Teoria Geral do Direito

O que vem a ser o direito? Do mínimo ético a uma potência moral (Segunda parte)

Resumo:Perseguindo ainda a definição de Direito, percorre-se várias escolas doutrinárias e filosóficas. Trata-se da segunda parte de outro artigo sob o mesmo título e, com o mesmo objetivo. Do mínimo ético a uma potência moral. O direito conhece extremos, particularmente, o contemporâneo.

Palavras-Chave: Filosofia. Teoria Geral do Direito. Introdução à Ciência do Direito. Direito. Jurisprudência.

Résumé: Toujours en poursuivant la definito du Droit, plusieurs écoles doctrinales et philosophiques sont couvertes. C’est la deuxième partie d’un autre article sous le même titre et avec le même objectif. D’un minimum éthique à une puissance morale. Le droit connaît les extrêmes, surtout le contemporain.

Mots-clés: Philosophie. Théorie générale du droit. Introduction à la science du droit. Droit. Jurisprudence.

O presente texto é a segunda parte do artigo jurídico de minha lavra intitulado “O que vem a ser o direito.” Nesse conteúdo, esmiuço as definições galgadas pela ciência jurídica tendo em vista as diversas escolas doutrinárias.

Na verdade, Platão definiu o direito ao definir a justiça como aquilo que possibilita que um grupo de qualquer homens, mesmo que bandidos ou ladrões, conviva e aja com vistas a um fim comum (A República[1]).

Ao que parece, essa seria uma função puramente formal do direito, graças à qual ele é simplesmente a técnica da coexistência. Mas, Aristóteles já qualifica o direito tomando como referência a coexistência justa, racionalmente perfeita.

O Direito, diz ele, é o que pode criar e conservar, no todo ou em parte, a felicidade da comunidade política, devendo-se recordar que a felicidade, como fim próprio do homem, é a realização ou a perfeição da atividade próprio do homem e, ou seja, a razão.

A sanção do direito diz Aristóteles em Política, é a ordem da comunidade política e a sanção do direito é a determinação do que é justo. Mas, um direito assim entendido é só o direito natural, que é o melhor e em toda parte o mesmo. O direito fundado na convenção e na utilidade é análogo às unidades de medida que variam de um lugar para o outro.

O direito natural, ao contrário, é aquilo que tem a mesma força em toda parte e independe da diversidade das opiniões.

Esse conceito de Direito, entre outras coisas, induzia a reconhecer a igualdade de todos os homens visto que em todos eles, pela sua natureza racional, revela-se a lei eterna da razão.

Em Cícero[2], encontra-se esse reconhecimento e também um dos corolários mais importantes da doutrina do direito natural: o princípio e o fundamento de qualquer direito devem ser procurados na lei natural dimanada antes que existisse qualquer Estado, portanto, se o povo ou o príncipe podem fazer leis, estas não terão verdadeiro caráter de direito se não derivarem da lei primeira.

Essas afirmações foram reiteradas por Sêneca, em que também se encontra a Teoria do Estado de Natureza que deveria dominar o pensamento político por muitos séculos. Segundo essa teoria, antes das instituições criadas por convenção pela sociedade, existiu uma idade em que homens viveram sem lei, unicamente à mercê da inocência da natureza original.

Segundo os doutores da Igreja que, nesse aspecto, continuam a tradição dos juristas romanos, a lei natural está escrita no “coração” dos homens como uma espécie de força inata ou instinto.

Afirmou Santo Agostinho[3]: “O Direito natural não foi gerado por uma opinião, mas inserido em nós por uma força inata, do mesmo modo como, na religião, estão a piedade, a graça, a observância, a verdade”.

E, foi justamente esse o conceito legado à filosofia escolástica através das Etimologias de Isidoro de Sevilha[4] (séc. VII) apud Abbagnano. Disse Isidoro: “O Direito natural é comum a todas as nações, sendo que em todos os lugares deriva do instinto natural, e não de uma constituição; por exemplo, a união do macho e da fêmea, a sucessão e a educação dos filhos, a posse comum de todas as coisas e a liberdade de todos, a aquisição das coisas que estão no céu, na terra e no mar, etc.”.

A identificação da lei natural com a lei divina constitui o fundamento do Direito canônico. O Direito. natural, notava Rufino, comendador de Graciano, é “uma força (vis) que a natureza imprime na criatura humana para levá-la a fazer o bem e a evitar o mal”. Ela ordena o que é útil, como por exemplo, “ama o Senhor teu Deus”; proíbe o que é nocivo, como por exemplo, “não matarás”; demonstra o que convém, como por exemplo, “tende tudo em comum”, ou “seja, uma só a liberdade de todos”, etc.

A distinção escrita por Graciano entre lei divina e lei humana é assumida como fundamento da doutrina tomista do direito. Segundo São Tomás de Aquino[5], há uma lei eterna, uma razão que governa todo o universo e que existe na mente divina; a lei natural que está nos homens é reflexo ou “participação” dessa lei eterna.

Além dessa lei eterna, que para o homem é natural, há duas outras espécies de leis: a “inventada pelos homens e segundo a qual se dispõe de determinado modo das coisas a que a lei natural já se refere” e a divina, necessária para encaminhar o homem ao seu fim sobrenatural.

Assim, São Tomás considera o Direito natural, ao mesmo tempo, instinto e razão visto que inclui nele tanto a inclinação que o homem tem em comum com todos os seres da natureza e com os animais, quanto a inclinação específica do homem.

Quanto a esta última, ele estabelece entre os preceitos do Direito. natural e a razão prática a mesma relação que há entre os primeiros princípios das demonstrações e a razão especulativa: tanto os preceitos quanto os primeiros princípios são “conhecidos de per si”, ou seja, evidentes. Mas em todas as suas determinações, tanto instintivas quanto racionais, o Direito natural é sempre a participação na “lei eterna”, na ordem providencial ou divina do mundo.

Para o jusnaturalismo moderno, o Direito natural não é mais o caminho através do qual as comunidades humanas podem participar da ordem cósmica ou contribuir para ela, e passa a ser uma técnica racional de coexistência.

Conquanto Alberico Gentile[6] que, antes de Grócio[7], ainda procurou extrair as noções normativas do Direito natural da consideração do estado de guerra (De jure belli, 1588) utilizasse o conceito de instinto natural imutável que manteria os homens unidos como membros de um único corpo, todos os conceitos desse gênero foram descartados por Grócio.

A teoria do Direito natural foi levada por Grócio ao mesmo plano racional da matemática, para o qual o próprio Descartes quis levar a filosofia e todas as outras pesquisas científicas. Como fundamento da obra de Grócio, há o recurso à razão, que é o recurso à razão matemática, à qual os filósofos do séc. XVII julgam estar confiadas as verdades da ciência.

Segundo Grócio, a matriz do Direito natural é a própria natureza humana, que conduziria os homens às relações sociais mesmo que eles não tivessem necessidade uns dos outros.

Por isso, o Direito que se funda na natureza humana “teria lugar mesmo que se admitisse aquilo que não pode ser admitido sem cometer um delito: que Deus não existe ou que não se preocupa com as coisas humanas” (De jure belli ac pacis, 1625, Prol., § 11).

Porquanto procede por legítima dedução dos princípios da natureza, o Direito natural distingue-se do Direito das gentes (jus gentiuni), que não nasce da natureza, mas do consenso de todos os povos ou de alguns deles e visa ao proveito de todas as nações.

A doutrina do Direito natural teve de Grócio a formulação mais madura e perfeita de sua longa história. Certamente essa formulação é condicionada pelo racionalismo geometrizante do tempo.

Técnica racional, nos tempos de Grócio e Descartes, é técnica geométrica; nela, uma proposição só se justifica quando pode derivar, por dedução necessária, de um ou mais princípios evidentes.

O jusnaturalismo nem sempre permaneceu fiel às formulações de Hugo Grócio. John Locke[8], no “Ensaio sobre a lei natural”, negava que essa lei fosse um ditame da razão, e considerava-a como sancionada e imprimida nos corações humanos por uma potência superior; desse modo, a razão só faz descobri-la, não sendo sua autora, mas sua intérprete (Law of Nature, I A ed., 1954, p. 110). Nisso, adotava a doutrina de Hooker (The laws of the Ecclesiastic Politycs, 1594-97,1, 8), que, por sua vez, adotava a doutrina tomista.

O segundo passo decisivo do jusnaturalismo moderno foi dado por Hobbes, graças a quem são eliminados da noção de Direito natural alguns vestígios dogmáticos que ainda persistiam na doutrina de Grócio.

Para Hobbes, a lei natural é, sem dúvida, “um ditame da reta razão”, mas a razão de que ele fala é a razão humana falível. “Por reta razão no estado natural da humanidade entendo, ao contrário da maior parte dos escritores que a consideram uma faculdade infalível, o ato de raciocinar, o raciocínio próprio de cada indivíduo, verdadeiro em termos de ações que podem gerar vantagens ou prejuízos aos outros homens.

A segunda concepção de Direito, fundado na moral, prenuncia-se quando se começa a atribuir à moral caracteres que os autores até aqui examinados atribuíam ao Direito Em todas as doutrinas do Direito natural, nem chega a nascer o problema da distinção entre moral e direito.

O Direito natural é constantemente identificado com o que é bem ou justo na ordem das relações humanas, portanto com a verdadeira moralidade; por outro lado, a sua diferença em relação ao que Graciano e São Tomás chamavam de lei humana e que Grócio chamava de lei voluntária é a distinção entre o que é justo e bom em si mesmo (verdadeiramente moral) e o que é justo ou bom só por participação, podendo, pois, não ser justo e bom, como de fato às vezes não é.

Leibniz diz que o Direito é uma “potência moral” e que a obrigação é uma “necessidade moral”, (grifo meu) entendendo por moral o que é natural no homem bom, ou seja, o amor ao próximo no sentido da alegria pela felicidade alheia.

“Dessa fonte”, acrescenta, “flui o Direito natural, que tem três graus: o Direito estrito, que é a justiça comutativa; a equidade ou caridade, que é a justiça distributiva; a piedade ou a probidade, que é a justiça universal. Esses graus correspondem aos três preceitos seguintes: ‘não prejudicar ninguém’[9], ‘atribuir a cada um o que lhe é devido’ e ‘viver honestamente’ (ou piamente)” (De notionibus júris et justitiae, 1693, Op., Ed. Erdmann, p. 119). Já nessas formulações de Leibniz a esfera da moral é entendida como originária e primária em relação à do Direito natural.

Mas foi Cristiano Thomasius[10] (1655-1728) o primeiro a expressar com clareza e impor na filosofia jurídica a distinção entre esfera jurídica e esfera moral, marcando assim a passagem da teoria do Direito natural à teoria do Direito fundado na moralidade. Thomasius distinguiu três “fontes” do bem: a honestidade (bonestum), o decoro (decoram) e a justiça (justum).

Portanto, o Direito é “o conjunto de condições por meio das quais o arbítrio de um pode ajustar-se ao arbítrio de outro, segundo uma lei universal da liberdade”, e pode ser representado como “uma coação geral e recíproca”, de tal modo que “Direito e faculdade de coagir significam a mesma coisa” (grifo meu).

Nessa doutrina de Kant há três pontos importantes: 1º:o caráter primário e fundamental da norma moral, que é a única lei racional, e, portanto, dá origem à norma de Direito; 2º: o caráter “externo”, logo imperfeito, da norma de Direito e, por conseguinte, o caráter imperfeito e incompleto da ação legal em relação à ação moral; 3º: o caráter necessariamente coercitivo do Direito. Esses três pontos tiveram grande importância no desenvolvimento sucessivo da doutrina do Direito; o primeiro deles é, obviamente, resultado da doutrina do Direito natural.

E, também inspira grande número de correntes da moderna filosofia do Direito, mais, precisamente, aquelas que partem da distinção entre a esfera externa da ação, como pertencente ao Direito, e a esfera interna da intenção ou da consciência, como pertencente à moralidade.

Assim, a teoria do Direito como “o minimum ético”[11], proposta por Jellinek (Die sozial-ethische Bedeutungvon Recht, Unrecht, und Strafe, 1878), implica, ao mesmo tempo, que o Direito deriva da moral e que o Direito se reduz a uma esfera moral restrita ou diminuta.

Concepção análoga foi sustentada por Croce, que a exprimia com a fórmula da identidade entre atividade jurídica e atividade econômica, identidade que servia para fazer a distinção entre Direito e moral, ao mesmo tempo em que vinculava os dois, de acordo com a solução geral apresentada por Kant (Filosofia da prática, 1909, pp. 370 ss.).

Outro modo de exprimir a mesma noção de Direito pode ser visto na doutrina de R. Stammler, de Direito como tendência imanente em todo D. positivo e da moralidade como perfeição do Direito correto, isto é, como perfeição última deste (Lebre von richtigen Recht, 1902, p. 87).

Ainda na mesma linha, situa-se o russo Leon Petrazycki (Introdução ao estudo do direito e da moral, 1905; Teoria do direito, 1907), que fez a distinção entre as normas morais que estabelecem “obrigações livres”, ou seja, não conferem aos outros nenhum Direito ou pretensão, e as normas morais que garantem tais obrigações em relação aos outros, ou seja, dão aos outros o Direito de pretender o que a norma garante (Law and Morality, trad. in., 1955, pp. 46-47).

Da negação do Direito natural e da ligação da noção de Direito com a de coerção externa ou sanção nasce a terceira concepção fundamental de D., que o identifica com a força.

A característica essencial da força é garantir a realização da norma, de tal modo que o Direito como força é o Direito realizado, ou seja, D. que ganha corpo e substância em instituições historicamente existentes.

O pressuposto dessa corrente é, portanto, a negação do Direito como dever-ser, aliás, do próprio dever-ser: é a identificação entre norma e realidade, entre dever-ser e ser.

Este último aspecto exclui Hobbes[12] dessa corrente doutrinai, pois, uma vez que ele não identificou o dever-ser com o ser, admitiu um Direito natural que é a saída razoável do homem de uma situação hostil que ameaça destruí-lo, e não considerou que essa saída era infalivelmente garantida e plenamente realizada. A concepção do Direito como força, com base na identificação entre dever-ser e ser, nasce com Hegel.

