Resumo: Para melhor compreensão do conceito de sucessão trabalhista, que se dá quando ocorre mudança na propriedade da empresa ou alguma alteração significativa na sua estrutura jurídica, sendo que a empresa continua utilizando-se dos serviços dos empregados da sucedida, utilizou-se tanto os conceitos de empregador, grupo econômico e solidariedade como sua natureza jurídica.
Palavras-chave: Sucessão trabalhista, conceitos, natureza jurídica e continuidade.
Abstract:To better understand the concept of labor succession, that is when change occurs in the ownership of the company or a significant change in its legal structure, and the company continues using the services of employees of the successful, so we used the concepts of employer, and economic group solidarity as its legal nature.
Sumário. 1. Introdução. 2. Conceitos Gerais. 2.1. Sucessão Trabalhista. 2.2. Requisitos da sucessão trabalhista. 3. Natureza jurídica da sucessão trabalhista no direito brasileiro contemporâneo. 3.1. Novação e Delegação. 3.2. Cessão de Créditos. 3.3 Sub-Rogação. 3.4 Estipulação em Favor de Terceiros. 3.5 Singularidade da Natureza Jurídica da Sucessão Trabalhista. 4. Efeitos da continuidade na sucessão trabalhista. 5. Conclusão. 6. Referências.
1. Introdução:
O presente artigo tem por finalidade falar acerca da sucessão trabalhista. Num primeiro momento, abordam- se os conceitos de empregador, grupo econômico e solidariedade e suas repercussões.
Logo após, enfatiza-se que a natureza jurídica da sucessão trabalhista não pode encaixar-se nos conceitos civilistas como da novação, estipulação em favor de terceiro, cessão, delegação e sub-rogação, tendo caráter singular.
Por fim, diz-se que como o contrato de trabalho é personalíssimo nada impede a sucessão por outro empregador que responderá pelos contratos de trabalho concluídos pelo antigo. Dessa forma, observa-se que a inalterabilidade dos contratos de emprego é, sem sombra de dúvidas, um dos efeitos da sucessão trabalhista.
2. Conceitos Gerais
Inicialmente para uma melhor compreensão da sucessão trabalhista temos que fazer uma análise de alguns conceitos básicos.
Primeiramente cabe discorrer sobre o conceito de Empregador esculpido na Consolidação de Leis do Trabalho.
O conceito de empregador é encontrado no artigo 2° da CLT:
Art. 2º Considera-se empregador a empresa individual ou coletiva, que, assumindo os riscos de atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.
§ 1º Equiparam-se ao empregador, para os direitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.
O dispositivo supracitado é alvo de críticas, positivas e negativas, da doutrina brasileira, principalmente quanto ao uso da palavra empresa para conceituar empregador.
A respeito das críticas (DELGADO, 1995, P.327e 328) diz que a palavra empresa ao ser utilizada “representa uma inequívoca influência da corrente teórico-doutrinária” e completa dizendo que a eleição do termo empresa, pela Consolidação, para designar a figura do empregador apenas denuncia, mais uma vez, a forte influência institucionalista e da teoria da relação de trabalho que se fez presente no contexto histórico de elaboração desse diploma justrabalhista. Enfatiza ainda que a Lei do Trabalho Rural (n. 5.889/73), construída em período histórico em que já não vigorava significativa influência dessas velhas correntes teóricas trabalhistas, não define empregador rural como empresa, porém como pessoa física ou jurídica (caput do art. 3° da Lei n. 5.889 de 1973).
(FILHO e MORAES, 2003, p.262,263 e264) a partir de vários conceitos definem e diferenciam empresa de estabelecimento. Para o autor empresa é a atividade de uma pessoa física ou jurídica, o empresário, que reúne pessoas e bens materiais e imateriais constituindo uma organização produtiva, com a finalidade de satisfazer as necessidades econômicas. Ressalte-se que a empresa pode ser constituída de um ou mais de um estabelecimento. Já o estabelecimento há titularidade de uma pessoa natural, ou jurídica, em nome e por conta da qual o estabelecimento é explorado, constituindo um conjunto de bens materiais e imateriais, como local, maquinaria, estoque, matéria-prima, patentes de invenção, créditos, direitos em geral, com finalidade técnica, ao contrário de empresa, cuja finalidade é econômica. Para o direito do trabalho, por não haver a diferenciação dirigente-dirigido, é destituído de interesse o estabelecimento de uma só pessoa. Cabe destacar que a titularidade do estabelecimento nem sempre se reveste da forma de propriedade, podendo dar-se sob a forma de locação, usufruto, ou qualquer outra forma válida em direito.
Pode-se, assim, constatar que se de um lado o uso da palavra empresa define de forma errônea empregador, de outro acentua o fenômeno da despersonalização da figura do empregador e legítima a aplicação do princípio da continuidade da relação laborativa.
(DELGADO, 1995, p.328) ainda enfatiza essa dicotomia dizendo que a falha técnica celetista (ou viés doutrinário) evidenciou, no correr da experiência trabalhista, um aspecto positivo, consubstanciado em sua funcionalidade. O autor destaca que a eleição do termo empresa tem o sentido funcional, prático, de acentuar a importância do fenômeno da despersonalização da figura do empregador. No decorrer de sua explanação diz que a CLT ao enfatizar, em seus artigos 10 e 448, a empresa como empregador a lei já indica que a alteração do titular da empresa não terá grande relevância na continuidade do contrato, dado que à ordem justrabalhista interessaria mais a continuidade da situação objetiva da prestação do trabalho empregatício ao empreendimento enfocado, independentemente da alteração de seu titular.
Ao analisar o §1° do artigo 2° da CLT observa-se que aqueles equiparados a empregadores na verdade são empregadores típicos e não por equiparação ou extensão legal. Ainda sobre o assunto (DELGADO, 2003,p.387) enfatiza que são entes sem fins lucrativos, mas esse aspecto não é relevante à configuração do tipo legal do empregador, por não se constituir em seu elemento fático-jurídico específico.
Portanto não há definição legal de que o empregador tenha que ser pessoa jurídica ou física, bastando que ele utilize a força de trabalho de pessoa física, com pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e sob subordinação ao tomador para ser definido como empregador. Esses elementos são caracterizadores da figura do empregado e, portanto o conceito de empregador deve ser definido a partir da existência dessas características da relação de emprego.
Assim ao observar configurada a figura do empregador, a do empregado e seus efeitos temos uma relação trabalhista.
