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00027 AGRAVO EM APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2007.70.00.005292-6/PR
RELATOR : Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ
AGRAVANTE : UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANA
ADVOGADO : Solange Dias Campos Preussler
INTERESSADO : MARCIANO DE ALMEIDA CUNHA
ADVOGADO : Flavio Jose Souza da Silva e outros
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PEDIDO DE EXONERAÇÃO. RETRATAÇÃO ANTERIOR À PUBLICAÇÃO
DO ATO ADMINISTRATIVO DE EXONERAÇÃO. MANUTENÇÃO DO CARGO E DA ESTABILIDADE FUNCIONAL.
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA.
1. Nos termos da melhor doutrina, a publicação do ato administrativo é elemento integrante da própria validade, ou melhor, da
eficácia do ato, sendo inerente a todo ato administrativo (THEMISTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, in Tratado de Direito
Administrativo, 5ª ed., Livr. Freitas Bastos S/A, v. I, pp. 227/9; HELY LOPES MEIRELLES, in Direito Administrativo Brasileiro,
14ª ed., Rev. dos Tribs., 1989, pp. 82/3 e 135/6).
Nesse sentido, é a jurisprudência do Pretório Elso, consoante se verifica do aresto proferido quando do julgamento do RE nº
71.652-SP, rel. Min. THOMPSON FLORES, in RTJ 61/472.
Com a promulgação da Carta de 1988, o princípio da publicidade dos atos administrativos adquiriu relevo constitucional (art. 37 da
CF de 1988).
No caso em eme, o ato de exoneração do impetrante, embora eficaz, não se revestiu de equibilidade, que é a disponibilidade do
ato para produzir imediatamente os seus efeitos finais (a respeito, v. HELY LOPES MEIRELLES, in Op. cit., p. 136). O ato
administrativo perfeito é aquele que não apenas está acabado (eficaz), mas sim completo (equível), pela verificação de todas as
condições de sua operatividade.
Pertinente, no caso, o magistério de ARNALDO DE VALLES, em obra clássica, verbis:
“Quando nellatto si riscontrino questi requisiti essenziali, senza che nessun vizio li intacchi, alla volontà dellagente corrisponde
leffetto, che lordine giuridico protegge: latto allora è valido, quando possiede lattitudine a produrre leffetto pratico desiderato
dal suo autore validamente, cioè con la protezione dellordine giuridico. Se, invece, uno di quei requisiti manchi, o sia viziato, ne
deriva la invalidità dellatto, il cui effetto pratico o non si produce affatto, o può prodursi in forza di azioni del soggetto senza la
protezione del diritto, come effetto puramente di fatto.”
(In La Validità Degli Atti Amministrativi, CEDAM, Padova, 1986, p. 90)
Actus omissa forma legis corruit.
Dessa forma, verificando-se a retratação antes da publicação da exoneração do impetrante, ilegítimo o ato administrativo, eis que
contrariou os princípios da legalidade e da publicidade insculpidos no art. 37 da CF/88.
Com efeito, no regime do Estado de Direito não há lugar para o arbítrio por parte dos agentes da Administração Pública, pois a sua
conduta perante o cidadão é regida, única e elusivamente, pelo princípio da legalidade, insculpido no art. 37 da Magna Carta.
Por conseguinte, somente a lei pode condicionar a conduta do cidadão frente ao poder do Estado, sendo nulo todo ato da autoridade
administrativa contrário ou extravasante da lei, e como tal deve ser declarado pelo Poder Judiciário quando lesivo ao direito
individual.
Nesse sentido, também, a lição de Charles Debbasch e Marcel Pinet, verbis:
“Lobligation de respecter les lois comporte pour ladministration une double exigence, lune négative consiste à ne prendre aucune
décision qui leur soit contraire, lautre, positive, consiste à les appliquer, cest-à-dire à prendre toutes les mesures réglementaires
ou individuelles quimplique nécessairement leur exécution.”
(In Les Grands Textes Administratifs, Sirey, Paris, 1970, p. 376)
Realmente, ao fir o alcance do art. 37 da CF, não cabe ao intérprete distinguir onde a lei não o faz (CARLOS MAXIMILIANO, in
Hermenêutica e Aplicação do Direito, 6ª ed., Freitas Bastos, 1957, p. 306, n. 300), notadamente quando se trata, como é o caso dos
autos, de interpretação constitucional.
