I – Direito e Lei
A princípio, Roberto Lyra Filho faz uma análise da etimologia das palavras Direito e Lei, que se confundem em muitas línguas, até muito parecidas, mas que porém não possui a mesma significação. Afirma ele que a Lei é instrumento, emana do Estado e portanto permanece ligado a classe dominante, aquela que controla o Estado. Nem toda lei então representa Direito, que será posteriormente definido, muitas delas representam pura e simplesmente interesses de determinados grupos dentro da esfera do poder. Cabe analisar essas leis e interpretá-las para que se entenda se sim ou não elas representam Direito. O Direito define o autor, é indicação dos princípios e normas libertadoras, são conquistas.
O Direito não pode ser cruamente feito de pura legalidade, torna-se dogma, e assim sendo divino e portanto religioso, longe de ser uma verdadeira ciência, produtora de conhecimento e libertação. É visto que a legalidade pode até determinado ponto ser questionada, assim sua legitimidade. Mas como forma de garantia e segurança jurídica, principalmente para o ramo do Direito Penal, não existe um instituto que garanta uma liberdade e garantia tão excelente na evolução jurídico histórica, quanto o instrumento que é a legalidade.
Portanto, o direito ser resumido na legalidade nada mais é do que um fato que vem acontecendo desde o absolutismo monárquico. Pois o rei emanava as leis, sendo representante de Deus na terra, então a lei que por ele era emanada era o símbolo de justiça e retidão, sendo o direito em sua primazia.
Já quando a sociedade chega à época dos Estados democráticos tem-se que a lei é o símbolo da justiça e do que é mais puro do direito baseado que os representantes eleitos são a voz do povo e, portanto, fazem do direito a lei emanada fundamentando tal afirmação na passagem: “vox populi, vox dei”.
Durante o livro será questionado do que se trata o Direito, em sentido amplo, de forma dialética buscando nas origens do ser a natureza do fenômeno.
II – Ideologias Jurídicas
A princípio define o autor como ideologia, “o estudo da origem e funcionamento das idéias em relação aos signos que as representam;” essa definição é efêmera na história como cita o próprio autor, pois “logo, passou a designar essas idéias mesmas, o conjunto de idéias de uma pessoa ou grupo, a estrutura de suas opiniões, organizada em certo padrão.” O que ele quer dizer é que na formação do conhecimento, estamos tomados por conclusões e deformações do nosso pensamento que não são preponderantemente nossos, mas vícios adquiridos pela formatação social e que assim estão presentes nas nossas premissas e conclusões do estudo cientifico. Essa padronização do pensamento é forte e arraigada na sociedade, comparativamente a fé religiosa que nos limita o questionamento; Quando alunos no banco da escola, pouco questionamos da estrutura do átomo, ou se ele mesmo existe, apenas, como é conveniente para o momento, aceitamos alegremente os conceitos e iremos os reproduzir posteriormente no nosso pensamento.
Claro, que se existe tal fenômeno do pensamento, com essa força determinativa da sociedade, ela é mais do utilizada, é bem vinda pelos elementos que a utilizam a fim de manter sua dominação social.
Três são os principais modelos apresentados por Roberto Lyra; A ideologia como crença, como falsa consciência e como instituição. Sendo os primeiros vinculados ao sujeito que as absorve e o ultimo no seio da sociedade. A crença é fruto de opiniões pré-fabricadas, elas esão sujeitas a nós e pelo meio em que convivemos e as aceitamos, pois aparentam ser obvias. Assim conceitua que “A ideologia, portanto, é uma crença falsa, uma ‘evidencia’ não refletida que traduz uma deformação inconsciente da realidade”. Na falsa consciência, “a ideologia é cegueira parcial da inteligência entorpecida pela propaganda dos que a forjaram”. Como se trata de conveniência a manter uma posição superior de aquém se dela absorve, ela é defendida com convicção e exaltação assim como o é vendida. Como instituição, o é pois é fato social, está enraizada na sociedade como um todo, assim se multiplica e se reproduz no seu ciclo de vida, alimentada se conveniente por determinado grupo ou posição.
Durante este capítulo o autor utiliza-se da formula comumente usada pelos contestadores da estrutura social a expressão conhecida de “dar a cada um o que é seu” ignorando a origem dessa definição de justiça. Ele afirma que é instrumento de justificação do poder, aos ricos a riqueza e aos pobres a pobreza. Porem com Platão, na obra a Republica, essa definição tem como fundamento a adequação de cada pessoa a sua função na vida da cidade. A cada um cabe fazer o que sabe fazer melhor, pois assim a todos se tratas benefícios. A pobreza na cidade não é desejada, pois cria um sentimento de divisão contrario a unicidade almejada pela cidade ideal.
III – Principais Modelos de Ideologia Jurídica
São dois os principais grupos, o Positivismo e o Jusnaturalismo. Para o autor, ambas se limitam apenas a demonstrar a realidade existente. Existem mais modelos de Ideologia, mas se tratam de subdivisões dos principais. Define o primeiro como ordem estabelecida, o segundo como ordem justa.
Ao positivista o que interessa e se vê como justo é a ordem, e somente nessa ordem o que é justo se encontra claramente existente. Para o Iurisnaturalista existem princípios gerais que são inalteráveis, anteriores e superiores as leis e que não podem ser modificados validamente pelo legislador. Caberia então para não se encontrar em nenhuma das duas posições radicalmente opostas, uma teoria dialética do Direito, para superar essas teorias, as antíteses seriam confrontadas e delas seria absorvido e conservado os aspectos válidos, rejeitando os demais e os reestruturando em uma nova postura.