Em sendo caracterizada a figura do empregador, o mesmo estará sujeito a determinados efeitos. Sobre esse assunto (DELGADO, 2003, p.388) pontua dois efeitos da figura do empregador, presentes em quase todas situações sociojurídicas pertinentes à existência do mesmo. Estando de um lado, a sua despersonalização, para fins justrabalhistas e de outro a assunção dos riscos do empreendimento e do próprio trabalho contratado.
A despersonalização da pessoa jurídica consiste em nada menos que a circunstância de autorizar a ordem justrabalhista à plena modificação do sujeito passivo da relação de emprego (o empregador), sem prejuízo da preservação completa do contrato empregatício com seu novo titular. (DELGADO, 2003, p.388) Já a assunção dos riscos do empreendimento ou trabalho (alteridade) consiste na circunstância de impor a ordem justrabalhista à exclusiva responsabilidade do empregador que assume os riscos da empresa, do estabelecimento e do próprio contrato de trabalho e sua execução. (DELGADO, 2003, p.389)
Ainda a respeito da despersonalização da pessoa jurídica (GOMES e GOTTSCHALK, 2001, p.97) ressaltam que à medida que se aperfeiçoava a tecnologia de produção e se desdobrava o mecanismo da sociedade anônima, acarretando modificações profundas na estrutura econômica das empresas, a figura do empregador, seu dirigente em pessoa, foi se ausentando do local de trabalho. Fugindo ao contrato com os empregados, o empregador, pouco a pouco, despersonalizava-se.
O Tribunal Superior do Trabalho, a respeito do caso, vem se manifestando em favor da proteção dos créditos trabalhistas, de modo que a empresa venha a garantir todos os créditos trabalhistas passados, presentes e futuros, despersonalizando a pessoa jurídica do empregador. Tal hipótese faz com que o trabalhador tenha maiores garantias. A despersonalização tem sido importante instrumento para evitar fraudes e demais artifícios utilizados para tentar burlar a legislação trabalhista, bem como os direitos dos trabalhadores. ( BRASIL. 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho. AIRR n. 724863. Relator: Ministro Rider de Brito. Data do Julgamento: 06.02.2004. In: JURIS SÍNTESE IOB n°50 – nov/dez de 2004.Cd-Rom. SUCESSÃO TRABALHISTA – BANCO BRADESCO S/A. E BANCO DE CRÉDITO REAL DE MINAS GERAIS S/A.)
Cabe ainda destacar que a jurisprudência tem assegurado os direitos adquiridos pelos empregados, junto ao antigo empregador, permanecendo íntegros, independentemente da transformação que possa ocorrer com a pessoa física ou jurídica detentora da empresa ou de sua organização produtiva, de forma que o novo explorador da atividade econômica torna-se responsável por todos os encargos decorrentes da relação de emprego. Trata-se, na verdade, da aplicação do princípio da despersonalização do empregador, onde a empresa, como objeto de direito, representa a garantia de cumprimento das obrigações trabalhistas, independentemente de qualquer alteração ou modificação que possa ocorrer em sua propriedade ou estrutura orgânica. (BRASIL. 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho. RR n. 3112. Relator: Ministro Milton de Moura França. Data do Julgamento: 22.08.2003.In:JURIS SÍNTESE IOB n°50 – nov/dez de 2004.Cd-Rom. SUCESSÃO – RESPONSABILIDADE)
Outro conceito que não pode ser deixado de lado é o de Grupo Econômico. ( MARANHÃO e CARVALHO,1993, p.91)afirmam que tal fenômeno surgiu diante da concentração econômico-financeira, típica do capitalismo moderno, tomando o Direito do Trabalho posição sobre o assunto, com a finalidade de oferecer ao empregado de um estabelecimento coligado a garantia dos seus direitos contra as manobras fraudulentas ou outros atos prejudiciais, aos quais se prestariam com relativa facilidade às interligações grupais entre administrações de empresas associadas, caso prevalecesse o aspecto meramente jurídico formal.
Sobre o conceito de Grupo Econômico ( DELGADO, 2003, p.393)define como a figura resultante da vinculação justrabalhista que se forma entre dois ou mais entes favorecidos direta ou indiretamente pelo mesmo contrato de trabalho, em decorrência de existir entre esses entes laços de direção ou coordenação em face de atividades industriais, comerciais, financeiras, agroindustriais ou de qualquer outra natureza econômica.
O artigo 2°, § 2° da Consolidação de Leis do Trabalho e a Lei do Trabalho Rural em seu artigo 3° dão a tipificação legal de grupo econômico:
Art.2. §2° Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.
Já o artigo 3°, §2°, da lei n.° 5.889 de 1973 acrescenta um requisito:
Sempre que uma ou mais empresas, embora tendo cada uma delas personalidade jurídica própria, estiverem sob direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico e financeiro rural, serão responsáveis solidariamente nas obrigações decorrentes da relação de emprego.
Ambos artigos têm de ser interpretados conjuntamente para a prefeita caracterização do grupo econômico para fins justrabalhista.
Portanto, conforme os artigos supracitados, pode-se observar que esse conceito abrange somente as figuras trabalhistas. (DELGADO, 2003, p.395) falando sobre a caracterização do Grupo Econômico e sua abrangência objetiva ressalta que o mesmo não necessita se revestir das modalidades jurídicas típicas do Direito Econômico ou Direito Comercial (holding, consórcios, pools, etc.). O doutrinador diz que não se exige, sequer, prova de sua formal instituição cartorial, ou seja, pode-se acolher a existência do grupo desde que emerjam evidências probatórias de que estão presentes os elementos de integração interempresarial de que falam os mencionados preceitos da CLT e da Lei do Trabalho Rural.
O autor ainda menciona uma abrangência subjetiva dos componentes do grupo econômico, não podendo ser qualquer pessoa física ou jurídica, massa falida ou entes despersonificados. Há, portanto, de se compor entidades estruturadas como empresas, tendo caráter e fins econômicos. (DELGADO, 2003, p.396)
Porém conforme demonstra a jurisprudência não há necessidade de que as empresas integrem a mesma categoria econômica.