A respeito, pertinente o magistério sempre autorizado de PONTES DE MIRANDA, verbis:
“Na interpretação das regras jurídicas gerais da Constituição, deve-se procurar, de antemão, saber qual o interesse que o texto tem
por fito proteger. É o ponto mais rijo, mais sólido; é o conceito central, em que se há de apoiar a investigação egética. Com isso
não se proscreve a exploração lógica. Só se tem de adotar critério de interpretação restritiva quando haja, na própria regra
jurídica ou noutra, outro interesse que passe à frente. Por isso, é erro dizer-se que as regras jurídicas constitucionais se
interpretam sempre com restrição. De regra, o procedimento do intérprete obedece a outras sugestões, e é acertado que se formule
do seguinte modo: se há mais de uma interpretação da mesma regra jurídica inserta na Constituição, tem de preferir-se aquela que
lhe insufle a mais ampla extensão jurídica; e o mesmo vale dizer-se quando há mais de uma interpretação de que sejam suscetíveis
duas ou mais regras jurídicas consideradas em conjunto, o de que seja suscetível proposição extraída, segundo os princípios, de
duas ou mais regras. A restrição, portanto, é epcional.”
(In Comentários à Constituição de 1967 com Emenda nº 1 de 1969, 3ª ed. Forense, Rio de Janeiro, 1987, t. I, p. 302, n. 14).
Outra não é a lição de um dos mais conceituados constitucionalistas norte-americano, HENRY CAMPBELL BLACK, em obra
clássica, verbis:
“Where the meaning shown on the face of the words is definite and intelligible, the courts are not at liberty to look for another
meaning, even though it would seem more probable or natural, but they must assume that the constitution means just what it says.”
(In Handbook of American Constitutional Law, 2ª ed., West Publishing Co., St. Paul, Minn., 1897, p. 68)
Ademais, recorde-se a lição do saudoso Ministro Hannemann Guimarães ao julgar o RE nº 9.189, verbis:
“Não se deve, entretanto, na interpretação da lei, observar estritamente a sua letra. A melhor interpretação, a melhor forma de
interpretar a lei não é, sem dúvida, a gramatical. A lei deve ser interpretada pelo seu fim, pela sua finalidade. A melhor
interpretação da lei é, certamente, a que tem em mira o fim da lei, é a interpretação teleológica.”(In Revista Forense, v.127/397).
Por conseguinte, a mencionada Portaria viola o texto constitucional, sendo, assim, nula.
Ademais, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que sendo inconstitucional, a regra jurídica é nula,
não produzindo qualquer efeito jurídico, sendo a declaração de inconstitucionalidade ex tunc (in RTJ 102/671; 143/859; 146/461 e
147/985-6 ).
A respeito, pronunciou-se o eminente Ministro THOMPSON FLORES, quando Presidente da Suprema Corte, ao votar no
julgamento da Rp. Nº 1.014-RJ, verbis:
A lei ou o ato atingido, porque inconstitucionais são nulos desde o nascedouro; são eles, como afirmava Ruy, como se nunca
tivessem existido; seu efeito dessarte, pelo nosso sistema, é sempre ex tunc. E esta é a jurisprudência indiscrepante e reiterada do
Supremo Tribunal Federal.
(in RTJ 91/776 )
Da mesma forma, manifesta-se a melhor doutrina, verbis:
The general rule is that an unconstitutional statute, though having the form and name of law, is in reality no law, but is wholly void,
and in legal contemplation is as inoperative as if it had never been passed. Since an unconstitutional law is void, it imposes no
duties and confers no power or authority on any one ; it affords protection to no one, and no one is bound to obey it, and no courts
are bound to enforce it.
When a judgment of any court is based on an unconstitutional law, it has been said that it has no legitimate basis at all, and is not to
be treated as a judgement of a competent tribunal, and courts of other states are not required to give to it the full faith and credit
commanded by the provisions of the United States constitution as to the public acts recirds and judicial proceedings of other states.”
(in Constitutional Law – Ruling Case Law, The Lawyers Co-operative Publisching Company, Rochester, N. Y. 1915, v. 6, pp. 117-8,
n. 117 )
“An unconstitutional act is not a law. It confers no(Tab)rights; it imposes no duties; it affords no protection; it creates no office. It
is, in legal contemplation, as inoperative as though it had never been passed.”
(HENRY CAMPBELL BLACK, in Handbook of American Constitutional Law., 2ª ed., West Publishing Co., St. Paul, Minn., 1897, p.
66, n. 46 ).
Em caso semelhante ao dos autos, deliberou o Eg. STJ, verbis:
“ADMINISTRATIVO. CARGO PÚBLICO. APOSENTADORIA. RETRATAÇÃO DO PEDIDO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ATO.
RETORNO AO STATUS QUO ANTE.POSSIBILIDADE.1 – Regida a Administração pelo princípio da publicidade de seus atos, estes
somente têm eficácia depois de verificada aquela ocorrência, razão pela qual, retratando-se o servidor, antes de vir a lume o ato de
aposentadoria, sua situação funcional deve retornar ao status quo ante, vale dizer, subsiste a condição de funcionário ativo.2-
Recurso em mandado de segurança provido. ”
(RMS nº 1994/0039028-9 – 6ª Turma – rel. Min. Fernando Gonçalves – j. em 15.08.2000 – DJU de 04.06.2000, vol. 24, p. 93).
2. Agravo a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de dezembro de 2007.