Segundo Hegel, o Direito é “uma existência em geral que seja existência da vontade livre”. Isso significa que o Direito seja uma liberdade realizada em instituições historicamente determinadas, que como tais nada têm mais a ver com a liberdade entendida como arbítrio individual.

Hegel, bem como todo o Romantismo reacionário peculiar do séc. XIX, via na liberdade do indivíduo o conceito e a inspiração fundamental do Iluminismo e da Revolução Francesa, contra os quais entendia assestar sua doutrina.

Citando a definição kantiana de Direito, ele observava: “A citada definição de Direito contém a opinião, corrente, sobretudo, depois de Rousseau, segundo a qual o “querer” deve ser fundamento substancial e primeiro princípio, não enquanto racional em si e para si, não enquanto espírito e espírito verdadeiro, mas enquanto individualidade particular, enquanto vontade do indivíduo em seu arbítrio particular[13].

Assim, os “horrores” da Revolução Francesa[14] constituem um paralelo à “superficialidade” de entender a liberdade não como realidade histórica, mas como o dever ser de uma norma.

Consequentemente, Hegel acha que o Direito é algo sagrado, só por ser “a existência do conceito absoluto, da liberdade autoconsciente”, e que um Direito superior, ou seja, mais real, subordina um Direito mais abstrato, ou seja, menos real ou imperfeitamente real.

Hegel, “é o Estado; seu fundamento é a potência da razão que se realiza como vontade. Como ideia de Estado não se devem ter em mente estados particulares, instituições particulares, mas considerar a Ideia por si, esse Deus real”.

Embora aponte assim do Estado “em si”, que conserva caráter divino ainda que, em suas manifestações particulares, se mostre imperfeito, assim como um homem conserva caráter humano mesmo quando é aleijado ou deficiente, Hegel julga que todos os Estados são encarnações do “Espírito do povo”, a autoconsciência que um povo tem de sua própria verdade e de seu ser, ou a “cultura” de uma nação (Phil. Der Geschichte, ed. Lasson, p. 93).

O Direito não é senão a realização da liberdade no Estado: existe só como lei do Estado. Assim, correspondentemente, a liberdade existe só como obediência às leis do Estado. “Ao Estado pertencem as leis, e isso significa que o costume não subsiste só na forma imediata, mas na forma do universal, como objeto de um saber.

O fato de esse universal ser conhecido constitui a espiritualidade do Estado. O Indivíduo obedece às leis, e sabe que nessa obediência está a sua liberdade; nela, portanto, entra em relação com seu próprio querer”. imperfeição do Direito positivo, na doutrina de Hegel não existe nenhum tribunal de apelação e, aliás, a própria doutrina não passa de negação desse tribunal, que é entendido como fonte de pensamentos “superficiais” e de acontecimentos “horríveis”.

O Direito deve ser reconhecido como um dever-ser, como uma regulamentação do comportamento humano, com a qual esse comportamento pode até não se ajustar.

Nessa concepção, confluem vários elementos historicamente reconhecíveis: a velha ideia do Direito como utilidade, que sofistas, epicuristas e céticos já haviam defendido na Antiguidade e que no mundo moderno foi retomada por

Hobbes e Hume[15], e, em especial, a ideia central do jusnaturalismo moderno de que o Direito é a racionalidade das relações humanas (pacíficas ou não) e que, portanto, em sua esfera inclui-se qualquer regulamentação racional de tais relações.

Este último também é o conceito de Direito aceito pela teoria formal, se bem que a polêmica tradicional de ordem ideal e perfeita da comunidade até agora impediu que essa teoria se identificasse em seu precedente histórico mais ilustre e significativo.

Não há dúvida de que a ideia de Direito como técnica ou instrumento para possibilitar as relações humanas, tanto na paz quanto na guerra, ideia exprimível na forma de imperativos hipotéticos ou de proposições condicionais do tipo se então, é comum ao jusnaturalismo clássico de Grócio, Hobbes, Pufendorf e a outros defensores hodiernos da “teoria geral do Direito”[16].

A ideia de Direito como técnica ou instrumento para possibilitar as relações humanas, tanto na paz quanto na guerra sendo uma ideia exprimível na forma de imperativos hipotéticos ou de proposições condicionais do tipo se então, é comum ao jusnaturalismo clássico de Grócio, Hobbes, Pufendorf[17] e a outros defensores hodiernos da “teoria geral do Direito”

Pode-se ver um precedente dessa teoria na doutrina de John Austin que definiu o Direito como “regra formulada para que um ser inteligente guie outro ser inteligente e tenha poder sobre ele. Direito seria, portanto, mando: expressão da vontade de um indivíduo, injuntiva para o indivíduo a quem é dirigida, no sentido de obrigá-lo a fazer o que o mandante requer (Lectures on Jurisprudence, 1861, 5- ed., 1885, I, pp. 88 ss.).

As características fundamentais da doutrina de Austin são duas: 1ª: redução do Direito a uma norma injuntiva, enquanto mando; 2ª: caráter racional, ou pelo menos razoável, desse comando, visto emanar de um ser inteligente e dirigir-se a outro ser inteligente.

Essas características também se encontram em doutrinas aparentemente diferentes da de Austin, como por exemplo, na doutrina sociológica de Eugen Ehrlich, para quem “o Direito é uma organização, vale dizer uma norma que atribui a cada membro da associação sua posição na comunidade, seja ela de preeminência ou de sujeição, bem como seus deveres” (grifo meu, in: Grundlegung der Soziologie des Rechts, 1913, p. 18).

Nessa doutrina, o conceito de ordenação prevalece sobre o de mando, mas a ordenação, assim como o mando de Austin, é uma norma apta a realizar certa forma de convivência. Kelsen, hoje o maior defensor e representante da teoria formal do direito, remete-se a esses predecessores.

Distingue-se de Ehrlich por não julgar que o conceito de ordenação baste para constituir o Direito, porquanto nem sempre a ordenação tem força injuntiva; e distingue se de Austin por julgar que tal força injuntiva não consiste no mando, mas no dever-ser do Direito, ou seja, na estrutura normativa do próprio Direito.

Mais precisamente, para Kelsen o Direito é “a técnica social específica de uma ordenação coercitiva, (grifo meu) sendo, pois, caracterizado pela “organização da força” (General Theory of Law and State, 1945, I, A, d; trad. it., pp. 19 ss.).

A eficiência dessa técnica é condicionada, segundo Kelsen, por sua coerência, que pode ser medida a partir de uma “norma fundamental”, que serviu de base para a criação das várias normas de determinada ordem jurídica.

Portanto, toda técnica eficaz deve ser autorretificável; essa é, na verdade, a única vantagem que a técnica da ciência experimental, desde Galileu até hoje, possui sobre as outras.

Desse ponto de vista, o juízo técnico sobre determinado sistema de Direito é o juízo sobre a sua capacidade de corrigir ou eliminar suas próprias imperfeições, de tornar-se mais ágil e, ao mesmo-tempo, mais rigoroso.

Não é um juízo que se refira à mera coerência do sistema, nem um juízo de valor resultante do confronto do sistema com um ideal prévio de justiça. É um juízo concreto e diretivo, capaz de influir na evolução histórica do direito.

De fato, Direito e moral devem ser considerados idênticos tanto do ponto de vista da teoria do Direito natural quanto do ponto de vista da teoria do Direito como força.

Obviamente, a teoria segundo a qual o Direito se apoia na moral faz uma distinção entre ambas e, na realidade, é a teoria de tal distinção. Quanto à teoria formal do Direito, provavelmente permite tanto uma quanto outra solução.

Mas na realidade o jusnaturalismo moderno não se apoiou em determinado ideal de justiça, mas na exigência de que o Direito, sejam quais forem as normas particulares em que se concretize, seja eficiente no objetivo de possibilitar as relações humanas.

Para Hegel[18], o problema do conceito é um problema filosófico, particularmente, ontológico, e, não lógico ou gnosiológico (In: Filosofia del derecho, p. 37 e p. 45-62 e La phénomelogie de l’espirit, filosofia de la história universal, p.86-100).

Enfim, definir um objeto é, essencialmente, explicitar suas notas essenciais do objeto de conhecimento significando determinar o que ele é. A essência é, pois, a soma de predicados que, por sua vez, dividem-se em dois grupos, a saber: predicados que convêm à essência de tal sorte que se lhe faltasse um deles não seria o que é: e predicado que convêm à substância, mas que ainda que algum deles faltasse, continuaria a ser a substância que é.

Aqueles primeiros são a essência propriamente dita, porque se algum destes faltasse à substância, ela não seria aquilo que é; e os segundo são o acidente, porque o fato de tê-los ou não impede de modo algum que seja aquilo que é. (In: Garcia Morente. Fundamentos da Filosofia, p. 76-96).

A ciência jurídica é considerada ora como scientia pelo seu aspecto teórico, ora como ars, pela sua função prática E, outros ainda, dão ao problema uma solução eclética.

Nas ciências humanas, talvez o caminho mais aconselhável seja aceitar, a título provisório, ou para noção corrente consagrada pelo uso. Aos olhos do homem comum, o Direito é lei e ordem, isto é, conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros.

O Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois nenhuma sociedade poderá subsistir sem o mínimo de ordem, de direito ou solidariedade.

E, para o jurista Santi Romano[19] cansado de conceber o Direito apenas como regra ou comando, resumiu que seja a realização de convivência ordenada.

A lição do brocardo jurídico ubi societas, ibi jus que tão bem traduz onde está o Direito, está a sociedade, e a recíproca é verdadeira. Ubi homo ibi societas; ubi societas, ibi jus é assim que se referia Ulpiano conforme consta no Corpus Iuris Civilis[20]. O homem não consegue estar e ficar só. Pois, convive, socializa, nasce em comunidade, no seio da família e, morre também dentro da comunidade (dos mais variados tipos e formatos.

A melhor edição do Corpus Iuris Civilis é a dos alemães Mommsen, Krueger, Schoell e Kroll. Os dois primeiros editaram o Digesto (Pandectas); o segundo, as Institutas e o Código; e os dois últimos, as Novelas. Mais antigas, mas igualmente importantes, são as edições de Dionísio Godofredo, publicadas entre 1583 e 1664.

Para a língua portuguesa, há várias traduções das Institutas, uma única integral do Digesto e nenhuma integral do Código ou das Novelas. Do Digesto, a tradução foi empreendida pelo Conselheiro Vasconcellos nas duas primeiras décadas do século XX, mas não se tornou (à época) pública.

Somente um século depois (precisamente, a partir do ano de 2017) é que ela foi adaptada, complementada e publicada por uma equipe de professores da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo[21] (após a descoberta por acaso dos nove volumes do manuscrito da tradução original do Conselheiro Vasconcellos). Em 2021 foi publicada uma nova tradução das Institutas de Justiniano[22], baseada em uma versão renovada do texto latino.

Historicamente é impossível conceber o homem solitário, exceto por limitados espaços de tempo, havendo a propensão inata e natural para o ser humano se agregar em comunidades. E, uma vez inserido dentro de comunidade importa ao homem refutar o caos e a anarquia e estabelecer um conjunto de regras de convívio e socialização. Toda comunidade, terá, ipso facto, as suas regras e normas de conduta.

Portanto, o Direito é um fato ou fenômeno social, o que serve para designar a realidade jurídica e a respectiva ordem de conhecimentos. Com razão, aduziu Giambattista Vico, pensador italiano do século XVIII, quando nos ensinou que verum ae factum convertuntur, o verdadeiro e o fato se convertem.

Como fato social e histórico, o Direito é multiforme e reflete distintas e renovadas estruturas normativas. A palavra “direito” é usada em diversos sentidos e se cogitarmos do direito de determinado país do direito positivo (norma agendi) seja brasileiro, espanhol ou português, estamos nos referindo ao conjunto de legislação em vigor no Brasil, na Espanha ou em Portugal.

Já a expressão “direito natural” trata dos princípios que supõem idênticos por toda parte e, inspiradores do direito positivo[23]. Pode ainda, a palavra “direito” designar a faculdade atribuída a cada qual de mover a favor de suas pretensões previstas na ordem jurídica, tem-se o direito subjetivo ou facultas agendi.[24]

O mundo do direito é o mundo das relações entre os homens. O Direito abrange um conjunto de disciplinas jurídicas. Disciplina é um sistema de princípios e de regras a que os homens se ater em sua conduta; é um sistema de enlaces destinados a balizar o comportamento dos indivíduos de qualquer idade ou classe social bem como as atividades de entes coletivos e do próprio Estado.

O Direito abrange um conjunto de disciplinas que se divide em duas grandes classes, a saber: o Direito Privado e o Direito Público[25]. As relações que se referem ao Estado e traduzem o predomínio do interesse coletivo são chamadas de relações públicas, ou de Direito Público.

Mas, o homem não vive apenas em relação com o Estado, mas também e, principalmente, em relação aos seus semelhantes essas são as relações de Direito Privado, onde predomina o interesse privado.

Conclui-se, portanto, em cada comportamento humano, a presença embora indireta, do fenômeno jurídico: o Direito está pelo menos pressuposto em cada ação do homem que se relacione com outro homem.

Todas as infinitas relações e ações condicionam à existência primordial do fenômeno jurídico. O Direito, por conseguinte, tutela os comportamentos humanos. Assim, o direito atua como salvaguarda da convivência social.

A Ciência Jurídica como se trata de ciências, obedece a um tipo de unidade que não é física e, nem orgânica, e sim, finalística ou teleológica.

O Direito localiza-se no mundo da cultura e, para tanto vale-se diferentes métodos. É fácil evidenciar os liames que estabelecem entre sujeito e o objeto, pois o sujeito cognoscente (jurista) tende para o objeto (direito).

Essa tendência é a intencionalidade do conhecimento que consiste em saber de si para o objeto para capturá-lo mediante o pensamento. O sujeito produz um pensamento do objeto e, o ato cognoscitivo, não é o ato solitário, é sempre heterogêneo.

A palavra “método”[26] é formada pela justaposição de dois vocábulos gregos, a saber: metas e odos. Meta tem o significado de fim-objeto que tende a uma atividade. Odos, equivale a caminho, trâmite. O composto “método” significa, portanto, o “caminho para”, o meio para o fim, isto é, o caminho que conduz a ciência à verdade.