A respeito do tema o Tribunal Superior do Trabalho tem se manifestado no sentido de que as empresas respondem solidariamente pelos créditos trabalhista, em razão de ser integrante do mesmo grupo econômico formado por empresas, hipótese que encontra amparo no § 2º do artigo 2º consolidado, e que não exige, para a configuração do grupo econômico, que as empresas integrem a mesma categoria econômica. (BRASIL. 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho. RR n. 549517. Relatora: Juíza Conv. Dora Maria da Costa. Data do Julgamento: 13.08.2004. In:JURIS SÍNTESE IOB n°50 – nov/dez de 2004.Cd-Rom. RECURSOS DE REVISTA)
No que tange ao Estado e suas entidades (DELGADO, 2003, p.396 e 397) ainda esclarece que em princípio, não podem, efetivamente, compor grupo econômico, como pacífico na doutrina e jurisprudência. Tal exclusão ocorre por serem públicas, sociais, comunitárias as atividades e fins do Estado e seus agentes institucionais. Destaca o autor que acaso o Estado pratique atividade notoriamente econômica, ele o faz, em tese, como instrumento para a realização de seus fins indispensáveis, que se preservam como públicos, sociais ou comunitários. A atividade econômica seria, pois, meramente instrumental, e não definitória dos fins do Estado e seus entes.O autor ainda menciona uma exceção a essa excludente estatal: se as próprias entidades estatais, organizadas em moldes privados, passam a se reconhecer e classificar, em seus estatutos, como grupo econômico para os fins inerentes ao Direito Civil e Direito Comercial (como tende a acontecer com os conglomerados financeiros oficiais), elas irão, automaticamente, sujeitar-se aos efeitos trabalhistas de sua situação fático-jurídica de grupo, isto é, aos efeitos do art. 2°, §2° da CLT.
Outro ponto que merece destaque é o nexo relacional interempresarial onde a lei descreve a modalidade da relação integrante do grupo econômico. Há duas correntes doutrinárias a respeito desse tema onde de um lado a primeira exige, para que se configure grupo econômico, relação interempresarial, através do controle, direção, administração da empresa principal sobre as demais. De outro lado à segunda corrente defendida por (NASCIMENTO,1989, p.141) diz que basta uma relação de coordenação entre as diversas empresas sem que exista uma em posição predominante, tendo-se em vista a finalidade do instituto, que é a garantia da solvabilidade dos créditos trabalhistas.
A corrente defendida pelo eminente doutrinador Amauri Mascaro do Nascimento parece mais correta porque amplia a configuração do grupo econômico para fins trabalhista e conseqüentemente dá uma maior proteção à parte hiposuficiente da relação, o trabalhador.
A solidariedade por sua vez é passiva e ativa, ou seja, responde o grupo econômico não só pelas obrigações trabalhistas decorrentes dos contratos de emprego, mas também pelos direitos e prerrogativas decorrentes desses contratos.
A respeito desse tema o Enunciado 129 do Tribunal Superior do Trabalho reforça a idéia do duplo efeito da solidariedade:
TST Enunciado nº 129 – A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário.
(DELGADO, 2003, p.401) ainda enfatiza os efeitos da solidariedade ativa e passiva, bem como a aplicabilidade do enunciado 129 do TST.
O autor diz que desde que se acolha a tese ativa (além da incontroversa solidariedade passiva), alguns importantes efeitos justrabalhistas podem se verificar quanto a determinado empregado vinculado ao grupo econômico. Citem-se, ilustrativamente, alguns desses potenciais efeitos: a) ocorrência da acessio temporis, isto é, a contagem de tempo de serviço prestado sucessivamente as diversas empresas do grupo; b) possibilidade de veiculação da temática de equiparação salarial em face de empregados de outras empresas do grupo – caso configurados, evidentemente, os demais pressupostos do art. 461 da CLT; c) pagamento de um único salário ao empregado por jornada normal concretizada, ainda que o obreiro esteja prestando serviços concomitantemente as distintas empresas do grupo (Enunciado, 129, TST); d) natureza salarial dos valores habituais recebidos de outras empresas do grupo por serviços prestados diretamente a elas (como conseqüente efeito expansionista circular dos salários); d) extensão do poder de direção empresarial por além da específica empresa em que esteja localizado o empregado – com o que se autorizaria, a princípio, a transferência obreira de uma para outra empresa do grupo, respeitadas as limitações legais quanto à ocorrência de prejuízo (art. 468, CLT). Ressalte-se que, mesmo no caso de grupo econômico, a transferência de localidade sempre exigirá real necessidade do serviço – Enunciado 43, TST -, submetendo-se, ainda, às demais regras do art. 469 da CLT.
Com o cancelamento do enunciado 205 do TST onde o responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução. (Res. 11/1985, DJ 11.07.1985) parece claro que existindo um grupo econômico, qualquer uma das empresas poderá ser acionada no processo de execução, mesmo que não tenha participado do processo de conhecimento.
Conforme já exposto a responsabilidade solidária do Grupo Econômico está prevista em Lei, mais especificamente no artigo 2º §2° da Consolidação de Leis do Trabalho, o que significa dizer que o empregado pode exigir de todos os componentes ou de qualquer deles o pagamento por inteiro da dívida, mesmo que tenha trabalhado para apenas uma das pessoas jurídicas que compõem o grupo.
O cancelamento de tal enunciado traz uma maior agilidade ao processo trabalhista evitando, dessa forma, algumas situações corriqueiras nos processos de execução. Cite-se a título exemplificativo as inúmeras suspensões da execução pelo fato de que o exeqüente não consegue encontrar bens passíveis de penhora pertencentes ao sujeito passivo da ação trabalhista.
Nesse caso, se posteriormente, descobre que há outras empresas que compõem o mesmo grupo econômico poderá o exeqüente requerer a penhora sobre os bens das empresas encontradas.
Vale lembrar que o supracitado artigo 2, §2° da CLT em nenhum momento limita a responsabilidade solidária à participação das empresas no processo de conhecimento. Ademais quando da penhora de bens de uma empresa do grupo econômico que não participou do processo de conhecimento, a mesma poderá discutir a sua legitimidade em compor a lide como componente do grupo, não havendo cerceamento de direito de defesa.
A insuficiência de bens da empresa demandada surge na execução, e poderá advir de uma cisão, transformação ou simplesmente pela baixa lucratividade do negócio, fato é que em qualquer das hipóteses, fraudulentas ou não, tem de haver a proteção ao trabalhador, através do princípio do in dúbio pro operario.
Além do mais, trazer ao processo de conhecimento todas as empresas que constituem um Grupo econômico contrariaria um outro princípio consagrado no direito do trabalho, o da celeridade.
Por fim destacamos que o sujeito passivo do título executivo poderia ter descumprido direitos em benefício de outra empresa do Grupo Econômico, fato que seria quase impossível para o empregado provar.
2. 1 Sucessão Trabalhista
A sucessão de trabalhista está prevista nos artigos 10 e 448 da Consolidação de Leis do Trabalho.
