LUCKESI, Cipriano; Et Al. Fazer Universidade: Uma Proposta Metodológica. 18ª Ed. São Paulo, cortez Editora, 1998.
CAPÍTULO II: Prática da Leitura no Brasil
É sabido que uma das maiores conquistas do homem, algo reponsável por trazê-lo até o patamar em que se encontra de ser social, científico e pensador, é a escrita e suas decorrências. Sendo ela um dos maiores instrumentos de divulgação e perpetuação de conhecimento, a sabedoria necessária à sobrevivência do homem possui uma importantíssima ligação com este meio de propagação massiva.
Gutenberg, cientista e inventor alemão, ficou famoso e marcou a história com uma das maiores invenções já vistas: a tecnologia da impressão e da tipografia, em 1440. Este maquinário consagrado era composto por cubos de chumbo fundido com o formato da letra, os quais eram reordenados formando as palavras. Essa nova facilidade para a manufatura de obras literárias iniciou a disseminação do conhecimento literário, acabando com o monopólio da Igreja Católica Apostólica Romana, a qual detinha a esmagadora maioria das obras, até então, trancadas em mosteiros.
Desde então, iniciou-se uma intensa distribuição de materiais de cunho crítico quanto à realidade do homem, indo de encontro ao sistema de controle populacional previamente instaurado pelas entidades que detinham o poder intelectual e financeiro.
No Brasil, no entanto, o hábito de ler nunca foi dos mais comuns: apenas uma pequena aristocracia pensanse tinha acesso às obras, e esta estava permanentemente a serviço do sistema instaurado há tempos, ou seja: não havia ameaça aos poderosos permitir a leitura à esta pequena parcela social.
Também, pouco há de se esperar. Quando o Brasil foi “descoberto” – é válida a reflexão “quem descobriu quem para a desgraça de quem?” –, no ano de 1500 por Cabral, fez-se uma pequena expeição e logo retornou-se para Portugal. Foram deixadas apenas três pessoas aqui: um ladrão, um estuprador e uma prostituta. Desde então o Brasil era usado como colônia de deportação, ou seja: apenas os indesejados socialmente em Portugal eram enviados para cá. Como se espera que haja a disseminação de hábitos intelectuais em tal população?
De qualquer modo, mesmo sendo permitida a uma pequena camada superior social a leitura, esta era insipiente e havia uma moderação por parte dos dominadores, garantindo que esta parcela não deveria criar cunho crítico e, se criado, deveria ser para a manutenção do sistema vigente.
O próprio método utilizado para a leitura não ajudava em nada: a memorização e a não-crítica eram os fundamentos da leitura. Não havia uma consciência de que se deveria filtar o que se lia, simplesmente absorviam-se as palavras e os conceitos.
Quinhentos anos de história e quinhentos anos de mesmisse: nada mudou em nossa nação. A mesma aristocracia pensante não deixou de ser aristocracia – embora esteja menos pensante a cada dia. Em uma população de quase duzentos milhões de pessoas, não é de se assustar se menos de 10% deste contingente realmente possuir o hábito de uma leitura de qualidade, leitura que tira-os da classificação de analfabetos funcionais.
O pensamento de que o povo deve ser mantido longe da leitura formadora de opinião continua formando o pensamento atual da camada dominante, confinando as classes desprovidas à insipiência.
O próprio preço dos livros torna-os inacessíveis a uma população que está, a maioria, abaixo da renda per-cápita determinada pela ONU para uma boa sobrevivência, onde há uma enormidade de pessoas vivendo – ou melhor, SOBREVIVENDO – abaixo da linha da miséria.
As próprias escolas e universidades contribuem para a morte da consciência crítica, pela não-paricipação na comunidade, onde deveriam ter voz ativa levando a cultura e o conhecimento a todos, não apenas mantendo-os dentro de seus portões, ajudando a manutenção da horda de ignorantes errantes que compõe a população brasileira.
Devo parar, por um momento, para tecer algumas críticas aos autores. Esta atual “teoria da conspiração” está ultrapassada. O acesso aos materiais de literatura está se tornando menos restritivo: em qualquer banca de revista encontra-se livros de baixo custo, capa mole, papel de menor qualidade, porém, mantendo a qualidade da obra original. Grandes autores como Voltaire, Nietsche e até mesmo Marx possuem obras editadas e lançadas a baixo custo.
Folhas informativas não são mais monopólio reacionário: há jornais de visão esquerdista – contrapondo a grande maioria existente – e até mesmo outros que se fazem presentes com intenção meramente informativa, sem formação de opinião.
A realidade brasileira tende a mudar pelo acesso ao material, sendo que, agora, o maior problema é a conscientização e a formação de um hábito de leitura. Deve-se desplugar o “povão” da televisão idiotizante e alienante e levá-los às bibliotecas públicas – outro sinal de que os livros estão mais acessíveis – para adquirirem contato com este material.
