Direito do Trabalho

Breves comentários sobre a Lei 13.271/2016

RESUMO

O presente artigo faz uma análise dos aspectos trabalhistas da Lei 13.271/2016 que versa sobre a proibição da revista íntima de funcionárias em locais de trabalho. Conceitua o instituto da revista intima e revista pessoal e aponta as suas principais distinções.

Palavras-chave:Revista Intima. Revista Pessoal.  Poderes de fiscalização.

INTRODUÇÃO

O tema revista íntima e revista pessoal já renderam diversas discussões, uma vez que há uma colisão de direitos. De um lado encontra-se o direito de privacidade e intimidade do empregado e do lado oposto tem-se o direito do poder diretivo e de fiscalização do empregador, envolvendo-se também nessa colisão a situação da relação de subordinação do empregado.

Diante disto, recentemente em abril de 2016 foi sancionada a Lei 13.271/2016 que tinham como objetivo disciplinar os seguintes assuntos: a vedação da revista íntima de empregadas nos locais de trabalho e a revista intima em ambiente prisionais, no presente artigo iremos apenas analisar os aspectos trabalhistas da referida lei, portanto será apenas abordado a vedação da revista íntima de empregadas.

 1.      Revista Intima x Revista Pessoal

No âmbito trabalhista sempre houve inúmeras discussões entre estudiosos do Direito a respeito da utilização da revista íntima e pessoal e seus efeitos para os empregados. Com base nisso, em abril desse presente ano, foi sancionada a lei 13.271/16 que proíbe a revista íntima em funcionárias.

Essa ferramenta era utilizada pelos empregadores para salvaguardar seu direito a propriedade, previsto na Constituição Federal, artigo 5°, inciso XXII, este direito nas relações trabalhistas garante ao empregador o poder diretivo, que consiste em um conjunto de regras que visam limitar a mão de obra do trabalhador, instaurado através do contrato de trabalho e tracejado em um dos principais requisitos da relação de emprego, a subordinação.

O poder diretivo, previsto no art.2° da CLT, se manifesta em três formas. A primeira é a disciplinar, onde o empregador pode aplicar sanções convencionadas por acordo, convenção coletiva ou no regulamento da empresa. A segunda é organização, como o próprio nome diz, o empregador organiza a estrutura, a quantidade de funcionários e suas respectivas funções laborativas no estabelecimento. A terceira e última forma é a fiscalização ou controle, no qual ocorre uma supervisão do comportamento e das atividades do funcionário, não podendo este agir diferente da maneira imposta pelo empregador. Desta maneira, a vigilância poderá ocorrer de várias maneiras, dentre elas a revista íntima ou pessoal.

De certo, a lei 13.271/16 não trouxe nenhum conceito do que seja revista íntima, portanto a distinção que se faz é baseada em entendimentos doutrinários e jurisprudenciais.

Essa distinção no fato que para uma revista ser caracterizada como íntima é necessário que o empregador coercitivamente durante a realização do procedimento ocorra o toque ou a exposição dos órgãos genitais da pessoa revistada, enquanto na revista pessoal não há esse contato físico direto e também não há nenhum tipo de exposição parcial ou total de nudez.

Com base nessa análise, é possível notar que o poder diretivo do empregador, com fulcro de proteger seu patrimônio, não pode ser ilimitado, tendo sua ação restringida pelos direitos fundamentais do funcionário, tais como o da dignidade da pessoa humana, intimidade, privacidade, honra e imagem. Com isso, constata-se uma colisão de direitos.

De acordo com Eugênio Hainzenreder Júnior (2009, p.89)

A subordinação jurídica oriunda da relação laboral não autoriza o empregador a extrapolar as prerrogativas de controle, fiscalização e direção adentrando na esfera pessoal do empregado. O exercício do poder diretivo está relacionado tão somente ao bom desenvolvimento e a segurança da atividade empresarial. Por essa razão, pode-se afirmar que a direção empresarial será limitada pelo próprio princípio da dignidade da pessoa humana, pelos direitos da personalidade do empregado, ainda que no ambiente do trabalho, pois são indissociáveis da pessoa do trabalhador. Tal conclusão, ainda que não definitiva, naturalmente, comporta controvérsias em situações consideradas “cinzentas” em que se verifica uma colisão de direitos e conflito de interesses entre empregado e empregador. ”

Deste modo, é de suma importância afirmar que a propriedade tem sua relevância, porém é ilegítimo utilizar deste argumento para sobrepor os direitos fundamentais mencionados, como também se contrapõem a função social. Portanto, o fato do empregado atender a subordinação não deve motivar o uso desenfreado do poder diretivo, devendo o empregador respeitar e tornar o ambiente de trabalho mais leve e sem constrangimentos, respeitando aos seus empregados como pessoa dotada de dignidade humana, ressalvando assim sua intimidade e vida privada.

