“O Código da Vinci”: A farsa consagrada
Ives Gandra da Silva Martins*
Raramente tive a oportunidade de ver a consagração de uma farsa como a que está ocorrendo com o livro O código da Vinci, constituído de um fantástico amontoado de inacreditáveis inverdades, de distorções fáticas inadmissíveis, de monumental ignorância histórica, de má-fé comprovada e espetaculares mentiras com ares de mistério, capaz de gerar o interesse das pessoas pouco avisadas.
Carlos Alberto di Franco lembrou, em julho, no Estado de São Paulo algumas críticas de respeitáveis jornais estrangeiros: El nundo chama-o de ”um livro oportunista e pueril”; The New York Times de ”um insulto à inteligência”; Weekly Standard de uma ”mixórdia de narrativas inimagináveis”; The New York Daily News declara que contém ”erros crassos, que só não chocam um leitor muito ingênuo”.
O livro não é péssimo. Se o autor percorreu as bibliotecas internacionais para escrevê-lo, não tem a menor capacidade de pesquisa nem de senso crítico. As afirmações históricas o excluiriam de qualquer medíocre escola, por serem quase todas incorretas e externando monumental ignorância: ”Godofredo de Buillon era um rei da França” ou que a Bíblia é uma coletânea de textos feita por Constantino! Em que livro, de ciência ou de história, há a afirmação de que, na Idade Média, a Igreja matou 5 milhões de mulheres!!!
Em que faculdade do mundo, ensina-se que as Cruzadas foram realizadas para destruir documentos secretos no Oriente, quando se sabe que muitos dos grandes líderes das Cruzadas não eram sequer letrados! Em que livro de história está que Cristo foi casado com Maria Madalena e que esta fundou o verdadeiro Cristianismo! Em que manuscrito do Mar Morto está a verdadeira história do Santo Graal, visto que os manuscritos descobertos, não na década de 50, mas em 1947, não fazem referência ao Santo Graal, até porque é impossível à época em que foram escritos! Tais manuscritos são guardados pelo Estado de Israel, que permite o livre acesso a todos que querem vê-los, e mostram exatamente que a Bíblia tinha razão.
No mundo da informação comprovada e dos acessos às fontes, como admitir que se consiga desvendar um segredo não revelado – de 2.000 anos! – de que Cristo teve uma filha! Ou que nas vidas altamente investigadas de Boticelli, Leonardo da Vinci, Boyle, Newton, Victor Hugo, Debussy e Cocteau seus investigadores não descobriram que eles eram grandes mestres de uma fantástica sociedade secreta denominada ”Priorado de Sião”, cuja função era guardar o segredo da filha de Jesus! Todos os historiadores do mundo não descobriram o que o oportunista Dan Brown descobriu em investigações cujas fontes é incapaz de citar. A história é pisoteada por alguém que, sem escrúpulos, mente deslavadamente, sobre tudo.
Quem conhece João Paulo II, ou conheceu João Paulo I, ou João XXIII poderia admitir que fossem chefes de uma ”máfia”, com claro objetivo de assassinar pessoas, encarregando um ”monge do Opus Dei” de fazê-lo! Esses papas seriam, pois, assassinos! Qualquer estudante de Direito Canônico sabe que o Opus Dei é uma prelazia pessoal, que objetiva dignificar a condição humana e que não tem monges, por não ser uma instituição religiosa, mas secular.
E não continuo, neste curto artigo, a mostrar todos os erros, enganos, falsidades, mentiras, aleivosias apresentadas sem qualquer base documental, pois o espaço não me permite. Quero, todavia, deixar minha estupefação ao verificar que tal coleção de inverdades, que objetiva denegrir pessoas e instituições, só é possível em face da liberdade de expressão e do livre arbítrio, valores maiores sempre pregados pelo Cristianismo no mundo.
Gostaria de saber se o autor Dan Brown teria a coragem de dizer tantas inverdades contra o Islamismo ou Maomé. Até nisto, o referido cidadão norte-americano demonstrou seu oportunismo e objetivo maior, qual seja, ganhar dinheiro à custa dos incautos e da curiosidade gerada pela produção de escândalos fabricados.
* Advogado tributarista, professor emérito das Universidades Mackenzie e UniFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária e da Academia Paulista de Letras.
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