A definição de método é complexa e pode sugerir certa gama de diferentes significados. Martin Heidegger lembra-nos que, etimologicamente, método é uma palavra de raiz grega e que significa “o caminho pelo qual sigo uma coisa”. No mesmo sentido, Friedrich Rapp afirma que “en su sentido más estricto por ‘método’ ha deentenderse una manera consecuente de proceder que se aplica para alcanzar un determinado fin”.

Questiona-se se o método científico por si só, já conduz a um resultado seguro. Pois, a finalidade da sistematização é negada por muitos doutrinadores, tal como Esser e, defendida por outros como Karl Engish[27], Larenz, Helmunt Coing[28] e Miguel Reale.

Outro questionamento que instiga saber se caberá ao Direito sistematizar o ordenamento jurídico? Afinal, há ainda os que negam a viabilidade de um conhecimento científico do direito, negando ainda a cientificidade da jurisprudência[29].

Para alguns estudiosos da ciência do direito não é, na realidade, uma ciência porque o seu objeto (o direito) modifica-se, com o tempo e no espaço. E, tamanha mutabilidade impede ao jurista a exatidão científica na construção.

Sequencialmente podemos identificar as seguintes correntes doutrinárias, a saber: 1. Racionalismo metafísico ou jusnaturalista; 2. Empirismo exegético; 3. Historicismo; 4. Sociologismo eclético; 5. Racionalismo dogmático; 6. Egologia existência. (In: MACHADO NETO, Arthur. A Teoria da Ciência Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1975, p.80; COSSIO, Carlos. Las actitudes de la ciencia jurídica. La Ley, 1956).

O racionalismo metafísico ou jusnaturalismo de Stammler[30] e Del Vecchio[31] apesar de sua relevante tradição, jamais pôde proporcionar um fundamento científico à ciência do Direito, trata-se de atitude pré-científica, no campo do conhecimento jurídico.

Já para o empirismo exegético de Demolombe[32], Aubry e Rau[33] e Laurent concluíram que a tarefa do jurista seria de mera exegese do texto legal.

Para o historicismo casuístico de Gustavo Hugo e Savigny[34] trouxeram a valorização do costume, manifestação espontânea do espírito nacional (nacionalismo) e do caráter feudal (conservadorismo). A experiência histórica e jurídica para a Escola Histórica[35] e o conhecimento do direito só poderia se basear nesta experiência.

A escola naturalista, por sua vez, tem diante de si um objeto permanente e imutável, o que lhe permite fazer verificações, experiências, correção de erros que porventura tiver cometido.

Bobbio (In: Teoria della scienza giuridica. Torino: Gianppichelli, 1950, p.53) cita entre os negacionistas da ciência do Direito estão Chamberlain, Nussbaum, Max Rumpf e, principalmente, Julian Herman Von Kirchmann, conforme a sua obra “La Jurisprudencia no es ciencia. Madrid: Instituto de Estudios Políticos, 1949.

Anunciou a maioria dos pensadores que a jurisprudência é ciência tal como Heirich Rickert, Wundt, Recanséns Siches e Porrúa. A ciência jurídica só veio consolidar-se no século XIX e, são inúmeras as concepções epistemológico-jurídicas referentes à cientificidade da jurisprudência, todas essas bem peculiares aos séculos XIX e XX.

Para o sociologismo eclético de David[36], Léon Duguit[37], François Gény, Maurice Hariou, Holmes, Pound, Rost, Olivercrona, Stundka, Pashukanis[38], Silvio Romero[39] e Tobias Barreto[40], a sociologia era a única ciência social enquanto a ciência social sendo um setor dessa ciência total da sociedade. Defendiam a aplicação do método sociológico à investigação jurídica.

O racionalismo dogmático tem em Kelsen sua expressão máxima e egologia existencial foi fundada por Carlos Cossio[41]. Consigne-se que a filosofia do direito compreende três temas fundamentais, a saber: 1. Investigando o que é o direito para chegar a defini-lo e precisar seu conceito; 2. O problema do conhecimento do direito, a epistemologia jurídica que tem o fim de estudar os pressupostos as características do objeto e o método do saber científico e de verificar suas relações e princípios sendo a epistemologia jurídica a teoria da ciência jurídica que tem por objetivo o estudo dos problemas do objeto e do método de jurisprudência[42] bem como sua posição no quadro das ciências e suas relações com as ciências afins[43].

A epistemologia lato sensu é sinônimo de gnosiologia, parte da filosofia que estuda a natureza, a origem e os limites e o valor da faculdade humana do conhecimento e seus critérios de validade. Todas as ciências possuem íntimo contato com a filosofia, uma vez que possuem princípios gerais, axiomas, supostos que penetram o objeto de estudo que investigam daí, a necessidade de uma consideração filosófica que permita justificá-los.

Lecionou Machado Neto que se o jusnaturalismo racionalista foi a expressão e configuração hierárquica do mundo medieval. Já o jusnaturalismo racionalista foi fruto do mundo burguês em ascensão; já o historicismo além da repercussão ideológica recém-instalada sociologismo, a ideologia jurídica de burguesia já bem instalada veio canonizar o fato como direito, o relativismo da teoria pura será o pensamento jurídico solidário e decadência da civilização liberal burguesa.

Foi com base nas descobertas de Kelsen que surgiu na Argentina nos meados do século XX um movimento filosófico com objetivo epistemológico de proporcionar ao estudioso do direito a utilização de instrumentos mentais que constituem o egologismo existencial[44], cujo fundador foi Carlos Cossio que concebeu a problemática jurídico-filosófica voltada para a investigação científica voltada para a fenomenologia filosofia de valores e o existencialismo.

Para os doutrinadores argentinos Aftalión, Olano e Vilanova, o egologismo entende que a filosofia jurídica envolve quatro grandes temas: ontologia jurídica; lógica jurídica formal; lógica jurídica transcendental; e axiologia jurídica.

Ao contrário da afirmação recorrente de que Cossio e o Egologismo entendem que a ciência jurídica deveria estudar somente a conduta humana em sua dimensão social, prescindindo da norma jurídica, um dos principais divulgadores da obra de Cossio no Brasil, o jurista Machado Neto sustenta que a principal preocupação da teoria egológica é a busca da essência (fundamento ontológico) do Direito. Logo, para o egologismo jurídico esse fundamento não estaria na norma jurídica, tal como defendido por Hans Kelsen, mas estaria na conduta humana.

Para Kelsen, o objeto do conhecimento jurídico é a norma, de modo que a atividade da ciência jurídica se esgota na tarefa de conhecer as normas de direito. O objeto da investigação do jurista deve ser a norma e o comportamento humano só o será na meia em que constitui o conteúdo de comandos jurídicos.

Para Hans Kelsen, a fórmula lógica da norma jurídica é deontológica (ou do “dever-ser”: dado A deve ser B), cujo enunciado é: “Dada a não prestação deve ser sanção”.

Cossio aditou a esta lógica a condicionante humana, também deontológica (ou do “dever ser”) ou seja, para que haja uma sanção é preciso haver um sujeito (juiz) que lhe aplique; de igual forma, a ilicitude em si não gera automaticamente esta sanção. E, mesmo a não-prestação de uma norma depende do sujeito a quem a sanção se destina: a sociedade, a quem o direito serve.

Segundo Kelsen o Direito se identifica com a norma e para Cossio com a conduta humana. Sendo que esta norma representa apenas o dever-ser da conduta.

Mais importante que a Lei é a conduta do indivíduo e a interação de seu ego em sociedade — daí o nomeEgológica” (grifo meu). Para Cossio, o Direito é uma ideia, não um conceito como Kelsen o atribuía. Cossio declara que a ciência jurídica deve estudar a conduta[45] humana enfocada em sua dimensão social, e não na norma jurídica.

Sua fórmula para a norma jurídica, então, obedece ao seguinte enunciado: Dado um fato gerador deve ser prestação pelo sujeito obrigado face ao sujeito pretensor, ou, dada a não-prestação, deve ser sanção pelo funcionário obrigado face à comunidade pretensora.

As ideias inovadoras de Cossio encontraram respaldo no Brasil, com o então jovem jurista Antônio Luiz Machado Neto, professor da Universidade Federal da Bahia e da Universidade de Brasília. Com o advento dos regimes militares, tanto no Brasil quanto na Argentina, ambos foram tratados como persona non grata dos respectivos governos. Parcialmente, por conta disto, as ideias do egologismo não encontraram respaldo no meio acadêmico, e tratadas com descaso e ironia, por parte dos demais juristas, afeitos à ordem vigente.

No Brasil, não se ignorar a importante contribuição do Professor Julio C. Raffo (ex-reitor da Universidade Nacional de Lomas de Zamora, Argentina), discípulo direto de Carlos Cossio, que nos anos 70 e 80 do século passado atuou no Rio de Janeiro como professor de Lógica, Metodologia e Filosofia Jurídicas na Universidade Cândido Mendes de Ipanema e na PUC-RJ. Raffo chegou a publicar pela Editora Forense a obra “Introdução ao conhecimento jurídico”, atualmente esgotada.

Contemporaneamente, o egologismo jurídico possui na jurista baiana Marília Muricy, uma discípula e continuadora do trabalho de A. L. Machado Neto, sendo uma das responsáveis para que a Faculdade de Direito da UFBA tenha sido um dos polos do egologismo no Brasil.

De acordo com a teoria pura do direito, o objeto da jurisprudência consiste nas normas jurídicas determinantes da conduta humana ou na conduta humana determinada pelas normas jurídicas, ou seja, enquanto contida nas normas de direito[46].

A norma jurídica é o elemento de base do direito e, portanto, a célula de cada ordenamento jurídico. É um imperativo de conduta, que coage os sujeitos a se comportarem da forma por ela esperada e desejada.

Kant considera ser a norma jurídica um juízo hipotético. No Kantismo encontramos a origem da distinção de imperativo categórico do hipotético. O primeiro impõe dever sem qualquer condição (norma moral), enquanto o hipotético é condicional. O categórico ordena por ser necessário, enquanto no hipotético a conduta imposta é meio para uma finalidade. Assim, o imperativo hipotético estabelece condição para a produção de determinado efeito.

Kelsen retomou essa distinção, considerando a norma jurídica um juízo hipotético por dependerem as suas consequências da ocorrência de uma condição: se ocorrer tal fato deve ser aplicada uma sanção. Então conclui Kelsen que a estrutura da norma jurídica é a seguinte: em determinadas circunstâncias, determinado sujeito deve observar determinada conduta e se não a observar, outro sujeito, órgão do Estado, deve aplicar ao delinquente a sanção.

Norma jurídica, segundo, Paulo Dourado de Gusmão, é a proposição normativa inserida em uma ordem jurídica, garantida pelo poder público ou pelas organizações internacionais. Coloca ainda ele, que tal proposição pode disciplinar condutas ou atos, como pode não as ter por objeto, coercitivas e providas de sanção. Visam, consoante o autor, a garantir a ordem e a paz social e internacional.

Norma[47] pode também se referir aos fatos e situações que não constituem a conduta humana, mas, desde que sejam condições ou efeitos da conduta humana.

Conforme o conhecimento jurídico-científico dirija-se às normas que devem ser aplicadas ou os atos de produção e aplicação, temos uma teoria estática e uma teoria dinâmica.

A teoria estática tem como objeto o direito tido como sistema de normas, estuda-o em estado de repouso. Ao considerar o direito em seu momento estático, a pesquisa jurídico-científica deve partir das normas de direito positivo e confrontá-las entre si, numa unidade coerente e sistemática sob o enlace dedutivo de preceitos normativos e da norma básica, mostrando o uno sistema no múltiplo (multiplicidade das normas). As normas de direito não são o resultado do estudo da Jurisprudência, mas sim, o seu objeto.

Por sua vez, a teoria dinâmica considera o direito em movimento, e tem por objeto o processo justo em que é produzido e aplicado o direito; “os atos de produção e aplicação do direito só interessam, à ciência jurídica, enquanto forem o conteúdo de normas jurídicas.

Por sua vez, a teoria dinâmica considera o direito em movimento e, tem por objeto o processo justo em que é produzido e aplicado o direito; “os atos de produção e aplicação do direito só interessam à ciência jurídica enquanto forem o conteúdo de normas jurídicas”.

A atividade cognoscitiva do jurista conforme a doutrina de Hans Kelsen em que há certa relação entre “ser” e “dever ser”. Dentre as várias teorias que explicam a Jurisprudência, cabe o exame do racionalismo dogmático e do egologismo existencial.

O racionalismo dogmático[48], ou melhor, a teoria de Kelsen é uma expressão ideológica de sua época, uma consequência do declínio do mundo capitalista-liberal, marcado pela Primeira Guerra Mundial. Para Jurisprudência, segundo essa doutrina, não importa o conteúdo do direito.

Segundo Machado Neto, essa teoria foi fruto da era denominada de “racionalização do poder”, resultante do democratismo formal e vazio de ideologias totalitárias nascentes e suas primeiras experiências concretas conviviam com o liberalismo democrático em sua fase conservadora, reconhecendo as ordens jurídicas de cunho político, diverso do liberal ou social-democrata que exiba os povos europeus ocidentais.

Constituiu uma teoria do direito reconhecendo ao lado do direito democrático-liberal, de um direito soviético, fascista e nazista. Vocação para a neutralidade com tom axiológico de normas jurídicas.

Kelsen, por sua vez, reagiu à anarquia conceitual a que má consciência científica do jurista tinha reduzido a meditação científica do direito ao identificá-la como ciência natural. A teoria pura do direito é a mais autêntica tentativa de fundamentação autônoma da ciência jurídica, pois antes desta a ciência jurídica se reduzia a ancilla sociologial e ao inerte protetorado teórico de quanta ciência causal existia.

Tércio Sampaio Ferraz Júnior em que obra intitulada “Por que ler Kelsen hoje?” chega a afirmar que a obra de Kelsen ainda o mantém vivo suas implicações para a Ciência Jurídica, para a lógica da norma e para a aplicação do direito são fecundas que, por mais que critiquemos, não deixam de desvendar novos ângulos e novos encaminhamentos. Interessante consultar, ainda, Fabio Ulhôa Coelho autor da obra “Para entender Kelsen”[49].