Ambos artigos tratam da hipótese de mudanças na estrutura jurídica da empresa:
art. 10 – Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.
art. 448 – A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.
Com base nesses dois artigos podemos claramente observar a aplicação do princípio da continuidade da relação de emprego, pois ao empregado pouco importa quem é ou quem deixa de ser o novo empregador, ou qual alteração jurídica ocorrida dentro da empresa, tendo, portanto que ser assegurado nessa nova estrutura jurídica empresarial os direitos adquiridos e os contratos de trabalho dos respectivos empregados.
Quanto a isso (FILHO e MORAES, 2003, p.268 e 269) enfatiza que o contrato de trabalho acompanha o estabelecimento, como elemento indispensável da sua constituição, através de todas as suas vicissitudes. Para ele pouco importa aos exercentes de uma relação de emprego suas transformações subjetivas que se operem na estrutura jurídica do organismo patronal: venda, cessão, doação, alteração, fusão, locação, usufruto ou qualquer outra modificação quanto à sua propriedade ou titularidade. Ressalta que a sucessão dá-se ope legis, por força de lei, ficando o sucessor inteiramente responsável pelas obrigações do sucedido, não valendo acordos ou convenções entre eles para elidir os efeitos da disposição legal, de ordem pública. Ainda destaca que o novo empregador substitui o antigo, sub-roga-se na totalidade das suas relações jurídicas, com assunção privativa de seus direitos e obrigações.
Além da previsão normativa a doutrina atribui como fundamento da sucessão trabalhista três princípios básicos do Direito Trabalhista. (SENA, 2000, p.217 e 218) menciona o princípio da intangibilidade dos contratos de trabalho sob o prisma objetivo, o princípio da continuidade (perpetuação) da relação de emprego e o princípio da despersonalização da figura do empregador.
(NASCIMENTO, 1999, P.205) completa dizendo que os contratos de trabalho são mantidos com a organização de trabalho e não com as pessoas que estejam eventualmente à frente dessa mesma organização. Portanto, a intangibilidade dos contratos é preservada pelo direito do trabalho, fenômeno que encontra raízes históricas na Carta Del Lavoro, cujo art. XVIII dispunha que nas empresas de trabalho contínuo a transferência da empresa não resolve o contrato de trabalho, e o pessoal a ela pertencente conserva os seus direitos em relação ao novo titular.
Conforme a doutrina moderna a sucessão trabalhista, assim como todo o direito sofre transformações. Sobre o assunto Adriana Goulart de Sena diz que atualmente, o instituto justrabalhista sucessório emerge como instrumento da caracterização efetiva da continuidade da relação de emprego em situações de alterações empresariais (internas ou entre empresas). É que, mesmo que haja alteração subjetiva (empregador) a sucessão trabalhista viabiliza a preservação do liame empregatício conforme moldes anteriores, já em face do novo titular da unidade econômico-jurídica.
Por fim a (SENA, 2000, p.217 e 219) ressalta que a sucessão trabalhista exsurge como um dos instrumentos mais expressivos da afirmação da impessoalidade do empregador no contexto da relação empregatícia.
Diante do exposto se pode extrair um conceito de sucessão trabalhista que servirá de base para abordar o tema em estudo. (DELGADO, 1995, p.339 e 340), diz que sucessão de empregadores, ou trabalhista é o instituto justrabalhista em virtude do qual se opera, no contexto da transferência da titularidade de empresa ou estabelecimento, uma completa transmissão de créditos e assunção de dívidas trabalhistas entre o alienante e o adquirente envolvidos.
Cabe ainda destacar que com do Novo Código Civil Brasileiro, que entrou em vigor em janeiro de 2002, trouxe profundas mudanças no Direito das Empresas bem como na sua regulamentação. Algumas dessas mudanças têm significativa importância ao tema em estudo, começando pelo Capítulo X, que vai do artigo 1113 ao 1122 do Código Civil, e que trata da transformação, incorporação, fusão e cisão das sociedades.
Todas essas formas de alteração societária geram efeitos para as partes. O artigo 1025 do Código Civil prevê um dos efeitos em relação ao sócio que ingressa na sociedade.
art. 1025 – O sócio, admitido em sociedade já constituída, não se exime das dívidas sociais anteriores à admissão.
Conforme se pode observar o artigo supracitado corrobora com a responsabilização do sucessor aos créditos trabalhistas passados, presentes e futuros.
Outro artigo que merece destaque é o 1032 do Código Civil que trata da responsabilidade dos sócios em caso de retirada, exclusão ou morte.
art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação.
Esse artigo abre a possibilidade de responsabilização do sucedido no caso acima citado.
Por fim cabe destacar que o artigo 1146 do Código Civil faz menção à responsabilidade do adquirente do estabelecimento.
art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.
O artigo faz previsão do prazo de um ano para responsabilização do devedor primitivo pelos créditos vencidos, o que reforça a responsabilidade solidária do sucedido.
2.2. Requisitos da Sucessão Trabalhista
Como dito anteriormente o direito sofre inúmeras modificações no decorrer do tempo, visto que as relações e os fenômenos jurídicos, culturais, econômicos, sociológicos, filosóficos dentre outros não são estanques sofrendo inúmeras mutações.
A sucessão trabalhista de igual forma está sujeita a modificações, tanto que dentro desse instituto do Direito do Trabalho a doutrina se subdivide em visão clássica (ou tradicional) e moderna (ou extensiva).
Os requisitos da sucessão segundo a vertente clássica são a transferência de uma unidade econômico-jurídica de um titular para outro e a inexistência de ruptura na prestação de serviços pelo empregado, ou seja, a continuidade da prestação laborativa.
(GOMES, 1995, p.157) acrescenta a essas duas características, a persistência dos fins econômicos, porém tal traço não é indispensável para caracterização do instituto sucessório trabalhista.
A transferência de uma Unidade Econômico-Jurídica de um titular para outro pressupõe o transpasse objetivado pela ordem justrabalhista. Esse transpasse da unidade econômico-jurídica pode ser referente a toda sociedade (conjunto societário), ao controle societário, a alguns estabelecimentos específicos, tais como filiais ou sucursais, quanto à parte da empresa, ou ainda parte do controle societário.
(SENA, 2000, p.212) completa dizendo que a sucessão trabalhista ocorre tanto na transferência de toda a organização, como também na transferência de apenas um ou alguns de seus estabelecimentos. Nas duas hipóteses, o pólo passivo subjetivo do contrato empregatício resta alterado, ingressando novo titular.
