Ações afirmativas: a solução para a desigualdade
Maria Berenice Dias*
A regra do inciso I do art. 5º da Carta Constitucional do Brasil de 1988 consagra com uma clareza solar o princípio da igualdade, reproduzido em praticamente todas as constituições editadas após a Revolução Francesa: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações nos termos desta Constituição”. Essa garantia encontra reforço no inciso XXX do seu art. 7º, que proíbe qualquer discrímine fundado em motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.
Apesar de decantar a igualdade formal, o próprio texto da Lei Maior prevê normas que concedem tratamento diferenciado a homens e mulheres. É outorgada proteção ao mercado de trabalho feminino, mediante incentivos específicos (inciso XX, art. 7º), bem como lhe é assegurada a aposentadoria com 60 anos, enquanto, para os homens, a idade limite é de 65 anos (art. 202). Essas distinções não se prendem a diferenças fisiológicas, mas são decorrência de fatores culturais, pois, em face das responsabilidades familiares, as mulheres prestam dupla jornada de trabalho. Assume a esposa a integralidade das tarefas domésticas e, quando é mãe, o cuidado com os filhos, exige um maior esforço, levando-a a um precoce envelhecimento.
A aparente incompatibilidade entre essas normas jurídicas solve-se ao se constatar que a igualdade formal – igualdade de todos perante a lei – não conflita com o princípio da igualdade material, que é o direito à equiparação mediante a redução das diferenças sociais. Nítida a intenção do legislador em consagrar a máxima aristotélica de que o princípio da igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam.
A obediência estrita ao preceito constitucional não permite reconhecer como infringência ao princípio da isonomia a adoção de posturas que, atentando na realidade, gerem normas protetivas. São normas que visam a propiciar o equilíbrio para assegurar o direito à igualdade.
As estatísticas não permitem disfarçar que essa diferenciação existe. A participação da mulher no mercado de trabalho não atinge 40% do conjunto de trabalhadores da zona urbana, sendo que percebem salário 40% menor no desempenho de igual atividade.
Esse quadro leva à constatação de que está ocorrendo uma verdadeira feminização da miséria, a justificar, por si só, como um imperativo da democracia e da cidadania, posturas que promovam discriminações positivas, única forma de corrigir tais distorções.
Frágeis e insuficientes, no entanto, são os mecanismos de promoção da igualdade de gênero, pois, em nome da preservação ao princípio da isonomia, se acaba consagrando a desigualdade. A incorporação, em textos legais, de dispositivos de proteção à mulher por meio de incentivos específicos funda-se na concepção, incluída em textos de convenções internacionais, de que não seriam consideradas discriminatórias medidas ou ações afirmativas com o propósito de sanar situações de desigualdade.
A Plataforma de Ações aprovada na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Beijing, no ano de 1995, documento subscrito pelo Brasil, reafirma e recomenda a adoção de ações afirmativas, por meio de quotas, incentivos fiscais e medidas legais que busquem superar a desigualdade entre homens e mulheres.
Foi atendendo a esse compromisso de incrementar a participação da mulher nos processos decisórios que restou assegurada a obrigatoriedade da quota mínima de 20% de mulheres candidatas aos cargos legislativos para as eleições municipais de 1996 (art. 11, § 3º, da Lei nº 9.100), sem que se alegasse afronta ao princípio isonômico.
O governo brasileiro, em 14 de maio de 1996, no lançamento do Programa Nacional dos Direitos da Mulher, elaborou documento denominado Estratégias da Igualdade, traçando diretrizes para seu atendimento e recomendando o uso de ações afirmativas para garantir a paridade sem ferir o art. 5º da Constituição Federal.
Indispensável a adoção de mecanismos compensatórios como única forma de superar as diferenças. A proteção à mulher deve constituir uma das preocupações primeiras do legislador, mediante positive discrimination, em face da necessária proteção à maternidade, reconhecimento da importância da mulher no lar, na execução dos trabalhos domésticos e na assistência aos filhos.
