Em sessão plenária especial, nesta terça-feira (27), o Senado prestou homenagem à memória do ex-senador e ex-governador do Amazonas Gilberto Mestrinho. Nascido em Manaus, em 1928, ele faleceu em 19 de junho último. Solicitada pelo senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), a sessão reuniu integrantes das diversas bancadas partidárias, todos enaltecendo a coragem cívica e pessoal do homenageado e sua extremada dedicação ao Amazonas e ao povo de seu estado.
Mestrinho começou sua vida política como prefeito de Manaus, em 1955. Quatro anos depois, foi eleito governador, cargo que voltou a ocupar por mais duas vezes. Como senador, ele dirigiu três vezes a Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO). Na sessão, os oradores reconheceram o homenageado como um político hábil, de trato fácil até mesmo com os adversários e inovador nas teses a favor da compatibilização entre desenvolvimento e preservação da Amazônia.
A sessão contou com a participação de quatro dos nove filhos do Mestrinho, entre outros familiares, políticos do seu estado natal e amigos que o acompanharam por toda a vida. Ao recordar a trajetória política de Mestrinho, Arthur Virgílio destacou a forma corajosa como se posicionou ao lado de Leonel Brizola, em 1961, em favor da posse do vice-presidente João Goulart, contra a vontade dos militares, depois da renúncia de Jânio Quadros.
Como lembrou Arthur Virgílio, depois das adesões do comandante do 3º Exército e do então governador de Goiás, Mauro Borges, o terceiro a defender a posse de Jango foi Mestrinho, naquele momento no exercício do primeiro dos três mandatos como governador do Amazonas. Segundo o orador, ninguém poderia imaginar que viria do Amazonas aquele ato de coragem, até pela falta de capacidade de resistência que estava à disposição do seu governador.
– Outras adesões aconteceram, mas as marcantes foram estas; as mais fundamentais, porque foram fruto da vontade pessoal, da determinação e da coragem – disse Arthur Virgílio.
Após o golpe de 1964, então na Câmara dos Deputados, Mestrinho sai de Brasília para se refugiar em São Paulo. Com seus direitos políticos cassados, como lembrou Arthur Virgílio, teve que esperar 19 anos para poder retornar a seu estado natal, voltar à política e, pela segunda vez, ao governo de seu estado. Porém, mesmo à distância, disse Arthur Virgílio, Mestrinho nunca deixou de se corresponder com correligionários e amigos, fator que contribuiu para que seu retorno fosse muito aguardado.
– Tudo o que queria o povo era alguém que se conectasse realmente com o povo, e não figuras que eram impostas ao povo – afirmou.
Teses polêmicas
Como presidente da CMO, Mestrinho ajudou de forma decisiva o Acre, como registrado pelo senador Tião Viana (PT-AC). Segundo o orador, o empenho do homenageado não foi apenas a favor de seu estado, mas por todas as unidades que integram a região amazônica. Outros senadores, como José Agripino (DEM-RN), destacaram o papel exercido pelo falecido senador para chamar a atenção para a Amazônia e a necessidade de sua conservação, mesmo com teses polêmicas.
– À sua maneira, ele amou, e como amou, a Amazônia, a selva, os seus valores. Eu me lembro que conversava muito com Mestrinho sobre os jacarés da Amazônia que ele, contrariando a tendência reinante à época, defendia o equilíbrio ecológico pelo abate do excesso – lembrou Agripino.
Jefferson Praia (PDT-AM), que presidiu a abertura dos trabalhos, passando o depois o comando da sessão a Arthur Virgílio, disse que a morte de Mestrinho deixou em seu estado natal um vácuo difícil de ser preenchido. Depois de afirmar que sempre há o que aprender na convivência com colegas de todo o país, Eduardo Suplicy (PT-SP) disse que o falecido colega era uma fonte inesgotável de conhecimentos.
– Para nós todos, ele foi um extraordinário professor das coisas de toda a Amazônia, de toda a Floresta Amazônica, das suas águas, das suas características, bem como do desenvolvimento que se deu ali, na Zona Franca de Manaus – disse Suplicy.
Clareza de convicções
Para Eduardo Azeredo (PSDB-MG), a defesa que Mestrinho fazia da Amazônia ultrapassava as obrigações da representação parlamentar. Segundo ele, suas ações nesse campo evidenciavam convicções claras sobre a importância da região para o país. Expedito Júnior (PR-RO) destacou o pioneirismo de Mestrinho na defesa da tese da “compensação ambiental”, pela qual os países ricos devem pagar o Brasil, como contribuição à conservação das florestas, já que isso interessa a todos. Filho de mãe índia, como observou Flexa Ribeiro (PSDB-PA), o homenageado era uma representação “mais do que real” da Amazônia.
– Mestrinho guardava nos seus traços fisionômicos a origem amazônica, que lhe conferia sagacidade intuitiva, a sabedoria no trato da natureza e a facilidade do contato humano pessoal. Sabia viver com e entre a gente de sua terra. Inteligente, homem do povo caboclo, ele era uma lenda viva – afirmou.
Conforme Marconi Perillo (PSDB-GO), o homenageado apresenta de fato uma biografia inegável, das mais completas do Estado brasileiro, pela diversidade de cargos desempenhados e os desafios vencidos para sua época. Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) recordou que, ainda menino, atuou pela eleição de Mestrinho como deputado federal – o que era permitido pela legislação eleitoral da época. Foi nesse momento que acabou cassado, tendo sua carreira sustada por um “ato arbitrário”. Segundo ele, o homenageado foi um dos primeiros a pensar no uso dos recursos da floresta em benefício dos que vivem nela.
Renan Calheiros (PMDB-AL) destacou Mestrinho foi uma das pessoas mais amigas e solidárias que já conheceu. Como disse, era alguém que, por seu carisma, não precisava fazer qualquer esforço para ser “querido e respeitado”. Ele foi um dos que destacaram a defesa que o falecido senador fazia da soberania do Brasil na região amazônica e do manejo sustentável quando – segundo afirmou – “a moda era o preservacionismo pura e simplesmente”.
Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) e João Pedro (PT-AM) também prestaram homenagens a Mestrinho durante a sessão, em que também fizeram uso da palavra três dos filhos do político: Maria Raposo, Luiz Carlos Mestrinho e João Thomé Mestrinho, que já foi deputado federal por duas vezes e também suplente do pai no Senado, tendo assumido a titularidade do cargo temporariamente, em 2004, em período de licença-saúde do pai.
Fonte: Senado