TRF4

TRF4, 00027 AGRAVO EM APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2007.70.00.005292-6/PR, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz , Julgado em 01/23/2008

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00027 AGRAVO EM APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2007.70.00.005292-6/PR

RELATOR : Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ

AGRAVANTE : UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANA

ADVOGADO : Solange Dias Campos Preussler

INTERESSADO : MARCIANO DE ALMEIDA CUNHA

ADVOGADO : Flavio Jose Souza da Silva e outros

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PEDIDO DE EXONERAÇÃO. RETRATAÇÃO ANTERIOR À PUBLICAÇÃO

DO ATO ADMINISTRATIVO DE EXONERAÇÃO. MANUTENÇÃO DO CARGO E DA ESTABILIDADE FUNCIONAL.

DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA.

1. Nos termos da melhor doutrina, a publicação do ato administrativo é elemento integrante da própria validade, ou melhor, da

eficácia do ato, sendo inerente a todo ato administrativo (THEMISTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, in Tratado de Direito

Administrativo, 5ª ed., Livr. Freitas Bastos S/A, v. I, pp. 227/9; HELY LOPES MEIRELLES, in Direito Administrativo Brasileiro,

14ª ed., Rev. dos Tribs., 1989, pp. 82/3 e 135/6).

Nesse sentido, é a jurisprudência do Pretório Elso, consoante se verifica do aresto proferido quando do julgamento do RE nº

71.652-SP, rel. Min. THOMPSON FLORES, in RTJ 61/472.

Com a promulgação da Carta de 1988, o princípio da publicidade dos atos administrativos adquiriu relevo constitucional (art. 37 da

CF de 1988).

No caso em eme, o ato de exoneração do impetrante, embora eficaz, não se revestiu de equibilidade, que é a disponibilidade do

ato para produzir imediatamente os seus efeitos finais (a respeito, v. HELY LOPES MEIRELLES, in Op. cit., p. 136). O ato

administrativo perfeito é aquele que não apenas está acabado (eficaz), mas sim completo (equível), pela verificação de todas as

condições de sua operatividade.

Pertinente, no caso, o magistério de ARNALDO DE VALLES, em obra clássica, verbis:

“Quando nellatto si riscontrino questi requisiti essenziali, senza che nessun vizio li intacchi, alla volontà dellagente corrisponde

leffetto, che lordine giuridico protegge: latto allora è valido, quando possiede lattitudine a produrre leffetto pratico desiderato

dal suo autore validamente, cioè con la protezione dellordine giuridico. Se, invece, uno di quei requisiti manchi, o sia viziato, ne

deriva la invalidità dellatto, il cui effetto pratico o non si produce affatto, o può prodursi in forza di azioni del soggetto senza la

protezione del diritto, come effetto puramente di fatto.”

(In La Validità Degli Atti Amministrativi, CEDAM, Padova, 1986, p. 90)

Actus omissa forma legis corruit.

Dessa forma, verificando-se a retratação antes da publicação da exoneração do impetrante, ilegítimo o ato administrativo, eis que

contrariou os princípios da legalidade e da publicidade insculpidos no art. 37 da CF/88.

Com efeito, no regime do Estado de Direito não há lugar para o arbítrio por parte dos agentes da Administração Pública, pois a sua

conduta perante o cidadão é regida, única e elusivamente, pelo princípio da legalidade, insculpido no art. 37 da Magna Carta.

Por conseguinte, somente a lei pode condicionar a conduta do cidadão frente ao poder do Estado, sendo nulo todo ato da autoridade

administrativa contrário ou extravasante da lei, e como tal deve ser declarado pelo Poder Judiciário quando lesivo ao direito

individual.

Nesse sentido, também, a lição de Charles Debbasch e Marcel Pinet, verbis:

“Lobligation de respecter les lois comporte pour ladministration une double exigence, lune négative consiste à ne prendre aucune

décision qui leur soit contraire, lautre, positive, consiste à les appliquer, cest-à-dire à prendre toutes les mesures réglementaires

ou individuelles quimplique nécessairement leur exécution.”

(In Les Grands Textes Administratifs, Sirey, Paris, 1970, p. 376)

Realmente, ao fir o alcance do art. 37 da CF, não cabe ao intérprete distinguir onde a lei não o faz (CARLOS MAXIMILIANO, in

Hermenêutica e Aplicação do Direito, 6ª ed., Freitas Bastos, 1957, p. 306, n. 300), notadamente quando se trata, como é o caso dos

autos, de interpretação constitucional.

A respeito, pertinente o magistério sempre autorizado de PONTES DE MIRANDA, verbis:

“Na interpretação das regras jurídicas gerais da Constituição, deve-se procurar, de antemão, saber qual o interesse que o texto tem

por fito proteger. É o ponto mais rijo, mais sólido; é o conceito central, em que se há de apoiar a investigação egética. Com isso

não se proscreve a exploração lógica. Só se tem de adotar critério de interpretação restritiva quando haja, na própria regra

jurídica ou noutra, outro interesse que passe à frente. Por isso, é erro dizer-se que as regras jurídicas constitucionais se

interpretam sempre com restrição. De regra, o procedimento do intérprete obedece a outras sugestões, e é acertado que se formule

do seguinte modo: se há mais de uma interpretação da mesma regra jurídica inserta na Constituição, tem de preferir-se aquela que

lhe insufle a mais ampla extensão jurídica; e o mesmo vale dizer-se quando há mais de uma interpretação de que sejam suscetíveis

duas ou mais regras jurídicas consideradas em conjunto, o de que seja suscetível proposição extraída, segundo os princípios, de

duas ou mais regras. A restrição, portanto, é epcional.”

