O subprocurador-geral da República Carlos Eduardo de Oliveira interpôs agravo regimental (recurso) para que o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Nilson Naves reconsidere a decisão de ter decretado segredo de justiça e determinado desmembramentos, redistribuição e baixa de parte do Inquérito 603 ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. E se o ministro, que é o relator do processo, não entender que deve haver a reconsideração, o subprocurador requer que o recurso seja apreciado pela Corte Especial do STJ.
Carlos Eduardo requer, também, a concessão de efeito suspensivo ao recurso, “tendo em vista as óbvias dificuldades de reunião posterior dos autos, caso a decisão seja imediamente cumprida, como parecem indicar as circunstâncias, advertindo para o risco palpável de extravio de peças”.
O Inquérito 603 trata do caso que ficou conhecido como Operação Pasárgada, que investiga a participação de prefeitos, advogados, lobistas, servidores públicos e magistrados em um esquema ilegal de negociação de decisões judiciais para repasse irregular de verbas do Fundo de Participação dos Municípios, além de decisões na Justiça Eleitoral e aprovação de contas de municípios em Tribunais de Contas estaduais, além de outros crimes. O esquema foi praticado em Minas Gerais e Rio de Janeiro, com repercussões no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília.
Destaca o subprocurador-geral da República que há inconstitucionalidade, ilegalidade e falta de fundamentação do restabelecimento do segredo de justiça, determinado pelo ministro Nilson Naves no último dia 8. Além disso, questiona a decisão do ministro na parte em que há ameaça de sanção penal e de anulação de conteúdo eventualmente divulgado.
Carlos Eduardo explica que, por decisão do ministro Paulo Gallotti, que se aposentou, a publicidade do inquérito vigora como regra há mais de um ano, sem que houvesse nenhum dano à imagem das pessoas envolvidas ou das instituições que elas integram. “Enquanto correu sob a direção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, as investigações, pertinentemente, estavam gravadas com o segredo de justiça por imperativo legal e necessidade da investigação, porque escutas telefônicas eram realizadas e medidas constritivas deveriam contar com a vantagem da surpresa em face do que se delineava como poderosa organização criminosa”. Após essa fase, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), Gallotti revogou o segredo de justiça.
Diferenças nas decisões – O subprocurador-geral afirma que há diferença entre a decisão do ministro Paulo Gallotti, que revogou o segredo de justiça, e a do ministro Nilson Naves, que o restabeleceu. “Enquanto a primeira, apesar de consagrar a regra constitucional da publicidade, cercou-se da necessária fundamentação, exigência igualmente de assento constitucional, a última, lacônica, consagra exceção sem avançar qualquer fundamento legal para sua decretação, e ainda faz ameaças descabidas, consubstanciadoras de verdadeira censura prévia, acenando com a sanção penal a quem divulgar o conteúdo sigiloso e a anulação do conteúdo anulado como prova ilícita”.
Argumenta o subprocurador-geral que a regra republicana é a publicidade e a exceção, o sigilo. Para isso, ele cita entendimento do Supremo Tribunal Federal: “A publicidade e o direito à informação não podem ser restringidos com base em atos de natureza discricionária, salvo quando justificados, em casos excepcionais, para a defesa da honra, da imagem e da intimidade de terceiros ou quando a medida for essencial para a proteção do interesse público”. Carlos Eduardo complementa que a reinserção do segredo de justiça no procedimento investigatório é medida prática e juridicamente inexequível, já que tiveram acesso ao processo todos os investigados, órgãos de outras esferas, comissões parlamentares de inquérito estadual e municipais, além da imprensa escrita, que “tem regularmente produzido matéria sobre aspectos da investigação e, certamente, mantém em seus arquivos os materiais e fontes de que se serviu”.
No recurso, o subprocurador-geral Carlos Eduardo questiona, também, o desmembramento do Inquérito 603 em vários inquéritos, referentes à possível prática de tráfico de influência pelo desembargador federal Francisco de Assis Betti no Tribunal Superior Eleitoral; à possível prática de falso testemunho pelo desembargador Eli Lucas Mendonça em procedimento disciplinar instaurado para apurar possível crime de lesão corporal atribuída ao juiz federal Weliton Militão; à possível facilitação na aprovação de contas de municípios pelos conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais Elmo Braz, Wanderley Geraldo de Ávila e Antônio Carlos Doorgal.
Mensalão – O subprocurador-geral argumenta que a formação de um novo inquérito exclusivo para investigar as condutas dos magistrados e dos conselheiros antes que o MPF possa formalizar a acusação prejudica a compreensão da relevância e poder de influência da organização criminosa. Além disso, ele assevera que todos os precedentes do STF consideram prematuro o desmembramento durante a investigação. Como exemplo, cita o caso conhecido como mensalão, no qual o STF reputou inconveniente o desmembramento do processo, mesmo diante do número elevado de acusados e, ainda assim, tão somente como questão de ordem ao recebimento da denúncia, já oferecida.
O MPF contesta, ainda, a livre distribuição entre os membros da Corte Especial dos inquéritos formados, assim como a do já desmembrado Inquérito nº 646, alusivo a possíveis práticas delituosas atribuídas aos conselheiros do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro José Gomes, Jonas Lopes e José Leite, até então distribuído por dependência ao Inquérito 603. Outro ponto questionado pelo subprocurador-geral é a decisão do ministro Nilson Naves de encaminhar ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região o que restar dos autos originais e seus apensos.
O subprocurador-geral assevera que não pode concordar com essas deliberações: “O ministro relator conseguiu decretar o segredo de justiça, determinar múltiplos desmembramentos a serem livremente distribuídos, prejulgar eventual e futura imputação de crime ao desembargador federal Francisco de Assis Betti e excluir de futura acusação a imputação de quadrilha em relação a este e aos demais investigados, e ainda afastar de si a competência para relatar o inquérito para o qual foi livremente sorteado, sem se dar por suspeito ou impedido, pois, neste caso, não poderia proferir decisão sobre segredo e desmembramentos”.
De acordo com Carlos Eduardo, o ministro relator perdeu a necessária imparcialidade para prosseguir na relatoria do inquérito, “razão pela qual o Ministério Público Federal não se insurge contra sua redistribuição no âmbito da Corte Especial do Tribunal Superior de Justiça entre os ministros e ministras que ainda não afirmaram inequivocamente impedimento ou suspeição, o que é compreensível, considerando a forte presença de ministros com fortes vinculações profissionais ou pessoais com os estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro”.
O recurso do MPF será analisado inicialmente pelo ministro Nilson Naves, relator do inquérito no STJ, podendo ser levado à Corte Especial, composta de 15 Ministros, caso ele não concorde em reconsiderar a decisão recorrida.
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Fonte: MPF