MP 451/08: Supressão do Beneficio do Seguro DPVAT / Loteamento do Corpo Humano
Rosinéia Cecília Mendonça*
Para se discutir a percepção da indenização relativa ao Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT), faz-se necessário verificar seu caráter especial de acidentes pessoais, destinado a pessoas transportadas ou não, que porventura venham a óbito ou ficaram debilitadas por veículos
Observa-se ainda, que nessa modalidade de beneficio securitário, ao contrário do que ocorre no seguro de responsabilidade civil, o proprietário do automóvel não é o segurado, mas estipulante em favor de terceiro (arts. 436 usque 438 CC), não havendo, assim, um contrato de seguro, mas uma obrigação legal, um seguro de responsabilidade social, imposta por lei, cuja finalidade é cobrir os riscos da circulação dos veículos
A Lei 6.194/74 instituiu a obrigatoriedade do pagamento de indenização por morte, lesão/Invalidez permanente e ainda valores referentes a despesas médico-hospitalares a quem quer que sofrer acidente com veículo automotor ou com sua carga.
Em virtude do grande alcance social dos dispositivos da Lei 6.194/74 e sua forte conotação do interesse público, haja vista que o perfil do acidentado é DESVALIDO OU EXCLUIDO SOCIAL, o legislador optou pela fixação da indenização devida em acidente de trânsito
Assim, respeitando o grande alcance social da legislação, após sucessivas e reiteradas demandas judiciais entre os beneficiários (vítimas de acidente de trânsito hiposuficientes) e o poderoso grupo econômico representado pela Fenaseg (Convênio Seguradoras), coube mais uma vez, ao Poder Judiciário decidir que a indenização decorrente de Seguro Obrigatório, prevista no art. 3º da Lei 6.194/74 não foi revogado pelas Leis n° 6.205/75 e 6.423/77, e nem ofende o disposto do inciso IV do art. 7º da CF/88, uma vez que a utilização do salário mínimo se deu como quantificador do montante indenizatório e não como fator de correção monetária, entendimento esse pacificado pelos Egrégios Tribunais, inclusive, pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, contrapondo as alegações procrastinatórias das Seguradoras.
Destarte, as Seguradoras que optassem por trabalhar com o referido seguro, deveriam efetuar os pagamentos na forma prevista na Lei 6.194/74.
Tal fato, porém, JAMAIS ocorreu, pois, ao permitir o pagamento de forma administrativa por parte das seguradoras, estas formularam em conjunto uma TABELA que simplesmente loteia e põe “preço” nas lesões, dificultando a aplicação da Lei na forma correta, desvirtuando os objetivos pelos quais a lei de 1974 fora editada.
As empresas seguradoras, não se importando com o apelo social determinado pela lei, sempre agiram no intuito de lesar as vítimas ou seus familiares, nos valores determinados legalmente, pagando (e quando pagam) os valores que ELAS PROPRIAS entendem por devidos .
Assim, apenas através do judiciário, devidamente provocado por advogados, é que se conseguiu fazer as seguradoras pagarem o que realmente é determinado pela legislação pertinente.
Com o passar do tempo, e devido o fato de as seguradoras se verem OBRIGADAS a efetuar os pagamentos nos valores corretos, estas intentaram de todas as formas obterem modificações na Lei 6.194/74, tendo finalmente, EM 29 de Dezembro de 2006 , conseguido alcançar parte de seu intento com a aprovação da MP 340/06 e conversão desta em Lei.
Essa Medida Provisória determinou, entre outras coisas, a partir de seu artigo 8º, que o valor da indenização deixaria de ser aquele correspondente a 40 Salários Mínimos para se fixar – sem qualquer tipo de correção – em R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais). Ainda, determinou a correção do valor do PRÊMIO do seguro obrigatório, que foi aumentado em até mais de 100% – PRÊMIO DE SEGURO é o valor cobrado dos proprietários de veículos automotores.
Ou seja: a MP340/06 AUMENTOU A COBRANÇA DE IMPOSTO E DIMINUIU O VALOR DAS INDENIZAÇÕES A SEREM PAGAS ÀS VÍTIMAS DE ACIDENTE DE TRÂNSITO, o que apenas serviu para elevar ainda mais o lucro das empresas seguradoras.
No entanto, o Convênio, não se conformando, mudou de estratégia e conseguiu no calar da noite a Edição das Medidas Provisórias, as quais envolvem assuntos dispares e complexos.
Porém, mais uma vez, a advocacia esteve atenta e defendeu intransigentemente os interesses da sociedade (vítimas de acidente de trânsito), reivindicando junto ao Poder Judiciário a correção monetária do valor reduzido e congelado, desde a data da edição da Medida Provisória (29/12/2006) e/ou argüindo a inconstitucionalidade desse dispositivo legal, o qual está sendo sensivelmente acatado pelos tribunais, em razão do espírito social e alimentar da Lei que rege o Seguro Obrigatório, bem como da total falta de observância aos requisitos para edição de uma Medida Provisória, qual seja de urgência e relevância.
