunto de medidas especiais voltadas a grupos discriminados e vitimados pela exclusão social ocorridos no passado ou no presente – a fim de que haja uma maior participação social e política das mulheres, obtida por meio de uma mudança cultural.
Além disso, é importante ter em vista que a Convenção constitui o principal instrumento de exigibilidade dos direitos das mulheres no cenário internacional e objetiva conferir um peso político e jurídico à proteção da dignidade da mulher, bem como combater as discriminações sofridas pelas mulheres em diversos países. Assim, além de tutelar sobre medidas que podem ser adotadas pelos Estados para garantir a igualdade de gênero, versa também sobre situações peculiares das mulheres, como a maternidade.
2.3 A Relação da CEDAW com a D.U.D.H
Depois deste breve apanhado sobre a origem, os princípios e objetivos da CEDAW, será abordado a relação entre alguns artigos dessa Convenção e o instrumento normativo internacional mais importante para os direitos humanos: a D.U.D.H.
É importante salientar que os artigos da D.U.D.H. visavam garantir o acesso e o gozo dos direitos a todos. No entanto, na mentalidade da sociedade da época, a palavra “todos” se resumia aos indivíduos do sexo masculino, ficando, assim, as mulheres totalmente excluídas do acesso à direitos e do gozo da cidadania.
A redação da D.U.D.H. também não ajudou muito no entendimento da natureza ampla dos direitos nela previstos, pois, a utilização da terminologia “homem”, para se referir aos sujeitos de tais direitos, reforçou o pensamento discriminatório da época. Sendo assim, fez-se necessário a elaboração da CEDAW, pois precisava-se de um dispositivo para incutir na mente da sociedade que os direitos garantidos pela D.U.D.H e pelas Constituições nacionais eram referentes também as mulheres.
Portanto, alguns pontos da Declaração, dentre eles: os direitos à educação, ao trabalho, à nacionalidade e à participação política, foram ampliados pela Convenção e passou-se a incluir a mulher como titular desses direitos. Contudo, a CEDAW não só afirmou a inclusão das mulheres como sujeito dos direitos já existentes como também pensou em novos, peculiares do sexo feminino, como a maternidade, a fim de igualar a situação dos gêneros.
2.4 Efetivação da CEDAW no Brasil
O Brasil foi um dos países que impôs reservas a alguns artigos da Convenção: artigo 15, artigo 16, § 1º, alíneas (a), (c), (g) e (h) e o artigo 29. Os artigos 15 e 16 da CEDAW tratam especialmente sobre os direitos civis e sobre a igualdade de direito nas relações matrimoniais. Inclusive, de acordo com Kyrillos (2018), o artigo 16 poderia ser um dos elementos que fez com que a CEDAW recebesse tantas ressalvas em diversos países, pois busca asseverar, dentre outras coisas, que se tem o direito de escolher livremente o cônjuge, que homens e mulheres tem os mesmos direitos e responsabilidades sobre os filhos e em caso de divórcio, que o casamento infantil é destituído de efeitos legais, propondo a adoção de todas as medidas necessárias, inclusive as de caráter legislativo, para que se estabeleça uma idade mínima para o casamento.
Segundo Kyrillos (2018), a reserva a esse artigo se deve ao fato de que:
Como a legislação brasileira na década de 1980 não assegurava direitos iguais entre mulheres e homens quando de relações matrimoniais, o país realizou a reserva. Contudo, em 1994 ela foi retirada e o país assumiu o compromisso de assegurar tal condição igualitária. […] (KYRILLOS, 2018, p. 73)
A reserva do artigo 29 não se refere a direitos substantivos, mas a disputas entre Estados parte quanto à interpretação da Convenção e até o momento continua vigorando.
Interessante observar que o artigo 29 expressa que em caso de controvérsia entre Estados sobre a aplicação ou a interpretação da Convenção, não havendo acordo por meio de negociações, quaisquer das partes pode pedir que a controvérsia seja submetida à arbitragem. Foi a esse método de resolução de conflito entre Estados que o Brasil fez reserva no momento de ratificação da Convenção […] (KYRILLOS, 2018, p. 76)
Visto isso, é necessário perceber que, como instrumento normativo internacional, apesar das já mencionadas ressalvas, a Convenção foi recepcionada pelo Brasil como norma constitucional. Além disso, os seus 30 artigos serviram como influência na elaboração de normas, constitucionais e infraconstitucionais, que visavam garantir a igualdade de gênero em todos os âmbitos sociais.