O denominador comum da teoria de Hans Kelsen é sua apaixonada postura gnosiológica e, onde o jurista encontra delineado o seu método de trabalho.

O positivismo da teoria de Kelsen foi prevalente no século XX, mas considerado como fenômeno universal e, onde o jurista encontra o seu próprio habitat teórico.

A teoria de Kelsen é considerada o “ovo de Colombo” da teoria jurídica, mas não quer dizer que tenha a palavra final sobre tão ricas implicações teóricas apesar de ter Kelsen pretendido admitir a existência de uma “antinomia inevitável” entre essas duas categorias apriorísticas, pois segundo ele, para que uma norma seja tida como válida, ela terá não só de ser posta por um ato de vontade – que é um ato do “ser” como também possuir determinado grau de eficácia.

A norma é vista como um sentido de um ato de vontade, que a fixa. O fim do ato de fixação da norma não é um “dever ser”, mas um “ser “que é a conduta existente na realidade, a qual corresponde à norma.

O ato de vontade, como ato do “ser”, tem o sentido de um “dever ser”, que é norma. Uma norma posta na realidade do ser por um realizante ato de vontade e uma norma positiva.

O segundo ato de vontade, de um ato comando dirigido à conduta de outrem só pode ser descrito com o termo “dever ser”, pois essa conduta pode “ser”, mas pode também “não ser”, isto é, o outro pode obedecer ou desobedecer à ordem.

Logo, essa conduta não entra na ordem no modo de ‘ser” e, sim no modo “dever ser”. Como se vê, a eficácia é condição de validade. A eficácia de uma norma consiste em que esta é, em geral, efetivamente cumprida e, se não cumprida é aplicada.

A validade consiste em que a norma deve ser cumprida, ou se não o for, deve ser aplicada. Uma norma que proíba a venda de bebida alcóolica, punindo com prisão a quem violasse, perderia sua validade, se fosse certo que não seria obedeceria devido à resistência dos subordinados a esta; e, não fosse cumprida, também não seria aplicada pelos órgãos competentes.

Trata-se da desuetudo, o que mostra a relação entre validade e eficácia. As normas são criadas por atos volitivos (atos de legislação) e atos que constituem um costume criador do direito, atos jurisdicionais, administrativos e convencionais sendo, por isso, consideradas como sentido subjetivo dos atos que as prescrevem.

O sentido subjetivo de um ato humano dirigido a conduta de outra só é interpretado com o sentido objetivo desse ato se for uma norma validade. Que é a promulgada por ato legítimo.

Suponha que uma organização secreta como o Esquadrão da Morte, por exemplo, com o escopo de libertar a sociedade de indivíduos nocivos, tanto que os executa. Aquilo que, subjetivamente, se considera a sentença de condenação à morte, objetivamente, ante o direito positivo, não é uma execução de sentença, mas um homicídio, porque nenhuma disposição legal apoio os atos dessa organização secreta.

Portanto, ao afirmar que a norma, para a teoria pura do direito, tem validade objetiva, é o mesmo que ratificar que o sentido subjetivo do ato legislativo é também o seu sentido objetivo.

Para Hans Kelsen, o que transforma um fato num ato jurídico (seja lícito ou ilícito) não é a faticidade, isto é, o “ser” como tal como determinado pela lei da causalidade, sua manifestação externa na conduta humana que se realiza no espaço e no tempo, sensorialmente perceptível, mas o sentido objetivo a que está ligado esse ato, a significação jurídica que possui.

Em sentido jurídico do ato advém de uma norma, de tal modo que o referido ato pode ser interpretado segundo esta. O juízo em que se enuncia que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico ou antijurídico é o resultado de uma interpretação normativa.

E, a norma que empresa ao ato significado de um ato jurídico ou antijurídico, é produzida também por um ato jurídico que, por seu turno, recebe a sua significação jurídica de uma outra norma, e assim por diante, até atingir a norma básica.

A norma funciona como um esquema de interpretação. Kelsen esclareceu que a norma é válida quando: a) o ato cujo sentido objetivo é a norma; A1 está determinado como devido em outra norma, que é o sentido subjetivo do ato A2 que está dirigido intencionalmente ao ato A1; b) o sentido subjetivo do ato A2 é também interpretado como o sentido objeto. A norma estabelecida no ato A2, que é interpretada com o sentido objetivo desse ato, constitui o fundamento de validade da norma estabelecida pelo ato A1. Aquela é, em sentido figurado, a norma superior, e a norma cuja validade fundamenta é a norma inferior.

Portanto, a validade da norma precede a norma individual, pois o conhecimento da norma geral é pressuposto para a fixação da norma individual. A norma superior só determina o ato do estabelecimento da norma inferior, não, porém, o conteúdo da norma que deve ser estabelecida, pois autoriza, o estabelecimento de normas de qualquer conteúdo.

Se a norma fundamental determina apenas quem está autorizado a estatuir normas, a norma inferior corresponde à superior se aquele que a estatuiu tem a sua conduta determinada no conceito que está contido na norma autorizante.

A norma superior apenas determina o órgão autorizado a produzir a norma inferior, aplicando a norma superior. Nesta ordem de ideias, que a norma pode valer mesmo quando o ato de vontade de que ela constitui o sentido já não existe; a existência ou vigência de uma norma é diferente da existência do ato de vontade que ela é o sentido objetivo; “a norma de dever ser, como sentido do ato de ser que a põe, não se identifica com esse ato”.

Denota-se, nesse caso no plano jurídico, não há nenhuma interligação de “ser” e “dever ser”; essa correlação ocorre num momento anterior ou pré-jurídico, ou seja, na fase da gestação da norma.

Lembremos ainda que para Kelsen[50] um mínimo de eficácia é condição de sua vigência (validade), deve existir a possibilidade de uma conduta em desarmonia com a norma, deve haver sempre a possibilidade de sua ineficácia, ou melhor, de não ser aplicada ou observada em casos particulares.

Logo, a norma jurídica não é somente válida quando é inteiramente eficaz, isto é, quando é aplicada e observada, mas também, quando é eficaz apenas até certo grau.

Kelsen pretendeu afirmar que o mínimo de eficácia consiste na condição de a norma ser desobedecida e aplicada; ou obedecida e não aplicada, imprescindível para que ela seja válida, vindo assim unir, de certa forma, o ser e o dever ser, uma vez que estabelece uma comunicação entre normatividade (vigência) e facticidade (eficácia).

Consigne-se, ainda, que a validade da norma não se confunde com a eficácia sociológica de norma. A validade ou vigência para a teoria de Kelsen é a existência específica norma jurídica, significando que é obrigatória. A eficácia é o fato real de que a norma é aplicada e seguida.

A norma é eficaz quando for aplicada pelos órgãos jurídicos e respeitada pelos que estão subordinados a esta. Esquematicamente, é eficaz a norma obedecida e não aplicada como a desobedecida, mas aplicada.

A norma vigente que for ineficaz será derrogada com o tempo, mas essa falta de eficácia que ela perdeu a vigência, pois ela pode ser ineficaz somente em alguns momentos recuperando sua eficiência quando outras condições sociais permitirem.

Mas, se ela permanecer duradouramente ineficaz, deixará de ser válida, sendo a eficácia nesse sentido a condição de vigência. A norma ineficaz só é inválida se a norma fundamental hipotética assim o dispuser.

Sublinhe-se que a vigência e a eficácia[51] não se dão ao mesmo tempo. A norma é válida mesmo que se torne ineficaz. Exemplificando: quando o magistrado a aplicação pela primeira vez que ela pudesse adquirir a eficácia.

O que Kelsen pretendeu afirmar foi que ao estabelecimento da norma deve seguir-se a sua eficácia, para que a referida norma não perca sua vigência. É eficácia uma conditio sine qua non (condição necessária) para a validade da ordem jurídica e, não conditio per quam (condição suficiente).

Para a sociologia jurídica a eficácia é nota característica do direito. Só é o Direito vigente que obtém, na realidade, a aplicação eficaz.

A maioria dos doutrinadores apresenta como objeção fundamental à teoria de Kelsen o seu caráter fragmentário, ou a sua visão parcial do direito. Isto porque o direito não se compõe apenas de normas; há algo mais, os valores, fatos sociais, comportamentos humanos e, etc. Não sendo apropriado defini-lo apenas por um de seus elementos.

Paul Amselek vislumbra na teoria pura do direito uma inspiração fenomenológica, considerando Kelsen como precursor da fenomenologia do direito, porque veem na sua doutrina uma ciência fundada sobre a teoria eclética do direito[52].

Segundo o professor Paul Amselek distingue-se dois tipos de pesquisa: a) pesquisa epistemológica: aquela que tem como objetivo a investigação de conceitos sob um ponto de vista dogmático-epistemológico.

b) pesquisa operatória: aquela cujo principal objetivo é a resolução de um problema prático da atividade do profissional do Direito.

Os professores Monteiro e Savedra propõe a classificação da pesquisa científica em epistemológica, instrumental e sociojurídica. Trata-se de uma classificação bastante útil, a qual merece ser considerada detidamente.

A pesquisa epistemológica implica atividade de pesquisa de cunho teórico ou filosófico, interessando-se sobre os conceitos e categorias fundamentais da Ciência do Direito, seus paradigmas, os fundamentos do discurso jurídico, os valores informadores das normas jurídicas, bem como pelos conceitos jusfilosóficos.

A pesquisa instrumental requer atividade determinada pela preocupação com a prática, buscando trazer uma contribuição teórica à resolução de problemas técnicos (transformando o saber em saber-fazer).

A pesquisa é dita instrumental porque capta o objeto da Ciência do Direito como um instrumento para a resolução de problemas práticos, tendo como principal objetivo a “racionalização das técnicas jurídicas e o aperfeiçoamento dos textos normativos”

A pesquisa instrumental pode ser dividida em: a) doutrinária, a qual está voltada prioritariamente ao estudo das teorias, teses ou opiniões emitidas pelos autores autorizados cujas obras têm como principal finalidade interpretar o Direito (técnica de pesquisa mais comum é a bibliográfica); b) legal, que está preocupada com a sistematização e interpretação das normas jurídicas, restringindo-se à análise de enunciados teóricos e práticos contidos nas normas do ordenamento jurídico vigente (técnicas de pesquisa mais comuns são a documental, a histórica e a comparada) ; e c) jurisprudencial, que se pauta na análise das decisões suficientemente concordantes a respeito de um determinado tema (principal técnica de pesquisa a documental).

A pesquisa sociojurídica importa atividade de pesquisa orientada pela relação da ordem jurídica com a ordem social (entendida como meio ambiente humano). A sociologia do Direito busca estabelecer as conexões entre as duas ordens de fenômenos, considerando-as alternativamente como variáveis dependentes ou interdependentes.

A pesquisa tanto pode partir da influência de fatores sociais sobre a ordem normativa quanto, inversamente, da influência da ordem normativa sobre os comportamentos sociais.

Kelsen, ao propor uma ciência pura, evitando toda mescla com elementos éticos, políticos e sociológicos cujo método permite purificações sucessivas e que permitem captar o fenômeno livre das impurezas que o ocultam, determinando a essência.

O normativismo de Kelsen jamais afirmou que direito é só norma que é apenas uma parte do âmbito maior que é direito. É evidente a natureza epistemológica dessa concepção, o esforço de conceder cientificidade ao conhecimento do direito, ficando as bases de uma ciência autônoma e rigorosa.

A Teoria pura do direito[53] é uma teoria do direito positivo. Kelsen apostou dualismo radial entre “ser” e “dever ser” e pretendeu submeter a ciência jurídica a uma dupla depuração metódica que é uma das vigas mestras de sua doutrina, eliminando quaisquer investigações sociológicas e axiológicas.

O direito é o objeto da ciência jurídica. Cossio procurou descobrir a essência do direito, com o fim de delimitar o objeto da ciência jurídica. Cossio partiu da construção de Husserl dos objetos culturais e da intuição eidética, chegando a concluir que o “ser” do direito é a conduta humana em sua interferência subjetiva sobre o qual incidem valores. Conclui-se que o direito é, ontologicamente, um objeto cultural egológico.

Kelsen, com o fim de evitar o sincretismo metodológico baseado no dualismo radical entre “ser” e o “dever ser”, pretendeu submeter a ciência jurídica a uma dupla depuração metódica que é uma das chaves principais de sua doutrina, eliminando de seu campo de ação quaisquer investigações sociológicas e axiológicas.

A teoria de Kelsen[54] confinou-se a uma perspectiva normativista, admitindo seu lado uma teoria da justiça e uma sociologia jurídica. Propondo ao jurista, ao exercer sua tarefa de conhecer normas, utilize o método normológico, o hipotético-dedutivo ou lógico-transcendental, empregando um ou outro conforme a natureza do fundamento de validade.

O tema central é o direito que é o objeto da ciência jurídica. É indispensável que se determine o “ser” do direito para que se fixe a faceta ou aspecto que a ciência jurídica o abordará e, como isso não pode ser feito pela próprio Jurisprudência[55].

Segundo Kelsen (o direito é uma) “ordem normativa de coerção”, (reportada a uma) “norma fundamental”, “a que deve corresponder uma constituição efetivamente estabelecida e, em termos gerais, eficaz, bem como as normas que, de acordo com essa constituição, foram efetivamente estabelecidas e são, em termos gerais, eficazes.” É também uma “técnica específica de organização social”(grifo meu).

O Direito é a norma das ações humanas na vida social, estabelecida por uma organização soberana e imposta coativamente à observância de todos. (Ruggiero e Maroi) (grifo meu).

De acordo com Max Weber, o direito é “Um ordenamento chama-se […] direito quando é exteriormente garantido pela possibilidade de coerção (física ou psíquica), através de um comportamento, dirigido a forçar a observância ou a punir a violação, de um grupo de pessoas disso especialmente incumbido“. (grifo meu).