CAPÍTULO III: O Leitor no Ato de Estudar a Palavra Escrita
Entra-se, neste momento, em uma elucidação do sistema de estudo – conseqüentemente de leitura – social, destrinchando os métodos diverosos utilizados para aprendizado e leitura.
Diz-se, aqui, que há dois métodos de estudar, um processo pelo qual enfrentamos a nossa realidade para descobrir novos métodos para compreendê-la e elucidá-la.
1. O método esperimental, onde nós, diretamente, enfrentamos os problemas, os desafios colocados à nossa frente e, gradualmente, enquanto nos adaptamos para solucionar os problemas e para buscar novas alternativas, fixamos conceitos inteiramente frescos, inéditos, para uma maior eficiência do resultado.
2. Há também o método infireto, onde, por intermédio de outra pessoa – já ciente de o que se trata – irá mestrar uma conscientização e uma educação no fato a ser tratado, elucidando percalços e destrinchando obstáculos, cedendo informações e, às vezes, até mesmo conclusões.
Por natureza o método número um é mais crítico, pois ele nos leva diretamente de encontro aos percalços, falsidades e problemas colocados à nossa frente, enquanto, pelo método dois, podemos ser levados a acreditar em algo que não é verossímil – sendo aqui necessária a capacidade crítica de quem se coloca na posição de aprendiz.
O ato de criticar toda e qualquer informação recebida não consiste em tentar derrubar todas as teorias com que se cruza, mas, sim, tentar filtrar toda informação que seja inexata ou totalmente inverossímil. Esse ato de criticar é o que dá ao ser humano a poderosa arma do QUESTIONAMENTO, o que o trouxe toda a evolução sócio-científica que apresenta hoje.
E é este ato de crítica que deve sempre estar aliado à leitura. A simples absorção de conceitos torna o leitor nada mais que um reprodutor do material exposto.
Os autores colocam três pontos – extremamente simples e fáceis de serem seguidos – para que uma pessoa torne-se um leitor de qualidade:
- Objetivar a compreensão acima da memorização do que foi exposto;
- Avaliação do material sendo lido;
- Questionamento acima de tudo durante a leitura.
Para estes pontos aqui colocados é necessária uma intensa consciência crítica.
São colocados dois tipos de leitor: o sujeito, aquele que pratica os pontos já colocados anteriormente, tornando-o um filtro de informações e um disseminador em potencial, e o objeto, que nada mais é que um receptáculo de conceitos previamente estabelecidos.
“Somente o leitor-sujeito multiplica a cultura e a aprofunda” (Cap. III, P. 143).
CAPÍTULO IV: Processo de Leitura Crítica da Palavra Escrita
Neste momento, há nada muito mais extenso do que a colocação de um manual de leitura, ou seja, as “dicas” que os autores dão àquelas pessoas que pretendem se tornar bons leitores.
Enumero-as abaixo:
- Elementos subsidiários da leitura:
1.1 Referência bibliográfica do texto e extensão da leitura a ser feita;
1.2 Identificação do tipo de texto;
1.3 Conhecimento dos dados biográficos do autor;
1.4 Estudo dos componentes desconhecidos do texto.
Aqui insere-se todo o conhecimento que se deve angariar de antemão à leitura, para que não se encontre “perdido” durante ela. Informações importantes podem ser passadas despercebidas se não há alguns conceitos ou informações adquiridas previamente.
- Elementos da leitura propriamente dita: estudo da temática do texto:
2.1 Identificação e análise do título do texto;
2.2 Identificação do tema abordado;
2.3 Identificação da problematização feita pelo autor em torno do tema;
2.4 Identificação do ponto de vista ou da idéia central;
2.5 Identificação da argumentação.
Eis aqui que se põe a idenificação do que se trata e de COMO se trata o texto. Devemos estar a par do que vamos ler e de como o autor vai colocar isso à nossa frente, para que tenhamos afiada a nossa capacidade crítica. Atenção especial deve ser dada ao item 2.5, pois é ele o principal elemento de um texto: argumentos bem fundamentados dão coerência e credibilidade a um texto.
- Elementos de avaliação e proposição;
3.1 Avaliação do texto lido;
3.2 Proposições;
É neste momento que entra todo o “sermão” dado pelos autores sobre a consciência crítica, sobre se colocar numa posição ativa frente a um texto, frente a um apanhado de informações e perante qualquer coisa exposta a nós.
A capacidade de criticar nos dá a amplitude de pensamento que de nós tirará qualquer informação inverossímil ou, pelo nosso modo de raciocínio, dispensável.
Obs: faço-me breve neste capítulo pois nele não há grande material a ser discutido. Manuais não se discutem, aprimoram-se e esta não é minha intenção aqui.
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