Não se pode esquecer que a própria Consolidação de Leis do Trabalho prevê como forma de sucessão trabalhista a alteração na estrutura jurídico-formal da pessoa jurídica, transformando simplesmente o tipo societário, desde que altere de modo significativo às garantias anteriores do contrato de emprego, pois, de qualquer forma, importa em transferência ou modificação do titular do empreendimento.
Ainda a respeito desse assunto (SENA, 2000, p.212) aduz que a sucessão trabalhista se verifica nas hipóteses de transferência de ‘unidades econômico-jurídicas’, ou seja, de universalidades. Os efeitos sucessórios celetistas (arts. 10 e 448) não se operam com a simples transferência de coisas singulares.
Sobre esse assunto (MARANHÃO, 1987, p.78) exemplifica, dizendo que não se configura sucessão o caso de venda de máquinas ou coisas singulares. A sucessão pressupõe a transferência de um para outro titular de uma organização produtiva, ainda que parte de um estabelecimento destacável como unidade econômica.
Alguns autores como o próprio Délio Maranhão, Evaristo de Moraes Filho, Roberto Barreto Prado todos defensores da vertente clássica condicionam ao instituto da sucessão trabalhista a transferência da organização produtiva, objetivas condições de sobrevivência, ou até exploração do mesmo negócio que exercia o sucedido. Se tais requisitos forem atrelados às sucessões trabalhistas estarão os empregados desprotegidos de situações comuns em nossa sociedade, como fraudes e etc.
Esses requisitos de forma alguma seriam recepcionados pelo artigo 9° da Consolidação de Leis do Trabalho:
art. 9° – Serão nulos de pleno direito os atos praticados com objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”, pois possibilitaria uma desvirtuação do instituto sucessório abrindo caminho para perpetuação de fraude contra os trabalhadores.
Outro ponto importante desse requisito, que é abordado por (DELGADO, 2003, p.405), é o Título Jurídico da Transferência, pouco importando para ordem justrabalhista a que título foi transferida a unidade econômico-jurídica. Para ele qualquer título jurídico hábil a operar transferência de universalidades no Direito brasileiro (logo, compra e venda, arrendamento, etc.) é compatível com a sucessão de empregadores.
O autor ainda intitula três situações peculiares envolvendo a sucessão trabalhista e o título jurídico de transferência. A primeira refere-se à viabilidade ou não da sucessão trabalhista em hipóteses de alteração ocorrida na empresa concessionária de serviço público. A segunda concerne aos efeitos do arrendamento na sucessão trabalhista. A terceira situação diz respeito à aplicabilidade dos arts. 10 e 448 da CLT nas aquisições de acervos empresariais em hasta pública.
Ressalta que no primeiro caso, prepondera já antigo entendimento de que, assumindo a nova empresa concessionária o acervo da anterior ou mantendo parte das relações jurídicas contratadas pela concessionária precedente, submete-se às regras imperativas dos dois preceitos celetistas, impositivos de obrigações e direitos trabalhistas prévios. Esse caso (como o das privatizações) não escapa, pois, à regra geral relativa à sucessão de empregadores.
Para ele a segunda situação merece destaque apenas para fins de se enfatizar que não se verifica qualquer óbice à incidência das regras cogentes da alteração subjetiva do contrato de emprego em casos de arrendamento de empresas ou estabelecimentos. Produz-se, no caso, sucessão trabalhista, em direção ao novo titular provisório do estabelecimento. Mais à frente pode-se operar, outra vez, nova alteração subjetiva do contrato, retornando ao pólo passivo da relação à antiga pessoa física ou jurídica originariamente arrendante. O título jurídico que confere substrato formal à transferência é, de fato, irrelevante.
A terceira das situações destacadas pelo autor (transferência por hasta pública) consistiria, entretanto, em singular exceção às regras estabelecidas nos arts. 10 e 448 da CLT.
Entende (DELGADO, 2003, p.408,409 e 410) ser juridicamente viável que os dispositivos da hasta pública elidam a incidência das normas da sucessão de empregadores na transferência operada. Já houve inclusive decisão do Tribunal Superior do Trabalho de que inexiste a sucessão trabalhista, quando o acervo da empresa falida é adquirido em hasta pública e repassado, sem qualquer ônus sobre ele incidente, para um terceiro adquirente. Nesta hipótese, a excepcional modalidade de transferência é que estaria conferindo a elisão acolhida jurisprudencialmente. É que objetivamente não há diferenciação substantiva entre essa e as demais situações em que se transfere a titularidade do estabelecimento ou empresa, preservando-se as relações de trabalho contratadas. Mas o título jurídico enfocado é tido como excepcional, submetido ao interesse de materializar a coisa julgada a que se refere, sendo hábil, portanto, a neutralizar a regra geral justrabalhista. Esclareça-se, contudo, que ainda assim emerge como relevante ao efeito elisivo aqui mencionado a previsão nos editais de hasta pública da ruptura propiciada pela aquisição do patrimônio a ser arrematado.
Portanto se pode observar que para toda regra há sua exceção. Tal hipótese foi construída pela jurisprudência e doutrina moderna, o tempo e a prática jurídica dirão se a hasta pública irá elidir as normas da sucessão trabalhista. No caso de adjudicação do patrimônio não parece ser esta regra a vigorar tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátria, pois se assim fosse abriria outro precedente para fraudar a relação trabalhista.
O segundo requisito, a inexistência de ruptura na prestação de serviço pelo empregado, vem sendo alvo de algumas críticas da vertente moderna ou extensiva, caso.
A inexistência de ruptura na prestação de serviço pelo empregado pressupõe, a priori, que o trabalhador já esteja laborando para o sucedido antes da sucessão trabalhista, e que após esse evento ele continue a prestar tal serviço ao sucessor, ou que permaneça à sua disposição.
(GOMES e GOTTSCHALK, 2001, p.98) ressaltam que na doutrina, é encontrada a referência ao princípio da continuidade da empresa e que tal princípio é de suma relevância em Direito do Trabalho. É ele o princípio mais relevante em matéria de empresa, pois a continuidade da relação de emprego é, normalmente, decorrência natural da continuidade do organismo empresário.
Ainda sobre este assunto (MARANHÃO, 1983, p.80) postula que salvo no caso do art. 453 da Consolidação (soma dos períodos descontínuos de trabalho), a sucessão – substituição de um dos sujeitos da mesma relação jurídica – opera-se em relação aos contratos vigentes.
A doutrina moderna ou extensiva considera o segundo requisito dispensável para configuração da sucessão trabalhista.