Já, para Gustave Radbruch: O Direito é vontade de justiça. Para Rudolf von Ihering afirmou que: “o direito é a soma das condições de existência social, no seu amplo sentido, assegurada pelo Estado através da coação“. (grifo meu)

Para Immanuel Kant, “o direito é o conjunto das condições segundo as quais o arbítrio de cada um pode coexistir com o arbítrio dos outros, de acordo com uma lei geral de liberdade”. (grifo meu)

Para Dworkin, (o direito são) “os padrões que determinam os direitos e deveres que um governo tem o dever de reconhecer e fazer respeitar, pelo menos em princípio, através das instituições comuns dos tribunais e da polícia.” (grifo meu)

Luhmann (o direito é) “a estrutura de um sistema social respeitante à generalização congruente de expectativas normativas de comportamento.” (grifo meu)

Para Robert Alexy “O direito é um sistema de normas que (1) ergue uma pretensão de justeza, (2) compõe-se da totalidade das normas que pertencem a uma constituição socialmente eficaz, em termos gerais, e não são extremamente injustas, bem como da totalidade das normas que são estabelecidas em conformidade com esta constituição, apresentam um mínimo de eficácia ou possibilidade de eficácia social e não são extremamente injustas, e (3) ao qual pertencem os princípios e os restantes argumentos normativos em que se apoia e/ou deve apoiar o processo de aplicação do direito para cumprir a pretensão de justeza.”(grifo meu)

Convém frisar que a criação do direito[56] não é exclusiva obra do legislador[57], mas também, e principalmente, do jurista, do magistrado, do advogado, enfim, de todos os operadores do direito. A lei não esgota o direito, assim como a partitura não esgota a música. Enfim, a finalidade do Direito, conforme é doutrinariamente enfatizado, é a realização da Justiça.

Segundo Perelman, ser justo é atribuir a cada qual o que lhe cabe, que, em sentido jurídico, é aquilo que a lei lhe atribui. Ser justo é aplicar as leis do país; daí decorrendo que, a depender de cada legislação, existirá um critério particular de distribuição de justiça.

Na contemporaneidade, o Direito passou da opção entre um assumido e ortodoxo positivismo legalista e um certo quixotesco jusnaturalismo de viés clássico, para um sutil e tênue juspositivismo que não deixa de imperar soberanamente sobre a prática, e um pós-modernismo por vezes cáustico, cujas aportações construtivas parecem indicar que há muita crítica e desconstrução. Assim, repleto de conceitos jurídicos indeterminados e, um emaranhado de princípios jurídicos e, ainda, uma hermenêutica cada vez mais constitucional, deram-se as possibilidades de legitimação de valores razoáveis e proporcionais nas normas produzidas nas decisões judiciais.

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[1] A República é um diálogo socrático escrito por Platão e narrado em primeira pessoa por Sócrates. A conversa tem como ponto de partida um esquadrinhamento pela definição do que abarca a justiça. Também contém um diálogo entre Sócrates e Glauco sobre as vantagens e prejuízos da velhice. Foi escrita por volta de 380 a.C., e é particularmente rica em termos filosóficos, políticos e sociais. Em questão, está a busca de uma fórmula que garanta uma harmoniosa administração à uma cidade, mantendo-a livre da anarquia, dos interesses e disputas particulares e do caos completo. O local do diálogo é a casa de Polemarco, irmão de Lísias e Eutidemos, filho do velho Céfalo. Os principais personagens do diálogo são Sócrates; os dois irmãos de Platão, Glauco e Adimanto; Nicerato, Polemarco, Lísias, Céfalo e Trasímaco. Nos livros II a V os diálogos evoluem para a definição dos princípios da justiça, ou seja, o que constitui a verdadeira justiça administrada à população. O primeiro princípio da justiça seria a solidariedade social, forma pela qual a pessoa contribui para o bem-estar coletivo. O segundo é o desprendimento, dever consciente de pessoas realmente dispostas a prover o bem comum. Deste princípio surgiria a necessidade de uma classe social distinta das atividades econômicas, a dos guardiões, reis-filósofos que sustentariam a felicidade do Estado. A sociedade então, ficaria dividida em três classes: os chefes dos guardiões, os próprios guardiões, ou militares, e os produtores e artesãos. A classe dos guardiões seria constituída por homens e mulheres, em iguais condições, mantidos pelo estado, sem direito à riqueza, não poderiam constituir família.

[2] Para Cícero, o direito natural é uma razão universal, e, por isso, comporta, ao contrário de Aristóteles, a sua anunciação tal qual um rol de normas válidas a todos, em todo o universo. Sendo um catálogo de deveres e ações, o justo para Cícero aproxima-se grandemente da moral.

[3] Santo Agostinho (354-430) foi um filósofo, escritor, bispo e importante teólogo cristão do norte da África, durante a dominação romana. Suas concepções sobre as relações entre a fé e a razão, entre a Igreja e o Estado, que dominaram toda a Idade Média. Santo Agostinho, conhecido também como Agostinho de Hipona, nasceu em Tagaste, na cidade da Numídia (hoje Argélia), no norte da África, região dominada pelo Império Romano, no dia 13 de novembro de 354. Sua infância e adolescência transcorreram principalmente em sua cidade natal, em um ambiente limitado por um povoado perdido entre montanhas. Seu pai era pagão e sua mãe uma cristã devota que exerceu grande influência sobre a conversão do filho. Santo Agostinho teve papel importante na fixação da hierarquia na Igreja Católica e fez a síntese entre a filosofia grega e o pensamento cristão. Fixou a ideia da vida interior do homem como o palco essencial da construção da identidade.

[4] Isidoro de Sevilha, em latim: Isidorus Hispalensis (560-636) serviu como arcebispo de Sevilha por mais de três décadas, sendo considerado, segundo o historiador do século XIX Montalement, num frase muito citada, “o último acadêmico do mundo antigo”. Sua fama depois de morto baseou-se em sua Etymologiae, uma enciclopédia que juntou fragmentos de muitos livros antigos que, não fosse isso, teriam sido completamente perdidos.

[5] Tomás de Aquino, em italiano Tommaso d’Aquino (1225-1274) foi frade católico italiano da Ordem de Pregadores (dominicano) cujas obras tiveram grande influência na teologia e na filosofia, particularmente, na tradição conhecida como Escolástica, e que, por essa razão, é conhecido por “Doctor Angelicus, Doctor Communis, e Doctor Universalis. O nome “Aquino” é referência ao condado de Aquino, uma região que foi propriedade de sua família até 1137. Foi o mais relevante proponente clássico da teologia natural e o pai do tomismo. E, sua influência sobre o pensamento ocidental é considerável e presente mesmo na filosofia moderna que foi concebida como sendo desenvolvimento ou oposição de suas ideias, particularmente, na ética, na lei natural, metafísica e teoria política. Tomás abraçou as ideias de Aristóteles a quem se referia como “o Filósofo” e tentou sintetizar a filosofia aristotélica com os princípios do cristianismo. Suas obras mais conhecidas foram a Suma Teológica ou Summa Theologiae, a Suma contra os Gentios ou Summa contra Gentiles. É venerado como santo pela Igreja Católica e, é tido como professor modelo para os que estudam para o sacerdócio por ter atingido a máxima expressão tanto da razão natural quanto da teologia especulativa. Também foi proclamado como Doutor da Igreja por Pio V em 1568.

[6] Alberico Gentili (1552- 1608) foi jurista italiano que foi também diplomata na Embaixada de Espanha em Londres, também trabalhou como professor de direito civil na Universidade de Oxford por vinte e um anos. Reconhecido como um dos fundadores do direito internacional.

[7] Hugo Grotius (1583-1645) foi um jurista holandês, considerado um dos fundadores do Direito Internacional. Foi também diplomata, poeta, dramaturgo e historiador. É o autor da obra “O Direito da Guerra e Paz”. Desenvolveu a doutrina da guerra justa, já estabelecida por St. Agostinho. Hugo Grotius (1583-1645) conhecido também por (Hugo Grócio) e (Hugo de Groot) nasceu em Delft, nos Países Baixos, no dia 10 de abril de 1583. Criança precoce começou a escrever poesia com apenas oito anos. Com onze anos entrou para a Universidade de Leiden, onde seu pai era curador, para estudar Direito. Com 15 anos acompanhou uma missão diplomática à corte parisiense de Henrique IV. Com 16 anos publicou obras sobre a filosofia grega e latina. Nesse mesmo ano, foi nomeado para o Tribunal de Haia, quando pronunciou seu primeiro discurso.

[8] John Locke (2632-1704) se destacou em seus estudos de filosofia política e deixou grande contribuição ao desenvolvimento do liberalismo, principalmente da noção de Estado de Direito. Foi um dos principais empiristas britânicos, juntamente com Thomas Hobbes, George Berkeley e David Hume. E, a sua filosofia reconhece a experiência como única fonte válida de conhecimento. John Locke negava radicalmente que existiam ideias inatas, tese defendida por Descartes. Argumentava ele, que quando se nasce, a mente é uma página em branco que a experiência vai preenchendo. Sua teoria do conhecimento foi exposta em sua obra fundamental: “Ensaio Sobre o Conhecimento Humano”.

[9] Neminem laedere é uma expressão em língua latina que significa, após tradução para a língua portuguesa, “a ninguém ofender”. No direito é representado como um princípio, que rege a chamada responsabilidade aquiliana, oriunda do descumprimento direto da lei (artigos 186 e 927 do Código Civil Brasileiro). O princípio alterum non laedere ou neminem laedere, caracteriza-se, principalmente, pela sua antiguidade e atualidade paralelas, fato que se perceberá ao longo dos tópicos relacionados ao tema. O princípio em estudo provém do preceito de Ulpiano, e consta no Digesto: “Iuris praecepta sunt haec: honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere”. “Os preceitos do direitos são estes: viver honestamente, não lesar a outrem, dar a cada um o que é seu.” Pelas palavras do jurisconsulto romano percebe-se que a realidade da vida em sociedade atual não se difere muito daquela época. Aliás, muito antes de Ulpiano, Moisés, ao conduzir o povo hebreu pelo deserto, recém liberto da escravidão do Egito, recebeu das mãos do próprio Deus o Decálogo ou Dez Mandamentos, dos quais, seis destinados a regular a vida em sociedade, conforme se verifica nos livros de Êxodo, capítulo 20 e Deuteronômio, capítulo 5.

[10] Christian Thomasius (1655-1728) é considerado o precursor do Iluminismo na Alemanha. E, contribuiu significativamente com seu direito penal humanitário orientado pelo movimento para a abolição da caça às bruxas e tortura. Em 1687, desafiou a prática comum acadêmica de sua época ao dar suas aulas em alemão ao invés de latim, além de dar a lição intitulada “Como alguém deveria imitar o modo de vida francês”, se referindo ao costume dos franceses de usarem sua língua nativa, não só no dia a dia, mas também no meio acadêmico. De acordo com o estudioso Klaus Luig, esse evento marca o verdadeiro começo do Iluminismo na Alemanha. No ano seguinte, começou a publicar um periódico mensal (Scherzhafte und ernsthafte, vernüftige [sic] und einfältige Gedanken über allerhand lustige und nutzliche Bücher und Fragen) no qual ridicularizava o que julgava como fraquezas pedantes dos letrados, ficando ao lado dos Pietistas na controvérsia destes com os luteranos ortodoxos e defendendo o casamento entre calvinistas e adeptos de Lutero; também publicou um volume sobre direito natural, no qual enfatizava a razão natural e uma redação, na qual, novamente, defendia o casamento entre luteranos e cristãos reformados. Apesar de não ter sido um profundo pensador filosófico, Thomasius pavimentou o caminho para grandes reformas na filosofia, assim como no Direito, na Literatura, na Filosofia na Teologia. Adotou como missão introduziu um ponto de vista racional, perpassado pelo senso comum, nas ciências humanas e divinas, trazendo-as para o dia a dia. Portanto, foi um dos responsáveis pela criação de um novo período na sociedade alemã, e, juntamente com Ludwig Spittler, foi parte da vanguarda do período moderno da história eclesiástica protestante na Alemanha. Lutou constantemente pela liberdade de pensamento expressão na esfera religiosa, no meio público e acadêmico.

[11] A teoria do mínimo ético foi desenvolvida pelo jurista Georg Jellinek (1851-1911) e aperfeiçoada por Jeremy Bentham (1748-1823). Essa teoria consiste na ideia de que todas as normas jurídicas são normas morais. Desse modo, considera-se que as normas morais mais relevantes para a sociedade são transformadas, pelo Estado, em normas jurídicas. Assim o direito representa apenas o mínimo de preceitos morais necessários para que a sociedade possa viver em harmonia. A Teoria do Mínimo Ético pode ser representada graficamente a partir de dois círculos concêntricos no qual o maior representa a moral e o menos o direito. A moral, em costume, é cumprida, de maneira espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é indispensável que um mínimo ético seja declarado obrigatório e armado de coercibilidade para fazer cumprir, impedindo assim, a transgressão daqueles dispositivos que a comunidade considera necessário para o bom convívio. Segundo Miguel Reale, a teoria afirma que é necessário “armar” de forças a certos preceitos éticos, pois nem todos podem ou querem de maneira espontânea cumprir as obrigações morais, sendo estas indispensáveis a paz social. É possível citar como exemplo de uma norma moral que necessita ser dotada de coercibilidade para ser cumprida, é a proibição do ato de fumar em ambientes fechados e sem ventilação. Dessa forma, não é direito algo diverso da moral, mas é uma parte desta, armada de garantias específicas.

[12] Thomas Hobbes (1588-1679) foi um teórico político e filósofo inglês. Sua obra de maior destaque é “Leviatã”, um tratado político cuja ideia central é a defesa do absolutismo e a elaboração da tese do contrato social. Ainda em Paris, em 1651, Hobbes publicou “Leviatã”, onde defende a monarquia absolutista. A razão disto deriva da visão que ele tinha da sociedade, segundo ele sempre ameaçada por uma guerra civil, onde todos os seus integrantes vivem em uma situação de permanente conflito: “uma guerra de um contra todos e de todos entre si”. O estado da natureza, segundo ele, não tinha nada de harmonioso. O mundo antigo dos primeiros homens era um mundo de feras, onde “o verdadeiro lobo do homem era o próprio homem”. Para se chegar a uma sociedade civil era necessário que todos, por meio de um “contrato social”, concordassem em transferir as suas liberdades naturais a um só homem: o rei, somente ele deveria deter o monopólio da violência. Somente o rei deve ter poderes que lhe permitam impor sua vontade sobre todos para o bem geral da comunidade.’’ No seu ponto de vista, não existe o direito à propriedade, nem à vida, nem à liberdade, que não sejam garantidos pela autoridade real. Rebelar-se contra ela, significa regredir no reino animal, onde impera sempre a violência, pondo em risco as conquistas da civilização. A obra desagradou a Igreja Católica e o Governo Francês, por ser muito radicalista e, sob essa pressão foi obrigado a deixar o país.

