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Editorial: Remendo constitucional

Brasília, 11/10/2009 – O editorial “Remendo constitucional” foi publicado na edição de hoje (11) do Jornal do Brasil:

A comemoração do 21º aniversário da “Constituição cidadã” não motivou a maioria esmagadora dos parlamentares. Investidos na condição de constituintes derivados, suas excelências promulgaram, 12 dias antes da histórica data, a Emenda Constitucional 58, que aumentou em 7.623 o número de vagas nas câmaras municipais e determinou o seu preenchimento “a partir do processo eleitoral de 2008”. Ou seja, a imediata ocupação das novas cadeiras pelos chamados suplentes de vereadores.

O “remendo constitucional” – costurado para beneficiar as bases municipais dos deputados e senadores, com vistas às (re)eleições do próximo ano – foi prontamente contestado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e pela Ordem dos Advogados do Brasil, em ações de inconstitucionalidade dirigidas ao Supremo Tribunal Federal, com pedidos de liminar. A ministra Cármen Lúcia, relatora das ações, não se limitou a conceder a medida cautelar para suspender ou anular as posses dos novos vereadores “eleitos” pelo Congresso, com base na petição do chefe do Ministério Público – a primeira a ser protocolada. Abordou também o mérito da questão, num alentado despacho que – tudo leva a crer – será referendado pelo plenário da Corte.

“A eleição”, disse Cármen Lúcia, “é processo político aperfeiçoado segundo as normas jurídicas vigentes em sua preparação e em sua realização. As eleições de 2008 constituem, assim, processo político juridicamente perfeito. (…) Os eleitos, diplomados e empossados vereadores, no número definido pela legislação eleitoral vigente segundo o artigo 16 da Constituição do Brasil, compõem os órgãos legislativos municipais e estão em pleno exercício de suas atribuições”.

O procurador-geral da República fundamentou sua argumentação na conjugação do artigo 16 da Constituição com o dispositivo do artigo 5º (inciso 54), referente ao “devido processo legal”. O artigo 16 determina que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. Assim, as cadeiras de vereadores criadas pela Emenda nº 58 só poderiam ser ocupadas por concorrentes às câmaras no pleito de 2012, tendo em vista que “o pleno exercício dos direitos políticos, aqui pelo ângulo dos legitimados a votar e na compreensão dos partidos políticos, está atrelado à perspectiva de um devido processo legal eleitoral, organizado por regras constitucionais”. E citou precedentes do STF na linha de que “existem limitações materiais ao poder de reforma”, constantes do núcleo duro da Constituição que, alterado, “faria desmantelar a própria decisão política fundamental”. Ao acolher as razões do chefe do MPF, a ministra Cármen Lúcia foi enfática: “A eleição é processo político aperfeiçoado segundo as normas jurídicas vigentes em sua preparação e em sua realização. As eleições de 2008 constituem, assim, processo político juridicamente perfeito. Guarda, pois, inteira coerência com a garantia de segurança jurídica que resguarda o ato jurídico perfeito, de modo expresso e imodificável até mesmo pela atuação do constituinte reformador”.

Ao invés de aprovar propostas de emendas casuísticas – como a dos “suplentes de vereadores” e a que beneficia os donos de cartórios não concursados – o Congresso deveria homenagear a Constituição, simplesmente, discutindo e votando as leis ordinárias e complementares encomendadas pela própria Carta, há 21 anos.

Fonte: OAB

Como citar e referenciar este artigo:
NOTÍCIAS,. Editorial: Remendo constitucional. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/noticias/oab-nacional/editorial-remendo-constitucional/ Acesso em: 26 jul. 2024