O que se deve atentar não é na igualdade perante a lei, mas no direito à igualdade mediante a eliminação das desigualdades, o que impõe o estabelecimento de diferenciações específicas como única forma de dar efetividade ao preceito isonômico consagrado na Constituição Federal. A regra do inciso I do art. 5º da Carta Constitucional do Brasil de 1988 consagra com uma clareza solar o princípio da igualdade, reproduzido em praticamente todas as constituições editadas após a Revolução Francesa: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações nos termos desta Constituição”. Essa garantia encontra reforço no inciso XXX do seu art. 7º, que proíbe qualquer discrímine fundado em motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.
Apesar de decantar a igualdade formal, o próprio texto da Lei Maior prevê normas que concedem tratamento diferenciado a homens e mulheres. É outorgada proteção ao mercado de trabalho feminino, mediante incentivos específicos (inciso XX, art. 7º), bem como lhe é assegurada a aposentadoria com 60 anos, enquanto, para os homens, a idade limite é de 65 anos (art. 202). Essas distinções não se prendem a diferenças fisiológicas, mas são decorrência de fatores culturais, pois, em face das responsabilidades familiares, as mulheres prestam dupla jornada de trabalho. Assume a esposa a integralidade das tarefas domésticas e, quando é mãe, o cuidado com os filhos, exige um maior esforço, levando-a a um precoce envelhecimento.
A aparente incompatibilidade entre essas normas jurídicas solve-se ao se constatar que a igualdade formal – igualdade de todos perante a lei – não conflita com o princípio da igualdade material, que é o direito à equiparação mediante a redução das diferenças sociais. Nítida a intenção do legislador em consagrar a máxima aristotélica de que o princípio da igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam.
A obediência estrita ao preceito constitucional não permite reconhecer como infringência ao princípio da isonomia a adoção de posturas que, atentando na realidade, gerem normas protetivas. São normas que visam a propiciar o equilíbrio para assegurar o direito à igualdade.
As estatísticas não permitem disfarçar que essa diferenciação existe. A participação da mulher no mercado de trabalho não atinge 40% do conjunto de trabalhadores da zona urbana, sendo que percebem salário 40% menor no desempenho de igual atividade.
Esse quadro leva à constatação de que está ocorrendo uma verdadeira feminização da miséria, a justificar, por si só, como um imperativo da democracia e da cidadania, posturas que promovam discriminações positivas, única forma de corrigir tais distorções.
Frágeis e insuficientes, no entanto, são os mecanismos de promoção da igualdade de gênero, pois, em nome da preservação ao princípio da isonomia, se acaba consagrando a desigualdade. A incorporação, em textos legais, de dispositivos de proteção à mulher por meio de incentivos específicos funda-se na concepção, incluída em textos de convenções internacionais, de que não seriam consideradas discriminatórias medidas ou ações afirmativas com o propósito de sanar situações de desigualdade.
A Plataforma de Ações aprovada na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Beijing, no ano de 1995, documento subscrito pelo Brasil, reafirma e recomenda a adoção de ações afirmativas, por meio de quotas, incentivos fiscais e medidas legais que busquem superar a desigualdade entre homens e mulheres.
Foi atendendo a esse compromisso de incrementar a participação da mulher nos processos decisórios que restou assegurada a obrigatoriedade da quota mínima de 20% de mulheres candidatas aos cargos legislativos para as eleições municipais de 1996 (art. 11, § 3º, da Lei nº 9.100), sem que se alegasse afronta ao princípio isonômico.
O governo brasileiro, em 14 de maio de 1996, no lançamento do Programa Nacional dos Direitos da Mulher, elaborou documento denominado Estratégias da Igualdade, traçando diretrizes para seu atendimento e recomendando o uso de ações afirmativas para garantir a paridade sem ferir o art. 5º da Constituição Federal.
Indispensável a adoção de mecanismos compensatórios como única forma de superar as diferenças. A proteção à mulher deve constituir uma das preocupações primeiras do legislador, mediante positive discrimination, em face da necessária proteção à maternidade, reconhecimento da importância da mulher no lar, na execução dos trabalhos domésticos e na assistência aos filhos.
O que se deve atentar não é na igualdade perante a lei, mas no direito à igualdade mediante a eliminação das desigualdades, o que impõe o estabelecimento de diferenciações específicas como única forma de dar efetividade ao preceito isonômico consagrado na Constituição Federal.
* Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM
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