Lucas Affonso Brandão
Matheus Dezan
Nos últimos anos o número de anúncios falsos que prometem ganhos monetários fáceis ou em quantidades desproporcionais àquelas comumente auferidas no mercado se multiplicaram, fazendo com que várias vítimas perdessem milhares, ou até mesmo milhões, de reais em verdadeiros golpes profissionais perpetrados por meio de estruturas empresariais voltadas exclusivamente para dispersão do produto do crime.
Quando as pessoas caem nesses golpes, muitas das vezes demoram a descobrir que se tratava de uma fraude. O desconhecimento do modus operandi é a ferramenta que mais proporciona a impunidade aos golpistas, visto que os clientes contratam a prestação de um serviço que lhes parece vantajoso — um produto de investimentos em ativos financeiros, inclusive em moedas e criptomoedas —, criando confiança no atendimento (que parece atencioso, dedicado e de qualidade) dos criminosos para que, nesse meio tempo, transfiram o dinheiro para fora do Brasil ou para inúmeras contas de laranjas, que maquiam o destino das quantias aportadas.
Geralmente, os golpes financeiros virtuais são perpetrados por falsas casas de apostas, por falsas corretoras de investimento (em criptoativos e/ou no mercado de ações brasileiro ou estrangeiro), por vendas de cursos que não possuem qualquer efetividade (ou que sequer existem) ou por transferências bancárias (ou PIX) com falsas promessas de retorno imediato. Assim, dentre os traços distintivos dos golpes financeiros, destacam-se as promessas, feitas pelos criminosos, de lucros superiores à média dos lucros do mercado financeiro.
Com propósitos ilustrativos, pode-se citar golpes bastante comuns que são perpetrados e divulgados em redes sociais, sendo geralmente acompanhados de promessas como “transfira R$ 100 reais no PIX e receba R$ 1000 em algumas horas” (rendimento de 1000% em menos de um dia), “ganhe dinheiro apenas assistindo vídeos do YouTube”, “invista e receba 1% de retorno por dia com ações”, “compre o curso para aprender a pagar todas as suas contas com Day Trade”, dentre diversos outros. Veja-se que os lucros advindos de tais “anúncios” são praticamente inalcançáveis em condições normais de investimento, visto que os juros de empréstimos e dividendos de ações costumam render, se muito, 1% do valor aportado por mês. Os ganhos diários nas condições apresentadas só poderiam ser auferidos por Day Trade e em situações muito específicas, muitas das vezes dependendo de sorte (o que não se repetirá diariamente).
Em regra, essas instituições não são sediadas no Brasil, nos Estados Unidos da América ou em países da Europa, por exemplo, mas em paraísos fiscais, como Chipre, Maldivas e São Vicente e Granadinas. Por isso, uma das principais formas de identificar um golpe financeiro é consultar o local em que a instituição financeira tem sede. Essa informação pode estar disponível no rodapé do sítio eletrônico dessa instituição ou em outros documentos oficiais da empresa (os quais, infelizmente, por vezes, são de difícil acesso, o que reforça a necessidade de extrema cautela).
Na maioria dos casos em que os golpistas se valem de empresas internacionais fantasmas, a organização criminosa (que muitas das vezes opera aqui mesmo, no Brasil) contrata uma empresa especializada na constituição de offshores em paraísos fiscais para que, em seu próprio nome (e não dos criminosos), crie uma sociedade e uma conta bancária no país. Essas empresas especializadas geralmente atuam de forma remota, sequer exigindo que os criminosos precisem se deslocar para o paraíso fiscal.
Criada a sociedade, a empresa especializada assina uma procuração em favor dos golpistas que passam a administrar a sociedade de fachada. Percebe-se que, com essa operação criminosa, nem as autoridades brasileiras nem as estrangeiras têm acesso à verdadeira identidade dos mandantes do crime.
Tanto não têm sede no Brasil que essas empresas sequer constam da relação de instituições financeiras registradas no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, nas Juntas Comerciais e na Comissão de Valores Mobiliários, bastando, portanto, a consulta a esses bancos de dados para constatar que se tratam de empresas, por vezes, fraudulentas.