[13] Para Kant, Direito é o que regula as relações entre indivíduos e moral é o conjunto de preceitos internos de cada indivíduo. “O direito é o conjunto de condições por meio das quais o arbítrio de um pode estar em acordo com o arbítrio de um outro, segundo uma lei universal da liberdade”.

[14] A Constituição inspirada pela Revolução Jacobina efetivava os direitos fundamentais abstratamente declarados em 1789. Liberdade e igualdade são transformadas em direitos desdobrados na garantia do sufrágio universal, no direito de insurreição, nos direitos ao trabalho e na seguridade social e o mais importante: no ideal de que a felicidade de toda a sociedade é o objetivo do governo. Além do mais, os jacobinos aboliram os privilégios remanescentes do antigo regime e tiveram coragem e a glória de decretar o fim da escravidão nas colônias francesas, diferentemente dos revolucionários de 1789. Os jacobinos também socializaram a propriedade ao defenderem espaços nas cidades e nos campos para pequenos e médios proprietários, pequenos camponeses e lojistas e fomentaram, ainda, o rápido desenvolvimento econômico.

[15]David Hume foi filósofo, historiador, ensaísta e diplomata escocês, um dos mais importantes filósofos modernos do Iluminismo. Seus pensamentos foram revolucionários o que o levou a ser acusado de heresia pela Igreja Católica por ter ideias associadas ao ateísmo e ao ceticismo. Por esse motivo, suas obras foram acrescidas no “Índice dos Livros Proibidos” (Index Librorum Prohibitorum). Inspirado nas correntes filosóficas do empirismo e do ceticismo, Hume foi um crítico do racionalismo cartesiano em que os conhecimentos estavam associados à razão. Suas ideias foram inspiradoras para diversos filósofos posteriores, como Immanuel Kant e Augusto Comte.

[16] É o estudo dos conceitos fundamentais e universais do direito, ou seja, das características que são comuns a todos os sistemas jurídicos. Esta busca uma visão compreensiva sobre a epistemologia (origem, natureza e limites) do direito, suas ideologias, metodologias e conceitos gerais, e também sobre a natureza e aplicações das leis. A despeito do viés unificador, a TGD está longe de ser uma visão uniforme, pois inúmeras escolas de pensamento dão-lhe interpretações díspares e concorrentes. Em crítica do jusfilósofo Hans Kelsen, as teorias do direito se pretendem “científicas”, ou seja, exatas e empíricas, mas de fato são parciais aos julgamentos éticos e morais de seu meio. Assim, a Teoria Geral do Direito é tão ciência quanto filosofia, sem ser inteiramente nenhum dos dois, portanto suas conclusões dependem da linha de raciocínio que o estudioso adotar.

[17] Samuel Pufendorf (1632-1694) foi jurista alemão. Ao se tornar nobre, quando fora elevado a barão, poucos meses antes da sua morte 1684, seu nome passou a ser Samuel von Pufendorf. Foi um dos expoentes da corrente jusnaturalista e criou o transpersonalismo, e sua obra influenciou de forma duradoura o ensino do Direito na maior parte da Europa, com especial destaque para os países de tradição católica, entre os quais Portugal, onde suas obras foram adotadas como manuais na Universidade de Coimbra. A visão transpersonalista traz que o Estado é ente moral. E, prevê a divisão entre Estado e as pessoas que corporalizam esse mesmo ente, pessoa física do soberano. Portanto, o Estado é separado das pessoas físicas. Subscreveu a noção de que a soberania não se cria na sociedade, não é criada por ninguém, quando muito, se institui.

[18] É um importante evidenciar que o objetivo de Hegel não é mostrar as configurações históricas e/ou uma concepção particular de Estado, mas como um conceito pensado, “ideia”, especulação filosófica. Como expoente nesta investigação temos Rousseau que colocou a “vontade geral” como princípio pertencente e ao pensamento, tomou o Estado como uma instituição derivada de um contrato de vontades individuais (mera associação). Estamos colocando um dos tópicos principais da doutrina contratualista francesa para mostrar a discrepância entre o seu ideal e o mundo dos fatos. Estamos diante da vontade arbitrária, opinião facultativa dos indivíduos (mera liberdade livre-arbítrio) chegando à conclusão de que esta pode ser suprimida a qualquer instante, destruindo a totalidade ética do Estado.

[19] Santi Romano (1875-1947) foi jurista italiano com atuação nas áreas da teoria do direito, do direito constitucional, do direito administrativo e do direito internacional. Advogado italiano. Catedrático direito administrativo da Universidade de Camerino e direito constitucional nas universidades de Pisa Modena e ocupa o mestre cátedra mesmo mais tarde na Universidade de Milão. Ele foi presidente do Conselho de Estado e membro do Senado. Escreveu numerosas obras, entre as quais princípios de direito administrativo (1902), O jurídico ordenação (1918) e Curso de Direito Constitucional (1926).

[20] O Corpus Juris Civilis (Corpo de Lei Civil) é uma obra fundamental da jurisprudência, publicada por ordem do imperador bizantino Justiniano I. O livro é composto por 4 partes: o Código de Justiniano, o Digesto ou Pandectas, composto pela jurisprudência romana; Institutos, os princípios fundamentais do direito; e as Novelas ou Autênticas, com leis formuladas por Justiniano. O CJC é a coleção de constituições imperiais (Codex), a compilação das obras dos juristas romanos (Digesto ou Pandectas), o curso de direito introdutório (Institutas) e as novas constituições imperiais de Justiniano (Novellae). Justiniano I (483-565 d.C.) foi o imperador romano do oriente (imperador bizantino) que ordenou a compilação do direito romano, por meio da constituição imperial Deo Auctore. Antecedentes: Codex Gregorianus, Codex Hermogenianus, Codex Theodosianus Discussão sobre as interpolações, que foram as possíveis alterações que as comissões justinianéias teriam feio às obras dos juristas anteriores. Principais juristas citados no Digesto: Ulpiano, Paulo, Gaio, Modestino e Papiniano. Estrutura das entradas do Digesto – Nome do jurista, livro e localização na obra.

[21] Professores da USP editam o “Pandectas”, de Justiniano Maior obra jurídica do imperador bizantino é lançada pela primeira vez em língua portuguesa Disponível em:  https://jornal.usp.br/cultura/professores-da-usp-editam-o-pandectas-de-justiniano/

[22] O trabalho resultou em 50 livros na versão final, que foram reunidos sob o nome de Pandectas ou Digesto e promulgados por Justiniano no dia 16 de dezembro de 533. Em vigor por quase mil anos em Constantinopla até a tomada da cidade pelos turcos, em 1453, essa obra influencia o direito ocidental até hoje. No Brasil, ela é a base de aproximadamente 4/5 do Código Civil, de 2002.

[23] Para Norberto Bobbio, em sua obra intitulada “O positivismo jurídico, lições de filosofia do direito”, quando passa a tratar da conclusão histórica acerca do juspositivismo, afirma: (…) a corrente doutrinária do juspositivismo entende o termo “direito positivo” de maneira bem específica, como direito posto pelo poder soberano do Estado, mediante normas gerais e abstratas, isto é, como “lei”. Logo, o positivismo jurídico nasce do impulso histórico para a legislação, se realiza quando a lei se torna a fonte exclusiva ou, de qualquer modo, absolutamente prevalente – do direito, e seu resultado último é apresentado pela codificação. (Bobbio, 1995. p.119).

[24] Direito objetivo é o complexo de normas jurídicas que regem o comportamento humano, as relações entre as pessoas e entre elas e o Estado. Direito posto. É a norma de agir (norma agendi), abrange o direito existente e concretizado em forma de leis. Compreende a série de direitos existentes e implantados. Conjunto de normas que a todos se dirige e a todos vincula. Direito subjetivo refere-se à posição do sujeito frente ao Direito Objetivo. Facultas agendi. É o poder que a ordem jurídica confere a alguém de agir e de exigir de outrem determinado comportamento. Permissão dada por meio da ordem jurídica para um sujeito fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Direito de forma concreta.

Hans Kelsen nega a existência autônoma do direto subjetivo. Estabelece que o direito deve ser visto como um sistema de normas e o direito subjetivo nada mais é do que o reflexo de um dever jurídico, que existe por parte dos outros em relação ao indivíduo de que se diz ter um direito subjetivo. Como o dever jurídico é a própria norma, o direito subjetivo é o fenômeno normativo colocado à disposição do sujeito. Três teorias que procuram definir a natureza do direito subjetivo: 1) TEORIA DA VONTADE de Savigny e Windscheid – direito subjetivo é o poder da vontade reconhecido pela ordem jurídica (críticas – há direitos sem vontade do titular; há casos em que há uma vontade real, porém o que o ordenamento jurídico protege não é a vontade do titulas, mas sim seu direito; o direito pode existir sem a vontade. 2) TEORIA DO INTERESSE de Ihering – direito subjetivo é o interesse juridicamente protegido (críticas: há interesses protegidos que não se confundem com direitos subjetivos; direitos subjetivos onde não existe interesse por parte do titular; confunde o interesse seria o objeto que interessa, o que não tem sentido. 3) TEORIA MISTA de Jellinek, Saleilles e Michoud – direito subjetivo seria o poder da vontade reconhecido e protegido pela ordem jurídica, tendo por objeto um bem ou interesse. Críticas: mesma acima. Direito não é objeto.

[25] A origem da dicotomia Direito Público e Direito Privado está no Direito Romano, onde sua base é um trecho de Ulpiano (Digesto) que afirma: “O direito público diz respeito ao estado da coisa romana, à polis ou civitas, o privado à utilidade dos particulares”. A questão relacionada aos critérios de distinção entre o direito público e o direito privado sempre foi muito debatida. Franco Montoro aponta que não existe um critério perfeito, o que se prova pela multiplicidade de critérios insatisfatórios que, ao longo do tempo, vêm sendo propostos. O jurista brasileiro menciona ainda que alguns autores, como Holiger, chegaram a catalogar mais de cem critérios.2 De todos os critérios utilizados, três costumam ter mais destaque: o do interesse, do sujeito e da subordinação. Além deles, também será feita menção à teoria da imputação, que não deixa de ser uma derivação da teoria da subordinação. Ao final, serão citados autores que negam a utilidade na distinção e os que defendem haver uma tricotomia.

[26] A discussão sobre o método possui essa finalidade. Ela pode se apresentar de duas maneiras distintas: a) na configuração e explicitação de uma teoria geral do direito que possibilite o acesso (conhecimento) ao fenômeno jurídico e à explicação dele; b) na constituição de uma dogmática do direito ou, na expressão de Larenz, de uma “ciência dogmática do direito”, que possui como objeto a análise da apreciação judicial de casos, possibilitando, assim, a solução de questões jurídicas.

[27] Karl Engish (1899-1990) foi jurista e filósofo do direito alemão. Foi descrito por Hans Joachim Hirsch como um dos notáveis teóricos de direito penal do século XX. Durante seu tempo em Gießen, Karl Engisch, como seu irmão Ludwig Engisch (1900-1957),[6] foi um membro da fraternidade “Corpo de Hassia”. Em 1924, Karl Engisch recebeu seu doutorado. Supervisionado por Otto Eger, a sua dissertação abordou a teoria imperativa, um aspecto da Filosofia Jurídica, e uma teoria que os alemães imputam a Jeremy Bentham e John Austin. Ele realizou um Rechtsreferendariat (equivalente a um estágio) entre 1924 e 1927, trabalhando no escritório de advocacia de seu pai, onde trabalhava nos casos sobre direito penal. Em 1929, ele recebeu sua habilitação em Gießen. Seu trabalho foi supervisionado pelo criminólogo Wolfgang Mittermaier (1867-1956), composto por uma destacada monografia sobre a intenção criminosa e a negligência, que ainda hoje, apesar das dramáticas mudanças de direção na evolução das ciências criminais no decorrer de décadas, continua a ser considerado por seus admiradores referência de trabalho em seu campo. Uma forte influência durante esse período foi o criminologista de Munique Ernst von Beling, à quem Engisch posteriormente dedicou seu “Logische Studien zur Gesetzesanwendung” (“Estudos Lógicos sobre a Aplicação da Lei”). Ele aceitou posições de professor de direito penal em Frieburg iB (1929), e Munique (1932). Em outubro de 1933, ele retomou sua antiga posição de professor de direito penal em Gießen. Em suas palestras, Engisch sabia expandir os horizontes de seus assuntos para além do âmbito comumente aceito na faculdade de direito, introduzindo conceitos das esferas da filosofia e da literatura. Ele frequentemente citava Goethe, Kant, Thomas Mann e Schopenhauer.

[28] Helmut Coing (1912-2000) foi importante estudioso de direito alemão e professor universitário em Frankfurt am Main e, por muitos anos foi Chanceler de Ordem Pour Le Mérite para ciência e as artes. O foco de seu trabalho foi a história do direito privado europeu, especialmente da Idade Média, a história do direito na Alemanha e a filosofia do direito. Em 1968 foi eleito membro correspondente da Academia de Ciências de Göttingen e da Academia de Ciências da Baviera. Em 1972 ele se tornou um membro correspondente da Academia Britânica. De 1970 a 1973 ele foi presidente da seção de humanidades da Sociedade Max Planck e de 1970 a 1972 também chefe da Comissão de Estatuto e, finalmente, de 1978 a 1984 foi vice-presidente da Sociedade Max Planck. Em 1984, Coing, que já havia sido aceito na Ordem Pour le Mérite para a Ciência e as Artes em 1973, foi eleito Chanceler da Ordem. Ele ocupou este cargo até 1992. Coing é um cientista homenageado por causa de sua pesquisa. Em 1958 foi condecorado com a placa Goethe pela cidade de Frankfurt am Main. Em 1966 ele se tornou oficial da Legião de Honra Francesa. Em 1973, tornou-se membro da Ordem Pour le Mérite para a Ciência e as Artes. Um ano depois, ele foi agraciado com a Grande Cruz do Mérito com Estrela da República Federal da Alemanha. Em 1990 recebeu a Cruz do Comandante da Ordem do Mérito da República da Itália e no mesmo ano a Grande Cruz Federal do Mérito com Estrela e Fita de Ombro e a Ordem do Mérito de Hesse. Ele foi premiado com doutorado honorário concedido pelas Universidades de Lyon (1959), Montpellier (1959), Viena (1965), Aberdeen (1968), Bruxelas (1975) e Uppsala (1977). Em 2008, o Instituto Max Planck de História do Direito Europeu em Frankfurt am Main concedeu o Prêmio Helmut Coing pela primeira vez. O prémio visa dar a jovens investigadores a oportunidade de trabalhar no instituto durante 4 a 5 meses, no final de uma dissertação ou habilitação no domínio da história do direito europeu. A bolsa é divulgada mundialmente a cada três anos.

