Super-Receita. Comentários genéricos
Kiyoshi Harada*
Sumário: 1 Criação e atribuições da nova Secretaria da Receita Federal do Brasil. 2 Preservação da autonomia financeira da autarquia securitária. 3 A transferência dos processos administrativos tributários em curso perante o InSS. 4 Inclusão dos créditos previdenciários na dívida ativa da União. 5 Órgãos de representação judicial e extrajudicial. 6 Processo administrativo fiscal. 7 Compensação de créditos tributários. 8 Parcelamento de débitos previdenciários.
1.Criação e atribuições da nova Secretaria da Receita Federal do Brasil
A Lei nº 11.457, de 16-3-2007, criou a Secretaria da Receita Federal do Brasil mediante transformação da Secretaria da Receita Federal (art. 1º) e extinção da Secretaria da Receita Previdenciária do Ministério da Previdência Social (§ 4º do art. 2º).
A nova Secretaria, subordinada ao Ministro de Estado da Fazenda, além de continuar com as atribuições da anterior Secretaria da Receita Federal, recebeu a incumbência de planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, fiscalização, arrecadação e cobrança e recolhimento das contribuições sociais previstas nas alíneas a, b, e c do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 24-7-1991, (contribuições previdenciárias), e contribuições devidas a terceiros (arts. 2º e 3º).
2 Preservação da autonomia financeira da autarquia securitária
Para assegurar a autonomia financeira da autarquia securitária, o produto de arrecadação dessas contribuições e acréscimos legais incidentes serão destinados, em caráter exclusivo, ao pagamento dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social e creditado diretamente ao Fundo do Regime de Previdência Social de que trata o art. 68 da LC nº 101, de 4-5-2000, vinculado ao Ministério da Previdência e Assistência Social (art. 2º § 1º). Pelos serviços prestados, a SRFB cobrará do INSS 3,5% do montante arrecadado, cujo produto será creditado ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização – FUNDF, instituído pelo Decreto-lei nº 1.437, de 17-12-1975.
3 Transferência dos processos administrativos tributários em curso perante o INSS
Os processos administrativos tributários em curso, bem como as guias e declarações apresentadas ao Ministério da Previdência Social ou ao INSS, referentes às contribuições previdenciárias e aquelas devidas a terceiros são transferidos para a Secretaria da Receita Federal do Brasil (art. 4º).
Cabe ao INSS, além das atribuições próprias estabelecidas em lei: I – emitir certidão relativa a tempo de serviço; II – gerir o Fundo do Regime Geral de Previdência Social; III – calcular o montante das contribuições previdenciárias e emitir o correspondente documento de arrecadação, com vistas ao atendimento conclusivo para concessão ou revisão do benefício requerido (art. 5º).
4 Inclusão dos créditos previdenciários na dívida ativa da União
A partir do dia 1º de maio de 2007 os débitos referentes às contribuições previdenciárias e àquelas devidas a terceiros (arts. 2º e 3º) passaram a constituir dívida ativa da União. E a partir de 1º de abril de 2008 a dívida ativa do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE decorrentes de contribuições previdenciárias e de contribuições devidas a terceiros, passarão a constituir dívida ativa da União (art. 16 e § 1º). A inscrição na dívida ativa da União dessas contribuições não altera a destinação final do produto da respectiva arrecadação (art. 16, § 7º).
5 Órgãos de representação judicial e extrajudicial
Houve unificação das duas Secretarias: a SRF e a SRP. Entretanto, não houve a desejada unificação dos órgãos de representação.
Na forma do § 3º do art. 16 compete à Procuradoria Geral Federal representar judicial e extrajudicialmente:
I – o INSS e o FNDE, em processos que tenha por objeto a cobrança de contribuições previdenciárias, até lº de abril de 2008;
II – a União, nos processos da Justiça do Trabalho relacionados com a cobrança de contribuições previdenciárias, de imposto de renda retido na fonte, de multas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações do trabalho, mediante delegação da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, ressalvada a representação privativa da União pela PGFN na execução de sua dívida ativa de caráter tributário (§ 4º do art. 16).
Como se verifica, no caso do item I, a atuação da Procuradoria Geral Federal tem caráter transitório, mas no caso do item II, hipótese em que a PGF age por delegação da PGFN, tem caráter definitivo.
Não se sabe por que razão foi mantida a PGF apenas para representar a União junto à Justiça do Trabalho, se a representação judicial na cobrança de créditos de qualquer natureza, inscritos na Dívida Ativa da União, que abrange as contribuições previdenciárias e aquelas dívidas a terceiros, como vimos, compete à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, nos termos do art. 23.
