Acordo Tributário entre Brasil e Estados Unidos
Ives Gandra da Silva Martins*
Em conversa e correspondência trocada com o Se-nador Francisco Dornelles, manifestou-me ele preocupação com os termos do acordo para intercâmbio de informações relativas a tributos, firmado entre o Secretário da Receita Federal e o Embaixador Americano no Brasil, principalmente no que concerne às cláusulas V e VI.
Tais cláusulas permitem que agentes fiscais americanos participem dos trabalhos de fiscalização em empresas brasileiras, exigindo a exibição de livros, promovendo interrogatórios e obtendo depoimentos, mesmo que “não necessitem de tais informações, naquele momento, para seus próprios fins tributários” (“verbis”).
Segundo o eminente Senador – que, a meu ver, é aquele que detém a maior experiência e os maiores conhecimentos em tratados internacionais e em matéria tributária naquela Casa Legislativa dos Estados – tais cláusulas revestem-se de manifesta violência ao direito dos contribuintes brasileiros, de serem apenas fiscalizados por autoridades brasileiras –e exclusivamente por elas- à luz do § 1º do art. 145 da CF, que atribui o poder de fiscalização tão somente à administração tributária do Brasil.
A meu ver, todavia, o referido acordo padece de inconstitucionalidade formal, sequer pressentida pelo eminente e competente Secretário do Ministério das Relações Exteriores, Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães.
Com efeito, S.Exa. encaminha o referido acordo ao Senado Federal com a seguinte introdução, na Mensagem n. 741: “Nos termos do disposto no art. 49, inciso I, combinado com o art. 84, inciso VIII, da Constituição, submeto…”.
Ora, os dois artigos referem-se: o primeiro, à competência exclusiva do Congresso Nacional para: “I. resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional” e, o segundo, que: “Compete privativamente ao Presidente da República: … VIII. Celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos ao referendo do Congresso Nacional”.
Como se percebe, apenas e tão-somente o Presidente da República, em sua competência privativa, é que pode assinar atos internacionais de qualquer espécie a serem referendados pelo Congresso Nacional.
Assim, o referido acordo é formalmente inconstitucional, por ter sido celebrado, não pelo Presidente da República, mas por uma autoridade subalterna ao Ministério da Fazenda, e não pelo Presidente americano ou por seu Secretário de Estado, mas por um mero embaixador daquele país.
Esta manifesta inconstitucionalidade macula, por inteiro, o acordo, que só por isso já deveria ser, de plano, rejeitado, sem necessidade de exame das demais inconstitucionalidades materiais.
Aproveito esta coluna para lamentar a morte do eminente Senador Jefferson Peres – com quem troquei idéias, por telefone, um dia antes de seu falecimento, sobre reservas indígenas – um dos mais nobres, dignos e éticos senadores que conheci na minha vida. O Brasil sentirá muito sua falta.
* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br
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