[29] A Jurisprudência dos conceitos (Begriffsjurisprudenz) também reivindica um ideal de sistema para o Direito. Seus mais representativos expoentes foram formados no ambiente do historicismo de Savigny. Todavia, o formalismo conceitual da Jurisprudência dos conceitos não se confunde com aquilo que foi produzido pela escola histórica. O método formalista-conceitual da jurisprudência dos conceitos representa o apogeu daquilo que Franz Wiacker chama de “ciência das pandectas”, sendo a face mais evidente do movimento nomeado de pandectismo. Os mais importantes autores dessa corrente são, certamente, Puchta e Bernhard Windscheid. A jurisprudência dos interesses tem sua origem na filosofia racionalista dos séculos XVII e XVIII ou no historicismo. Seu maior corifeu teórico foi Philipp Heck que era líder na Escola de Tübingen. Na origem desse movimento estão outras duas posturas teóricas que, cruzadas servem de impulso para Heck e seus seguidores: trata-se do pensamento professado segundo Ihering e dos postulados defendidos por chamado movimento direito livre. Outro elemento, que também oferece as bases para a Jurisprudência dos interesses, é a eclosão do movimento do direito livre. E, teve em Ihering uma espécie de fiador intelectual, pelo menos em sua vertente germânica. Duas curiosidades ceram esse movimento: de um lado sua brevidade e seu ápice foi entre os anos de 1905 e 1914; por outro lado, sua internacionalização, uma vez que o movimento começa com doutrinador francês François Gény e, passa pelos doutrinadores alemães com destaque para Hermann Kantorowicz e, disseminou-se para várias partes do mundo com fim da primeira grande guerra mundial e ascensão do nacional socialismo na Alemanha. Houve também relações com os movimentos nos EUA como se pode notar pelas doutrinadas de Cardoso, Holmes e Pound.

[30] Rudolf Stammler (1856-1938) foi filósofo do direito alemão. Foi inspirador da corrente neokantiana na seara jurídica, conferiu à ciência do direito e atribuiu-lhe metodologicamente os instrumentos do “fim e dos meios” contrapostos aos de “causa e efeito” das ciências naturais. O mérito de Stammler reside na sua tentativa de superar o positivismo da sua época. Foi autor da teoria do chamado Direito natural de conteúdo variável.

[31] Giorgio Del Vecchio (1878-1970) foi relevante filósofo jurídico italiano do início do século XX. Entre outros, influenciou as teorias de Norberto Bobbio. É famoso por seu livro Justiça. Entre os maiores intérpretes do neocantantismo italiano, Giorgio Del Vecchio, como seus colegas alemães, criticou o positivismo filosófico, afirmando que o conceito de direito não poderia ser derivado da observação de fenômenos jurídicos. Nesse sentido, ele entrou na disputa entre filosofia, teoria geral e a sociologia do direito que estava em fúria na Alemanha, redefinindo a filosofia do direito. Em particular, ele atribuiu a ela três tarefas: uma tarefa lógica que consistiria na elaboração do conceito de direito; uma tarefa fenomenológica, consistindo no estudo do direito como um fenômeno social; uma tarefa deontológica, que consiste em “buscar e avaliar a justiça, isto é, o direito como deveria ser”.

[32] Jean Charles Florent Demolombe (1804-1887) foi jurista francês, foi conhecido por seu comentário ao Código Civil, em favor de cuja conclusão. Recusou uma nomeação para o Tribunal de Cassação. O comentário ao codex originalmente fora planejado para abranger vinte volumes. NO entanto, não conseguiu atender aos seus próprios padrões de exigências mesmo após a publicação de trinta e um volumes de 1845 a 1882. O comentário cobriu somente a metade do Código. E, após seu óbito, o trabalho foi continuado por Guillouard, mas de forma bem reduzida. O comentário monumental fez com que Demolombe fosse declarado como o maior jurista francês de sua época, mas seus críticos se ativeram à excessiva atenção da obras aos detalhes bem coo sua negligência da estrutura dogmática do Código além de excessiva elaboração e estilo descritivo.

[33] Charles Aubry (1803-1883) foi jurista francês. Ficou famoso nos círculos jurídicos franceses por sua única publicação feita junto com Frédéric Charles Rau, o Cours de droit civil français (1839-46) que representou a primeira síntese sistemática do direito civil francês abandonou a estrutura do Código Civil. Introduziu noções jurídicas alemãs, tais como as regras de evidência, bem como as teorias de propriedade conjunta e a defesa da lei francesa.

[34] Friedrich Carl von Savigny foi um dos mais respeitados e influentes juristas alemães do século XIX. Foi o maior nome da Escola Histórica do Direito, seu pensamento teve enorme influência no direito alemão, bem como no direito dos países de tradição romano-germânica, especialmente, no direito civil. Na política alemão, foi Ministro da Justiça entre 1842 a 1848, tendo renunciado devido à revolução. Em 1803, publicou seu famoso tratado, Das Recht des Besitzes (“Tratado da Posse”), que foi imediatamente saudado pelo grande jurista Thibaut como sendo uma obra-prima e obteve uma rápida aceitação europeia, permanecendo, ainda hoje, um marco na história do direito. Em 1804 Savigny se casou com Kunigunde Brentano, conhecida por “Gunda”, a irmã de Bettina von Arnim e Clemens Brentano, o poeta. No mesmo ano, iniciou uma demorada viagem pela França e sul da Alemanha à procura por novas fontes do direito romano.

[35] A Escola Histórica do Direito foi uma escola de pensamento jurídico – precursora do positivismo normativista que apareceria com a Jurisprudência dos conceitos – que surgiu nos territórios alemães no início do século XIX e exerceu forte influência em todos os países de tradição romano-germânica.

[36] René David (1906-1990) foi jurista francês. Combatente na Segunda Guerra Mundial, acabou capturado e feito prisioneiro no campo de prisioneiros Oflag X-B, na Alemanha. Após fugir, retornou a Grenoble, onde logo se juntou a La Résistance. Em batalha na Córsega foi gravemente ferido, tendo o episódio lhe imposto sérias limitações motoras pelo resto da vida. Findada a guerra, assumiu a cadeira de Direito Comparado na Universidade de Paris, lá permanecendo até 1968, quando o levante estudantil de maio de 1968 engatilhou uma ampla reestruturação na universidade, que culminaria em sua divisão em trezes instituições independentes dois anos mais tarde. Diante da situação de incerteza, optou por se mudar para Aix-en-Provence, passando a ensinar na universidade local, onde permaneceria até se aposentar da docência, em 1976.

[37] Pierre Marie Nicolas Léon Duguit (1859-1928) foi jurista francês especializado em Direito Público. Duguit é responsável por influenciar significativamente a teoria do Direito Público. Seu trabalho jurídico caracteriza-se por uma crítica das teorias então existentes do Direito e pelo estabelecimento da noção de serviço público como fundamento do Estado e seu limite. Desta forma, as regras jurídicas são constituídas por normas que se impõem naturalmente e igualmente a todos. Sobreleva-se a governantes e governados o dever de se absterem de qualquer ato incompatível com a solidariedade social. Na visão de Duguit, o Estado não é um poder soberano, mas apenas uma instituição que cresce da necessidade de organização social da humanidade. Os conceitos de soberania e direito subjetivo são substituídos pelos de serviço público e função social. No Brasil, a função social da propriedade foi elevada ao status de princípio constitucional fundamental (artigo 5º, inciso XXIII), constando ainda como princípio ordenador da economia (artigo 170, inciso III). Apesar disso, os juristas Eros R. Grau e Telga de Araújo informam que o germe da ideia de função social da propriedade já havia sido lançado primeiramente por Augusto Comte, em seu “Sistema de Política Positiva”. O constitucionalista Dimas Macedo, contudo, no seu livro “Política e Constituição” (RJ: Editora Lumen Júris, 2003), acredita que foi Léon Duguit o primeiro jurista a admitir que a função social da propriedade não quer significar que ela “esteja se convertendo em coletiva, mas sim que estamos deixando de concebê-la em termos de direito privado, passando a aceitá-la em termos de Função Social”.

[38] Evgeni Bronislávovich Pachukanis (1891-1937) foi um jurista soviético que revolucionou a teoria geral do direito a partir da perspectiva metodológica marxista, tornando-se um autor incontornável no debate jurídico contemporâneo. Diferenciando-se radicalmente de outros marxistas, Pachukanis demonstrou em seus escritos os vínculos indissociáveis entre a forma mercadoria – existente no capitalismo – e a forma jurídica. A incompatibilidade de suas ideias com o pensamento político-jurídico stalinista resultou em perseguição, prisão e morte precoce. Sua obra mais importante é intitulada Teoria geral do direito e marxismo (1924). As críticas pachukanianas às teorias juspositivistas e jusnaturalistas renderam-lhe diversos embates teóricos, inclusive com Hans Kelsen. Reabilitado publicamente em 1956, após a autocrítica soviética ao período stalinista, sua teoria provocou enorme impacto, especialmente na Europa, a partir da década de 1960, inclusive no denominado “debate da derivação do Estado” desenvolvido, sobretudo, na Alemanha e Reino Unido. No Brasil, Pachukanis ganhou notoriedade a partir das pesquisas do professor Márcio Bilharinho Naves e de seu livro Marxismo e Direito: um estudo sobre Pachukanis, influenciando juristas como Alysson Leandro Mascaro – com destaque para sua obra Estado e Forma Política –, Celso Naoto Kashiura Jr. e Silvio Luiz de Almeida dentre outros que se agruparam em tais conjuntos de pesquisas a partir dos anos 2000.

[39] Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero (1851 —1914) foi um advogado, jornalista, crítico literário, ensaísta, poeta, historiador, filósofo, cientista político, sociólogo, escritor, professor e político brasileiro. Sílvio Romero foi um importante membro da elite intelectual brasileira, porém suas falas notadamente racistas geram polêmicas até hoje. Sílvio Romero dizia ““Povo que descendemos de um estragado e corrupto ramo da velha raça latina, a que se juntaram o concurso de duas das raças mais degradadas do globo, os negros da costa e os peles vermelhas da América […] [de que] resultaram o servilismo do negro, a preguiça do índio e o gênio autoritário e tacanho do português [que] produziram uma nação informe e sem qualidades fecundas e originais”. Sobre o futuro do Brasil, Romero enunciava: A minha tese, pois, é que a vitória na luta pela vida, entre nós, pertencerá, no porvir, ao branco; mas que esse, para essa mesma vitória, tem necessidade de aproveitar-se do que de útil as outras duas raças lhe podem fornecer, máxime a preta com quem tem mais cruzado. Pela seleção natural, todavia, depois de prestado o auxílio de que necessita, o tipo branco irá tomando a preponderância até mostrar-se puro e belo como no Velho Mundo. Será quando já estiver de todo aclimatado no continente. Dois fatos contribuirão largamente para esse resultado: de um lado, a extinção do tráfico africano e o desaparecimento constante dos índios, e de outro a imigração europeia.

[40]Tobias Barreto de Meneses (1839-1889) foi um filósofo, poeta, crítico e jurista brasileiro e fervoroso integrante da Escola do Recife, um movimento filosófico de grande força calcado no monismo e evolucionismo europeu. Foi fundador do condoreirismo brasileiro. Com apoio de seu amigo Sílvio Romero, foi designado Patrono da Cadeira 38 da Academia Brasileira de Letras. Segundo registra Clóvis Beviláqua, apesar de já ocupar a Cátedra de Teoria e Prática do Processo na Faculdade de Direito do Recife, os anos finais da vida de Tobias Barreto foram marcados por dificuldades econômicas e financeiras. Veio a falecer na residência de um amigo. Por meio da Lei nº 13.927, de 10 de dezembro de 2019 seu nome foi inscrito no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.

[41] Carlos Cossio (1903-1987) foi militante universitário reformista, advogado, filósofo do Direito e professor argentino. Cossio prova que “o juiz vê o Direito não como algo conclusivo e já feito, mas sim como algo que se faz constantemente em seu caráter de vida humana vivente.” Sua obra chegou a ser traduzida a línguas como francês, inglês, iugoslavo, alemão, polonês, português, finlandês, sueco, além de outras. A Teoria egológica do direito é uma das expressões mais destacadas do movimento cultural latino-americano infundido pela Reforma Universitária de 1918. Em seus últimos anos de vida, durante a ditadura militar argentina (1976-1983), Cossio encarregou-se, junto a Ernesto Giudice, de difundir os ideais da Reforma Universitária, organizadas pela Fundação Juan B. Justo.

[42] São dois os principais modelos que fundamentam a aplicação do direito nos diversos sistemas jurídicos espalhados no mundo, quais sejam: o civil law e o common law. O civil law se caracteriza como o sistema jurídico que está estritamente ligado às normas escritas. Sua fonte criador por excelência é a lei. Daí, se afirmar que esta prioriza as normas legisladas, pois são o ponto de partida para a definição dos direitos. É o sistema adotado no nosso país. Encontra suas raízes no direito romano, devendo-se considerar, também a influência alemão, a tradição romano-germânica. E, por este, a jurisprudência revela um caráter persuasivo (não vinculativo). Já o common law fundamenta-se no direito costumeiro, assim, a norma escrita não é considerada como sua única fonte geradora, sendo ressaltado o papel da jurisprudência ou da norma jurídica. Prioriza, ipso facto, o instituto dos precedentes judiciais. Os precedentes visam dar estabilidade e segurança ao sistema jurídico. Os países de tradição anglo-saxã, tal como a Inglaterra, e os EUA seguem essa linha, embora não exista plena identidade entre os seus sistemas. Cada país tem a sua realidade, oriunda da história, cultura e valores que prezam, essencialmente, na formação do direito.