Nos golpes financeiros virtuais, os membros da organização criminosa que interagem com o cliente, isto é, a vítima, utilizam linguagem persuasiva, sempre prometendo a manutenção ou o aumento dos ganhos financeiros no curto prazo, bastando, para tanto, que se mantenham ou aumentem os aportes financeiros na empresa.
Contudo, esses aportes são feitos em contas bancárias não pertencentes à própria instituição financeira, como a corretora de investimentos, que, usualmente, deveria ser a beneficiária desses aportes. Ao contrário, eles são realizados em contas de terceiros, que atuam como “Payment Service Providers”, ou seja, intermediários entre a vítima e a suposta instituição financeira.
Acontece que corretoras e empresas sérias também costumam se valer de intermediadores de pagamento (geralmente bancos ou outras instituições financeiras), devendo o investidor redobrar a atenção quando se depara com estes terceiros, sugerindo-se fortemente que sejam feitas pesquisas sobre sua procedência de mercado antes da realização do aporte.
Tais “Payment Service Providers” fraudulentos são chamados na linguagem coloquial de “laranjas” e podem atuar nos golpes financeiros de diversas formas. Por vezes, os “laranjas” são profissionais que conscientemente vendem suas identidades para que os golpistas abram as empresas intermediárias e diluidoras em seus nomes, dificultando que as autoridades policiais descubram quem foi o verdadeiro mandante. Em outros casos, os “laranjas” são pessoas humildes que são cooptadas pelos criminosos e, em sua ignorância, recebem pequenas quantias de dinheiro para permitir a utilização de seus documentos pessoais para a abertura de empresas fraudulentas.
Normalmente, uma vez transferidas quaisquer quantias monetárias para esses terceiros, eles (ou os próprios criminosos, em nome dos “laranjas”) distribuem o dinheiro entre contas bancárias dos demais integrantes da organização criminosa (ou dos demais “laranjas”, diluindo-o em ativos financeiros (inclusive criptomoedas), em bens materiais, como casas, carros etc., ou em transferências internacionais para a empresa “fantasma” criada em um paraíso fiscal, o que inviabiliza – ou muito dificulta – a recuperação dessas quantias em caso de solicitação de saque dos investimentos e torna árdua a tarefa de identificação do fluxo das transações realizadas em caso de investigação policial.
Exemplificativamente, tem-se o caso dos crimes apurados pela operação Black Monday, originária do Ministério Público de Minas Gerais e da Polícia Federal. Os crimes apurados, em suma, a princípio consistiram na disponibilização de uma suposta plataforma de investimentos falsa, mas na qual as vítimas depositavam alguma confiança, mormente em razão do fato de que o sistema de investimentos simulava operações reais, porém sem que a vítima efetivamente fosse proprietária dos ativos financeiros supostamente comprados.
Ao contrário, as vítimas aportavam dinheiro na suposta corretora de investimentos por meio de terceiros, os Payment Service Providers, que, por sua vez, ao invés de transferirem os recursos para a corretora, os desviavam para contas de outros integrantes da organização criminosa e os diluíam em bens materiais diversos, dispersando o produto do crime e, sobretudo, dificultando eventual investigação governamental.
Assim, as principais formas recomendadas por nós para que você identifique um golpe financeiro são: i) comparar a proporção dos lucros prometidos com os lucros médios do mercado, ii) verificar se as instituições financeiras estão registradas no Brasil, e não em “paraísos fiscais” ou em países sem legislação rigorosa em matéria de finanças, iii) verificar se os aportes estão sendo feitos para contas bancárias cujos titulares são as instituições financeiras, ou, principalmente, o próprio investidor, e não um intermediário que promete repassar o dinheiro às instituições em questão.
Em caso de dúvidas, consulte um advogado e acione as autoridades competentes, como a Polícias Civil, a Polícia Federal, o Ministério Público e o PROCON de seu Estado.
Este artigo foi originalmente publicado em: https://schiefler.adv.br/golpes-financeiros/