6 Processo administrativo fiscal
Como resultado da unificação da SRF e da SRP os processos administrativos envolvendo as contribuições previdenciárias passam a ser regidos pelo Decreto nº 70.235, de 6-3-1972, nos termos do art. 25, obedecidos os seguintes lapsos temporais:
I – Os processos de consulta fiscal relativos a contribuições previdenciárias, a partir de 1º de maio de 2007, aplicando-se também os dispostos nos artigos 48 e 49 da Lei nº 9.430, de 27-11-1996;
II – Os processos contenciosos envolvendo as contribuições previdenciárias e aquelas devidas a terceiros, a partir de 1º de abril de 2008, com a faculdade de o Executivo antecipar ou postergar esse prazo no que se refere a procedimentos fiscais, instrumentos de formalização do crédito tributário, prazos processuais e competência para julgamento de 1ª instância pelos órgãos de deliberação interna e natureza colegiada.
O art. 24 dispõe que “é obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo de 360 dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos”.
Atualmente, a finalização do processo administrativo tributário leva em média 4 (quatro) anos. Pelo novo texto, se considerarmos três instâncias administrativas, o prazo seria reduzido para no máximo 3 anos, ou seja, um ano para decisão de 1ª instância; um ano para decisão do recurso pelo Conselho de Contribuintes; e um ano para decisão de eventual recurso especial pela Câmara Superior de Recursos Fiscais. Para conferir eficácia a esse dispositivo faltou a estipulação da respectiva sanção na hipótese de seu descumprimento.
A competência do Conselho de Recurso da Previdência Social para julgamento de recursos pertinentes às contribuições sociais e aquelas devidas a terceiros ficou transferida para o 2º Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda.
7 Compensação de créditos tributários
Como é sabido, a partir do advento da Lei nº 10.637/02 passou a ser possível a compensação direta de créditos tributários pelo sujeito passivo da obrigação tributária, desde que pertinentes àqueles administrados pela Secretaria da Receita Federal de então. É a chamada compensação branca.
Com a unificação da SRF e da SRP era de se esperar que pudesse haver compensação de tributos da União com as contribuições do INSS e vice-versa. Como se sabe, a maior dificuldade dos contribuintes da Previdência Social era e é a de compensar os seus créditos acumulados, decorrentes da retenção de 11% a título de ‘antecipação’ (Lei nº 9.711/98).
Antes do advento da Lei nº 11.457/2007 sob comento, a Instrução Normativa Conjunta SRF/SRP nº 629, de 10-3-2006, tornava possível a compensação de ofício de tributos entre os dois órgãos. A restituição ou ressarcimento de créditos a cargo da SRF ficava condicionada à inexistência de débito junto ao INSS relativamente ao mesmo contribuinte. Em havendo débito, operava-se a compensação extinguindo-se o débito da contribuição previdenciária mediante emissão de guia da Previdência Social (GPS) por meio de Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi).
Dessa forma, o contribuinte em débito com o INSS, inclusive em relação àquele oriundo de retenção na fonte, poderia, indiretamente, obter compensação com o crédito tributário de qualquer natureza que tivesse junto à SRF. O que voluntariamente o contribuinte não poderia compensar (contribuição retida na fonte) poderia feito por meio da compensação de ofício.
Só que a situação inversa, isto é, compensar o débito de tributos federais com o crédito do INSS não era possível, nos termos da IN retro referida. A compensação de ofício visava tão só promover a liquidação de débitos junto ao INSS.
A Lei sob comento mantém a mesma sistemática, dispondo em seu art. 26 que o valor correspondente à compensação de débitos previdenciários será repassado ao Fundo de Regime Geral da Previdência social no prazo máximo de 2 (dois) dias úteis após a data em que promovida de ofício ou em que for deferido o respectivo requerimento. O parágrafo único desse mesmo artigo veda a compensação de créditos previdenciários.
Os débitos tributários poderão ser compensados com créditos de quaisquer outros tributos, a exceção dos créditos de contribuições previdenciárias, apesar de todos os tributos estarem concentrados em torno da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
A manutenção de tal sistemática não é lógico, nem razoável. Fere o princípio da simetria, à medida que permite a extinção do débito representado pela contribuição previdenciária mediante compensação com crédito de qualquer outra espécie tributária, mas veda a operação inversa.
8 Parcelamento de débitos previdenciários
Nos termos do art. 32, os débitos previdenciários dos Estados, DF e de suas autarquias e fundações, com vencimento até 1º de abril de 2007, poderão ser parcelados em até 240 (duzentos e quarenta) prestações mensais e consecutivas.
Os débitos resultantes de retenção na fonte só poderão ser parcelados até 60 (sessenta) prestações mensais (§ 3ºdo art. 32).
Na hipótese de não pagamento da prestação na data do vencimento, serão retidos e repassados à Secretaria Da Receita Federal do Brasil recursos do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal suficientes para sua quitação, acrescidos de juros pela taxa ‘Selic’, acrescido ainda de 1% no mês do pagamento da prestação (§ 4º do art. 32).
Estranhamente os débitos previdenciários dos Municípios não foram abrangidos pelo regime de parcelamento.
* Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Conselheiro do IASP. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
E-mail: kiyoshi@haradaadvogados.com.
Site: www.haradaadvogados.com.br