Existem três tipos de positivismo Jurídico; o legalista, o historicista ou sociologista e o psicologista. O primeiro é definido como baseado única e exclusivamente na lei, não podendo os costumes terem capacidade de questioná-lo. O historicista ou sociologista procura as fontes do direito positivado, ou seja, busca uma analise das fontes jurídicas que serviram como fundamento, seja em determinado momento ou situação histórica, e que assim instituíram tal fato modelo que baseou a criação e positivação da lei. O ultimo é mais confuso, mas é uma espécie de justificação da criação legislativa a partir do individuo que se situa em determinado grupo social e que portanto tem estes e aqueles princípios enraizados no seu ser e que assim os aceita.
Esses princípios justificadores são intitulados pelo autor como formas e maneiras encontradas pela classe dominante para manter o controle social. Assim sendo é necessário que aja uma fundamentação para que não se trate de pura e simples dominação.
Em seguida o Iurisnaturalismo é dividido em três grupos; o direito natural cosmológico, o teológico e o antropológico. Muito ligado as fases históricas da evolução do Direito Natural, o primeiro relativo ao cosmos, força universal pré-existente que indica naturalmente a maneira como o homem deve ser organizar para melhor se gerir, em convivência social. O segundo, posterior ao do homem antigo, é a justificativa de que porque o é porque Deus o quis. Se o rei é rei é porque Deus assim o deseja, dividido em intervenção direta da força divina, ou através da divina providencia, ou seja, as coincidências de fatos e valores que levam a determinada condições foram todas metodicamente calculadas no inicio da criação. Por ultimo, o antropológico é a superação de Deus, o homem é individuo único e insuperável em sua capacidade criativa, senhor de direitos superiores e a todo o homem essencial. Cabe a ele direitos que são universais e últimos em matéria de humanidade.
IV – Sociologia e Direito
Neste capítulo a abordagem é feita através de uma visão sociológica do Direito. Segundo o autor foi através de Marx e Engels que se fundou uma sociologia histórica. É assim para ele a Sociologia uma “disciplina mediadora, que constrói, sobre o monte de fatos históricos, os modelos, que os arrumam”. A Sociologia realmente cientifica é aquela que “empenhada, sempre, em determinar a origem, os antecedentes das formas sociais, que não são desovadas no mundo por algum espírito criador ou líder excepcional, nem deduzidas pela inteligência pura de algum teórico de gênio”.
Ele cita também a sociologia do conhecimento, a que procura a razão e o modo de influência do engajamento do homem na busca do conhecimento e do saber.
V – A dialética social do Direito
Aqui o que pode se dizer é que se trata de uma conclusão de todas as idéias apresentadas pelo livro. Ele resume nesse capitulo e faz um estudo dialético das estruturas do Direito. Em contraposição é estabelecido um direito em âmbito internacional, com a disputa e o controle de estados dominantes contra os estados periféricos dos grandes centros de poder. Há muito influência dos grandes centros sobre as relações econômicas e sociais das periferias, esse poder é travestido ou deliberadamente escancarado. No âmbito interno a disputa encontra-se nas classes dominantes e as dominadas, e grupos descontentes em geral. O conflito não se resolve diretamente por uma única via, são diversas as vias e as buscas das classes descontentes, sejam elas reformistas ou revolucionárias.
Concluindo e resumindo seu pensamento o autor apresenta em um quadro sinótico nove pontos que demonstram as estruturas do pensamento dialético. São eles:
I- trata da raiz internacional que tem o direito, não se limitando apenas a um aspecto histórico interno, “o princípio da autodeterminação dos povos e as soberanias nacionaisnão impedem a atuação, até, das sanções internacionais, na hipótese das mais graves violações do direito”; o II afirma que há uma recusa as classes dominantes pelas nações, no que tange ao direito internacional; III e IV afirma que cada sociedade configura seu próprio direito e sua dialética e que mesmo em sociedades socialistas há problemas de conflitos de direito; V diz que a organização social dominante adquire um perfil jurídico; VI trata do setor centrípeto, “o ponto VI é o único focalizado pelo positivismo, como se ali estivesse todo o Direito”; VII diz que se persistir a classe dominadora e a dominada criar-se-á através da dialética uma desorganização social, “mostrando a ineficácia relativa e a ilegitimidade das normas dominantes e propondo outras, efetivamente vividas, em setores mais ou menos amplos da vida social”; VIII trata da coexistência conflitual de normas jurídicas, os reformistas e os revolucionários; e o último ponto, IX, “radica neste ponto o critério de avaliação dos produtos jurídicos contrastantes, na competição de ordenamentos”.
Mesmo tentando se livrar através do caminho da dialética, fica claro a oposição entre Jusnaturalismo e Positivismo. Alias é difícil de livrar dessa discussão, até porque mesmo em ambos os modelos existem aspectos e elementos do outro. Cabe uma visão critica e consciente, como define o autor, do que deve ser buscado nessa confrontação no mundo das idéias e uma força e luta constante contra as ideologias que dominam, limitam e formatam o pensamento.
Chegar a uma conclusão definitiva do que é o direito através desse método, se resume numa apropriação de conceitos inerentes a ambos esses campos do conhecimento. Com uma abordagem sociológica, ou seja, uma valoração das causas sociais e uma contraposição como é demonstrado brevemente do direito alternativo, que se usa das estruturas criadas e ratificadas pelos grupos dominantes em favor daqueles que não tem esse poder disponível.
* Texto enviado de maneira anônima