Direito do Trabalho

No sindicalismo até Santos têm chifres

A eterna e nunca resolvida questão sindical retorna à ordem do dia, após a saída de Carlos Lupi no ministério do Trabalho, em escândalo similar aos
ocorridos em outras pastas. A tônica de todos eles: corrupção e malversação de dinheiro público, que, desde então passaram a ter uma terminologia suave
e amena: malfeitos…

E alguém do ramo sindical duvida que a pasta do Trabalho volte ao domínio do PT, que Lula só foi transferiu ao PDT para que o recém destronado pudesse
imperar a seu bel-prazer juntamente com sua companheirada, em troca de apoio político-eleitoral como importante integrante da base do Governo?

Assim, a perspectiva provoca a necessária indagação. Como fica, de forma real e efetiva, a possibilidade de uma reforma sindical no Governo Dilma? Para
construir uma resposta, necessário se torna volver a passado não distante.

Contrariamente ao trabalho de higienização e revigoramento de um modelo obsoleto, digno, quando muito, de uma republiqueta de bananas persistiria em
manter, por implantado na remota década de 40, obra da ditadura varguista, forjada em amplo viés corporativista, tempo que o País não passava de uma
colônia agrícola e a indústria e o comércio apenas engatinhavam, a verdade é que o sindicalismo brasileiro tornou-se ainda mais empobrecido,
especialmente a partir em que Lula e o PT assumiram o Poder. E lá se vão quase 10 anos!

E o curioso é que essa regressão deu-se pelo mesmo ente que emanou do meio e com a promessa formalizada de acabar com as amarras que impediam não só a
sua evolução. Sua moralização. Lamentavelmente, suas ações foram em sentido inverso, beneficiando tão-somente os operadores, seus ex-colegas de ofício,
em detrimento dos contribuintes dos sindicatos. Para um sistema, já recheado de vícios, sobrevieram novas mazelas, decorrentes da corrupção gerada pelo
dinheiro fácil oriundo da contribuição sindical obrigatória, mãe de todas as suas deformidades.

Resultado: mais um logro adicionado à História sindical. As conhecidas e histriônicas promessas reformistas de palanque ficaram ao sabor do vento, após
Lula catapultar o Poder. Uma prova real disso? A representada pela PEC-252, de maio de 2000 (dois anos e meio antes de assumir o Poder) e que dormita
até hoje na Câmara Federal, escrita e assinada. Com o recibo da burla à disposição dos desconhecedores da empulhação, as decantadas prometidas reformas
ficaram para as calendas.

Portanto, não há nada que indique a menor vontade política do Governo Dilma –cujas ações, pelo menos até aqui, provam ser às de uma mera continuísta do
anterior- em realizar uma reforma sindical que acabe com a devassidão existente. Nem por iniciativa do Executivo e muito pelo Legislativo, que
demonstra, a cada dia, ser uma mera gaveta do primeiro. Aliás, todas as imoralidades que deram azo aos escândalos que não param de surgir, emanam do
Governo de seu antecessor, fruto de impensada e desmedida cooptação político-eleitoral, cuja moeda de troca foi a concessão de ministérios de porteira
fechada… Conduta vazia, meramente de preservação e perenidade de poder.

O que é preciso adicionar para ficar evidenciado e materializado que o Executivo e Legislativo não se interessam por uma reforma sindical radical que
dê azo às transformações requeridas pelo Estado? Eu disse Estado e não Governo, pois desde 2003 neste País as diferenças entre um e outro têm sido
confundidas, tornando-se díspares. A velha e tenebrosa questão sindical é uma delas. Na ótica dos dois Poderes, sua radical reforma, a bem do real
interesse público (ou seja, do Estado) não dá votos nas urnas. Tiram! Quais as razões? Muito simples. Ferem os interesses pessoais dos donatários
sindicais, isto é, dos operadores que deveriam servir e não serem regiamente servidos em seus insaciáveis apetites pecuniários e a preservação de
sinecuras.