[43] Miguel Reale em sua obra “Lições Preliminares de Direito” explicou a importância de cada uma das ciências para o Direito. Cabe explicar filosofia em relação ao Direito. Filosofia vem do grego “Philos” (amizade, amor) e “Sophia” (ciência, sabedoria). Atribuída a Pitágoras em virtude de suas atitudes e que recusava o título de sophos (sábio). A Filosofia pode ser vista como uma dedicação desinteressada e constante ao bem e a verdade. Já a Filosofia do Direito, é uma pesquisa permanente e desinteressada das condições morais, lógicas e históricas do fenômeno jurídico e da Ciência do Direito. Como o Direito é um fenômeno histórico-social sempre sujeito às mudanças, com isso geram problemas que são de ordem filosófica. Sobre a Teoria Geral do Direito. Teoria, do grego theoresis, significa a conversão de um assunto em problema, sujeito a indagação e pesquisa. A Ciência Jurídica se eleve ao plano de uma Teoria Geral do Direito, representa a parte geral comum a todas as formas de conhecimento positivo do Direito. Alguns autores distinguem entre Teoria Geral do Direito e Enciclopédia Jurídica, atribuindo a esta tarefa de elaborar uma sumula de cada uma das disciplinas do Direito, numa espécie de micro-organismo jurídico. Enciclopédia quer dizer “conhecimento ou visão de natureza circular”.

[44] A Teoria Egológica do Direito é uma proposta jusfilosófica de compreensão do Direito, elaborada pelo catedrático argentino Carlos Cossio, a partir da teoria de Hans Kelsen, de acordo com as ideias da fenomenologia crítica de Edmund Husserl e do existencialismo de Martin Heidegger.

A síntese do pensamento egológico pode ser expressa nas seguintes proposições:

O direito é conduta em interferência intersubjetiva referida a valores;

O direito considera todas as ações humanas;

O direito se interessa pelo ato humano em sua unidade;

O direito supõe a possibilidade de atos de força;

A liberdade é um conteúdo imprescindível do direito;

As normas jurídicas conceituam a conduta em interferência intersubjetiva; e

As normas jurídicas imputam sanções e são juízos disjuntivos, diferenciando-se da teoria da norma de [Hans Kelsen] que entendia que a norma jurídica era um juízo hipotético.

[45] O cidadão precisa saber, de modo claro e absoluto, se a sua conduta está ou não de acordo com a lei, não podendo, portanto, ficar ao livre arbítrio do juiz o que pode ou não ser aplicado como lei, visto que, além do subjetivismo já tratado e da disformidade da fonte, haveria o risco da concentração de poderes, que representa um dos meios de condução ao regime absolutista. A questão da legitimação também deve ser observada. O Poder Legislativo é o órgão legitimado pela sociedade para, em regra, produzir as suas normas oficiais de convivência, sendo que as exceções são previstas na própria Carta Maior. Tal legitimação é o principal fundamento da democracia representativa adotada como pilar do Estado, onde todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. A CF/1988 estabeleceu, como cláusulas pétreas, a separação dos poderes e o sufrágio universal e determinou que o Poder Legislativo deve ser exercido pelo Congresso Nacional, vide art. 44, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, ressalvando-se que a primeira Casa abriga os representantes eleitos do povo e a segunda Casa os representantes eleitos dos Estados e Distrito Federal.

[46] O conceito de Direito produzido pela modernidade estava assentado no que havia sido desenvolvido teoricamente pelo positivismo jurídico. Com as transformações ocorridas na sociedade e, também, na teoria do direito, o paradigma jurídico contemporâneo é caracterizado pelo trinômio moral-princípios-discricionariedade, ou seja: a) pelo predomínio da utilização de princípios; b) pela incorporação da moral ao Direito; e c) pelo reconhecimento do poder discricionário dos juízes. Em razão disso, a pergunta pelo conceito de direito parece ganhar uma nova resposta, forjada a partir do que vem sendo academicamente denominado de pós-positivismo.

[47] Segundo Von Wright a classificação das normas se dá em seis espécies, sendo três principais e três secundárias. As primeiras são: as normas definitórias ou determinativas; normas derretias ou normas técnicas; normas prescrições. Os costumes assemelham-se às prescrições por terem um caráter obrigatório. E, se distinguem daquelas pelo fato de não emanarem de nenhuma autoridade. São, portanto, prescrições anônimas. Os costumes aproximam-se das regras determinativas, porquanto é por meio desses que se diferenciam as diversas comunidades. Já as normas morais são muito difíceis de se identificar e classificar. Podem parecer-se com costume e com as regras determinativas.

[48] O dogmatismo filosófico pode ser entendido como a possibilidade de conhecer a verdade, a confiança nesse conhecimento e a submissão a essa verdade sem questionamento. No século XVIII, o dogmatismo racionalista prega confiança na razão a fim de se chegar a verdades. Para ele o dogmatismo é toda atitude de conhecimento. Dogmatismo é uma atitude espontânea que temos desde criança com senso. É uma tendência para acreditar que o mundo é da maneira que aprendemos. O sentido filosófico do termo dogmatismo é diferente do usado para definir um termo não pertencente à realidade. Nesta última, o dogmatismo é o conjunto de dogmas teológicos, isto é, de expressões surgidas com pensamentos filosóficos ou pertencentes à hierarquia mais alta da Igreja absolutamente indubitáveis. Em contrapartida, o vocábulo dogma do grego ????? (dogmatikós, em grego moderno (alasbilaleiko)) significou primitivamente oposição. Tratando-se assim de uma opinião centrista, isto é, algo que se referia a opinião em si. Por isso, o termo dogmatismo significava “relativo doutrina” ou “fundado em princípio”.

[49] O livro divide-se em Prólogo, Conceitos Básicos, Teoria da Norma Jurídica, A Ciência do Direito e Kelsen na Filosofia Jurídica que, por sua vez, subdividem-se em outras 16 partes. O prólogo de Tércio Sampaio Ferraz Jr., que com perfeição pontua pontos fundamentais da obra e vida de Kelsen, dá início à obra. Logo em seguida temos o capítulo intitulado Conceitos Básicos, que é iniciado com a definição de epistemologia: ciência que define as condições para a construção de um conhecimento consistentemente científico do direito. Passamos então ao princípio fundamental do método proposto, método este que foi proposto por Kelsen baseando-se exclusivamente na norma posta. Coelho explica que, segundo Kelsen, “para que a doutrina se torne ciência deve-se observar o objeto do conhecimento e desconsiderar os aspectos prénormativos e metanormativos de modo que eles não venham a obscurecer o conhecimento da norma”. A norma de Justiça é de fundo moral. Nem toda norma moral é norma de Justiça: a norma moral é de Justiça quando prescrever uma conduta em face do semelhante. Para o teórico austríaco, o juízo de valor seria aplicado somente sobre as condutas e não sobre as normas, não sendo correto atribuir-se à norma jurídica a qualidade de justa e injusta. A Teoria Pura do Direito mostra uma separação entre os valores do Direito, que são referentes à validade da norma, e os valores da Justiça, que seriam critérios de ordem subjetiva, fora dos limites do Direito. Kelsen alega que não existe Justiça absoluta, e que por possuir conteúdo variável ela não faz parte do Direito. Ainda que cada sociedade tenha uma concepção valorativa acerca dos fatos sociais e das condutas a serem coibidas, as normas devem obedecer a hierarquia de valores e a ideia de Justiça adotadas pela sociedade da qual são destinatárias, devem ser baseadas em uma fonte de princípios que as fundamentem eticamente, de modo a propiciar um convívio harmônico entre os cidadãos, cumprindo o seu papel de reger a conduta dos indivíduos de maneira que estes as cumpram de modo autônomo, por dever, e não heterônomo, conforme o dever.

[50] Como neokantiano, Kelsen empreende a fundamentação da autonomia metodológica da ciência do direito a partir da distinção entre ser e dever-ser. A diferença entre ser e dever-ser é, para Kelsen, insusceptível de maior explicação; é nos dada imediatamente à consciência. Segundo Kelsen: Ninguém pode negar que o enunciado: tal coisa é – ou seja, o enunciado através do qual descrevemos um ser fático – se distingue essencialmente do enunciado :algo deve ser – com o qual descrevemos uma norma – e que da circunstância de algo ser não se segue que algo deva ser, assim como da circunstância de que algo deve ser se não segue que algo seja. Outrossim, Kelsen propõe a separação entre direito e política. A ciência do direito não pode ser confundida com a jurisprudência dogmática, que procede de modo normativo (valorativo). A jurisprudência dogmática pertenceria ao âmbito da política do direito. Firme no postulado da neutralidade valorativa da ciência, Kelsen afirma que a ciência do direito só pode ser uma ciência das formas puras do direito, uma ciência puramente normativa.

[51] A vigência está diretamente relacionada à eficácia jurídica da norma. Por sua vez, a eficácia da lei está relacionada à possibilidade de a lei, uma vez válida e devidamente publicada, vir a surtir efeitos junto aos seus destinatários. … Em regra, a vigência e a eficácia de uma lei se dão ao mesmo tempo. A efetividade, ou eficácia social da norma, diz respeito ao cumprimento do direito por parte de uma sociedade, ao reconhecimento do direito pela comunidade ou, mais particularizadamente, aos efeitos que uma regra suscita através do seu cumprimento, e equivale à (A) mera vigência da norma, conforme pretendia Kelsen. (B) observância espontânea do comando contido na norma. (C) aplicabilidade imediata da norma de eficácia plena. (D) materialização, no mundo dos fatos, da dicção da norma.

[52] TEORIA ECLÉTICA: defende que a existência do direito de ação independe da existência do direito material, mas do preenchimento de certos requisitos formais, chamados “condições da ação” (possibilidade jurídica do pedido, legitimidade das partes e interesse de agir – lembrando que o NCPC não considera a possibilidade jurídica do pedido como condição da ação, mas sim como causa de mérito, acarretando a improcedência do pedido). Para essa teoria, adotada pelo CPC, as condições da ação NÃO se confundem com o mérito e, quando ausentes, geram uma sentença terminativa de carência de ação (art. 485, VI, CPC/2015) sem a formação de coisa julgada material.

[53] A questão acerca da importância que Kelsen atribuiu ao tema da interpretação jurídica ao longo de sua obra é bastante controversa. Enquanto alguns autores entendem que ela ocupa posição marginal no contexto da obra do jurista austríaco, outros asseveram que ele se debruçou suficientemente sobre o tema. A interpretação surge na obra de Kelsen quando da publicação do artigo intitulado “Zur Theorieder Interpretation”, no periódico Internationale für Theorie des Rechts, em 1934. No mesmo ano, o artigo em referência é reproduzido, sem maiores alterações, na primeira edição da Teoria Pura do Direito. É somente na segunda edição da Teoria Pura, publicada em 1960, que o tema da interpretação será ostensivamente abordado, ainda que em uma dezena de páginas.

[54] Outrossim, Kelsen propõe a separação entre direito e política. A ciência do direito não pode ser confundida com a jurisprudência dogmática, que procede de modo normativo (valorativo). A jurisprudência dogmática pertenceria ao âmbito da política do direito. Firme no postulado da neutralidade valorativa da ciência, Kelsen afirma que a ciência do direito só pode ser uma ciência das formas puras do direito, uma ciência puramente normativa. Karl Larenz, muito perspicazmente, antevê o mesmo desequilíbrio na Teoria Pura do Direito, no que se refere ao balanço entre teoria e práxis: Assim como a jurisprudência dos interesses é deficiente como teoria, mas foi de grande utilidade prática, assim a teoria pura do Direito atinge um alto nível como teoria, mas do ponto de vista prático os seus resultados são pobres. Em último termo, porém, o fato encontra a sua razão de ser numa deficiência da própria teoria.

[55] Kelsen diferencia duas espécies de interpretação jurídica – autêntica e não-autêntica –, elevando a primeira como objeto privilegiado de sua análise. Quando o direito é aplicado por um órgão jurídico, trata-se da interpretação autêntica. Já a interpretação não-autêntica é aquela realizada por uma pessoa privada, especialmente pela ciência jurídica. A interpretação autêntica cria direito, ao passo que a interpretação jurídico-científica (não-autêntica) não cria direito, sendo pura determinação cognoscitiva do sentido das normas jurídicas. Firme no jogo de contrastes, Kelsen estabelece que a interpretação autêntica pode assumir o caráter de lei ou tratado internacional, como também pode assumir a forma de uma sentença, enquanto a interpretação jurídico-científica deve ser ater a estabelecer “as possíveis significações de uma norma jurídica”

[56] Além das críticas feitas às Ciências Jurídicas, o pensamento sociojurídico de Ehrlich realiza uma reflexão crítica acerca da relação entre Direito, coerção e Estado frequentemente feita pela doutrina do Direito. Para Ehrlich, a fonte primária dos direitos não é o Estado, e sim a sociedade e as relações sociais humanas. Do mesmo modo, para o sociólogo, as normas jurídicas, em geral, não são cumpridas em razão da possibilidade ou efetivo uso da força aparelhada do Estado, mas por serem reflexo dos anseios e necessidades sociais.

[57] O jurista Charles Secondat Montesquieu, na sua célebre obra “O espírito das leis”, que trata também da História e da Ciência Política da sua época, deixa, em poucas páginas, explícito que o Poder Legislativo, o Poder Judiciário e o Poder Executivo devem ser exercidos por órgãos diversos. A divisão de poderes, que foi defendida também por Aristóteles, fundamenta-se basicamente em dois elementos: a) a especialização funcional; e b) a independência orgânica.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. O que vem a ser o direito? Do mínimo ético a uma potência moral (Segunda parte). Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2021. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/teoria-geral-do-direito/o-que-vem-a-ser-o-direito-do-minimo-etico-a-uma-potencia-moral-segunda-parte/ Acesso em: 07 out. 2024