No entanto, surpreendendo novamente a sociedade, os defensores dos direitos humanos fundamentais, operadores do direito e os próprios parlamentares, foi inserido nos artigos 19, 20 e 21 da Medida Provisória n.º 451, de 15 de dezembro de
Assim, Em 15/12/2008 foi promulgada nova MP, esta de nº 451/08, que determinou, entre outras coisas, que os juízes brasileiros, a partir de sua promulgação, estão OBRIGADOS a utilizar a famigerada TABELA de percentual de lesão permanente para efetivamente determinar os valores devidos a título de indenização a serem pagas pelas seguradoras, ou seja O PODER JUDICIARIO AGORA SIM TERÁ QUE APLICAR AQUELA MALFADADA TABELA DE PERCENTUAIS DE LESAO ,já que para tanto foi providenciada uma Medida Provisória QUE TEM FORÇA DE LEI , a qual vincula o judiciário
Essa TABELA flagrantemente viola princípios fundamentais da República, como o Principio da Dignidade da Pessoa humana, Principio da Legalidade, da Moralidade e da Publicidade.
Mostra-se a referida MP num completo descaso para com a pessoa humana vítima de acidente de trânsito, para com o cidadão já tão sofrido com as agruras de um sinistro de transito , quando lotea o corpo humano, parte a parte, fixando PREÇO por membro lesado.
Mal sabe o legislador o quão cruel é o percurso para se receber a indenização referente ao Seguro DPVAT, ainda mais em se tratando de vitimas/beneficiarios que, em um sinistro de transito, perdeu a perna, o braço, a Mão, os dedos, a visão, um ente querido, a audição, a memória, são pessoas que estão lutando para sobreviver sem um de seus membros, sem emprego, sem auxilio do INSS e sem qualquer perspectiva de vida.
Deve ser lembrado que todos os cidadãos que possuem veículos PAGAM anualmente para , quando precisarem , ter direito ao Seguro DPVAT, e pagam a quantia que varia entre R$ 90,00 e 256,00 pelo Bilhete do Seguro DPVAT .
Porém no momento seguinte ao acidente de transito, ao pleitearem seus direitos em âmbito administrativo, os cidadãos se esbarram em serias dificuldades impostas pelo CNSP e pela FENASEG para receberem quantia irrisória que, À PARTIR DE 15/12/2008, será paga de forma equivalente à perda anatômica que sofreram ( 10,20,30 …. 80% de R$ 13.500,00) , tudo a depender de qual membro perderam , de quais movimentos não mais poderão fazer .
Enquanto anteriormente o valor já era considerado IRRISÓRIO frente ao lucro das seguradoras, e ínfimo por parte das vítimas, fixados em 40 salários mínimos, agora caiu para apenas um percentual do valor fixado anteriormente pela MP 340/06, que é de R$ 13.500, ou seja, é quase impossível a uma vítima de acidente de trânsito receber o benefício em seu valor máximo, pois a TABELA instituída pala MP 451/08 determina que apenas um percentual do valor máximo (R$ 13.500,00) deve ser pago a título de indenização por INVALIDEZ PERMANENTE.
Oras, quem sabe o VALOR de uma mão, de um olho, de uma perna?
A FENSASEG ?
Somente a pessoa que perdeu/sofreu a lesão é capar de quantificar seu valor.
Importante destacar que as modificações introduzidas nas Medidas Provisórias nº 340 e 451, prejudicam as vítimas e/ou seus beneficiários, hospitais e Sistema Único de Saúde – SUS (superlotação), tanto no aspecto econômico (redução dos valores das indenizações) quanto à praticidade para a montagem do processo administrativo, pois a imposição de exigências, muitas delas “extra-legis”, afasta os beneficiários do Seguro DPVAT, geralmente vítimas hipossuficientes e, conseqüentemente, beneficiando o Consórcio das Seguradoras, ou seja, o grande vencedor é o mercado segurador, que mesmo não tendo sucesso na Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta (ADPF/95-2006), que versava sobre a fixação da indenização em salário-mínimo, com liminar indeferida.
O que está em VOGA é a intenção do Legislador de 1974 em socorrer e amparar as vitimas de acidente de transito em um momento tão complicado, dando ao Seguro DPVAT uma indiscutível FUNÇÃO SOCIAL , justamente pelo fato de ter um importante caráter social e alimentar junto aos cidadãos que, em sua maioria, são hipossuficientes, agravado essa situação, pelos custos com tratamento médico-hospitalar, devido a imprevisibilidade do aspecto fortuito do acidente e a necessidade de perenizar aquele valor mínimo para o atendimento de urgência das vítimas e beneficiários.
Nesse sentido, várias jurisprudências dos diversos tribunais pátrios convergem com a importância social do seguro DPVAT.
Portanto, a grande divergência, inclusive a recente MP nº 451/2008 veio alterar substancialmente o benefício em relação a INVALIDEZ PERMANENTE, no qual as Seguradoras Conveniadas nunca pagaram, via administrativa, o valor integral previsto no art. 3º, alínea “b” da Lei n.º 6.194/74, aplicando abusivamente uma Tabela de Cálculo de Indenização (Loteamento do Corpo Humano), elaborada aleatoriamente pela Fenaseg, numa afronta a lei federal, algo que AGORA RECENTEMENTE FOI CONSAGRADO NA MP nº. 451, que tem força de lei, e QUE JAMAIS pode ser admitido pelos defensores da Constituição da Republica , pelos operadores do direito em geral, pelos CIDADÃOS BRASILEIROS .
URGE UM CLAMOR PÚBLICO em favor da Inconstitucionalidade da medida !
* Advogada