É indispensável que se observe como se dá a aplicação prática da CEDAW, especificamente no contexto brasileiro. Desse modo, apesar de estar positivado mecanismos e ações afirmativas que devem ser adotadas pelos Estados para garantir a igualdade de gêneros e transformar a cultura patriarcal vigente, na prática, a situação é um pouco mais complicada, mostrando que a mudança ocorre de forma lenta e relutante.
Nesse sentido, é importante observar o art. 17, § 1.º, da Convenção:
Artigo 17
1. Com o fim de examinar os progressos alcançados na aplicação desta Convenção, será estabelecido um Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (doravante denominado o Comitê) composto, no momento da entrada em vigor da Convenção, de dezoito e, após sua ratificação ou adesão pelo trigésimo-quinto Estado-Parte, de vinte e três peritos de grande prestígio moral e competência na área abarcada pela Convenção. Os peritos serão eleitos pelos Estados-Partes entre seus nacionais e 8 exercerão suas funções a título pessoal; será levada em conta uma repartição geográfica eqüitativa (sic) e a representação das formas diversas de civilização assim como dos principais sistemas jurídicos. (NAÇÕES UNIDAS, 1979)
Nesse artigo observa-se que, para examinar os progressos alcançados pela aplicação da Convenção, foi estabelecido o Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, conhecido também como “Comitê CEDAW”. Nota-se que esse Comitê se fez necessário pelo fato de não ocorrer de maneira instantânea a concretização das recomendações e objetivos da Convenção e, por isso, foi preciso que houvesse um órgão que acompanhasse se as medidas recomendadas aos Estados estavam sendo implementadas e o objetivo de mudança cultural estava sendo atingido.
Desse modo, foi através da criação desse Comitê, que pode haver um maior acompanhamento da observância dos Estados às diretrizes da CEDAW. Além disso, ele possibilitou a efetivação do Protocolo Facultativo, pois permite que as mulheres enviem, sozinhas ou em conjunto, queixas, reclamações e informações sobre violações aos seus direitos ou aos de outrem, a fim de que haja uma investigação e sejam indicadas medidas a serem tomadas.
Outro ponto importante é que o Comitê da CEDAW foi fundamental para a inclusão da violência contra mulher como forma de discriminação, tratada no art.1.º da Convenção de 1979. É necessário destacar que o texto original não mencionava nada sobre violência contra mulher, mas sua repetida ocorrência na realidade prática fez com que o Comitê adotasse, em janeiro de 1992, a Recomendação Geral n. º 19 e passou a considerar a violência como discriminação contra as mulheres, nos termos do art.1.º da Convenção de 1979. (MAZZUOLI, 2014).
Além da ausência do grave problema da violência contra a mulher no texto da CEDAW, a jurista Meghan Campbell (2015) destaca que outros pontos relevantes também estão ausentes do texto da Convenção.
Não há referência às mulheres que experimentam discriminação com base em raça, religião, etnia, status de imigrante, identidade sexual, orientação sexual, deficiência, idade ou condição socioeconômica ou em situação de violência, conflito ou o sistema de justiça. O preâmbulo refere-se à pobreza, discriminação racial, colonialismo e neocolonialismo; no entanto, não há disposições substantivas sobre essas questões no tratado.[2] (CAMPBELL, 2015, p. 486)
Assim, apesar de todos os esforços da CEDAW, para haja uma transformação na mentalidade social e cultural, ainda existem muitos pontos a serem discutidos para a efetivação da proteção feminina. Ademais, na prática, as mulheres ainda são vítimas de discriminação e violência e, mais do que a previsão legal, é preciso se pensar em tantas medidas quanto forem necessárias para mudar esse cenário, que é observado no Brasil por meio das estatísticas, pois são inúmeras as mulheres que não tem seus direitos trabalhistas respeitados ou são vítimas de violência e até de feminicídio.
3 DADOS SOBRE A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
As diversas notícias e dados sobre os desrespeitos sofridos chegam a assustar, mas não há surpresa e só constatam o que as mulheres sofrem no dia a dia, precisando lidar com a discriminação e a violência em diversos aspectos de suas vidas, como na área profissional, por exemplo, pois, segundo pesquisa presente no site do Banco Nacional de Empregos (BNE) e realizada pela consultoria IDados, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE, as mulheres ganham em média 20,5% a menos que os homens no Brasil. Além disso, um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas constatou mostra que, após dois anos, quase metade das mulheres que tiram licença-maternidade não voltam ao mercado de trabalho, sendo maior parte das desvinculações empregatícias sem justa causa e por iniciativa do empregador.