Querem uma comprovação inequívoca do forte e ferino lobby pela manutenção dessa verdadeira reserva de mercado? Que
tal o exemplo das próprias centrais sindicais, órgãos espúrios na legislação, surgidas no final dos anos 70, após redemocratização do País e que são
lideradas pelas CUT (PT) e Força Sindical (PDT). Desde o seu nascedouro foram sustentadas pelas mensalidades de seus respectivos sindicatos de
trabalhadores filiados. Quando da assinatura da lei de sua oficialização, Lula destinou a elas a metade do percentual devido ao ministério do Trabalho,
resultante da partilha do bolo sindical (20%). Trata-se de concessão anual de milhões de reais, representados por dinheiro público e sem nenhuma
fiscalização, pois quando da destinação, foi cuidadoso ao vetar o artigo que submetia o TCU como órgão fiscalizador. A justificativa foi de que as
centrais, a exemplo dos sindicatos são pessoas jurídicas privadas, ficando sua fiscalização a cargo de seus próprios Conselhos Fiscais.  O que vale
reprisar o velho bordão: raposas tomando conta do galinheiro… Claro que a destinação dessa dinheirama pública foi em troca de apoio
político-eleitoral. Assim, não se surpreendam se no futuro, esses perspicazes sindicalistas não exigirem os 10% restantes… Com toda certeza, antes do
pleito presidencial de 2014… Anotem e confiram!

Foi esta a única “obra” do Governo Lula no campo sindical. Reconhecimento e dinheiro a rodo para as centrais sindicais, tendo à frente a CUT, braço
direito do PT…

Mas não pensem que a inversão de valores  no âmbito  sindical ocorre somente nas entidades laborais. Embora nelas haja predomínio, também nos patronais
existem nichos similares, ainda que guardadas as bem devidas proporções. Ainda recentemente uma federação esteve (e na verdade continua) engasgada em
explicações sobre um caríssimo patrocínio de “palestras” que teriam sido feitas por um atual ministro de Estado, após ter deixado o cargo de prefeito
grande Capital. Ocorre que os próprios funcionários de tal federação desconhecem a existência de tais eventos. Como nesta terra, campeã absoluta do
ócio, o ano só começa depois do Carnaval, e também a exemplo de outros, igualmente este estranho fato está pendente de esclarecimento. Que pode não
passar de um simples fato isolado, como também representar a ponta de um iceberg na existência de incestuosas relações de tráfico de influência de
autoridades públicas com líderes sindicais do patronato.

A carcomida legislação também impõe que a empresa seja a cobradora e repassadora obrigatória da contribuição compulsória descontada do salário do
trabalhador. Assim, não interessa às entidades laborais cogitar por mudanças. Para que trabalhar por associativismo se os cofres continuarão inflados
sem ele? Subsiste, pois, alguma dúvida de que no dia em que o artigo 582 da CLT for suprimido, ficando sob a inteira vontade e iniciativa do empregado
efetuar ele próprio o recolhimento da contribuição diretamente à sua entidade, que o sistema sindical laboral desabe como um castelo de areia?

Nas entidades patronais é a própria empresa que efetua o pagamento da contribuição devida ao sindicato da sua categoria econômica, cujo cálculo incide
sobre o valor do seu capital social. Em razão disso, ocorre a necessidade de um trabalho de fidelização junto ao contribuinte no sentido de torná-lo
sindicalizado, termo que indica que, além de contribuinte obrigatório, ele igualmente é associado, pagando uma mensalidade espontânea. Entretanto, esse
expediente só é efetuado em entidades patronais efetivamente de vanguarda, e por dirigentes que se preocupam com o futuro, adotando as posturas e
diretrizes do cognominado novo sindicalismo, que é imune aos ranços da obsoleta legislação de Vargas. O que deve ser destacado e deixado devidamente
esclarecido é que a contribuição sindical (até 1996, denominada de imposto sindical) nunca deixou de ser tributo obrigatório, por sua recepção ao
artigo 149 da Constituição Federal. Dinheiro público destituído de fiscalização idem.

A indagação que fica não é outra. Quando será que teremos um Governo realmente comprometido com a causa pública do sindicalismo? Bastam os que já
passaram ao largo ou os que não se preocupam com os soberanos interesses da sociedade brasileira, mas sim atuando na contramão, como guardiões
protetores dos interesses menores e mesquinhos dos seus donatários feudais. Das fileiras do PT, e com base nos antecedentes, com certeza absoluta não
será jamais!

Como se observa no sindicalismo brasileiro, excetuando-se poucos atores, não há santos, embora alguns até proclamem divindade. E muitos deles, quando
incomodados, além dos chifres à mostra ainda agitam seus aguçados tridentes.

* Fernando Alves de Oliveira, Consultor sindical patronal, autônomo e independente, autor dos livros S.O.S. SINDICAL e O sindicalismo brasileiro clama por socorro, editados pela LTr, além de dezenas de artigos (vide acervo em http://falvesoiveira.zip.net) e de
palestra direcionada. Contatos: falvesoli40@terra.com.br

Como citar e referenciar este artigo:
OLIVEIRA, Fernando Alves de. No sindicalismo até Santos têm chifres. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2012. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-do-trabalho/no-sindicalismo-ate-santos-tem-chifres/ Acesso em: 22 nov. 2024
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