 2.      Comentários a Lei 13.271/2016

A Lei 13.271/2016 veda a proibição de revista íntima de funcionárias nos locais de trabalho e trata da revista íntima em ambientes prisionais, porém o único artigo que tratava sobre os ambientes prisionais foi vetado pela Presidente da República, sendo assim a lei disciplina apenas sobre a revista íntima em “funcionárias e clientes”.

Em seu primeiro artigo temos a seguinte previsão: “As empresas privadas, os órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta, ficam proibidos de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes do sexo feminino”. Apesar de no texto legal existir apenas a vedação ao sexo feminino, acredita-se que a revista íntima é vexatória independente do sexo ou gênero.

O art.5°, caput da Constituição Federal, consagrou o princípio da Isonomia, aonde temos a garantia que homens e mulheres são iguais perante a lei e ainda dentro do rol deste artigo podemos elencar também que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Portanto, o direito a intimidade, a vida privada que estão dentro do rol de direitos fundamentais não são limitados apenas ao sexo feminino, são garantias também aos homens, não se admitindo qualquer distinção que possa gerar algum tipo de discriminação.

Sobre esse assunto, temos o Enunciado n° 15 da I Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho:

I – REVISTA – ILICITUDE. Toda e qualquer revista, íntima ou não, promovida pelo empregador ou seus prepostos em seus empregados e/ou em seus pertences, é ilegal, por ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade do trabalhador.

II – REVISTA ÍNTIMA – VEDAÇÃO A AMBOS OS SEXOS. A norma do art. 373-A, inc. VI, da CLT, que veda revistas íntimas nas empregadas, também se aplica aos homens em face da igualdade entre os sexos inscrita no art. 5º, inc. I, da Constituição da República.

Apesar de a previsão ser apenas ao sexo feminino, pode-se aplicar uma interpretação extensiva e garantir a vedação a todos os empregados, independente de sexo, gênero, o legislador deveria ter trazido essa ampliação taxativamente, acrescentando a vedação a homens, mulheres, homossexuais, transexuais, não restringir a apenas um sexo, uma vez que na ponderação de direitos fundamentais prevalece o direito a intimidade do empregado (a) sobre direito de propriedade e poder diretivo do empregador.

Acrescenta-se ainda que a lei também veda a revista íntima em clientes, existem relatos de casos aonde pessoas suspeitas de furto em lojas de departamento foram direcionadas a salas reservadas, onde foram submetidas a esse tipo de revista, com a vedação da lei é necessário que se encontre outros meios para evitar essas práticas, algumas dessas medidas podem ser a instalação de câmeras de segurança e detectores de metal. Sobre esse assunto a Justiça Comum já vem decidindo:

Os proprietários e prepostos de estabelecimento comercial não possuem o poder de polícia, o que lhes impede de, por mera suspeita de furto de mercadorias, abordar e efetuar a revista pessoal, não havendo que se falar em exercício regular de direito, além disso, o preposto não logrou êxito em localizar o aludido produto no momento da indigitada revista pessoal. Age com culpa aquele que, precipitadamente, imputa fato criminoso a alguém, sem que haja provas da efetiva prática do furto e, ainda, impõe à pessoa o constrangimento de submetê-la a uma revista pessoal. Ademais, é inconcebível que se viole direitos constitucionais de intimidade, liberdade e dignidade da pessoa humana, no intuito de proteger seus interesses comerciais” (TJ/MS, AP 0019337-77.2010.8.12.0110, Rel. Eliane de Freitas Lima Vicente, p. em 30/03/2012).

Existe a previsão da aplicação de multa no valor de R$ 20.000,00, que deverá ser revestido aos órgãos de proteção dos direitos da mulher, e que no caso de reincidência será aplicado o dobro, ou seja, R$40.000,00, independentemente da indenização por danos morais e matérias, bem como as sanções de ordem penal.

No que tange a previsão desta multa, a lei não deixou claro se esta será aplicada até R$20.000,00, existindo assim uma gradação, ou sempre será o valor fixo, o que seria uma afronta ao princípio da proporcionalidade, uma vez que uma empresa aonde tem-se apenas um (a) funcionário (a) seja submetida a mesma multa que outra empresa que possua por exemplo 400 funcionários. Além disto, não se têm nenhum parâmetro em como essa multa será atualizada.