Os dados de violência e feminicídio são mais alarmantes, já que, com base encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) ao Instituto Datafolha, uma em cada quatro mulheres foi vítima de algum tipo de violência na pandemia no Brasil, ou seja, cerca de 17 milhões de mulheres (24,4%) sofreram violência física, psicológica ou sexual no último ano, isso significa uma estabilidade em relação à última pesquisa, de 2019, quando 27,4% afirmaram ter sofrido alguma agressão.
Entretanto, na comparação com os dados da última pesquisa, houve um aumento na participação de companheiros, namorados e ex-parceiros nas agressões, o que possivelmente fez com que a violência dentro de casa crescesse de 42% para 48,8% e as agressões na rua passassem de 29% para 19%, sendo mulheres separadas/divorciadas, negras e na faixa etária de 16 a 24 anos a maioria das vítimas dessa violência. Ademais, “mesmo com as medidas de restrição impostas para conter a pandemia de Covid-19, 37,9% das brasileiras sofreram algum tipo de assédio sexual. Em 2019, foram 37,1%.” (G1, 2021)
Gráfico 1: Vítimas de feminicídios, por mês (Brasil – 2019 – 2021)
Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Gráfico 2: Registro de vítimas de estupro e estupro de vulnerável, gênero feminino. Brasil, 2019-2021.
Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Para tentar mudar essa realidade, que se verifica em todo o país, o Estado do Maranhão busca implementar diversas ações afirmativas de combate a violência sofrida pelas mulheres. Dentre elas, cabe mencionar: a criação de um Plano Estadual de Políticas para as Mulheres (PEPM-MA), que orientam a implementação de políticas públicas na área, e a aprovação de uma lei que determina a realização, em escolas públicas estaduais e instituições privadas, de uma campanha educativa anual de combate à violência contra a mulher e promoção da cultura de paz. Além disso, como medidas significativas, destacam-se a criação do Departamento de Feminicídio, da Coordenadoria das Delegacias de Atendimento e Enfrentamento à Violência contra a Mulher (Codevim) e da Patrulha Maria da Penha (policiamento que atua exclusivamente no acompanhamento da mulher vítima).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após todo o apanhado do que é essa Convenção e a sua efetivação no Brasil, conclui-se que, mesmo com todo o esforço da CEDAW para mudar mentalidade social e cultural, a fim de as mulheres possam ter acesso e gozar de seus direitos, bem como serem tratadas de forma igualitária, a realidade ainda se distancia do objetivo pretendido.
Nota-se que, apesar do esforço estatal com a implantação de ações afirmativas, as mulheres, principalmente as brasileiras, ainda sofrem com um cenário de exclusão, discriminação e violência. Assim, na prática, a Convenção ainda é muito desrespeitada e as mulheres ainda são vistas como pessoas indignas do respeito aos seus direitos, bem como de estar no mesmo patamar que os homens, sendo as estatísticas uma prova disso.
Desse modo, mesmo que haja políticas públicas de combate à violência, como no Estado do Maranhão, de inserção da mulher no mercado de trabalho, de proteção a maternidade e de igualdade salarial, a realidade será difícil de mudar, pois a transformação deve ocorrer de dentro para fora, ou seja, deve haver uma transformação do pensamento.
É importante destacar que não se exclui a ação estatal para garantir a efetivação dos direitos femininos e a igualdade de gênero, visto que a mudança está ocorrendo de forma muito lenta, gradual e relutante, mas deve haver, primeiramente, uma modificação na forma de pensar da sociedade, para que os comportamentos se transformem e as ações de combate à violência, a desigualdade entre os gêneros se tornem cada vez menos frequentes e o respeito seja mais visto na realidade brasileira.
Sendo assim, é preciso que se invista não apenas na repressão das formas de violência contra a mulher, mas na educação da população, pois através de uma transformação de dentro para fora, e não o contrário, é que as mulheres deixarão de ser marginalizadas, coisificadas e mortas por uma sociedade patriarcal que não as vê como sujeitos de direitos e sim como objeto.
REFERÊNCIAS
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[1] Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão.
[2] No original: “There is no reference to women experiencing discrimination based on race, religion, ethnicity, migrant status, sexual identity, sexual orientation, disability, age or socio-economic status or in violence, armed conflict or the justice system. The preamble refers to poverty, racial discrimination, colonialism and neo-colonialism; however, there are no substantive provisions on these issues in the treaty.” (CAMPBELL, 2015, p. 486)