(DELGADO, 2003, p.410) ressalta que a presença do segundo requisito (ao lado, é claro, do primeiro já examinado) torna inquestionável a incidência do tipo legal celetista. Verificando-se a continuidade laborativa em cenário de transferência interempresarial haverá, indubitavelmente, sucessão de empregadores com respeito ao novo titular da empresa ou estabelecimento.
Em caso de ausência do segundo requisito terá o operador do direito tarefa mais difícil, cabendo ao mesmo uma análise mais detalhada das circunstâncias e do tipo de transferência interempresarial. Como já dito anteriormente a transferência terá que afetar de modo significativo às garantias anteriores do contrato trabalhista. (DELGADO, 2003, p.410) postula que estará, sim, propiciada a sucessão, ainda que a transferência interempresarial não tenha afetado significativamente o contrato empregatício, mas desde que se verifique a continuidade da prestação laborativa para o novo titular.
A Jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região já vem trabalhando com essa linha de raciocínio. Com a assunção de atividade e de significativa fração patrimonial do antigo empregador, comprometendo as garantias sedimentadas do contrato de trabalho, o adquirente assume a posição do sucessor, respondendo pelas velhas obrigações patrimoniais, independentemente da continuidade da prestação de serviços. (MINAS GERAIS. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região AP n. 4121. Relator: Juiz Maurício Godinho Delgado. Data da Publicação: 24.11.98. Sucessão Trabalhista — configuração — Responsabilidade do Sucessor)
Portanto a nova vertente extensiva considera tão somente como requisito essencial para a sucessão trabalhista qualquer mudança na estrutura intra ou interempresarial que afete de modo significativo os contratos de trabalho.
A respeito desse assunto Delgado esclarece que, mesmo para a nova vertente, a noção tida como fundamental é a de transferência de uma universalidade, ou seja, a transferência de parte significativa do(s) estabelecimento(s) ou da empresa de modo a afetar significativamente os contratos de trabalho. Ou seja, a passagem para outro titular de uma fração importante de um complexo empresarial (bens materiais e imateriais), comprometendo-se de modo importante o antigo complexo, pode ensejar a sucessão de empregadores, por afetar de maneira também importante os antigos contratos de trabalho.
(DELGADO, 2003, p.411) ainda destaca que não será toda e qualquer transferência interempresarial que será apta a provocar a sucessão trabalhista. Se ela vier acompanhada da continuidade da prestação laborativa para o novo titular, ocorrerá, sim é claro, a sucessão (vertente tradicional). Porém, não se verificando o segundo requisito, é preciso que se trate da transferência de universalidade empresarial que seja efetivamente apta a afetar os contratos de trabalho, sob pena de se estender em demasia o instituto sucessório, enxergando-o em qualquer negócio jurídico interempresarial.
3. Natureza jurídica da sucessão trabalhista no direito brasileiro contemporâneo
O tema ora em questão, a natureza jurídica da sucessão trabalhista, é e foi alvo de inúmeras divergências na tentativa de classificá-la. A doutrina inicialmente tentou enquadrar a sucessão trabalhista em algumas das figuras já existentes em nosso ordenamento jurídico, tais como os institutos clássicos civilistas dentre eles a novação, estipulação em favor de terceiro, cessão, delegação e sub-rogação. Porém na realidade, em que pese alguns desses institutos tenham alguns traços semelhantes da sucessão trabalhista, fato é que nenhum deles se enquadra perfeitamente ao instituto sucessório.
Sobre esse assunto, mais uma vez (DELGADO, 2003, p.349 e 350) diz que todas as tentativas de assimilação efetuadas conduziram à perda ou substantiva transformação de algum elemento constitutivo característico seja da sucessão trabalhista, seja das figuras civilistas cotejadas, comprometendo-se a validade daquelas assimilações intentadas.
Cabe, portanto analisar cada uma das hipóteses supramencionadas, mesmo que seja de forma superficial, a fim de afastar tais institutos civilistas.
3.1. Novação e Delegação
A novação nada mais é do que a extinção ou substituição da obrigação, com a conseqüente contração de uma nova. Além dessa hipótese, cabe ressaltar que alguns doutrinadores tentaram atribuir à natureza jurídica sucessória o instituto da delegação também chamado de cessão de débito, modalidade de novação onde o devedor originário indica terceira pessoa para resgatar seu débito.
O código civil traz em seu artigo 360 as hipóteses de novação:
Art. 360. Dá-se a novação:
I – quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior;
II – quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o credor;
III – quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao antigo, ficando o devedor quite com este.
Tal instituto depende do ânimo de novar, criar nova obrigação, o que nem sempre ocorre na sucessão trabalhista. José Martins Catharino, em análise com base no Código Civil de 1916, a respeito desse assunto ressalta que o nosso Código Civil disciplina a novação como um dos efeitos das obrigações (arts. 999 a 1008). O instituto possui dupla natureza: subjetiva e objetiva. Subjetivamente, implica ânimo de novar. Objetivamente, implica contração, pelo devedor, de nova dívida “para extinguir ou substituir a anterior.
Diante dos efeitos supracitados resta claro para o autor que na situação examinada, não há intenção de novar nem extinção de obrigação com celebração de outra independente.E vai mais adiante dizendo que a novação exige consentimento do credor, expresso, embora dispensável quanto ao devedor. (CATHARINO, 1982, p.147)
Assim pode se notar que os argumentos supracitados afastam a possibilidade da justaposição da sucessão trabalhista ao instituto da novação ou da delegação.
3.2. Cessão de Créditos
Conforme ensinamento da Professora (DINIZ, 1998, p.437), a cessão de crédito é um negócio jurídico bilateral, gratuito ou oneroso, pelo qual o credor de uma obrigação (cedente) transfere, no todo ou em parte, a terceiro (cessionário), independente do consenso do devedor (cedido), sua posição na relação obrigacional, com todos os acessórios e garantias.
A cessão de crédito é uma das formas de transmissão das obrigações. Quanto à origem, a cessão pode ser decorrente de lei, de decisão judicial e convencional. Tal instituto, cessão de crédito, está previsto no art. 286 do Código Civil de 2.002.