Ressalta-se que o art.2°, inciso II da referida lei, possui uma redação um pouco equivocada, não deixando claro se as indenizações por danos morais e materiais e as sanções de ordem penal poderiam ocorrer apenas em casos de reincidência no descumprimento dessa vedação, ou não se exigindo que haja essa reincidência, tornando assim esse fator como meio de ponderação para fins de elevação no valor indenizatório em razão da maior gravidade da conduta.

Outro questionamento que se faz, é se essa multa não deveria ser revestida, pelo menos em parte à pessoa que sofreu a revista, sem prejuízo algum a eventual ação de danos morais pleiteados.

Diante disto, apesar do assunto revista intima já ter rendido diversas discussões, principalmente no âmbito trabalhista, a Lei 13.271/2016 necessita de aperfeiçoamento em alguns aspectos para torna-se mais clara e para que não haja tantas discussões a respeito da sua aplicabilidade e seu alcance.

Considerações Finais

Portanto, conclui-se que após exaustivas discussões sobre o tema revista íntima e o poder diretivo do empregador, enfim acabou as dúvidas em relação a vedação da revista, porém o legislador perdeu a oportunidade de esclarecer aspectos bastantes pontuais, como o próprio conceito do que seria revista intima e se seria permitido a realização das revistas pessoais, esclarecendo por fim qual seria o limite permitido pelo poder diretivo ao empregador em confronto a intimidade do empregado.

Acrescenta-se ainda que esta alteração legislativa deveria também ter incluso a proibição para homens, homossexuais e transexuais, ou seja, a todos os trabalhadores independente de sexo ou gênero, desperdiçando assim o legislador  a oportunidade de colaborar para a promoção da igualdade de gênero, ressalta-se ainda que o texto legal permite divergências de entendimentos em aspectos como a aplicação da multa e sua atualização, diante disso torna-se necessário o aperfeiçoamento da previsão legal voltada ao relevante tema em questão. E em razão a essa omissão no texto legal sobre a extensão da lei, caberá aos tribunais, mais uma vez, adequar à lei à realidade social dos processos, surgindo então a necessidade de reflexão e debate quanto ao alcance da Lei 13.271/2016 e aos seus possíveis encaminhamentos.

Referências Bibliográficas

Disponível:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13271.htm> Acesso em 06 de agosto de 2016.

Disponível:< http://blog.jornalterceiravia.com.br/advogados/poder-de-comando-e-poder-disciplinar-do-empregador> Acesso em 7 de agosto de 2016.

Disponível:<l http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,limites-ao-poder-diretivo-do-empregador,35987.html> Acesso em 7 de agosto de 2016.

Disponível:<  http://www.jurisite.com.br/doutrinas/Trabalho/douttrab100.html> Acesso em 8 de agosto de 2016.

Disponivel:< http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1475&idAreaSel=8&seeArt=yes> Acesso em 10 de agosto de 2016.

Garcia, Gustavo Filipe Barbosa, Proibição da Revista íntima e a Lei 13.271/2016. Disponível em: <  http://genjuridico.com.br/2016/04/19/proibicao-de-revista-intima-e-lei-13-2712016/> Acesso em 06 de agosto de 2016.

Roesler, Átila Da Rold, Sobre a nova Lei n. 13.271/2016 e a revista íntima e de pertences de trabalhadores. In Empório do Direito, Disponível em: <  http://emporiododireito.com.br/sobre-a-nova-lei-n-13-2712016/>, acesso em 06 de agosto de 2016.

Hainzenreder Júnior, Eugênio Direito à Privacidade e Poder Diretivo do Empregador. O uso do E-mail no trabalho. São Paulo: Atlas, 2009

Autoras:

Natalia Pinto Costa – Graduanda do curso de Direito do 7° Semestre da Universidade de Fortaleza- Unifor e Monitora Voluntária da disciplina de Direito do Trabalho II.

Licia Lopes – Graduanda do curso de Direito do 7° semestre da Direito da Universidade de Fortaleza- Unifor.

Como citar e referenciar este artigo:
LOPES, Licia; COSTA, Natalia Pinto. Breves comentários sobre a Lei 13.271/2016. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2016. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-do-trabalho/breves-comentarios-sobre-a-lei-132712016/ Acesso em: 22 nov. 2024
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