(In Comentários à Constituição de 1967 com Emenda nº 1 de 1969, 3ª ed. Forense, Rio de Janeiro, 1987, t. I, p. 302, n. 14).

Outra não é a lição de um dos mais conceituados constitucionalistas norte-americano, HENRY CAMPBELL BLACK, em obra

clássica, verbis:

“Where the meaning shown on the face of the words is definite and intelligible, the courts are not at liberty to look for another

meaning, even though it would seem more probable or natural, but they must assume that the constitution means just what it says.”

(In Handbook of American Constitutional Law, 2ª ed., West Publishing Co., St. Paul, Minn., 1897, p. 68)

Ademais, recorde-se a lição do saudoso Ministro Hannemann Guimarães ao julgar o RE nº 9.189, verbis:

“Não se deve, entretanto, na interpretação da lei, observar estritamente a sua letra. A melhor interpretação, a melhor forma de

interpretar a lei não é, sem dúvida, a gramatical. A lei deve ser interpretada pelo seu fim, pela sua finalidade. A melhor

interpretação da lei é, certamente, a que tem em mira o fim da lei, é a interpretação teleológica.”(In Revista Forense, v.127/397).

Por conseguinte, a mencionada Portaria viola o texto constitucional, sendo, assim, nula.

Ademais, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que sendo inconstitucional, a regra jurídica é nula,

não produzindo qualquer efeito jurídico, sendo a declaração de inconstitucionalidade ex tunc (in RTJ 102/671; 143/859; 146/461 e

147/985-6 ).

A respeito, pronunciou-se o eminente Ministro THOMPSON FLORES, quando Presidente da Suprema Corte, ao votar no

julgamento da Rp. Nº 1.014-RJ, verbis:

A lei ou o ato atingido, porque inconstitucionais são nulos desde o nascedouro; são eles, como afirmava Ruy, como se nunca

tivessem existido; seu efeito dessarte, pelo nosso sistema, é sempre ex tunc. E esta é a jurisprudência indiscrepante e reiterada do

Supremo Tribunal Federal.

(in RTJ 91/776 )

Da mesma forma, manifesta-se a melhor doutrina, verbis:

The general rule is that an unconstitutional statute, though having the form and name of law, is in reality no law, but is wholly void,

and in legal contemplation is as inoperative as if it had never been passed. Since an unconstitutional law is void, it imposes no

duties and confers no power or authority on any one ; it affords protection to no one, and no one is bound to obey it, and no courts

are bound to enforce it.

When a judgment of any court is based on an unconstitutional law, it has been said that it has no legitimate basis at all, and is not to

be treated as a judgement of a competent tribunal, and courts of other states are not required to give to it the full faith and credit

commanded by the provisions of the United States constitution as to the public acts recirds and judicial proceedings of other states.”

(in Constitutional Law – Ruling Case Law, The Lawyers Co-operative Publisching Company, Rochester, N. Y. 1915, v. 6, pp. 117-8,

n. 117 )

“An unconstitutional act is not a law. It confers no(Tab)rights; it imposes no duties; it affords no protection; it creates no office. It

is, in legal contemplation, as inoperative as though it had never been passed.”

(HENRY CAMPBELL BLACK, in Handbook of American Constitutional Law., 2ª ed., West Publishing Co., St. Paul, Minn., 1897, p.

66, n. 46 ).

Em caso semelhante ao dos autos, deliberou o Eg. STJ, verbis:

“ADMINISTRATIVO. CARGO PÚBLICO. APOSENTADORIA. RETRATAÇÃO DO PEDIDO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ATO.

RETORNO AO STATUS QUO ANTE.POSSIBILIDADE.1 – Regida a Administração pelo princípio da publicidade de seus atos, estes

somente têm eficácia depois de verificada aquela ocorrência, razão pela qual, retratando-se o servidor, antes de vir a lume o ato de

aposentadoria, sua situação funcional deve retornar ao status quo ante, vale dizer, subsiste a condição de funcionário ativo.2-

Recurso em mandado de segurança provido. ”

(RMS nº 1994/0039028-9 – 6ª Turma – rel. Min. Fernando Gonçalves – j. em 15.08.2000 – DJU de 04.06.2000, vol. 24, p. 93).

2. Agravo a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

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Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de dezembro de 2007.

Como citar e referenciar este artigo:
JURISPRUDÊNCIAS,. TRF4, 00027 AGRAVO EM APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2007.70.00.005292-6/PR, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz , Julgado em 01/23/2008. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/jurisprudencias/trf4/trf4-00027-agravo-em-apelacao-em-mandado-de-seguranca-no-2007-70-00-005292-6-pr-relator-des-federal-carlos-eduardo-thompson-flores-lenz-julgado-em-01-23-2008/ Acesso em: 06 dez. 2024