O artigo 286 do Código Civil diz que:
O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser à natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
Ainda em relação à cessão de crédito, o art. 290 do Código Civil, determina que a cessão de crédito não tenha eficácia em relação ao devedor, senão quando a esse notificada, mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
Em decorrência da analise do texto legal (SENA, 2000, p.242) enfatiza que a eventual convenção com o devedor pode impedir a cessão de créditos, o que não ocorre com a sucessão trabalhista. Nessa nenhuma convenção particular impedirá que os efeitos do transpasse se efetivem, efeitos esses tanto de assunção de créditos e débitos. Já na cessão de créditos civil, como o próprio nome diz, a sua abrangência é apenas dos créditos e não dos débitos.
O autor (CATHARINO, 1982, p.147) sobre cessão de créditos, completa dizendo que a nossa lei somente prevê a crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor. Com a sucessão, além de não haver cessão no sentido convencional, também há transmissão de débito, do sucedido para o sucessor, nem de delegação, pois o sucessor não é constituído pelo sucedido, seu delegado, para agir em seu nome.
Por todos esses elementos citados acima, como a convenção com o devedor e de que a sucessão vai abranger tanto créditos como débitos, não se poderia vincular a natureza jurídica do instituto sucessório a cessão de créditos.
3.3 Sub-Rogação
A Sub-rogação tem previsão legal no artigo 346 e seguintes do Código Civil, necessitando, portanto o consentimento de ambas as partes.
Assim para um melhor entendimento acerca do tema cabe transcrever os artigos 346 e 347:
Art. 346. A sub-rogação opera-se, de pleno direito, em favor:
I – do credor que paga a dívida do devedor comum;
II – do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel;
III – do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte.
O artigo 347 postula:
Art. 347. A sub-rogação é convencional:
I – quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos;
II – quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida, sob a condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito.
A sub-rogação nada mais é do que a substituição de uma coisa ou pessoa por outra, porém (CATHARINO, 1982, p.147) a respeito do enquadramento desse instituto como natureza jurídica da sucessão trabalhista faz a seguinte crítica de que a sub-rogação é convencional, e na sucessão a responsabilidade do sucessor não resulta de convenção feita com o sucedido, nem do consentimento do empregado, alheio ao que sucedido e sucessor convencionaram, por isso afasta a possibilidade de acertamento da natureza jurídica desta figura justrabalhista à sub-rogação. (SENA, 2000, p.242)
3.4 Estipulação em Favor de Terceiros
Tal instituto está previsto nos artigos 436 a 438 do Código Civil. Conforme (DINIZ, 1998, v.4, p.706) a estipulação em favor de terceiro é um contrato estabelecido entre duas pessoas, em que uma (estipulante) convenciona com outra (promitente) certa vantagem patrimonial em proveito de terceiro (beneficiário) alheio à formação do vinculo.
A respeito do tema (DELGADO, 2003 p.419 e 420) ressalta que a figura regulada pelo Direito Civil é estranha ao instituto dos arts. 10 e 448 da CLT. Para ele o empregado é credor dos direitos trabalhistas e devedor da obrigação de prestar trabalho e de outras prestações contratuais, e não mero terceiro favorecido. Desse modo, a sucessão provoca efeitos dialéticos, distintos, mas combinados, que se verificam que no âmbito de suas obrigações, ao contrário do que seria decorrente da figura civilista comparada.
(SENA, 2000, p.241), salienta que na estipulação de terceiros resta ao credor a garantia de uma vantagem nova, o que não ocorre ao empregado na sucessão trabalhista. Destaca que ao estipulante é garantido o direito à revogação da estipulação, se existir cláusula assegurando que o beneficiário irá executar o serviço. E, ao sucedido não é garantido que o empregado irá executar o serviço. Distintas as hipóteses, impossível assimilação da natureza jurídica de uma pela outra.
Portanto extrai-se que o instituto sucessório irá gerar efeitos para ambas as partes, o que não ocorre com a figura civilista da estipulação em favor de terceiros. Ademais o trabalhador não é mero terceiro favorecido o que afasta tal instituto da natureza jurídica sucessória.
3.5 Singularidade da Natureza Jurídica da Sucessão Trabalhista
Diante dos supracitados institutos do Direito Civil extrai-se o entendimento de que a natureza jurídica da sucessão trabalhista tem um traço singular, com caráter próprio, inassimilável a qualquer figura clássica do Direito Civil. O instituto juslaboral não se enquadra nos institutos civilistas conhecidos, tendo natureza jurídica própria. (DELGADO, 2003, p.419e420)
(FILHO, 1960, V.2, p.261) citado por (SENA, 2000, p.243 e 244) ensina que na sucessão trabalhista podem ser abandonadas as teorias institucionalistas, as de direito real, já que a explicação da natureza jurídica da sucessão se encontra no campo mesmo da teoria geral do direito, sem necessidade de frases equívocas, repassadas de valores políticos ou avessas aos princípios racionais do direito. Basta que se reconheça que ope legis, que o contrato de trabalho passou, obrigatoriamente, a fazer parte do estabelecimento industrial ou comercial.
Por fim (CATHARINO, 1982, p.148) completa reiterando que a sucessão é ope legis, de todos os créditos e débitos decorrentes da relação de emprego, que fica incólume. Assim, ela é, como considerada no Direito alemão, transmissão de crédito e assunção de dívida. Ou, melhor, imposição de crédito e de débito, ajustável por inteiro à relação de emprego, que é de trato sucessivo, com tendência a permanecer.
4. Efeitos da continuidade na sucessão trabalhista
De acordo com o que foi estudado no capítulo anterior a sucessão trabalhista tem como principal característica a assunção de direitos e obrigações trabalhistas pelos envolvidos no transpasse, bem como limitações entre esses mesmos envolvidos.
Segundo (SENA, 2000, p.223), a assunção dos créditos e débitos da sucessão trabalhista em nada difere dos outros ramos do direito, exemplifica que na sucessão civil, quem sucede, por ato inter vivos ou causa mortis, assume todos os débitos e créditos do sucedido. A autora ainda adverte que negar esses efeitos na esfera justrabalhista seria um contra senso, tendo o novo empregador que responder pelos contratos de trabalho concluídos pelo antigo, a quem sucede, ope legis, em razão da aquisição do estabelecimento, da aquisição da “organização produtiva”. A autora ainda lembra que estabelecimento é um conceito unitário.
A assunção dos direitos e deveres do trabalhador nasce da Lei, artigos 10 e 448 da Consolidação de Leis do Trabalho, que vedam qualquer alteração que afete de modo significativo os contratos de trabalho. Outro argumento trazido pelo eminente doutrinador ( PLÁ RODRIGUES,2000,p.296) é o caráter intuitu personae somente em relação à pessoa do trabalhador, já que em regra o contrato de trabalho não é de caráter pessoal em relação ao empregador. Isso se explica pela circunstância de que ao trabalhador o que interessa fundamentalmente é que se lhe conceda uma oportunidade de pôr suas energias à disposição de alguém, mediante o pagamento de um salário determinado. Para o autor, o fato de que a empresa pertença a uma pessoa física ou jurídica não interessa em absoluto ao trabalhador. Pelo mesmo motivo, não preocupa o trabalhador que a pessoa moral modifique sua composição jurídica ou que os possuidores das ações ou das quotas sociais sofram mudanças.
Para ele as possibilidades de variações são infinitas e vão estabelecendo matizes diferentes praticamente inapreciáveis: uma empresa unipessoal que se constitui em sociedade coletiva integrada pelo proprietário e seus filhos que já colaboram com ele; essa sociedade coletiva se converte em sociedade de capital e indústria, ou em sociedade em comandita para dar entrada a simples fornecedores de capital, ou em sociedade de responsabilidade limitada; uma sociedade que se modifica porque incorpora um novo sócio; esse sócio pode ser um estranho à empresa nesse momento ou ser um antigo empregado ao qual se dá acesso à sociedade; o número de novos sócios que venham a fazer parte da sociedade pode sofrer sucessivos aumentos, acrescentando-se também em graus diversos a influência que em conjunto possuem, relativamente aos sócios anteriores ou a distância ou à desvinculação que cada um deles possuía relativamente à situação anterior; a sociedade pode mudar simplesmente de forma jurídica, sem mudar de proprietário ou vice-versa; manter-se a mesma forma jurídica e substituir-se o proprietário; pode ter a forma de uma sociedade de capital, porém pertencer realmente a uma pessoa, a uma família ou a um grupo; as ações ou as partes sociais podem ir mudando de mãos paulatina e progressivamente ou de forma clara e perceptível. Enfim, o autor poderia continuar mencionando indefinidamente hipóteses distintas que não têm repercussão alguma no contrato de trabalho e que demonstram que todas essas alterações não afetam o trabalhador nem repercutem em sua relação de trabalho. Por isso, se pode dizer que, se o trabalhador não pode continuar o contrato de trabalho esse termina; todavia, se o empregador não pode prosseguir, pode ser substituído por outro, sem que o contrato de trabalho se altere.
Ainda nessa esteira (MARANHÃO e BARBOSA CARVALHO, 1993, p.94) seguem o mesmo raciocínio dizendo que não sendo o contrato de trabalho, em geral, intuitu personae em relação ao empregador, nada impede, juridicamente, a substituição de uma pessoa por outra, nessa qualidade, como sujeito da mesma relação de emprego. Responde, portanto, o novo empregador pelos contratos de trabalho concluídos pelo antigo, pela aquisição do estabelecimento como organização produtiva, como um bem que resulta do conjunto de vínculos existentes entre os fatores de produção.
Convém ainda mencionar que há correntes doutrinárias que aceitam, em casos excepcionais, contratos de trabalho intuitu personae em relação ao empregador. A doutrina de (PLÁ RODRIGUES, 2000, p.297) diz que essa situação se produz naqueles casos raros em que o trabalhador levou em conta a pessoa do empregador para celebrar o contrato de trabalho. Embora não frequentemente, esses casos acontecem, quando o contrato de trabalho se refere a uma atividade intimamente conexa com a vida do empregador, e que não pode ser continuada por seus herdeiros. Os exemplos mais típicos são: o de secretário de um político ou de ajudante de um profissional liberal, nos quais existe, no espírito do trabalhador, uma razão diretamente vinculada à pessoa do empregador para celebrar o contrato. É evidente que entre um político e seu secretário existe uma vinculação ideológica e partidária que impede que o secretário possa olhar com indiferença a pessoa com quem colabora. Outro tanto se deve dizer do empregado de um profissional, onde, a par de certa afinidade pessoal exigida pelo contato direto, quase permanente entre ambos, existe sempre uma consideração da pessoa do profissional, pelo prestígio que possa rodeá-lo ou pelos ensinamentos que aspira receber o colaborador, no desempenho de suas funções. Podem-se formular considerações análogas nos contratos de trabalho celebrados por damas de companhia ou governantas, ou em algum outro exemplo de serviço doméstico no qual o trabalhador tenha levado fundamentalmente em conta a pessoa do empregador.
Assim os contratos, em regra, não são intuitu personae em relação ao empregador, portanto possibilita-se a continuidade da prestação laborativa com a consequente assunção das dívidas passadas, presentes e futuras em relação ao sucedido. Terá, também, o empregador direito aos créditos decorrentes dos fatores de produção assumidos, além de utilizar a força de trabalho do obreiro.
(MARANHÃO, 1991, v.1, p.287) a respeito do transpasse do estabelecimento menciona que o bem que resulta do conjunto de vínculos existentes entre os diferentes fatores de produção, com todos os elementos organizados. Um desses elementos é o trabalho.
Ainda sobre o assunto (SENA, 2000,p.225) pontifica que o objetivo principal da ordem jurídica com o instituto sucessório é a garantia da intangibilidade objetiva dos contratos empregatícios. Na visão tradicional, a intangibilidade objetiva dos contratos empregatícios se refere aos contratos já existentes à época da sucessão e, desde que mantida a prestação de serviços ao sucessor. Para tal corrente, operada a sucessão, o contrato se mantém íntegro, sendo o mesmo, único. O novo titular passa a responsabilizar-se pelos efeitos presentes, futuros e passados dos contratos de trabalho que lhe foram transferidos porque já existentes e cuja prestação de serviços manteve-se.
A corrente tradicional, que tem como pressuposto a continuidade da prestação de serviços ao sucessor, pacifica o entendimento da intangibilidade dos contratos de emprego.
Dessa forma observa-se que a inalterabilidade dos contratos de emprego é, sem sombra de dúvidas, um dos efeitos da sucessão trabalhista.
6. Conclusão.
Enfim, conclui-se a sucessão trabalhista é decorrente da relação de emprego e não de uma relação civilista como querem alguns.
Ainda, tem-se que pela sucessão trabalhista, trabalhador não pode continuar o contrato de trabalho se esse termina, entretanto, se o empregador não pode prosseguir, pode ser substituído por outro, sem que o contrato de trabalho se altere.
Daí a importância da sucessão trabalhista, visto que mantém hígidos os contratos de trabalho, trazendo maior segurança jurídica para as relações entre empregado e empregador, mais precisamente, para o empregado que tem garantido os seus direitos no caso de haver a referida sucessão.
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